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A ORDEM ECONÔMICA BRASILEIRA E O DIREITO CONCORRENCIAL

3 DEFESA DA LIVRE CONCORRÊNCIA

3.2 Mercado Concorrencial

Mercado é o lugar onde atuam os agentes da atividade econômica; nele, encontram-se oferta e demanda de bens, e são determinados preços e quantidades. É imprescindível a garantia da possibilidade de nele entrar, permanecer e dele sair a exclusivo critério. As primeiras manifestações estabelecendo essas garantias remontam aos Estados Unidos, como

311PEREIRA, Alexandre Carneiro. Op. Cit. Disponível em:

http://bdtd.bce.unb.br/tedesimplificado/tde_busca/processaPesquisa.php?listaDetalhes%5B%5D=422&processar=Processar > Acesso em: 21 set. 2007.

forma de proteger a sociedade dos conglomerados que se formaram após a independência, apesar dos ideais de liberdade, igualdade de oportunidades, da livre empresa, livre concorrência, que provocaram sérias desigualdades sociais (VAZ, 1993, p. 79 e 80). Pierre George312 analisa aquele momento vivido pelos Estados Unidos, tecendo o seguinte comentário:

Durante muito tempo, a criatividade e a eficiência mascararam os efeitos negativos de uma corrida ao sucesso em que os fracos sucumbem e, muitas vezes, o caminho é devastado. Empresas livres de qualquer constrangimento, dispondo de recursos inexplorados do continente, beneficiando-se de um espaço imenso, puderam realizar performances únicas no mundo e tornar os Estados Unidos a primeira potência econômica no começo do século XX.

3.2.1 Concorrência Perfeita

Esse regime de concorrência caracteriza-se por elevado número de participantes atuando no mercado, sendo que nenhum vendedor ou comprador, considerado isoladamente, tem influência sobre o preço dos produtos. Não há poder de mercado; todos os agentes são hipoteticamente iguais (FONSECA, 2001, p.12); nenhum vendedor conseguirá vender produto a preço superior ao praticado pela maioria: a influência conjunta dos vendedores e dos compradores determina o preço.

Nessa sistemática, não existem barreiras à entrada de novos competidores nem ao aumento de produção. Há amplo acesso às informações sobre as características do mercado, enfim, tudo funciona em perfeita sintonia, conforme determinava o liberalismo. O regime denota o mercado ideal.

Fábio Nusdeo (1997, p. 263) define assim o sistema de concorrência perfeita

[...], o preço surge natural e objetivamente da interação recíproca dos inúmeros agentes em presença [...], sem ressalvas à lei da oferta e da procura, e tanto consumidores como compradores pautam suas decisões única e exclusivamente pelas suas utilidades em cotejo com o preço objetivamente fixado pelo mercado, [...] Diz-se que nele o consumidor é rei, já que todo o aparato produtivo se expandirá ou se contrairá em função do que ele, consumidor, decidir (princípio da soberania do consumidor).

O regime de concorrência perfeita é o ideal desejado para o mercado. Nele, isoladamente, os agentes econômicos não tem influência sobre os preços. Todos são hipoteticamente iguais.

3.2.2 Concorrência Imperfeita

A concorrência imperfeita é tolerável enquanto compatível com o objetivo do bem- estar econômico geral. Caracteriza-se por três liberdades: do lado das empresas, a de acesso ao mercado e a de fixação de preço; do lado do consumidor, a de escolha.

Nesse modo de concorrência também existem muitos agentes atuando no mercado, mas, lidam com produtos diferenciados. Os consumidores identificam-se com uma determinada marca e somente adquirem determinado produto, mesmo que exista outro similar no mercado; vários mercados coexistem, ou estão compartimentados313, podendo o fabricante migrar de um para outro (NUSDEO, 1997, p. 266). Em decorrência dessa imperfeição ou característica, quem faz o preço é o fabricante, pois já possui clientela fiel aos produtos da marca, o que pode configurar uma posição de monopólio. É o que esclarece Fábio Nusdeo (1997, p. 266 e 267):

É interessante observar que quanto mais imperfeita for a concorrência mais difícil se torna a interligação entre os compartimentos do mercado e, em cada um deles, os vendedores desfrutarão de uma posição muito próxima à de um monopolista. Daí ser o regime chamado também de concorrência monopolística, pois, em alguns casos mais extremos, a possibilidade competitiva dentro de cada segmento torna-se muito remota.

Nos dizeres de Nuno T.P. Carvalho (1995, p. 88 e 90), a concorrência que o Direito Antitruste protege é a concorrência praticável, vez que é uma realidade de mercado, e serve como parâmetro de análise comparativa de que as autoridades lançam mão ao detectarem a ocorrência de abusos do poder econômico. [...], as autoridades examinam os níveis de competitividade que, na impossibilidade de se atingir a concorrência perfeita, o mercado real comporta. Depois de ter apurado que determinada prática, examinada à luz dessa concorrência real, praticável, é abusiva, então, pelo princípio da concorrência-instrumento, as autoridades

irão apurar se há eficiências sociais, legalmente definidas, que justifiquem uma atitude de tolerância. [...].

3.2.3 Concorrência Desleal

A deslealdade concorrencial pode ser lícita ou ilícita. O que as distingue são os meios utilizados para atingir os objetivos. Se houver ilicitude, é que a concorrência pode subdividir- se em desleal – de que é exemplo a obtenção e divulgação de informações por meios fraudulentos - e infrações à ordem econômica, estas previstas na Lei Antitruste brasileira, e controladas pelo CADE.314 Caso a ação seja lícita, o prejuízo recai somente sobre os competidores do mercado. Nesse tipo de concorrência, os efeitos desejados pelos competidores também é que o consumidor deixe de utilizar os produtos do concorrente.

3.2.4 O Panorama Interno Brasileiro

A partir dos anos 90, em face de tornarem-se freqüentes as concentrações empresariais, a sociedade brasileira passou a ter notícias sobre a atuação do Sistema de Defesa da Concorrência; outras davam conta sobre investigação e descoberta de cartéis, referindo à atitude do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que condenou acordos como o de postos de gasolina de Florianópolis e de Goiás; o das distribuidoras de gás de cozinha do Triângulo Mineiro; o desfecho desfavorável do negócio envolvendo a compra da chocolates Garoto pela Nestlé.

No panorama legislativo brasileiro, tem-se que a proteção da concorrência, em cotejo com a livre iniciativa, atinge dois espectros: a concorrência desleal, inserta no âmbito Civil e Penal - vez que envolve sobremodo o interesse do empresário - e a infração à ordem econômica por abuso do poder econômico. É que a Lei Antitruste aumentou o espectro repressivo anticoncorrencial, em que o abuso passou a ser uma hipótese de infração à ordem

313A compartimentação do mercado decorre da possibilidade de se diferenciar o produto, ou seja, de apresentá-lo sob formas

e condições diversas. Cai, assim, o pressuposto da homogeneidade do bem, até aqui uma hipótese básica de trabalho inseparável, aliás, de todas as formulações relativas ao regime de concorrência perfeita. NUSDEO, Fabio., Op. Cit., p. 266.

314AGUILLAR, Eduardo Maimoni. O Fenômeno Moderno das Concentrações Empresariais e o Direito Antitruste. Disponível

econômica. De modo que os atos de concentração devem ser apreciados mediante a ótica do abuso de poder econômico, como também se comportam restrição à concorrência ou aumento arbitrário de lucros (AGUILLAR, 2006, p. 234).

Ligeira comparação do art. 1º da Lei Sherman com o art. 20 da Lei Antitruste brasileira demonstra o seguinte: a Lei americana diz que “todo contrato, combinação na forma de truste ou outra forma, ou conspiração, restritiva do tráfico ou comércio entre os vários Estados, ou com nações estrangeiras, deve ser declarado ilegal”; já conforme a Lei brasileira, “constituem infração da ordem econômica [...] os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: [...]”. Ou seja: na Lei americana, nada se fala sobre objetivo ou efeitos. A Lei brasileira fala expressamente e reprime-os todos (AGUILLAR, 2006, p. 235).

Diante disso, a defesa da concorrência atua na prevenção ou na repressão de condutas anticompetitivas, seja quando se procura evitar a que ocorram fusões e aquisições, seja quando são investigadas e punidas práticas abusivas à ordem econômica.

Com esta pesquisa, espera-se esclarecer sobre as concentrações empresariais no Brasil, ante os diplomas normativos vigentes na ordem jurídica brasileira. Posto isso, passa-se a analisar a regulação do mercado interno e o enquadramento da livre competição no Direito pátrio, referindo, de início, às noções sobre concorrência: