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Das Origens ao Mundo Contemporâneo

A DIALÉTICA DA GLOBALIZAÇÃO: UM PROCESSO DE MUDANÇAS

3 A GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA

3.1 As Empresas Transnacionais

3.1.2 Das Origens ao Mundo Contemporâneo

O fenômeno das sociedades mercantis que operam em diversos países do mundo, e cuja sede está localizada em um determinado Estado de origem, onde se situa o centro de decisões, não é novidade no cenário internacional. A partir do séc. XIII, surgem pela Europa ligas voltadas ao comércio marítimo no transporte de títulos e valores. Também se encarregavam disso as companhias marítimas das cidades italianas e as situadas nos portos do Mar do Norte e do Báltico, embora os registros dos primeiros exemplos de empresas multinacionais, com alguns dos traços que ainda hoje possuem, somente sejam localizados na Idade Moderna (CRETELLA NETO, 2006, p. 1).

Como parte da expansão ultramarina da Holanda, da Grã-Bretanha e da França, a partir do início do séc. XVII, os europeus do Norte começaram a estabelecer colônias nas Américas e a se relacionar comercialmente com o Oriente. O tipo de organização mais

52 CRETELLA NETO, José, 1951 - Empresa transnacional e direito internacional; exame do tema à luz da globalização / Rio

empregado para comerciar em pontos distantes era a sociedade anônima credenciada, modalidade societária difundida pela Itália, Portugal e Espanha. Eram investidas de autoridade delegada pelas respectivas Coroas. Tinham bandeira própria e exerciam atos de competência dos Estados. Tais empresas foram as primeiras sociedades por ações (CRETELLA NETO, 2006, p. 1-2, passim).

A propósito, é de 1600 o registro da criação da Companhia das Índias Inglesas – sediada em Londres – destinada a comerciar com os países do Oceano Índico. Dois anos depois, na Ásia, o poderio foi da Companhia Holandesa das Índias Orientais. Em 1630, a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, conquistou Pernambuco. De meados para o fim do século XVII, a França estabeleceu a Companhia Francesa das Índias Ocidentais para explorar matérias-primas e especiarias do Oriente, e a empresa Compagnie de Chine, como concorrente da Companhia inglesa nas operações comerciais com a China (CRETELLA NETO, 2006, p. 1-2, passim).

As empresas lutavam contra piratas e também entre elas, em conflitos armados; firmavam alianças com governadores e outros chefes de nações, ou seja, na linguagem jurídica do Direito internacional, dispunham do poder de celebrar tratados, sendo-lhes, inclusive, permitido cobrar tributos. Tanto na Inglaterra quanto no continente Europeu, a habilidade de organizar ativos e pessoas na forma corporativa, nos séculos XVII e XVIII era encarada como um privilégio, a ser concedido pelo soberano na forma de carta de franquia, freqüentemente associada a uma taxa ou tributo devido ao governo (CRETELLA NETO, 2006, p. 3).

Já em meados do séc. XIX, algumas empresas, detentoras de tecnologia avançada, passaram a expandir-se além-fronteiras nacionais, a exemplo da companhia alemã Friedrich Bayer & Co. que, em 1865, adquiriu participação acionária em uma fábrica de anilina, em Albany, Estado de Nova Iorque. Dois anos mais tarde, a Singer Sewing Machines Corp., empresa americana de máquinas de costura, montou a primeira fábrica em Glasgow, Escócia. Com efeito, o desenvolvimento tecnológico, a melhoria dos meios de comunicação e transporte e a necessidade de conquista de novos mercados foram fatores decisivos para que essas novas empresas européias e americanas passassem a operar no exterior (CRETELLA NETO, 2006, p. 4-5).

O movimento globalizador é amplo, posto que fruto do apurado desenvolvimento científico. Indivíduos, grupos, sociedades e Estados interagem de forma próxima53.As sociedades comerciais procuraram novos mercados consumidores, e na busca por mais lucros, abandonaram as fronteiras dos territórios nacionais. Para lograrem êxito, uniram forças por meio de fusões, joint ventures 54 e, juntas, passaram a disputar o mercado internacional como grandes corporações mundiais.

José Cretella Neto (2006, p. 6) observa que, nos últimos vinte anos do século XIX, ocorreu intenso processo de fusão entre as empresas americanas e, a partir de 1900, vários conglomerados dos EUA concorriam na Europa com produtos fabricados no Velho Continente. Como exemplo, já no limiar do século XX, a Westinghouse era a maior indústria da Grã-Bretanha; a partir de 1914, também lá, a Ford Motor Co. produzia 25% dos carros e a Standard Oil (Esso) era a maior companhia petrolífera da Europa. No Brasil, pode-se trazer à baila a atuação da Light – no ramo da iluminação pública – e São Paulo Railway, com ferrovias.

Aldemário de Castro (2006, p.9-13, passim) observa que, notadamente pela globalização econômica, os espaços de poder deixados pelo enfraquecimento dos Estados nacionais são ocupados pelos mercados. Neles, as empresas transnacionais passam a ser, progressivamente, o principal ator de ordenação sócio-econômica. Elas redesenham o mapa do mundo, em termos geoeconômicos e geopolíticos, muitas vezes bem diferentes daqueles que haviam sido estabelecidos pelos mais fortes Estados nacionais. O que já ocorria no passado com a emergência dos monopólios, trustes e cartéis, intensifica-se e generaliza-se.

A tradicional soberania do Estado-nação encontra fortíssima limitação na ação das TNC's por novos mercados. Nesse ambiente, negociações em torno de investimento direto e ameaças de "retirada" influenciam diretamente as decisões sobre as políticas de governo. A atualidade da matéria, em termos econômicos, políticos e o status jurídico perante o Direito internacional, parece evidente no século XXI, eis que essas empresas estenderam a economia de mercado à totalidade dos espaços políticos do planeta (CRETELLA NETO, 2006, 5 e 9).

53 VITAGLIANO, José Arnaldo; BIASI, Clóvis Guido de. Op. Cit. Disponível em: < http://www1.jus.com.br/doutrina/texto

> . Acesso em: 10 dez. 2006.

54 joint ventures – aliança estratégica estável, de regime jurídico particular, entre empresas com personalidades jurídicas

Boaventura de Souza Santos (2005, p.31) destaca alguns dados que demonstram a importância das empresas transnacionais no cenário econômico globalizado:

a) setenta por cento do comércio mundial é controlado por quinhentas empresas multinacionais;

b) um por cento das empresas multinacionais detém cinqüenta por cento do investimento estrangeiro direto;

c) mais de um terço do produto industrial mundial é produzido pelas empresas multinacionais.

Grandes indutoras dos investimentos diretos estrangeiros e do comércio internacional, as empresas transnacionais são milhares de unidades pelo mundo. O patrimônio é avaliado em trilhões de dólares. Respondem por milhões de empregos diretos e por 66% das exportações mundiais. Isso já revela a dimensão que atingiram e que o processo de internacionalização das empresas também se constitui importante fator de incremento do comércio internacional. O crescente papel desempenado pelas TNC's tem implicado uma mudança no posicionamento global das principais entidades econômicas, à medida que elas representam um novo ator com estratégias próprias, e que nem sempre vão ao encontro dos demais atores locais55.

O processo de fusões e aquisições de empresas é um fenômeno internacional que tem crescido muito nos últimos anos. Os efeitos da globalização na economia, o acirramento da competitividade e maior exigência dos mercados têm imposto às empresas transformações que, muitas vezes, não conseguem realizar individualmente. Na dinâmica da economia global, o movimento crescente das fusões e aquisições além-fronteiras tem impulsionado a corrida pela inovação, de sorte que empresas de tecnologia sofisticada dos EUA sejam objeto de assédio por empresas européias56.

de acordo reforçado pelas garantias que permitem a uma empresa punir os comportamentos oportunistas de outra, o que torna as partes reciprocamente vulneráveis.

55 LACERDA, Antônio Corrêa de. In. Prefácio Empresa Transnacional e Direito Internacional: exame do tema à luz da

globalização / José Cretella Neto. – Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 30, passim.