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Constitucionalização do Direito do Petróleo

No documento O poder normativo com ênfase na ANP (páginas 138-144)

Sabendo-se que apenas a partir da Constituição de 1934, (16/07/34), se iniciou o tratamento da matéria a respeito da concessão para exploração do petróleo, não há razão para maiores análises das Constituições anteriores, as quais são a Constituição de 1824 (25/03/1824), e de 1891, (24/02/1891), porque não havia preocupação ainda em seus textos sobre a comercialização do petróleo no Brasil.

A CF de 1824, outorgada pelo Imperado Dom Pedro II, não chegava a tratar dos recursos minerais, mas apenas dizia que seria assegurado o direito de propriedade em sua plenitude, assegurado o pagamento de indenização em caso de exigibilidade de uso ou emprego, mas o que se percebe é que a grande maioria das terras eram de propriedade pública, as poucas propriedades privadas que existiam eram provenientes de concessões reais

311 Estas expressões significam partes do processo exploratório do petróleo, a primeira etapa é a upstream que identifica os campos, por meio de estudos, exploração, transporte até as refinarias, quando entra a midlestream, que são as atividades de refinamento e assim transformação da matéria prima em produtos manifaturados, e a última atividade da cadeia de produção é a downstream, que é a logística, ou seja, o transporte do produto das refinarias até o mercado de consumido, para então ser distribuídos e comercializado para o consumidor final. 312 MENEZELLO, Maria D’Assunção Costa. Comentários à Lei do Petróleo. 2ed., Editora Atlas: São Paulo, 2009, p. 1-25

e assim não havia maiores detalhamentos sobre as propriedades privadas, não dispondo sobre os minerais constantes no solo.

Art. 179 (...) XXII - É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem público legalmente verificado exigir o uso, e emprego da Propriedade do Cidadão, será elle préviamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos, em que terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação.

Em 1864, são datados os primeiros estudos sobre a possibilidade da existência de petróleo em território brasileiro. Neste diapasão, houve a mudança na interpretação da disciplina constitucional em relação às riquezas provenientes do solo, que antes eram do proprietário do solo plenamente, e passaram a ser objeto de intervenções administrativas, como as desapropriações em decorrência de necessidade ou utilidade pública, assegurado o pagamento de indenização previamente na Carta de 1891.

Assim, a partir da Constituição de 1891, o direito de propriedade passou a fazer parte do rol dos direitos invioláveis, cujo art. 72, §17, determinou que o proprietário do solo detinha a propriedade dos recursos naturais ali encontrados, devido ao caráter da acessoriedade que os recursos minerais apresentavam em relação ao solo, conforme o dispositivo seguinte:

Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 17 - O direito de propriedade mantém-se em toda a sua plenitude, salva a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia. As minas pertencem aos proprietários do solo, salvas as limitações que forem estabelecidas por lei a bem da exploração deste ramo de indústria.

No ano de 1907, foi criado o Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil – SGMB, com o objetivo de estimular a pesquisa de reservas petrolíferas no Brasil, mas o país ainda não dispunha de uma infraestrutura especializada nesta atividade, carente de recursos e equipamentos.

Antes da Era Vargas, o governo de Washington Luís baseava-se na República Velha dos cafeicultores brasileiros, que em virtude da superprodução culminaram numa drástica crise econômica, eis que a produção de café excedia o seu consumo.

A crise de 1929 dos Estados Unidos, agravou ainda mais a situação no Brasil, pois os EUA eram um grande importador de café brasileiro, mas em virtude da I Guerra Mundial,

passou a investir unicamente na industria bélica, enquanto a Europa se industrializava largamente, deixando assim de depender dos produtos importados dos EUA, o que gerou estoque e queda de preços dos produtos americanos, gerando a quebra de várias empresas, em razão da retirada das ações de forma abrupta pelos investidores das empresas, e assim aumentou a dívida externa brasileira, havendo também a queda dos créditos brasileiros.

Além disso, o quadro brasileiro se intensificou quando Washington Luís burlou o acordo de suceder um presidente mineiro, em razão da política do café com leite, passando a preferência ao cargo de presidente para Júlio Prestes, que era paulista, gerando o fim da política de valorização do café, deixando as oligarquias insatisfeitas com o governo estabelecido. Isto deu azo ao fortalecimento do Ministro da Fazenda Getúlio Vargas, á época, à candidatura de Presidente da República, aliado ao candidato à vice presidência João Pessoa, o qual se teve por assassinado com base em motivos políticos, gerando a tomada de poder pelos militares inaceitável pelo povo, que exigiu a ascensão de Getúlio a Presidente.

Em 1930, principia a preocupação brasileira a respeito do petróleo, em todos os níveis da federação, e em meio a amplas discussões, dividem o tema entre os defensores do monopólio estatal na exploração do petróleo, e aos que defendem a possibilidade da iniciativa privada explorá-lo.

Após a Revolução de 1930, Getúlio Vargas assume o poder afastando o interesse agrário comercial das oligarquias, adotando uma política industrial, investindo na indústria de base e energia.

A partir da Constituição de 1934, seu art. 119 passou a constar que o aproveitamento industrial das minas e das jazidas, assim como as águas e energia dependiam de concessão, além de incorporar a ordem econômica e social, sob a influência da Constituição do México de 1917, (05/02/17) e de Weimar de 1919 (11/08/19).

Art 119 - O aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, bem como das águas e da energia hidráulica, ainda que de propriedade privada, depende de autorização ou concessão federal, na forma da lei. § 1º - As autorizações ou concessões serão conferidas exclusivamente a brasileiros ou a empresas organizadas no Brasil, ressalvada ao proprietário preferência na exploração ou co-participação nos lucros. (...) § 4º - A lei regulará a nacionalização progressiva das minas, jazidas minerais e quedas d'água ou outras fontes de energia hidráulica, julgadas básicas ou essenciais à defesa econômica ou militar do País. § 5º - A União, nos casos prescritos em lei e tendo em vista o interesse da coletividade, auxiliará os Estados no estudo e aparelhamento das estâncias mineromedicinais ou termomedicinais. § 6º - Não depende de concessão ou autorização o aproveitamento das quedas d'água já utilizadas industrialmente na data desta Constituição, e, sob esta mesma ressalva, a exploração das minas em lavra, ainda que transitoriamente suspensa.

Assim a sua exploração passa a ser objeto de concessão, perseverando o pensamento na Constituição de 1937, (10/09/37), mas restringindo ao regime das autorizações.

Art 143 - As minas e demais riquezas do subsolo, bem como as quedas d'água constituem propriedade distinta da propriedade do solo para o efeito de exploração ou aproveitamento industrial. O aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica, ainda que de propriedade privada, depende de autorização federal. § 1º - A autorização só poderá ser concedida a brasileiros, ou empresas constituídas por acionistas brasileiros, reservada ao proprietário preferência na exploração, ou participação nos lucros.

Em 1938, com o Decreto nº 395 (30/10/69) foi declarada a utilidade pública do petróleo. Este decreto foi a primeira legislação brasileira a respeito do petróleo, pois antes só se falava sobre produtos extraídos do solo.

Neste mesmo ano, em 1938, Vargas criou o Conselho Nacional do Petróleo, CNP, com o objetivo de coordenar os assuntos de distribuição, pesquisa, lavra e refino de petróleo. Era o início da intervenção estatal na economia no sentido de regular o setor petrolífero.

Neste sentido, tem a visão de que a criação das agências reguladoras não trouxe qualquer teor de inovação, uma vez que as atividades regulatórias já eram implementadas por outros entes anteriores a sua consolidação, no caso do petróleo este papel foi iniciado pelo

CNP. 313

No ano de 1939, ocorre a primeira exploração de sucesso no Brasil, a qual se deu na cidade de Lobato, na Bahia, quando então a Bacia do Recôncavo Baiano passou a ser intensamente explorada.

Em 1942, Vargas cria a Companhia Vale do Rio Doce, e em 1946, a Companhia Siderúrgica Nacional, conhecida como a maior usina siderúrgica da América Latina. Simultaneamente a isto, Vargas defende os movimentos nacionalistas, e inicia a intensa intervenção do estado na economia.

Em 1946, o regime das concessões retornou:

Art 152 - As minas e demais riquezas do subsolo, bem como as quedas d'água, constituem propriedade distinta da do solo para o efeito de exploração ou aproveitamento industrial.

Art 153 - O aproveitamento dos recursos minerais e de energia hidráulica depende de autorização ou concessão federal na forma da lei.

313 DUTRA, Luís Eduardo Duque. Combustíveis no Brasil – Desafios e Perspectivas . Rio de Janeiro: Synergia, 2012, p. 44

§ 1º - As autorizações ou concessões serão conferidas exclusivamente a brasileiros ou a sociedades organizadas no País, assegurada ao proprietário do solo preferência para a exploração. Os direitos de preferência do proprietário do solo, quanto às minas e jazidas, serão regulados de acordo com a natureza delas.

Com a vitória dos Estados Unidos na Segunda Guerra, o Brasil criou o Estatuto do Petróleo em 1948, com o intuito de imiscuir capital público e privado na dita atividade, em virtude de nossa carência de tecnologia à época.

Eurico Gaspar Dutra, em 1948, levou ao Congresso um anteprojeto que autorizava empresas privadas participarem da indústria de combustíveis, só que o Brasil não dispunha de empresas privadas com estes recursos tecnológicos, o que acarretaria a entrada de estrangeiros na atividade. Isto foi alvo de críticas pelos nacionalistas que assim se opuseram a aprovação do anteprojeto.

Em 1951, inicia a campanha “o petróleo é nosso” quando Getúlio é reeleito e elabora o Projeto de Lei 1561/51 (1º/10/51), o qual proporcionou a aprovação da Lei 2004/53. Apesar de todo este avanço no ramo petrolífero, o que se constata é que o seu monopólio foi reconhecido apenas em 1953, em virtude da Lei que instituiu a Petrobrás para exercê-lo.

A Constituição de 1946 (18/08/46), não dispôs sobre o regime de monopólio, pois havia uma bipartição de opiniões sobre a monopolização ou não da exploração de petróleo e resolveu-se deixar o tratamento do assunto por lei ordinária.

O art. 162 da Constituição de 1967, (24/01/67), passou a constitucionalizar o monopólio da Petrobrás na indústria petroleira que já era matéria de lei ordinária. A Carta assegurava que a propriedade do solo era distinta da propriedade dos recursos ali encontrados, se tratavam de bens jurídicos distintos e reconhecia a participação do proprietário nos resultados, da lavra, em relação às jazidas e minas cujo monopólio fosse da União.

Art 161 - As jazidas, minas e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo para o efeito de exploração ou aproveitamento industrial. § 1º - A exploração e o aproveitamento das jazidas, minas e demais recursos minerais e dos potenciais de energia hidráulica dependem de autorização ou concessão federal, na forma da lei, dada exclusivamente a brasileiros ou a sociedades organizadas no País. § 2º - É assegurada ao proprietário do solo a, participação nos resultados, da lavra; quanto às jazidas e minas cuja exploração

constituir monopólio da União, a lei regulará a forma da indenização. Art 162 - A pesquisa e a lavra de petróleo em território nacional constituem monopólio da União, nos termos da lei.

A ideia da Carta de 1967, foi perpetuada em 1969, pois o AI (Ato Institucional) 01 de 1969, (07/10/69) em seu art. 169 manteve o trecho a respeito do monopólio petrolífero. O

AI em alusão é reconhecido por alguns constitucionalistas como José Afonso da Silva como Constituição, pois uma emenda não tem a intenção de desconstituir a Carta em vigor, e ao convocar uma Assembléia Nacional Constituinte, configuraria um verdadeiro ato político para

desconstituir a ordem vigente.314

Art. 169. A pesquisa e a lavra de petróleo em território nacional constituem monopólio da União, nos têrmos da lei.

Em seguida veio a Constituição de 1988, (05/10/88), para melhor detalhar a

matéria em seu art. 177315. Esta Constituição retirou a ordem econômica de junto dos Direitos

Sociais, que desde 1934 vinham juntos no texto das Constituições, mas com a modificação, os Direitos Sociais passaram a integrar o rol dos Direitos e Garantias Fundamentais e a ordem econômica passou a ser chamada ‘Da Ordem Econômica e Financeira’.

Posteriormente, o texto constitucional do art. 177 foi modificado pela EC n°

9/95316, flexibilizando o monopólio da Petrobrás, para que empresas privadas também

pudessem participar na atividade de exploração.

314 JESUS, Damásio apud SILVA, José Afonso. Disponível em :

http://www.damasio.com.br/LinkClick.aspx?fileticket=NiWuNIuUTSw%3D&tabid=141. Acesso em 16 de abril de 2013

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Art. 177 - Constituem Monopólio da União:I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e

outros hidrocarbonetos fluidos;II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores;IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal. (Alterado pela EC-000.049-2006)§ 1º - A União poderá contratar com

empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I e II deste artigo, observadas as condições estabelecidas em lei. (Alterado pela EC-000.009-1995)§ 2º - A lei que se refere o §

1º disporá sobre: (Acrescentado pela EC-000.009-1995)I - a garantia do fornecimento dos derivados de petróleo em todo o território nacional;II - as condições de contratação;III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União.§ 3º - A lei disporá sobre o transporte e a utilização de materiais radioativos no território nacional. (Alterado pela EC-000.009-1995)§ 4º - A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: (Alterado pela EC-000.033-2001)I - a alíquota da contribuição poderá ser:a) diferenciada por produto ou uso;b) reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150, III, b;II - os recursos arrecadados serão destinados:a) ao pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo;b) ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás;c) ao financiamento de programas de infra-estrutura de transportes.

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Art. 177(...)§ 1º A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei. § 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre: I - a garantia do fornecimento dos derivados de petróleo em todo o território nacional; II - as condições de contratação; III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União.

Depreende-se que a Constituição de 1988, por meio do art. 177, transcreveu detalhadamente as atividades da indústria petroleira previstas na Lei instituidora da Petrobrás nº 2.004/53 então revogada pela Lei 9.478/97.

Art. 1º Constituem monopólio da União: I - a pesquisa e a lavra das jazidas de

petróleo e outros hidrocarbonetos fluídos e gases raros, existentes no território nacional; II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados de petróleo produzidos no Pais, e bem assim o transporte, por meio de condutos, de petróleo bruto e seus derivados, assim como de gases raros de qualquer origem. Art. 2º A União exercerá, o monopólio estabelecido no artigo anterior: I - por meio do Conselho Nacional do Petróleo, como órgão de orientação e fiscalização; II - por meio da sociedade por ações Petróleo Brasileiro S. A. e das suas subsidiárias, constituídas na forma da presente lei, como órgãos de execução. (REVOGADA)

Esta lei trazia ainda em seu bojo dispositivos a respeito do CNP, do capital da Petrobrás, dos seus acionistas, de sua diretoria e do seu conselho fiscal, dos seus fatores e obrigações, de seu pessoal, de suas subsidiárias, entre outras concernentes à Petrobrás, a qual atuou de forma monopolística de 1953 até 1997.

Na prática, o que se percebe, é que a Petrobrás ganhou várias áreas privilegiadas nas rodadas de licitações em virtude de se tratar de empresa brasileira, com capital parcialmente público, o que não a coloca em posição de igualdade em relação às outras empresas particulares participantes do certame licitatório.

Mesmo assim, ainda não conseguimos alcançar a autossuficiência do petróleo, apesar de haver discursos políticos de que alcançamos esta independência desde 2005, o que é uma inverdade, posto que o Brasil ainda importa petróleo leve, já que a utilidade do óleo é decorrente de sua qualidade, assim há bens de consumo que não podem ser fabricados com o óleo brasileiro, restando-nos importar e fabricar o restante dos bens de consumo provenientes deste fóssil.

No documento O poder normativo com ênfase na ANP (páginas 138-144)