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Definição de depósito como causa de suspensão

5. DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL

5.1. Definição de depósito como causa de suspensão

Conforme ensina PAULO DE BARROS CARVALHO223, “a figura do depósito, conquanto muito empregada na esfera tributária, tem sua origem no direito

223 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. São Paulo, Noeses, 2008, p.

privado, sendo seu conceito cuidadosamente traçado no Código Civil”, que assim dispõe em seu art. 629:

Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante.

A partir da leitura do dispositivo acima citado, nota-se que o conceito fundamental de depósito consiste na situação em que um sujeito entrega um bem móvel ao outro, que depois está obrigado a restituí-lo224. Portanto, é inerente à noção de depósito a não transferência de propriedade entre depositante e depositário.

Conforme ensina MARIA RITA FERRAGUT225 o estudo da legislação civil é de grande importância para conhecer o direito tributário, uma vez que, nos termos do art. 110, do CTN, o legislador tributário não pode atribuir livremente o conteúdo semântico de institutos de direito privado.

Sendo isso considerado, temos que, na esfera tributária, o conceito dogmático de depósito se constrói pela leitura do art. 151, II do Código Tributário Nacional, que assim prescreve:

Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: (...)

II - o depósito do seu montante integral;

224 “Depósito é o contracto pelo qual uma pessôa recebe um objeto móvel alheio, com a obrigação de

guardá-lo, e restituí-lo em seguida”. BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das obrigações. 4 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1936, p. 261. Em sentido semelhante “1. CONCEITO. O contrato de depósito é contrato pelo qual alguém, depositário, se incumbe de guardar (custodiar) coisa móvel de outrem, e entregá-la ao depositante”. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Tomo XLII. Rio de Janeiro: Editor Borsoi, 1963, p. 317.

225 "A importância do estudo da legislação civil, para todo aquele que se propõe a conhecer o direito

tributário, reside na circunstância de que os fatos descritos nas regras-matrizes de incidência tributária são definidos e regulados a partir do direito privado. Assim, conhecer esses conceitos, em grande parte disciplinados pelo direito civil e pelo direito comercial, propicia ao intérprete ferramentas para a correta construção do sentido das normas jurídicas tributárias. (...) Há de se considerar, além disso, que o artigo 110 do CTN proibiu ao legislador eleger livremente o conteúdo semântico dos signos utilizados peara definir a materialidade dos tributos, (...)".FERRAGUT. Maria Rita.

Portanto, pelo que está prescrito nas normas gerais de direito tributário, o depósito é uma das causas de suspensão da exigibilidade. Dito de outra forma, o fato jurídico do depósito serve como antecedente da norma de suspensão, dentro daquela estrutura que apresentamos no item 3.1.1.

Além disso, é interessante notar que o CTN não traz nenhuma definição da palavra “depósito” e sequer traz mais enunciados prescritivos que regulem a matéria, como faz no caso da moratória e do parcelamento, por exemplo.

Portanto, a regulamentação das condições e procedimentos para realização do depósito como causa de suspensão da exigibilidade fica a cargo do legislador ordinário de cada um dos entes tributantes226.

Contudo, como as normas gerais de direito tributário não trazem enunciados suficientes para a construção de uma definição de “depósito”, cabe à Ciência do Direito, tendo por base as unidades do sistema de direito positivo, descrever tal fenômeno.

Justamente é essa a finalidade do presente item, ou seja, buscar os elementos caracterizadores do conceito dogmático de depósito na esfera tributária.

Nesse sentido, destacamos que o enunciado do art. 151, II do CTN não faz qualquer menção acerca do contexto em que o depósito deve ser realizado. No entanto, é de certa forma consensual que há possibilidade de o depósito ser realizado tanto no âmbito de procedimento administrativo, como em processo judicial.

Todavia, conforme leciona PAULO DE BARROS CARVALHO227, somente o depósito judicial deve ser considerado como causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário.

226 A título de exemplo, no âmbito federal foi editada a Lei nº 9.703/1998, que dispõe sobre os

depósitos judiciais e extrajudiciais de tributos e contribuições federais.

227 “Aliás, é somente quando efetuado na esfera do Judiciário que o depósito vai assumir a feição de

causa suspensiva da exigibilidade, porquanto no curso do processo administrativo, quer ao impugnar o lançamento, quer ao interpor recurso aos órgãos superiores, tais expedientes do sujeito passivo,

Quando realizado na esfera administrativa, o que impede a exigência é a interposição de reclamações e recursos, nos termos do art. 151, III, e não o depósito. Logo, nesse caso a única função do depósito é evitar a atualização da dívida e os encargos da mora228.

Além disso, apesar de não estar de forma explícita no art. 151, II, do CTN, consolidou-se na jurisprudência do STJ o entendimento de que o depósito deve ser realizado em dinheiro. Isso se verifica com a edição da súmula 112, que possui a seguinte redação: “o deposito somente suspende a exigibilidade do credito tributário

se for integral e em dinheiro”.

Considerando uma interpretação sistemática, concordamos com esse posicionamento do STJ, já que o art. 3º do CTN determina que tributo é prestação pecuniária. Logo, se a forma de adimplemento se dá mediante a entrega de dinheiro, da mesma forma deve ser feito o depósito.

Sendo isso considerado, nota-se que o depósito como causa de suspensão da exigibilidade tem a função de garantia229. Como o depósito a que se refere o art. 151, II, do CTN somente é verificado dentro do contexto de um processo judicial, temos que há a configuração de um conflito230. E a função do depósito é justamente assegurar que o sujeito passivo não sofrerá nenhum ato de cobrança enquanto perdurar esse conflito.

Além disso, por não implicar na transferência de propriedade do valor, sendo uma faculdade do sujeito passivo, o depósito também tem como fundamento

por si só, já asseguram a suspensão da exigência, não se constituindo o depósito forma direta de inibir o sujeito pretensor, no sentido de ingressar em juízo com a ação competente”. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. São Paulo, Noeses, 2008, p.

228 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. São Paulo, Noeses, 2008, p.

460.

229 “Efetuado o depósito, fica ele cumprindo função de garantia do pagamento do tributo, com

destino vinculado à decisão, após seu trânsito em julgado”. PAULSEN, Leandro. Curso de direito

tributário completo. 5 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013, p. 187.

230 “Processo é relação jurídica. Mais: é relação jurídica instrumental – defluente que é do fato jurídico

conflito, supõe a preexistência de um’outra relação (jurídica), efetiva ou potencial”. CONRADO, Paulo

afastar o solve et repete. Isso será melhor aprofundando no próximo item desse capítulo.

Portanto, feitas essas considerações, podemos definir que o depósito como causa de suspensão da exigibilidade possui as seguintes características: (i) entrega de dinheiro, (ii) realizada no curso de um processo judicial, (iii) no montante integral da dívida, (iv) cuja restituição está condicionada ao resultado de favorável ao sujeito passivo da obrigação tributária.

As características (i) e (ii) já foram analisadas nesse tópico. A característica (iii) será analisada no item 5.3 desse capítulo. Já a característica (iv) está relacionada com a questão do levantamento do depósito, e será analisada no item 5.6.

A seguir trataremos do depósito judicial como faculdade do sujeito passivo.

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