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Relação entre a norma de suspensão e a norma do crédito: uma questão de

3. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO

3.1. Sintática da suspensão da exigibilidade

3.1.2. Relação entre a norma de suspensão e a norma do crédito: uma questão de

Conforme explicamos no item anterior, o fenômeno da suspensão da exigibilidade pode ser visto como norma jurídica em sentido estrito. Isso quer dizer que tal fenômeno se enquadra na estrutura normativa que compreende antecedentes ligados a consequentes.

Visto dessa forma, resta claro que a norma de suspensão, ao ser inserida no ordenamento jurídico, formará novo sistema jurídico, cronologicamente posterior, que se intersecciona com o sistema antecessor, conforme explicamos no item 1.2 desse trabalho.

Portanto, ao se formar esse novo sistema jurídico, agora com a norma de

suspensão, esta necessariamente se relacionará com as demais normas, inclusive

aquelas que se referem ao crédito tributário.

Dependendo do momento em que a norma de suspensão for inserida, as normas jurídicas referentes ao crédito podem estar em dois estágios possíveis: (i) individuais, ou (ii) gerais.

Note-se que apenas nos referimos aos critérios do consequente, pois é nessa posição sintática em que se verifica o crédito tributário. Portanto, o foco se dá no consequente, onde necessariamente está o crédito.

Sendo assim, dentro dessas duas possibilidades, temos que o crédito pode estar de forma conotativa, em que ainda não foi constituído para um sujeito passivo determinado (i.e., norma geral); ou pode estar de forma denotativa, já constituído para um sujeito passivo determinado (i.e., norma individual).

Se a norma do crédito for geral, quer dizer que ela ainda não foi aplicada. Isso diz respeito às condutas que devem ser praticadas pelos utentes participantes da linguagem jurídica. Por conta disso, deslocamos essa análise para o âmbito

pragmático, pois diz respeito à relação sujeito x norma. Esse é o objeto de estudo do item 3.3 desse trabalho.

Portanto, no presente item a análise se restringe em saber qual é o efeito causado pela norma de suspensão na norma do crédito, uma vez que aquela proíbe que o sujeito ativo exija o crédito tributário do sujeito passivo.

Em outras palavras, as perguntas que pretendemos responder nesse item são as seguintes: a norma de suspensão tira a eficácia ou a vigência da norma do

crédito? Considerando a estrutura completa da norma, isso interfere na endonorma, perinorma ou norma secundária?

Sobre esse assunto, informamos que alguns autores entendem que a suspensão da exigibilidade do crédito revela norma inibidora que retira a eficácia técnica sintática da norma individual do crédito tributário113.

Por outro lado, há também os que entendem que a suspensão da exigibilidade do crédito tributário interfere na eficácia jurídica114, pois com ela o fato

jurídico tributário não desencadeia o consequente normativo.

Contudo, conforme demonstramos no item 1.7.2.1 desse trabalho, a questão da eficácia das normas jurídicas não se amolda à premissa de que o direito é um fato linguístico.

113 Nesse sentido, EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI entende que: “O art. 151 do Código Tributário

Nacional funciona, assim como as normas de isenção, como regra voltada a imprimir ineficácia técnica à marcha da exigibilidade do crédito tributário”. Crédito Tributário: a Medida liminar como

Forma de Reflexão sobre a Legalidade da “incidência Jurídica” e a Suspensão da Exigibilidade.

Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n. 152, 2008, p. 76. Da mesma forma, AURORA TOMAZINI DE CARVALHO: “(i) Há ineficácia técnica sintática quando a norma não pode produzir seus efeitos: (a) pela existência no ordenamento de outra norma inibidora de sua incidência; (...). No primeiro caso, podemos citar como exemplo a liminar suspensiva da exigibilidade do crédito tributário, que, enquanto vigente, retira a eficácia técnica da norma tributária individual e concreta, impedindo sua resolução (...)”. Curso de Teoria Geral do Direito (o constructivismo lógico-semântico), São Paulo: Noeses, 2009, p. 724.

114 Esse é o entendimento de DÉCIO PORCHAT: “(...), entendemos que a ‘regra de suspensão’ não

limita um dos âmbitos de validade de outra norma, como o autor supra; mas sim, interfere em seu âmbito de eficácia jurídica. (...), enquanto perdurarem os efeitos da ‘regra se suspensão’ (sic), o fato jurídico-tributário não desencadeia os efeitos que lhe são próprios, operando, consequentemente, por um certo lapso de tempo, a ineficácia jurídica da norma individual e concreta que documenta a incidência.” Suspensão do Crédito Tributário. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 96.

Considerando a norma jurídica como juízo hipotético condicional (S3),

essa somente pode irradiar efeitos se houver a incidência (i.e., aplicação). Logo, não é possível falar em eficácia técnica no sentido de possibilidade de irradiar efeitos, pois só temos norma jurídica em sentido estrito quando aplicada. E se aplicada, temos efeitos no plano jurídico.

Da mesma forma, a noção de eficácia jurídica também não se sustenta, pois parte da premissa que esta é qualidade do fato jurídico no interior da norma individual e concreta. Ocorre que se há o fato jurídico (antecedente), há consequente normativo. Não há fato jurídico fora da norma. Todo fato, justamente por ser jurídico, possui eficácia jurídica, tornando-se desnecessária a utilização desse conceito.

Por conta disso, concluímos que a relação entre a norma de suspensão e a norma do crédito ocorre no âmbito da vigência.

Assim, cabe relembrarmos que a vigência é a aptidão que a norma tem de ser considerada imperativa, ou seja, está relacionada com a força vinculante da norma. E por aptidão, deve-se entender o “conjunto de requisitos necessários para o

desempenho de determinada função”115.

Considerando que a função das normas nada mais é do que regular condutas, cabe retomarmos a noção de que o direito positivo é aplicado por meio de mecanismos que revelam relações de coordenação entre normas jurídicas. É por meio desse mecanismo que se observa a estrutura completa da norma jurídica - composta por endonorma, perinorma e norma secundária -, conforme explicado no item 1.3 desse trabalho.

Como será demonstrado mais adiante, no item 3.2.1, a exigibilidade do crédito tributário surge no momento do vencimento do tributo. Como o vencimento do tributo é o critério temporal da perinorma, conforme já anotado no item 2.1, temos

então que a norma de suspensão paralisa a aplicação de apenas parte da estrutura completa.

Em outras palavras, a norma de suspensão apenas atinge a vigência da

perinorma e, consequentemente, da norma secundária. São essas duas que ficam

impossibilitadas de serem aplicadas, pois é a partir delas que o sujeito ativo exige o crédito tributário.

No que diz respeito à endonorma, sua vigência resta intacta, uma vez que possui a aptidão de ser aplicada espontaneamente pelo próprio sujeito passivo, como no caso de pagamento, por exemplo.

Portanto, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário está relacionada com o âmbito da vigência. A função da norma de suspensão é retirar a aptidão da endonorma ser aplicada coercitivamente. E isso é feito atingindo a vigência da perinorma ou norma secundária.

Ademais, é interessante relembrar que TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR relaciona o conceito de vigência com o de exigibilidade116, conforme já falamos no item 1.7.2.2. E exigibilidade nada mais é do que a possibilidade de ser exigido, conforme veremos mais à frente, no item 3.2.1.

Essas noções serão retomadas mais à frente quando formos tratar da semântica e pragmática da suspensão da exigibilidade do crédito tributário.

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