• Nenhum resultado encontrado

Políticas públicas e Justiça Fiscal

No documento O poder normativo com ênfase na ANP (páginas 104-110)

3.3 As limitações decorrentes da subordinação ao orçamento geral

3.3.3 Políticas públicas e Justiça Fiscal

As políticas públicas são ações desencadeadas pelo Estado para atender às necessidades da sociedade, podendo ser prestadas unicamente pelo governo ou por meio de PPPs (Parcerias Público Privadas). Estas para serem implementadas, precisam obviamente de receitas que financiem os projetos, mas há diversos problemas na administração pública no que pertine ao manuseio dos recursos públicos direcionados à efetivação de tais políticas.

Baleeiro, elenca as cinco fases da receita pública: a primeira seria a parasitária, como proveniente da extorsão em guerra; a segunda seria a dominial, proveniente do patrimônio do rei; a terceira seria a regaliana, proveniente do pedágio; a quarta seria a tributária e por fim a social, provenientes da tributação extrafiscal sócio política. Ele ainda define receita pública como entrada que integrando-se ao patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu valor como elemento

novo e positivo. 225

Art. 11 - A receita classificar-se-á nas seguintes categorias econômicas: Receitas Correntes e Receitas de Capital § 4º - A classificação da receita obedecerá ao seguinte esquema: RECEITAS CORRENTES RECEITA TRIBUTÁRIA Impostos Taxas Contribuições de Melhoria RECEITA DE CONTRIBUIÇOES Contribuições Sociais Contribuições Econômicas RECEITA PATRIMONIAL RECEITA AGROPECUÁRIA

RECEITA INDUSTRIAL RECEITA DE SERVIÇOS

TRANSFERÊNCIAS CORRENTES OUTRAS RECEITAS CORRENTES

RECEITAS DE CAPITAL

OPERAÇÕES DE CRÉDITO ALIENAÇÃO DE BENS

AMORTIZAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS TRANSFERÊNCIAS DE CAPITAL OUTRAS RECEITAS DE CAPITAL

De acordo com a Lei 4320/64, a receita pública se divide em receita corrente e receita de capital. As receitas correntes se subdividem em receitas tributárias (impostos – tributos não vinculados -, taxas - serviços divisíveis e específicos - e contribuições de melhoria - tributos vinculados-, receitas de contribuições (contribuições sociais e contribuições econômicas), receita patrimonial, receita industrial, receita de serviços e outras, conforme o §4º do art. 11 da lei supra mencionada.

As receitas de contribuições tem o caráter de serem receitas vinculadas, deve haver com a entrada destes montantes, vinculação orçamentária com despesas mandatórias como educação básica, saúde, pobreza etc.

O que se nota nos últimos anos, é que as receitas de contribuições ultrapassaram as receitas tributárias, assim contribuições sociais e econômicas são em maior número do que as taxas e os impostos e se o tributo tem um fim específico, a maior parte da receita das fontes tributárias está comprometida.

Em razão disto, a EC 44 repartiu parcela da contribuição de intervenção no domínio econômico, consubstanciada nos art. 177, §4º e art. 159,III da CF/88, levando a política tributária a deixar de ser baseada em impostos para basear-se em contribuições. Além disso, a EC 27/00 desvinculou 20% dos impostos e contribuições da União, com base no art. 76 da ADCT. A EC 42/03 desvinculou 20% da receita da União de impostos e contribuições sociais e intervenção no domínio econômico (contribuição para financiamento de seguridade social, cota-parte da contribuição sindical, contribuição sobre concursos de prognósticos, contribuições para programas de integração social e de formação do patrimônio público, contribuição social sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas e contribuições sobre movimentação financeira ou transmissão de valores e de crédito de natureza financeira – exceto parcela do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza-). A EC 56/07 prorrogou tudo

isto para 2011 e a EC 59/09 reduziu parcela da desvinculação do FUNDEB, em 2009 para

12,5%, em 2010 para 5% e em 2011 para 0. 226

As politicas públicas vinculadas aos tributos foram prejudicadas, pois os tributos vinculados ao serem desvinculados passam a exercer a função de impostos, os quais não são vinculados e sim repartidos igualmente pela sociedade, gerando um ônus desigual, para aqueles que contribuíram de forma vinculada ao tributo com vinculação. Isso gerou o direcionamento destas políticas ao beneficiamento de grupos eleitoreiros, cita-se como exemplo o orçamento participativo.

As taxas utilizam o princípio da equivalência (proíbe que o tributo ultrapasse o benefício), ou seja, o serviço equivale ao valor cobrado mediante taxa, e as contribuições utilizam o principio da proporcionalidade (se contribui proporcionalmente ao benefício, e não de forma abusiva), e não se sujeitam ao princípio da capacidade contributiva atinente aos impostos (baseado na solidariedade fiscal), não sendo direcionado para as necessidades gerais e sim específicas.

Sobre o principio da proporcionalidade argumenta Orozimbo Nonato no julgamento do RE 18331:

o poder estatal de não taxar não pode chegar a desmedida do poder de destruir, uma vez que aquele somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade do trabalho, de comércio e de indústria e com o direito de propriedade, sob pena de caracterizar ‘detournement de pouvoir’.227

Não obstante, o que acontece na realidade é o atendimento das necessidades gerais, ainda que sem ser baseado na capacidade contributiva, e assim grupos específicos

sustentam políticas gerais, o que gera grave injustiça fiscal.228

As políticas públicas deixam de ser financiadas por tributos não vinculados para serem financiadas por tributos vinculados que sofrem desvinculação e culminam no seu sustento sobre toda a sociedade e as políticas públicas protegidas por tributos vinculados são simplesmente abandonas.

Ocorre que, nos manuais de Direito Financeiro e Tributário tende-se a argumentar que os tributos não vinculados são as melhores formas para se planejar o gasto público, mas o que, no entanto, a prática tem demonstrado é a sustentação de políticas públicas por tributos

226 CAMPOS, op. Cit, p. 234, 235

227 Disponível em : http://www.slideshare.net/frankmagalhaes2/proporcionalidade-tributaria, acesso em 12/03/2013

vinculados que sofrem desvinculação, em virtude do aumento de tributos vinculados (taxas e contribuições) dos anos 90 para os dias atuais, inclusive a DRU resultou em 20% de apropriação pela União dos recursos que deveriam ter fins sociais.

Deveria a repartição de receitas de contribuição ser direcionada para políticas públicas e se fundar em impostos, apenas mexendo nos tributos vinculados de forma subsidiária.

Se arrecadados os tributos, eles serão classificados como receitas tributárias ou receitas de contribuição, mas se for para a conta única perderão a referência, podendo ser usado para qualquer destino, inclusive ser alvo de contingenciamento, o qual não possui um limite legal, e impede a proteção dos direitos protegidos.

Com relação à despesa pública, segundo Baleeiro, denomina-se como o conjunto dos dispêndios do Estado ou de outra pessoa de Direito Público, para o funcionamento dos serviços públicos. Ou ainda, aplicação de certa quantia, em dinheiro, por parte da autoridade ou agente público competente, dentro de uma autorização legislativa, para a execução de fim

a cargo do governo. 229

O art. 17 da Lei 4320/64 classifica despesa pública em despesa corrente e despesa de capital. Dentre as despesas correntes se tem despesas de custeio (que são obrigatórias e de caráter contínuo) e transferências correntes (transferências constitucionais). Despesas de custeios são dotações para manutenção de serviços anteriormente criados, inclusive destinados a atender a obras de conservação e adaptação de bens imóveis, de acordo com o art. 12 §1º, são despesas de pessoal, material de consumo, contratação de terceirizados, etc. As transferências correntes, contidas no art. 12 §2º da lei, são despesas que não correspondem contra prestação direta em bens ou serviços, inclusive para contribuições e subvenções, destinadas à atender à manifestação de outras entidades de direito público ou privado.

Art. 13. Observadas as categorias econômicas do art. 12, a discriminação ou especificação da despesa por elementos, em cada unidade administrativa ou órgão de govêrno, obedecerá ao seguinte esquema:

DESPESAS CORRENTES Despesas de Custeio Pessoa Civil Pessoal Militar Material de Consumo

Serviços de Terceiros Encargos Diversos Transferências Correntes Subvenções Sociais Subvenções Econômicas Inativos Pensionistas

Salário Família e Abono Familiar Juros da Dívida Pública

Contribuições de Previdência Social Diversas Transferências Correntes.

DESPESAS DE CAPITAL Investimentos Obras Públicas

Serviços em Regime de Programação Especial Equipamentos e Instalações

Material Permanente

Participação em Constituição ou Aumento de Capital de Emprêsas ou Entidades Industriais ou Agrícolas

Inversões Financeiras Aquisição de Imóveis

Participação em Constituição ou Aumento de Capital de Emprêsas ou Entidades Comerciais ou Financeiras

Aquisição de Títulos Representativos de Capital de Emprêsa em Funcionamento Constituição de Fundos Rotativos

Concessão de Empréstimos Diversas Inversões Financeiras

Transferências de Capital Amortização da Dívida Pública

Auxílios para Obras Públicas

Auxílios para Equipamentos e Instalações Auxílios para Inversões Financeiras Outras Contribuições.

Há nas despesas, afora estas contabilizações, aquelas de montantes provenientes de refinanciamento e refinanciamento da dívida mobiliária interna e externa, e que, portanto, devem ser retiradas do valor correspondente às despesas, pois estas operações de crédito,

mediante emissão de novos títulos vencidos geram a rolagem da dívida pública federal.230

Desde 1990, arrecadam-se mais tributos vinculados (taxas e contribuições), onde não há preocupação com a capacidade contributiva, realizando uma situação de injustiça

fiscal, desorganizando e aumentando a carga tributária, atualmente em média 65%.231

Acresce-se ainda a quebra do pacto federativo, uma vez que as contribuições não se tratam de repartição constitucional de receitas com entes menores, limitando o acesso dos entes federativos menores à principal fonte de receitas, as contribuições.

Há um aumento na centralização de receitas nas mãos da União, mas as partilhas para com os outros entes continuam em mesma medida, não acompanhando o acúmulo federal, gerando uma complexidade de problemas em relação a crescente demanda pública em setores essenciais, principalmente no setor regulador, gerando o verdadeiro caos na prestação de serviços, citam-se como exemplos educação e saúde, que não obstante serem eleitos prioritários, refletem a ausente execução.

Merece ainda ênfase a respeito das discussões sobre o depósito dos royalties do petróleo na conta única do governo federal, em virtude de serem as receitas originárias dos Estados contabilizando grande montante de capital, mas que tem natureza de indenização como compensação financeira em razão das perdas dos recursos provenientes de sua exploração aos Estados detentores, não devendo por isso seguir o destino do Tesouro Nacional, a não ser que sejam decorrentes da exploração em águas pertencentes exclusivamente à União, esta seria a única possibilidade legal em haver o repasse para os demais entes políticos, caso contrário restaria em total afronta ao princípio da autonomia dos

estados federados, com base no art. 18 da CF/88.232

Tendo em vista esta situação, os arts. 20 e 27 da Lei 9478/97, bem como os arts. 18, 20 e 35 do Decreto 2705/98 devem ser reputados inconstitucionais, além do que a ANP, como autarquia federal, vinculada ao governo central, não tem o condão de fiscalizar recursos que não os da União.

Esta falta de autonomia nos entes reguladores brasileiros repercute num outro campo extremamente prejudicial para a economia, que é o descrédito dos financiadores em função dos altos riscos que os negócios podem proporcionar-lhes, impedindo uma maior participação e assim impedindo a qualificação dos serviços necessários para o desenvolvimento, culminando no encarecimento do custo do capital e o aumento da tarifa final para o consumidor, corroborando com a insatisfação generalizada da população que mais

231 CAMPOS, op. Cit, p. 244

232 Disponível em : http://download.rj.gov.br/documentos/10112/766503/DLFE-

sofre com isto, por receber não raras vezes um serviço ou produto caro e de baixa qualidade, sem solução regulatória para a reparação, tornando frustrante a legislação em relação à praxe vivenciada.

Ora, se o órgão regulador deve equilibrar a relação, consumidor vs. empresa regulada, e nada faz em relação a estes, não há porque continuar a existir, a menos que haja uma modificação concreta na efetivação de seu exercício, e um melhoramento da legislação, por exemplo, no que tange a figura do ouvidor, ele é direcionado unicamente pelo Presidente da República, não passando pelo Poder Legislativo, o que prejudica o papel da governança, e aprimora o controle direto do executivo sobre sua tomada de decisão em relação às denúncias, desequilibrando sensivelmente a relação triangular, estado, denunciante e ouvidor, aproximando estado e ouvidor em detrimento do denunciante que mais tem interesse na solução do problema, refletindo pendular influência política.

Por tudo isto, finaliza com o pensamento de Luís Roberto Barroso que assim observa:

é desnecessário, com efeito, enfatizar que as agências reguladoras somente terão condições de desempenhar adequadamente seu papel se ficarem preservadas de ingerências externas inadequadas, especialmente por parte do Poder Público, tanto no que diz respeito a suas decisões político-administrativas quanto a sua capacidade financeira. Constatada a evidência, o ordenamento jurídico cuidou de estruturá-las como autarquias especiais, dotadas de autonomia político-administrativa e autonomia econômico-financeira.233

Abstrai-se que o Brasil, enquanto não modificar sua conscientização em relação ao correto manuseio de verbas públicas, obedecendo as suas destinações constitucionais, efetivando os repasses legais e corroborando com uma política de solução dos problemas coletivos, não irá muito longe na aquisição de uma real independência administrativa.

No documento O poder normativo com ênfase na ANP (páginas 104-110)