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O Mar Como Pretexto

| Fotografia Panorâmica 1| Baía de Sines | Sines | 09.Mai.2009 | Fotografia de Cátia Assunção.

Portugal constitui um território predominantemente litoral no qual o mar assume um papel de destaque em vários domínios motivando, desde os tempos mais remotos, o desenvolvimento de assentamentos urbanos, pesqueiros e portuários, arrogando-se como fonte de abastecimento de alimento, potenciador de trocas comerciais, movimento de pessoas e bens e como ponto de partida para horizontes desconhecidos.

Desde cedo se percebeu que é perto da costa e dos rios que se encontram as melhores condições para o desenvolvimento agrícola, em cujo atlântico actua como agente regulador do clima, evitando frios intensos, propiciando temperaturas relativamente estáveis e amenas.

Destacando-se na geografia da costa atlântica portuguesa, designada como uma espécie de finisterra da Europa, num pequeno promontório localizado a meia distância entre o Cabo de Sagres e o Estuário do Sado, a região de Sines constituiu um bom exemplo das características morfológicas da costa, integrando falésias rochosas, extensas praias de areia clara bem como pequenos pontos onde a incursão do oceano dialoga consentâneamente com pequenas lagoas de água doce.

O oceano e sobretudo a baía natural, côncava, de águas calmas e naturalmente abrigada pelo cabo de Sines, estabelecem a primeira grande oportunidade urbanística da região, tendo as populações como principal motivação não só a actividade piscatória como também a possibilidade de comunicação e de comércio, dada a sua localização no contexto das rotas comerciais, nomeadamente nas descritas entre o Algarve e a capital.

A relação com o mar é também potenciada pela actividade agrícola e florestal das áreas circundantes, uma vez que é sobretudo através dele, que se faz o seu transporte e

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comercialização. As características morfológicas, uma vez que possibilitam boas condições de defesa relativamente a eventuais invasores, colocam, mais uma vez, o mar não como adversidade, mas como uma benevolência.

A segunda grande oportunidade urbanística fomentada pelo oceano ressalta somente a partir da segunda metade do século XX, quando se percebe, ao observar a batimetria, que este é o único ponto da costa portuguesa capaz de abrigar navios de grande calado, dando resposta à necessidade de modernização industrial de um país que padece de um grande atraso no sector e às reconhecidas limitações dos portos de Lisboa e Setúbal para tal função14. Intensifica-se assim, de forma exponencial, o carácter industrial e comercial da região, que a partir daqui deixa de se relacionar somente com a actividade piscatória e de escoamento dos produtos da região, passando a servir, sobretudo, as industrias petroquímicas e metalomecânicas.

A partir de então, Sines passa a integrar o mapa das rotas comerciais, enquanto

porto complementar dos portos de Lisboa e Setúbal, instituindo-se como imprescindível para o estabelecimento de tráfego pesado que colocaria Portugal num patamar mais elevado no âmbito do comércio marítimo mundial. As condições geomorfológicas da costa, nomeadamente os fundos naturais, os quais dispensam assoreamento, passam a constituir um elemento de relevo no âmbito do desenvolvimento da região, instaurando-se como uma das mais significativas potencialidades de progresso num Baixo Alentejo marcadamente subdesenvolvido e num país caracterizado por fortes assimetrias regionais.

14 Para além das condições naturais que fomentavam a dificuldade em receber navios de grande calado, os portos de

Lisboa e Setúbal padeciam também, de dificuldades no que respeita à instalação de cais mineraleiros (CARVALHO, 2005, p. 79).

| Fotografia 7 | Porto de Sines (vista do Terminal Multipurpose) | Sines | 23.Out.2009 | Fotografia de Cátia Assunção.

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O mar impulsiona Sines colocando o país ao nível dos iberoportos e europortos existentes, possibilitando não só o aproveitamento intensivo dos recursos naturais do Alentejo como também a integração, por proximidade, no contexto das rotas marítimas entre a Europa, Mediterrâneo, América do Sul e África15.

Apesar do relacionamento entre água, e terra sofrer constantes alterações, no decurso da história, experienciando relações de maior ou menor proximidade, com o porto, o cais, a frente de água ou a doca, a verdade é que, na maioria dos casos, e de uma forma transversal ao tempo, estes são os elementos e espaços que contribuem de forma mais incisiva para a competitividade destas cidades (se não directa, pelo menos indirectamente) e, consequentemente das regiões envolventes.

Desde a década de 1970, que o mar com o seu uso comercial e industrial se mantém como ex-líbris da região, sendo o principal motor de desenvolvimento, apesar de experienciar ritmos diferentes ao longo do tempo, ritmos esses que inevitavelmente

transparecem os contextos político, económico e social do país, da Europa e do mundo. Paralelamente à actividade portuária, o mar e as praias impõem-se como principais referências para o desenvolvimento turístico, mais intenso nos meses de Verão, registando temperaturas médias da água na ordem dos 15 a 17º C16. Sem dúvida que a actividade turística tem, sobretudo desde a década de 60, registado algum desenvolvimento, embora de forma lenta, prevendo-se porém, uma intensificação desta actividade num futuro próximo.

15 Para melhor conhecimento consultar Apêndice Documental – Documentos de Apoio ao Corpo Teórico -

Movimentação Mundial de Ramas e Produtos em 1971 e Acessibilidades Marítimas do Porto de Sines – p. 91.1.

16 Fonte: Atlas de Portugal do Instituto Geográfico do Exército, Texto de Henrique Souto, “O Mar que nos Envolve –

Variações de Temperatura”, consultado a 15 de Julho de 2010 em http://www.igeo.pt/atlas. | Fotografia 8 | Praia da Vieirinha | Sines | 11.Jun.2009 | Fotografia de Cátia Assunção.

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Por outro lado, prevê-se também uma intensificação da actividade portuária baseada na melhoria e desenvolvimento de infra-estruturas, bem como no aprumo e aceitação das exigências da contemporaneidade fundamentadas na especialização, na tecnologia e, sobretudo, no conhecimento.

Deste modo, e tendo em consideração a caracterização da região, que traduz a conjuntura de todo um país marcado por um fraco desenvolvimento agrícola, um aproveitamento incipiente dos seus recursos naturais, geográficos e patrimoniais, augura- se que o mar se mantenha enquanto principal motor de desenvolvimento da cidade e região de Sines, e um dos principais do Baixo Alentejo, embora experiencie os efeitos do progresso, aperfeiçoando-se a diferentes contextos e dinâmicas.

Conclui-se portanto que, de uma forma geral, a motivação da criação dos povoamentos é, normalmente atraída pela água, seja ela fluvial ou marítima, pelos mais diversos motivos, tal como abordado anteriormente. Para além de motivações de ordem mais prática e indispensáveis à sobrevivência, o estabelecimento de laços afectivos e relações mentais com seu ambiente envolvente, são características naturais do ser humano, que contribuem de forma marcante, para o facto de cerca de quatro quintos da população actual, viver a cerca de cinquenta quilómetros da zona costeira (BRITO R. S., Território, Suporte das Gentes, 2005). Em Portugal, dada a sua localização geográfica, tal relação é sentida de forma intensa, uma vez que o mar serviu, em diferentes contextos, para a hegemonia de povo marcado pelas vicissitudes da história.

De um modo frequente, a relação entre os povoamentos e o mar, é mantida, mais que não seja, por uma cultura local, resistente à mudança e quase sempre relacionada com a actividade piscatória. Porém, e apesar das transformações, mais ou menos lentas, ou incisivas, a relação entre desenvolvimento urbano e água/mar é quase sempre inseparável, embora experienciando diferentes graus de proximidade. O desenvolvimento das cidades marítimas/portuárias, depende, em primeiro grau, do dinamismo do mar. Embora dependa também, inevitavelmente de outros factores, de ordem endógena e exógena, é no mar que encontram, na grande maioria dos casos, a motivação, o elemento diferenciador ou o factor de competitividade que se impõe como motor de desenvolvimento.

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