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A Death Obsession Scale ou Escala de Obsessão com a Morte (DOS):

3.2 AS MEDIDAS DESENVOLVIDAS PARA A MENSURAÇÃO DAS ATITUDES PERANTE A MORTE

3.2.8 A Death Obsession Scale ou Escala de Obsessão com a Morte (DOS):

Um de entre vários contributos interessantes desta medida desenvolvida por Abdel Khalek (1998) e que justificou a sua inclusão nesta revisão reside na sua orientação para uma população de língua mãe e cultura árabe, raras vezes incluída em estudos desta natureza.

Os poucos estudos realizados no âmbito da comparação de respostas obtidas transculturalmente mostraram existir elevada permeabilidade cultural e religiosa na

percepção da morte e das atitudes com a mesma que fazem divergir as leituras dos instrumentos daquelas em que foram inicialmente criados. Isto sucedeu, por exemplo, com uma das escalas mais amplamente reconhecidas, nomeadamente a MFDOS (traduzida para árabe) num estudo desenvolvido por Long (1985-86) com população Saudita. Abdel Khalek (1998) presta assim um contributo muito válido no domínio da investigação das atitudes perante a morte preenchendo esta lacuna.

Em acréscimo, ao focar comportamentos de natureza obsessiva (Abdel Khalek, 1998 define a obsessão com a morte como a presença continuada de pensamentos repetitivos, ideias persistentes ou imagens intrusivas centradas em torno da morte) esta medida vem igualmente preencher um vazio no campo da investigação nesta área de conhecimento que os outros instrumentos (que compreendem geralmente o constructo de ansiedade ou de medo perante a morte) não aprofundam. A medida em que o pensar sobre a morte se torna algo obsessivo e disfuncional para o funcionamento individual no seu dia a dia fica assim disponível para a investigação.

Para gerar os itens da Escala de Obsessão com a Morte (DOS), Abdel Khalek (1998) recorreu à noção de inevitabilidade da morte e à caracterização da obsessão enquanto perturbação neurótica marcada por alguns aspectos específicos tais como ideias intrusivas, pensamentos persistentes, imagens repetitivas ou impulsos dominantes.

Foram gerados 25 itens simples e breves em árabe corrente, respeitantes à antecipação da própria morte, e em formato de resposta em escala de Likert.

Para testar a validade facial dos itens pediu-se a 10 membros do Departamento de Psicologia da Universidade do Kuwait que atribuíssem a cada item uma classificação variando entre 1 (irrelevante para a obsessão com a morte) e 5 (fortemente associado à obsessão com a morte). Todos os itens que obtivessem uma média de avaliação global igual ou inferior a 3 pontos foram eliminados.

Desta forma, seis itens foram eliminados, mantendo-se os restantes 19. A estes membros de júri também se pediu que se pronunciassem quanto à adequação da formulação de cada item em termos de compreensibilidade. Desta avaliação resultaram revisões e reformulações no sentido de tornar mais claros todos os itens.

Posteriormente a DOS foi aplicada a 141 estudantes universitários de de nacionalidade egípcia (70 homens e 71 mulheres e com idades compreendidas entre os 19 e os 24 anos). Da análise dos resultados foram excluídos mais quatro itens que apresentavam correlações não significativas com a pontuação global. Assim, a versão final contém 15 itens.

Um estudo posteriormente conduzido com o intuito de determinar o melhor formato de resposta testou duas versões: uma em formato de Likert (com cinco pontos) e outra em formato de resposta dicotómica “sim” ou “ não”. As duas versões foram aplicadas a um conjunto de 117 indivíduos de ambos os sexos. Embora, no global, ambas as formas apresentassem equivalentes resultados, o autor optou pelo formato Likert por, no seu entender, apresentar globalmente mais vantagens para pessoas mais indecisas.

Procurando obter dados adicionais quanto à validade deste instrumento, Abdel Khalek (1998), aplicou a DOS conjuntamente com outras escalas tais como a Escala de Ansiedade perante a Morte (DAS) de Templer (1970) na versão árabe (Abdel Khalek, 1986), a Escala de Depressão perante a Morte (DDS) de Templer et al (1990) na versão Árabe (Abdel Khalek, 1997), a escala traço do Inventário Estado-Traço de Ansiedade de Spielberger et al (1983) na versão Árabe (Abdel Khalek, 1989), o Inventário de Depressão de Beck (BDI) de Beck e Steer (1993) na versão árabe (Abdel Khalek, 1997), a Escala Árabe de Comportamento Obsessivo-Compulsivo de Abdel Khalek e Lester (1999), e as escalas de Extroversão e de Neuroticismo do Questionário de Personalidade de Eysenck (EPQ) de Eysenck e Eysenck (1975) na versão árabe (Abdel Khalek e Eysenck, 1983).

A totalidade destes testes foi aplicada a uma amostra de 148 indivíduos e a DOS foi adicionalmente aplicada a mais 418 sujeitos. Todos os sujeitos eram estudantes universitários da Universidade de Alexandria com idades compreendidas entre os 18 e os 24 anos.

Da análise factorial dos resultados obtidos na DOS obtiveram-se três factores . O factor 1, responsável por 47,6% da variância explicada foi denominado de “Ruminação acerca da morte” e envolve itens relativos à presença de pensamentos recorrentes acerca da morte, os quais o sujeito admite ter dificuldades em abandonar; o factor 2, responsável por 9,8% da variância explicada, foi denominado de “Dominância da morte” e envolve itens relativos à emergência súbita de ideias variadas envolvendo a temática da morte; o factor 3, responsável por 8% da variância explicada, foi denominado de “Ideação repetida acerca da morte” e envolve sentimentos desagradáveis que emergem quando se pensa na morte.

A DOS apresentou uma boa consistência interna e igualmente bons resultados no que respeita a fiabilidade teste-reteste (com uma semana de diferença), rondando os .90 (Abdel Khalek, 1998).

A DOS apresentou correlações positivas e significativas com todas as escalas destinadas a medir atitudes negativas perante a morte nomeadamente a DAS e a DDS e também relativamente às medidas gerais de Obsessão-Compulsão, Ansiedade e Depressão. De notar que a correlação entre a DOS e a medida dada pela Escala Árabe de comportamento Obsessivo-Compulsivo (Abdel Khalek e Lester, 1999) foi mais elevada do que as obtidas com as restantes medidas de comportamento neurótico. Os resultados médios obtidos na DOS, para os sujeitos do sexo masculino (n=212) foram de 32,2 e para os do sexo feminino (n=206) foram de 34,2. A diferença entre ambos os sexos não é estatisticamente significativa. A DOS correlacionou-se significativamente com a escala de neuroticismo e não apresentou correlações significativas com a escala de Extroversão.

Concluindo, a DOS parece revelar alguns aspectos importantes tais como validade facial, estabilidade temporal, consistência interna e uma estrutura factorial com significado e consistência. Outro aspecto interessante e facilitador da sua aplicação em contexto de investigação é sua brevidade (15 itens).

A DOS foi posteriormente aplicada a diferentes populações. Assim, procurando averiguar os valores e estrutura factorial obtidos por populações com proveniências culturais distintas da que deu origem à escala, Abdel Khalek e Lester (2003), aplicaram a DOS a uma amostra de estudantes do Kuwait e a uma amostra de estudantes de Nova Jérsia, nos Estados Unidos da América. Verificaram que a população do Kuwait apresentava valores significativamente mais elevados na escala do que a amostra Norte-Americana. Constataram igualmente que existiam diferenças significativas entre homens e mulheres na amostra do Kuwait mas que essas diferenças não se verificavam na amostra americana.

Mais tarde Abdel Khalek, Nahida e Addalla (2006) seleccionaram uma população que estava a viver um conflito armado na altura (os Palestinianos) e aplicou a DOS a uma amostra de 601 homens e mulheres de origem palestiniana. Os resultados obtidos na DOS, ao contrário do esperado pelos autores, não foram mais elevados nesta população do que noutras anteriormente estudadas. Abdel Khalek et al (2006) avançam com a hipótese de se poder ter desenvolvido alguma habituação ao cenário de conflito, o que faria com que as pessoas encarassem o tema da morte com menor neuroticismo.

Comparou igualmente (Abdel Khalek, 2002) os valores obtidos na DOS por populações normais (sem qualquer diagnóstico ou acompanhamento clínico) e populações a receber acompanhamento psiquiátrico regular por diferentes motivos: 1) população com distúrbios ansiosos, 2) população com diagnóstico de esquizofrenia, 3) população sofrendo de dependência de substâncias várias. Todos os sujeitos eram de origem egípcia. O estudo revelou que o grupo com distúrbios ansiosos foi o que obteve valores mais elevados na DOS (mais do dobro dos valores médios obtidos para a população normal) e que os

homens com esquizofrenia apresentavam os valores mais baixos de todos na DOS, o que o autor explica como sendo decorrente do processo de pensamento psicótico ser muito diferente do neurótico, com o qual a DOS mais se relaciona.

Dentro da linha do estudo das atitudes perante a morte Abdel Khalek (2002a) desenvolveu ainda uma outra escala destinada a compreender as razões que levam as pessoas a temer a morte: A “escala de razões para o medo da morte” (RFDS) com 18 itens e 4 factores que procuram chegar ao cerne do que preocupa as pessoas quando antecipam a própria morte. Esta escala, apesar de conter alguns aspectos necessitados de uma adaptação cultural, se for aplicada num contexto distinto do que a originou (cultura árabe muçulmana), parece prover uma linha de investigação com interesse na compreensão do porquê das atitudes negativas que muitas pessoas manifestam quando antecipam a morte.

Um outro estudo com interesse foi desenvolvido em torno da possível ligação entre o sentimento subjectivo de felicidade (avaliada pelo Inventário de Felicidade de Oxford (Argyle, Martin e Lu, 1995 cit. por Abdel Khalek, 2005) e a manifestação de atitudes negativas perante a morte avaliadas através da DAS, da DDS e da DOS (Abdel Khalek, 2005). Estes instrumentos foram aplicados a 275 estudantes universitários da Universidade do Kuwait e mostraram que quanto mais elevados forem os valores obtidos ao nível da felicidade percebida mais baixos são os valores nas escalas que medem atitudes negativas face à morte, o que remete para a relação entre o significado de vida e de realização e a percepção da morte.

Finda a breve revisão dos principais instrumentos destinados à medida de atitudes perante a morte cumpre justificar a escolha do DAP-R como medida central no presente estudo. Esta deveu-se essencialmente à possibilidade, que este instrumento concede, de acesso a um mais vasto leque de atitudes perante a morte, que não apenas as consideradas mais negativas, ao contrário do que sucede na grande maioria dos

instrumentos revistos. O cuidado depositado na sua construção e as suas promissoras qualidades psicométricas foram igualmente um factor de peso nesta decisão.

Atendemos finalmente à sugestão de Wass (2004, p.300) que afirma: “…most studies

have used death anxiety scales that inadequately represent the complexity of death- related attitudes of which death anxiety is only one dimension. Standardized instruments measuring the range of attitudes from anxiety to acceptance and more positive and cognitive aspects of death attitudes are available and are recommended for use”.

Na sequência da análise dos instrumentos, passamos a apresentar alguns dos estudos específicos sobre o impacto da formação nas atitudes perante a morte complementando a análise da oferta formativa já efectuada no capítulo anterior.