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2 DA INTERNACIONALIZAÇÃO DAS PRÁTICAS ANTICOMPETITIVAS: OS

2.2 OS CARTÉIS INTERNACIONAIS

2.2.2 Conceito e nomenclatura dos cartéis internacionais

De acordo com parcela da doutrina, o caráter internacional de um cartel advém da composição de seus membros, isto é, do fato de seus participantes serem empresas originárias de mais de um Estado. Dessa forma, o cartel internacional seria aquele cujos integrantes têm sede ou domicílio em países distintos ou nacionalidades diversas94. Todavia, tal definição não parece ser a mais adequada, por ser ora bastante restritiva, ora demasiado extensiva. Por exemplo, são excluídos do referido conceito os cartéis formados por empresas de apenas um país, mas que atuam em vários pontos do globo, ao passo que são incluídos os acordos celebrados por agentes de várias nações, mas que visam a limitar a concorrência de um único Estado.

Por outro lado, pode-se centrar no âmbito de atuação dos partícipes. Assim, estar-se-ia diante de um cartel internacional quando ele é composto por empresas que operam em simultâneo em mais de um país (independentemente da origem delas), de sorte que o mercado relevante em que os agentes atuam ultrapassa os limites geográficos de um Estado95. Entretanto, tal definição pode ser, por vezes, muito abrangente, englobando como internacionais, por

93 MAGGI, Bruno Oliveira. O Cartel e seus Efeitos no Âmbito da Responsabilidade Civil. 2010. 221 f. Dissertação de Mestrado em Direito Civil – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2131/tde-28012011-140203/pt-br.php>. Acesso em: 24/07/2016. p. 21/57; FORGIONI, Paula. op. cit. p. 346/348; OLIVEIRA, Gesner; RODAS, João Grandino. op. cit. p. 57/58; NUSDEO, Fábio. op. cit. p. 271/272.

94 CONNOR, John. Global Antitrust Prosecutions of Modern International Cartels. Journal of Industry, Competition and Trade, Vol. 4, Iss. 3, 2004. p. 239/240; CONNOR, John. The Private International Cartels (PIC) Data Set: Guide and Summary Statistics, 1990-2013. SSRN Working Paper, August 9, 2014. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2478271>. Acesso em: 26/07/2016. p. 2/3; CONNOR, John. Private Recoveries in International Cartel Cases Worldwide: What do the Data Show? The American Antitrust Institute Working Paper No. 12-03, October 2012. Disponível em: <http://www.antitrustinstitute.org/sites/default/ files/WorkingPaperNo12-03.pdf>. Acesso em 26/07/2016. p. 3; YU, Yinne. The Impact of Private International Cartels on Developing Countries. Honors Thesis, Stanford University, Department of Economics, 2003. p. 1, 5; ARRUDA, Vivian Anne Fraga do Nascimento. op. cit. p. 65.

95 SANTOS, Karla Margarida Martins. op. cit. p. 63/64; SANTOS, Karla Margarida Martins. Os Cartéis Internacionais e a Transnacionalização das Decisões do Direito Concorrencial. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 9, n.º 4, 2012. p. 68/69; FORGIONI, Paula. op. cit. p. 218/220. Levenstein e Suslow, apesar de considerarem como elemento distintivo do cartel internacional o fato de ele ser composto por agentes econômicos de mais de um país, reconhecem que, em alguns casos, a empresa legalmente responsável está localizada na mesma jurisdição de seus coconspiradores, embora seja uma subsidiária de uma corporação estrangeira, razão por que tais acordos também são considerados cartéis internacionais (LEVENSTEIN, Margaret; SUSLOW, Valerie. International Cartels. In COLLINS, Wayne Dale (ed.). Issues in Competition Law and Policy, Vol. II. Chicago: ABA Section of Antitrust Law, 2008. p. 1107). Entretanto, reputa-se existir cartel internacional ainda que todas as matrizes das empresas componentes do conluio localizem-se na mesma jurisdição, desde que a atuação delas se dê em mais de um país.

exemplo, cartéis cujos membros funcionam em mais de um país, mas restringem a concorrência de um único Estado.

A seu turno, uma definição mais pragmática propõe a caracterização dos cartéis internacionais, ao menos para fins de aplicação da lei antitruste, a partir de seus efeitos. Desse modo, é considerado internacional um cartel estrangeiro que produza efeitos econômicos na jurisdição da autoridade que analisa a conduta. Por outro lado, haverá um cartel nacional, ainda que formado por empresas transnacionais, quando seus efeitos se restrinjam a um só território96. Essa definição é, de fato, a mais utilizada pelas autoridades antitruste, em virtude da aplicação extraterritorial do Direito da Concorrência, com base na teoria dos efeitos, que é técnica corrente na maioria dos direitos nacionais, o que será objeto de análise na segunda parte deste trabalho. Nesse sentido, um determinado país terá jurisdição para julgar um cartel se ele produzir efeitos em seu território. Trata-se de uma abordagem unilateral, que leva em conta somente os prejuízos à concorrência interna, de modo que cartéis que tenham como integrantes empresas atuantes no país, mas que prejudicam a concorrência apenas de mercados estrangeiros, não serão considerados pelo direito nacional. Portanto, o cartel internacional, para ser considerado por dada jurisdição, precisa afetar a concorrência do respectivo mercado nacional, uma vez que a legislação antitruste exclui de seu âmbito de aplicação restrições da concorrência unicamente no exterior, estando estas sujeitas ao direito estrangeiro97.

Nesse contexto, uma definição mais precisa e imparcial, desvinculada a um país específico, deve levar em conta o âmbito geográfico do escopo do acordo. Haverá, pois, um cartel internacional quando o conluio ultrapassar as fronteiras nacionais, prejudicando a concorrência de mais de um país, independentemente da origem das empresas, do local em que elas operam e de os efeitos se verificarem em um determinado Estado98. Produzindo efeitos em mais de uma jurisdição, o cartel será considerado internacional. É evidente que, na grande maioria dos casos, os cartéis internacionais serão formados por empresas originárias de Estados distintos e que atuam em mais de um país, todas as definições antes apresentadas chegando a um mesmo resultado99.

96 SILVEIRA, Paulo Burnier da; TOLLINI, Priscilla Tardelli. International Cartels in Brazil: an Overview and a Look Forward. In CARVALHO, Vinícius Marques de; RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert; SILVEIRA, Paulo Burnier da (org.). International Cooperation and Competition Enforcement: Brazilian and European Experiences from the Enforcers' Perspective. Alphen aan den Rijn: Kluwer Law International, 2014. p. 170.

97 JAEGER JÚNIOR, Augusto. op. cit. p. 39/40. Tal questão será retomada na segunda parte do trabalho, quando se analisar a definição de efeitos.

98 Contudo, como visto, a análise da produção dos efeitos em determinada jurisdição será fundamental para saber se o respectivo país possuirá jurisdição para regular a conduta, consoante será melhor examinado na parte II. 99 Em sentido semelhante se coloca Martinez, segundo a qual “cartéis poderão ser definidos como internacionais se ao menos um dos seguintes requisitos for preenchido: (i) se envolver partes de ao menos duas jurisdições; (ii) se a conduta causar efeitos em ao menos duas jurisdições; ou (iii) se a conduta tiver sido praticada em uma

Em relação à nomenclatura, consideram-se intercambiáveis os termos cartéis internacionais, transnacionais e transfronteiriços. John Connor realiza interessante distinção entre cartéis internacionais e cartéis globais, estes com a particularidade de envolver pelo menos dois continentes, geralmente mercados da tríade das regiões mais industrializadas da atual economia política internacional (ou seja, da Europa Ocidental, da América do Norte e da Ásia Oriental)100. Contudo, essa diferenciação não será usada neste trabalho, que englobará, no gênero cartéis internacionais, a espécie cartéis globais.

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