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4 DAS PERSPECTIVAS PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO DO DIREITO DA

4.1 A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL COMO INSTRUMENTO PARA A

4.1.5 A cooperação internacional no Brasil

4.1.5.2 O protagonismo do CADE na cooperação internacional

O quadro normativo da cooperação internacional em matéria de concorrência realizada pelo Brasil foi bastante modificado após a edição do Decreto n.º 7.738/2012 (que aprova a Estrutura Regimental do CADE) e da Resolução do CADE n.º 1/2012 (que institui o RICADE e regulamenta o mencionado decreto). Tais normativas estabeleceram um marco regulatório inovador ao consagrar o CADE como protagonista na cooperação internacional, colocando o SBDC em consonância com as correntes recomendações dos foros internacionais e práticas dos sistemas antitruste mais avançados565.

Antes de tais mudanças, utilizava-se, sobretudo, os pedidos de assistência em matéria civil com trâmite pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica

562 Sobre estes, vide ARRUDA, Vivian Anne Fraga do Nascimento. op. cit. p. 175/177, 183.

563 ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OECD). Improving International Co-Operation in Cartel Investigations. p. 2.

564 ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OECD). Improving International Co-Operation in Cartel Investigations. p. 2/3; CARVALHO, Vinícius Marques de; SILVEIRA, Paulo Burnier da. op. cit. p. 101; WEBBER, Marianne Mendes. op. cit. p. 84/85.

565 ARANOVICH, Tatiana de Campos. op. cit. p. 127/128. Essas regras devem ser lidas em conjunto com o Capítulo II do Título II do Livro II do Código de Processo Civil de 2015, que traça os contornos gerais da cooperação jurídica internacional, uma vez que o CPC aplica-se subsidiariamente à Lei n.º 12.529/2011.

Internacional (DRCI), subordinado à Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania do Ministério da Justiça e Cidadania, e/ou pelas vias diplomáticas. Contudo, tais procedimentos se mostravam excessivamente burocráticos e formalistas, contrariando a celeridade necessária para a eficácia das medidas. Com as aludidas alterações legislativas, aprimoraram-se os mecanismos, tanto na cooperação ativa (requerida pela autoridade brasileira) como na passiva (requerida por autoridade estrangeira), disciplinando-se em legislação interna o procedimento de assistência mútua em questões antitruste. A partir de então, o CADE adquiriu competência para exercer a função de autoridade central na tramitação de pedidos ativos e passivos de cooperação jurídica internacional em matéria de defesa da concorrência566.

A autoridade central constitui, juntamente com as vias diplomática e consular, um dos três meios de cooperação, sendo cada vez mais utilizada na prática. Ela se insere no chamado auxílio ou assistência direta, modalidade de cooperação internacional desenvolvida para agilizar os procedimentos tradicionais (através das mencionadas vias diplomática e consular), associados à morosidade. Por meio do auxílio direto, a solicitação é dirigida pela autoridade estrangeira diretamente aos agentes nacionais (as autoridades centrais), para que estes lhe deem cumprimento, por meio do exercício formal de suas atribuições, tal qual se tratasse de um procedimento doméstico. A execução do pedido é inteiramente nacional, com a única especificidade de ter sido iniciada por uma demanda de autoridade estrangeira. Assim, estabelece-se um contato direto e facilitado entre os órgãos nacionais e congêneres estrangeiros, ao mesmo tempo em que se garante uma via institucionalizada que assegura a autenticidade, a veracidade e a legalidade de documentos e atos567. Desse modo, a dispensa de trâmite por

566 Idem. Ibidem. p. 128/131. Tal competência do CADE está prevista nos seguintes dispositivos: Decreto nº 7.738/2012:

Art. 22. Ao Presidente do Tribunal compete: (...)

XIII - exercer a função de autoridade central para tramitação de pedidos ativos e passivos de cooperação jurídica internacional em matéria de defesa da concorrência, sem prejuízo das atribuições regimentais do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, e demais atribuições previstas em outros tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja parte; XIV - executar e obter a cooperação mútua e o intercâmbio de informações com órgãos de defesa da concorrência de outros países, ou com entidades internacionais, em matéria de defesa da concorrência, na forma estabelecida nos tratados, acordos ou convênios referidos no inciso XII do caput, e, na ausência destes, com base em reciprocidade.

RICADE:

Art. 11. Compete ao Presidente do Tribunal: (...)

XIX - executar e obter a cooperação mútua e o intercâmbio de informações com órgãos de defesa da concorrência de outros países, ou com entidades internacionais, nas atividades relacionadas à proteção da livre concorrência, na forma estabelecida em tratados, acordos ou convênios, e, na ausência destes, com base na reciprocidade.

567 Nesse sentido, a institucionalização do CADE como autoridade central passa a conferir formalidade ao ato de cooperação internacional em matéria antitruste, razão por que se passou a dispensar a tradução juramentada da

órgãos intermediários facilita a comunicação entre as autoridades concernentes e confere maior celeridade e fluidez ao procedimento, sem, contudo, implicar uma frouxidão quanto ao grau de formalismos exigido568.

Vale destacar que o CADE poderá vir a executar os pedidos de assistência mútua diretamente, nos casos em que possuir competência legal para a execução da medida solicitada. É o que ocorre, por exemplo, naquelas hipóteses que dispensam intervenção judicial, tal qual se dá em prestação de informações públicas ou sobre a legislação brasileira aplicável. Por outro lado, se a autarquia não for competente para a prática do ato objeto dos pedidos de cooperação (nos casos, por exemplo, em que sejam necessárias medidas judiciais, como a realização de buscas e apreensões), a execução da medida pelo CADE será indireta, sendo apenas responsável pelo recebimento e encaminhamento das solicitações ao órgão nacional competente569.

Ademais, o próprio art. 22, XIII do Decreto nº 7.738/2012, que prevê a atuação do CADE como autoridade central, ressalva que a nova função da autarquia se dá sem prejuízo das competências do DRCI e demais atribuições previstas em outros tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja parte570. Dessa forma, as comentadas alterações legislativas não impedem que o CADE continue a usar, paralelamente, os pedidos de assistência em matéria civil com trâmite pelo DRCI. Da mesma maneira, em se tratando de solicitações provenientes de autoridades responsáveis por persecução criminal, com fundamento em MLATs, os requerimentos também devem ser encaminhados para o DRCI ou a PGR, de acordo com o órgão que tenha sido determinado como autoridade central pelo respectivo tratado. Portanto, a inovação em atribuir ao CADE a função de autoridade central visa apenas a complementar os procedimentos anteriormente existentes, e não a eliminá-los, aperfeiçoando a tramitação da cooperação internacional em matéria de defesa da concorrência no país571.

Além disso, cabe ressaltar que o art. 22, XIV do Decreto nº 7.738/2012 e o art. 11, XIX do RIDACDE preveem que a realização da cooperação internacional entre o CADE e uma autoridade antitruste estrangeira ou uma entidade internacional deverá ser baseada em tratado, acordo ou convênio internacional e/ou na reciprocidade. Assim, conforme antes comentado, a cooperação pode ocorrer ainda que inexista instrumento internacional firmado entre as partes,

documentação pertinente, bastando sua tradução técnica simples (ARANOVICH, Tatiana de Campos. op. cit. p. 131/132).

568 WEBBER, Marianne Mendes. op. cit. p. 81/82; ARANOVICH, Tatiana de Campos. op. cit. p. 131. 569 WEBBER, Marianne Mendes. op. cit. p. 82; ARANOVICH, Tatiana de Campos. op. cit. p. 132.

570 É o caso, por exemplo, da Procuradoria Geral da República (PGR), que é prevista como autoridade central no Tratado de Auxílio Mútuo em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Portuguesa e no Tratado de Assistência Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Canadá.

desde que haja a promessa de reciprocidade para casos análogos, fundamentando-se tais hipóteses na própria lei doméstica.

Por sua vez, quanto aos procedimentos, os pedidos estrangeiros de cooperação deverão adotar a forma e seguir os trâmites e ritos previstos no Estado ao qual se requer sua execução (o denominado princípio da lex diligentiae). Desse modo, a medida solicitada à autoridade brasileira deverá ser cumprida como se inteiramente nacional fosse, de sorte a observar os requisitos legais e garantias constitucionais do ordenamento pátrio. Por outro lado, o CADE possui certo grau de discricionariedade na aceitação da demanda de cooperação internacional, visto que seu cumprimento poderá ser recusado caso a autoridade entenda que a execução poderá violar o interesse público572-573.

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