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4 A ESTRUTURA NORMATIVA DOS INCENTIVOS FISCAIS

4.3 Segunda aproximação: a Norma de Competência e uma proposta de análise

4.3.2 Definição de Norma de Competência

Analisar a norma de competência pressupõe, antes de mais nada, definir competência tributária.

Apesar da descrição de forma ampla no tópico anterior sobre a competência no tópico anterior, cabe-nos adentrar neste conceito específico a fim de, posteriormente, adotar nosso posicionamento sobre a norma de competência.

A definição do conceito de norma de competência é importante, porque, como registra Tárek Moysés Moussallem233, há mais de seis acepções para a palavra

competência:

Sem levar em conta outros significados da palavra “competência” (capacidade e imputabilidade), podemos anotar seis acepções que nos interessam: (1) indicativo de uma norma jurídica; (2) qualidade jurídica de um determinado sujeito; (3) relação jurídica (legislativa) modalizada pelo functor permitido entre o órgão competente (direito subjetivo) e os demais sujeitos da comunidade (dever jurídico de se absterem); (4) hipótese da norma de produção normativa que prescreve em seu consequente o procedimento para a produção normativa (se o agente competente quiser exercer a competência para produzir uma norma “y” deve-ser a obrigação de observar o procedimento “z”); (5) previsão do exercício da competência que, aliada ao procedimento para a produção normativa, resulta na criação de enunciados prescritivos que a todos obrigam, e a que denominaremos norma sobre produção jurídica; e (6) veículo introdutor que tem no seu antecedente a atuação da competência e do procedimento previstos na norma sobre a produção jurídica, dando por resultado uma norma específica, que também a todos obriga.

Considerando a análise da norma de competência, que foi estruturada a partir dos estudos desenvolvidos por Tácio Lacerda Gama, temos, por dever e coerência ao método, buscar os conceitos de competência e norma de competência em sentido amplo também por ele desenvolvidos.

Então, podemos dizer, conforme Tácio Lacerda Gama234:

• Competência tributária: é a aptidão jurídica, modalizada em obrigatório, para criar normas jurídicas que, direta ou indiretamente, disponham sobre a instituição, arrecadação e fiscalização de tributos.

233 MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Fontes no direito tributário. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2006, p. 82-

83, grifos do autor.

234 GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed.

revista e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 65.

• Norma de competência em sentido amplo: é toda proposição prescritiva que estabelece disposições voltadas a informar como deve ser a criação de outras normas relacionadas à tributação.

• Norma de competência em sentido estrito: é o juízo condicional que vincula, em sua estrutura, os elementos fundamentais para regular como deve ser a produção de norma inferior: Para que se tenha uma norma em sentido estrito, é necessário que a proposição jurídica i) qualifique o sujeito que pode criar normas; ii) indique o processo de criação das normas, sugerindo todos os atos que devem ser preordenados ao alcançar este fim; iii) indique as coordenadas de espaço em que a ação de criar normas deve ser desempenhada; iv) indique as condições de tempo em que a ação de criar normas deve ser desempenhada; v) estabeleça o vínculo que existe entre quem cria a norma e quem deve se sujeitar à norma criada, segundo as condições estabelecidas pelo próprio direito; vi) prescreva a modalização da conduta de criar outra norma, se obrigatória, permitida ou proibida; e vii) estabeleça a programação material da norma inferior, que é feita segundo quatro variáveis – sujeito, espaço, tempo e comportamento.

A norma de competência deve reunir sete critérios ou elementos, a fim de regular a conduta de criar outras normas jurídicas, os quais compõem o mínimo e irredutível de manifestação do deôntico235. Esses sete critérios estão distribuídos no antecedente e no consequente da norma de competência, a qual, como qualquer norma jurídica, apresenta-se como um juízo hipotético-condicional.

Para Tácio Lacerda Gama236, o núcleo de uma norma jurídica é um verbo, encontrado no antecedente enquanto fato e no consequente enquanto dever previsto. O verbo sempre apresenta quatro âmbitos de vigência: sujeitos e predicados da ação a que ele se reporta, que ocorre em tempo e espaço. Assim, têm-se os âmbitos subjetivo, material em sentido estrito, espacial e temporal237.

Na hipótese da norma de competência, são elencados os requisitos para a identificação de um evento de possível ocorrência no mundo fenomênico que, relatado

235 GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed.

revista e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 56.

236 Ibid., p. 63. 237 Ibid., p. 64.

em linguagem competente, nascerá juridicamente como fato. O fato hipoteticamente descrito no antecedente da norma de competência é a enunciação, entendida como atividade produtora de enunciados; identificada a presença do verbo enunciar na hipótese, certamente ele terá os quatro âmbitos antes mencionados238.

Quanto ao âmbito subjetivo, diz-se competente para a criação de normas, para a enunciação jurídica, o sujeito que introduz norma jurídica válida no ordenamento jurídico através de um ato ou um conjunto deles239. Nesse contexto, devemos lembrar, distinguindo, que o sujeito só é competente porque reúne os requisitos jurídicos arrolados em norma para, se considerado como tal (o que se deve fazer para ser competente) e apenas com essa qualificação, poder enunciar novos textos de direito positivo (o que se pode fazer quando se é competente)240.

No tocante à forma de enunciar, isto é, exercer a competência, são previstos atos isolados ou conjuntos de atos que abonem a enunciação. Trata-se do âmbito procedimental da norma de competência, denunciado na enunciação-enunciada como tipo de enunciação da norma241: o antecedente dos veículos introdutores de normas jurídicas242, cuja divisão em instrumentos introdutores primários e secundários é indicada por Tácio Lacerda Gama243:

Os primários inserem normas jurídicas gerais e abstratas que podem inovar a ordem jurídica, dispondo sobre novos direitos e deveres. Já os instrumentos secundários inserem disposições destinadas a aplicar aquilo que está previsto pelos instrumentos primários. Podem fazer isso mediante a publicação de atos infralegais gerais e abstratos, como decretos, regulamentos, instruções normativas. E podem, também, inserir normas individuais e concretas. Essas, por sua vez, podem ser produzidas por sujeitos competentes.

O modo de realizar a enunciação, previsto na hipótese da norma de competência, importa para que seu exercício seja feito conforme o sistema jurídico,

238 Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed. revista e ampliada. São

Paulo: Noeses, 2011, p. 68.

239 Ibid., p. 68-69. 240 Ibid., p. 70.

241 “Os termos ‘Constituição da República’, ‘Emenda Constitucional”, ‘Lei Complementar’, ‘Lei

Ordinária’, ‘Lançamento de Ofício’, ‘Norma de Pagamento’ e outros tantos utilizados para denotar o ‘instrumento introdutor de normas’, são apenas locuções diferentes para identificar a mesma conduta. São formas de legitimar a criação de normas jurídicas, atendendo às próprias escolhas positivadas pelo Sistema Constitucional Tributário”. (ibid., p. 74).

242 “A positivação dessa hipótese faz surgir o fato jurídico do exercício da competência, que coincide

com o que a doutrina vem chamando de antecedente do veículo introdutor de norma”. (ibid., p. 77).

243 Ibid., p. 73.

como garantia de que a norma produzida seja válida, justificando o relevo dado aos aspectos da enunciação244.

Identificado um verbo na hipótese da norma de competência, qual seja, “enunciar”, a ação a que ele se refere, como toda ação, ocorre em tempo e espaço, razão por que tempo e espaço são também âmbitos de vigência. O elemento “tempo” define o interregno em que a enunciação pode ocorrer245, ao lado do “espaço” em cujos limites ela se realizará246.

Se, na hipótese, encontramos a forma pela qual se deve exercer a competência, no consequente, devemos encontrar a matéria, enquanto objeto da relação jurídica. Vinculando forma e matéria, ou seja, hipótese e consequência, estará o conectivo interproposicional, que resume o ato de decisão do legislador, que prescreveu a determinada matéria uma certa forma de enunciação: como todo conectivo interproposicional, será neutro, vinculando os termos do juízo hipotético-condicional, já que, no território jurídico, não há que se falar em causalidade física247.

Já no consequente da norma de competência, encontraremos a relação jurídica de competência, na qual repousa a matéria ou o conteúdo da norma inferior que será editada como resultado da positivação daquela248. Num paralelo com o antecedente dessa mesma norma de competência, pode-se afirmar que, se o antecedente programa a enunciação, no consequente, delineiam-se os enunciados-enunciados249.

Como toda relação jurídica, no consequente encontramos o sujeito ativo e o passivo. O sujeito ativo executa duas funções: ser o agente da enunciação e também ser a pessoa que pode dispor sobre determinada matéria. Em outras palavras, ele será tanto

244 Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed. revista e ampliada. São

Paulo: Noeses, 2011, p. 74.

245 “Neste ponto, estamos falando dos limites cronológicos da enunciação, quando ela deve ser válida

para ser válida”. (ibid., p. 76).

246 Ibid., loc. cit.

247 “A forma, já vimos, é descrita pela hipótese da norma de competência; a matéria, por seu turno,

encontra-se delineada no objeto da relação jurídica. O vínculo entre ambas, então, só pode ser estabelecido pelo conectivo deôntico neutro (), aquele que vincula o acontecimento A à consequência B. Destarte, o encontro entre forma e matéria é sintetizado pelo ‘dever-ser’ que vincula a previsão hipotética do fato – enunciação da norma – à relação jurídica entre sujeito competente e os demais que integram a sociedade, tendo como objeto a possibilidade de inserir texto jurídico versando sobre certa matéria. E esse conectivo interproposicional sintetiza a decisão, positivada na norma de competência, de submeter determinada matéria à enunciação de certo tipo”. (ibid., p. 79, grifos do autor).

248 Ibid., p. 80.

249 “Por isso, os contornos materiais da norma criada devem ser compatíveis com o conteúdo dos

dispositivos que integram o consequente da norma de competência. Ocorrendo o contrário, e sendo esta incompatibilidade reconhecida por quem de direito, a norma será inválida”. (ibid., loc. cit.).

o titular do direito subjetivo de, na relação jurídica de competência, exigir uma determinada conduta de outrem, como também de exigir a constitucionalidade da nova norma, expondo, em contrapartida, sua própria responsabilidade pela criação da norma250.

Por sua vez, ao sujeito passivo cabe respeitar o direito subjetivo do sujeito ativo251, não criando impedimentos ao exercício da enunciação nem exercendo competência alheia252. Dentro dessa perspectiva de respeito ao direito subjetivo do sujeito ativo da competência, Tácio Lacerda Gama253 sugere dividir os sujeitos passivos da competência em fortes e fracos, de acordo com a possibilidade de atuação que detêm. Assim, são sujeitos passivos fracos todos os que, na relação jurídica de competência, devam apenas saber da existência da norma e a ela se sujeitar. Os sujeitos passivos fortes, diversamente, não apenas sabem da norma, mas podem, inclusive, se socorrer no Poder Judiciário caso entendam que a norma apresenta vícios nomogenéticos que justifiquem a suspensão ou o afastamento de sua juridicidade. Exemplificando com base no Direito Tributário, são sujeitos passivos fortes e legitimados a questionar uma regra- matriz de incidência tributária as pessoas que devem pagar o tributo; os que não têm esse dever são ditos sujeitos passivos fracos e limitam-se a respeitar a norma em virtude de sua existência, sem legitimação ou interesse para a questionar254.

Sobre o modal deôntico intraproposicional dessa relação jurídica de competência, Tácio Lacerda Gama 255 cita autores para quem o exercício das competências não condicionadas é regido pelo modal facultativo, enquanto para as competências condicionadas o modal seria o obrigatório256.

250 “Como se pode perceber, o atributo de ser ‘sujeito ativo’ da competência pode ser desdobrado em: ter

aptidão para editar o texto; propor medida judicial para que seja reconhecida a validade do texto com eficácia ‘erga omnes’; e ser chamado a defender a validade/licitude do texto na hipótese de haver a propositura de ação judicial voltada a configurar a sua ilicitude”. (GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed. revista e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 83).

251 Ibid., loc. cit.

252 “Essa omissão, que percebemos nos direitos potestativos e de propriedade, é dever comum de todo

sujeito que ocupe a posição de sujeito passivo da competência”. (ibid., p. 85).

253 Ibid., p. 84 254 Ibid., p. 85. 255 Ibid., p. 92-93.

256 “A competência jurisdicional, a competência administrativa para lavrar lançamentos de ofício, a

competência do particular para apresentar declaração de tributos são exemplos de competência modalizada em obrigatório”. (ibid., p. 92).

Por fim, no consequente da norma de competência estão os requisitos materiais da norma de inferior hierarquia que será criada. A referência à matéria de que trata a norma em criação nos remete a verbos e, por consequência, a condutas. Como dissemos antes, uma conduta é sempre realizada por alguém, num certo modo, em tempo e espaço dimensionáveis257. A disciplina de validade das normas a serem criadas, encontrada no consequente da relação jurídica de competência, necessariamente contempla esses âmbitos subjetivos, materiais, temporais e espaciais. Com isso, justifica-se que a estrutura da norma de competência revele, em última análise, um vínculo entre um tipo de enunciação e uma matéria258. Esse vínculo entre a forma descrita na hipótese e o conteúdo ou matéria delimitada na relação jurídica nada mais é do que o conectivo interproposicional neutro259.

A fórmula “C=E.M”, em que “C” é a competência, “E” é o tipo de enunciação, e “M” é a matéria a ser disciplinada, nos permite sedimentar as ideias trazidas260. Desdobrando essa fórmula com o emprego dos critérios da norma de competência que foram abordados, temos:

Njcom = H {[s.p(p1, p2, p3…)].(e.t)}  R (S (s.sp) . m (s.e.t.c.)}

Nela, a norma jurídica de competência (Njcom) é composta pelo vínculo deôntico () entre a hipótese (H) e a relação jurídica de competência (R). A hipótese (H), por descrever um fato, apresenta os âmbitos subjetivo (s), procedimental (p), espacial (e) e temporal (t); a relação de competência (R), também expressando uma conduta, terá seu aspecto subjetivo (s e sp), bem como seu aspecto material (m), o qual, composto por verbos, trará, assim como a hipótese, os âmbitos subjetivo (s), espacial (e), temporal (t) e material em sentido estrito (c)261.

Tal estrutura lógica possibilita ao sujeito passivo da norma de competência, além de um norte para encontrar a validade de uma dada norma, um trajeto para a

257 “A matéria é composta por um ou mais verbos que descrevem uma conduta. Assim, toda referência à

materialidade é sempre uma referência a verbos e seus respectivos complementos”. (GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed. revista e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 93).

258 Ibid., p. 94.

259 “E esse conectivo interproposicional sintetiza a decisão, positivada na norma de competência, de

submeter determinada matéria à enunciação de certo tipo”. (ibid., p. 79).

260 Ibid., loc. cit.

261 “De fato, ao prescrever a ação de criar outras normas, a hipótese da norma de competência toca no

principal ponto da atividade enunciadora de textos: ela indica o verbo. Esse é o elemento central, tanto da hipótese como do consequente das normas jurídicas”. (ibid., p. 72).

identificação dos enunciados que influenciam a interpretação da norma de inferior hierarquia criada262.

As normas de competência são portadoras dos modais deônticos Permitido, Obrigatório, Proibido, de maneira que veiculam relações jurídicas nas quais as condutas são a permissão para legislar sobre determinada matéria, a obrigação de seguir o procedimento estabelecido e a proibição de alterar alguns conteúdos.

O exercício da competência legislativa, no caso, a competência legislativa tributária, na qual está englobada a competência para instituir incentivos fiscais, pressupõe o ato de vontade da autoridade encarregada dessa atividade.

Tal ato de vontade expressa-se através das normas introdutoras e das normas introduzidas. No antecedente da norma introdutora, encontraremos a descrição do fato jurídico da enunciação, que está previsto abstratamente na hipótese da norma de competência. Em outras palavras, o conteúdo da norma introduzida é elaborado consoante o procedimento previsto no antecedente do instrumento introdutor.

Já os enunciados-enunciados tratam da matéria prevista no consequente da norma de competência, que, em linguagem formalizada, é escrito “m (s.e.t.c.)”, e estarão localizados no consequente do veículo introdutor.

Em vista disso, podemos concluir, com Tácio Lacerda Gama, que a norma introduzida, produzida pelo exercício da competência legislativa, deve corresponder ao objeto da norma de competência263. Segundo ele264:

Com isso, demonstramos que a norma de competência, na forma definida neste trabalho, prescreve como deve ser enunciada a norma e sobre o que deve versar. A forma de elaboração da norma é positivada no instrumento introdutor. Já a matéria que é introduzida, segundo aquela forma de enunciação, é prevista pelo consequente do instrumento introdutor, ou seja, são os enunciados introduzidos (enunciados-enunciados).

262 “Noutra síntese, de ordem funcional, relacionamos os papéis da norma de competência segundo a

perspectiva de quem é competente e soba óptica daqueles que devem suportar o exercício da competência. Para esses, a estrutura lógica proposta oferece: i) regras para identificação do direito válido num sistema de direito positivo qualquer; ii) um roteiro para a organização dos enunciados que fundamentam a validade de uma norma –regime jurídico; e iii) um caminho para a identificação dos enunciados que condicionam a forma de interpretar uma norma de inferior hierarquia”. (GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed. revista e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 96-97).

263 “Os enunciados produzidos com o exercício da competência têm como finalidade, então, prescrever

condutas de forma mais concreta do que prescreve a norma superior, sem, contudo, ser incompatíveis com ela”. (ibid., p. 101).

264 Ibid., p. 103.

Aproveitando os conceitos de norma primária e secundária já abordados, podemos avançar para analisar a estrutura das normas sancionatórias.

A norma de competência, enquanto norma e primária, terá, como qualquer norma jurídica, sua correspondente norma sancionatória265. Sua estrutura é, em linguagem formalizada266:

Ncom.s = H [s.p(-c).e.t]  R [ S(s.sj) . m(s.e.t.c)]

Como se observa, na hipótese da norma sancionatória, encontramos o descumprimento da norma de competência, que a qualifica como tal. A infringência do elemento material (-c) enseja a aplicação da norma sancionatória.

Na hipótese dessa norma sancionatória, vislumbramos os requisitos de sua aplicação. O sujeito (s) nela indicado é aquele habilitado a exercer a jurisdição, em determinado tempo (t) e espaço (e), em processo no qual se conclua pela irregularidade da norma criada, ou seja, pelo irregular exercício da norma de competência, a que nos remete o símbolo “p(-c)”267.

Em sua consequência, encontramos dois sujeitos em relação, diante de uma prestação. O sujeito passivo nessa norma é o Estado-jurisdição, enquanto o sujeito ativo legitimado é aquele de comprovar interesse de agir para solicitar a aplicação da norma sancionatória de competência, com vistas a afastar o cumprimento de norma carente de validade. A prestação, por sua vez, é a própria obrigatoriedade de haver uma manifestação sobre o pedido efetuado pelo sujeito ativo268.

Assim, podemos dizer que as normas de competência, seguindo a classificação das normas jurídicas, podem ser assim representadas:

Norma primária de competência: se a uma hipótese (o fato do exercício da competência pela autoridade legitimada mediante o processo legislativo estabelecido, no tempo e local determinados) deve ser imputada uma consequência (a permissão de o sujeito ativo produzir, em conformidade com as regras do sistema, norma que cria, revoga ou modifica outra norma e o dever de os sujeitos passivos cumprirem as

265 “Isso porque norma jurídica sem sanção deixa de ser jurídica […] Assim, o descumprimento de toda e

qualquer norma projeta efeitos. O efeito que qualifica uma norma como jurídica é, justamente, a previsão de uma consequência coercitiva para o seu descumprimento ou o fato de o aparato estatal estar preordenado à aplicação da norma primária, mesmo contra a vontade do seu destinatário”. (GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade. 2. ed. revista e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 111).

266 Ibid., loc. cit. 267 Ibid., p. 113. 268 Ibid., p. 114-116.

determinações contidas nas normas produzidas).

Norma Secundária de Competência: se a uma hipótese (a desconformidade da atividade do legislador com o prescritor da norma primária) deve ser imputada uma

consequência (a relação jurídica entre o órgão de controle de constitucionalidade e a

autoridade legisladora, cujo objeto será a conduta obrigatória do Estado-Juiz de expelir a norma produzida invalidamente).

Tácio Lacerda Gama269 analisa algumas concepções sobre a norma de competência, partindo das ideias de Hans Kelsen para, na sequência, contrapor a esse outros modelos teóricos, bem como respectivas críticas.

Segundo ele, Hans Kelsen enfrenta o tema das normas de competência dentro de seu modelo teórico, que tem na norma hipotética fundamental sua base e que contempla a criação de normas jurídicas como conduta igual às outras, identificada pelo seu resultado de produzir mais normas, preservados os pressupostos de unidade, homogeneidade e consistência do objeto de estudos270.

A classificação de Hans Kelsen para as normas de competência como normas incompletas, que precisariam buscar sua complementação coercitiva em outras normas, acalmou os questionamentos quanto à natureza coercitiva dessas normas. Para Tácio Lacerda Gama271, tratou-se de distinção ilusória cujo fim era conservar a coerência do sistema defendido quanto a sua uniformidade sintática: ao classificar as normas como incompletas, sugeriu-se a existência de normas completas que regulam condutas,