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Do PARPA I e Consultas Esporádicas à Sociedade Civil

O Plano de Ação para a Redução da Pobreza Absoluta (PARPA I), abrangendo os anos 2001-2005 apontava pretender combater as precárias condições de subsistência que afetam grande parte da população moçambicana116. Em termos oficiais, o PARPA I é uma estratégia de redução da pobreza cuja elaboração beneficiou de um processo de consultas com diversos segmentos e atores sociais. Assim, o documento afirma ter contado com a experiência das estratégias e programas sectoriais, da conceção dos perfis provinciais da pobreza que tinham igualmente merecido uma ampla e prolongada contribuição da sociedade civil e de financiadores externos. Tratando-se de um processo de planeamento, assumiu-se que o PARPA I sairia reforçado se privilegiasse para seu aperfeiçoamento a continuidade e aprofundamento de discussões públicas interativas sobre o todo ou partes do mesmo.

115 No decorrer deste capítulo apresentaremos algumas notas sobre o conteúdo e o processo que envolveu este

documento de políticas públicas e outros dois que o sucederam – PARPA II e PARP.

116Este documento foi derivado dos antecedentes de planeamentos do Governo, incluindo as Linhas de Ação

para a Erradicação da Pobreza Absoluta (1999), o PARPA 2000-2004 (PRSP-Interino) e o Programa do Governo 2000-2004, bem como os planos, políticas, e estratégias sectoriais e intersectoriais desenvolvidos

pelos órgãos do Estado. Para mais detalhes vide: República de Moçambique (2001), Plano de Ação para a

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Neste plano, o PARPA I foi tido como instrumento de programação rolante e dinâmico. Esta caracterização visava permitir a incorporação de elementos novos que, eventualmente, fossem surgindo da evolução da economia e sociedade. O objetivo principal da redução da pobreza absoluta não se alteraria, mas os instrumentos, políticas e metas podiam sê-lo a medida que se aprimorasse o conhecimento sobre as diferentes variáveis.

No quadro do PARPA I, o governo estabeleceu como objetivo central a redução substancial dos níveis de pobreza absoluta através de medidas para melhorar as capacidades e oportunidades para todos os moçambicanos, os mais carenciados em particular. O objetivo específico era a redução da incidência da pobreza absoluta do nível de 70% em 1997 para menos de 60% em 2005, e menos de 50% até finais da primeira década de 2000.

Nos cinco anos que antecederam a elaboração do PARPA I, Moçambique atingira um crescimento económico de cerca de 8% ao ano, em termos reais, num ambiente de estabilização económica e política. Porém, os progressos alcançados não permitiram que fossem superados problemas sociais e económicos graves.

Moçambique continua a ser um dos países mais pobres do mundo, sendo este problema um desafio que se coloca com premência. A capacidade de enfrentar tal desafio continua limitada dado que verificam-se carências severas de recursos por conta de uma profunda fraqueza estrutural da economia117. A análise dos dados do Inquérito aos Agregados Familiares (IAF) de 1996/97 mostram que a incidência da pobreza absoluta abrangia em média cerca de 70% da população, sendo notáveis os desequilíbrios entre zonas urbanas e rurais e entre regiões.

O IAF facilitou também a identificação dos principais determinantes da pobreza em Moçambique, tais sejam: (i) crescimento lento da economia até ao começo da década de 1990; (ii) fraco nível educacional dos membros do agregado familiar em idade economicamente ativa, com maior destaque para as mulheres; (iii) elevadas taxas de dependência nos agregados familiares; (iv) baixa produtividade na agricultura familiar; (v) falta de

117 De acordo com alguns entrevistados, para um país pobre como Moçambique, o crescimento rápido é um

instrumento essencial e poderoso para a redução da pobreza a médio e longo prazo. Sem crescimento, o objetivo de aumentar as capacidades e expandir as oportunidades para os pobres continuará severamente limitado pela falta de recursos públicos e privados. Assim, a estratégia incorporou políticas para criar um ambiente propício ao estímulo do investimento e da produtividade, de modo a alcançar e manter uma taxa média anual de crescimento do PIB na ordem dos 8%. Porém, tal crescimento económico não se reflete na melhoria da vida dos mais carenciados, posição que, em nosso entender, faz jus ao princípio de que pode se ter crescimento económico sem desenvolvimento humano (Muendane, s.a.: 6/9).

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oportunidades de emprego dentro e fora do setor agrícola; e (vi) fraco desenvolvimento de infraestruturas (INE, 1996/7).

Além de sofrerem uma pobreza material aguda, os pobres em Moçambique enfrentam igualmente um elevado nível de vulnerabilidade aos choques naturais e económicos. Esta dimensão da pobreza foi evidenciada pelos resultados trágicos das referidas cheias que atingiram o país no ano de 2000, bem como pelas carências causadas nos últimos anos pelos baixos preços no mercado internacional dos produtos agrícolas principais.

Para enfrentar esta situação de pobreza, suas determinantes e constrangimentos económicos o governo decidiu colocar esforços na preparação de uma estratégia compreensiva e integrada para a redução das referidas carências e vulnerabilidades. Com base no diagnóstico das determinantes da pobreza no país, vários estudos e lições de experiências internacionais sobre a matéria, consultas com a sociedade civil e setor privado, o governo afirma ter sido possível realizar a versão final do PARPA I, na medida em que tal processo permitiu: a) Reconfirmar a seleção das “áreas de ação fundamentais” para a promoção do desenvolvimento humano e a criação de um ambiente favorável ao crescimento rápido, inclusivo e abrangente, tais sejam educação, saúde, agricultura e desenvolvimento rural, infraestrutura básica, boa governação, gestão macro-económica e financeira; b) Enfatizar a importância das matérias de “boa governação”, em especial a questão da desconcentração e da descentralização para um planeamento participativo ao nível local, em particular distrital. Pretendia-se aqui um processo de consulta que envolvesse os menos favorecidos na determinação das prioridades a prosseguir; c) Destacar a necessidade premente do Estado revelar uma capacidade mais efetiva na realização das opções que toma e concretização dos programas, planos e compromissos que assume. Por exemplo, houve um apelo para maior intervenção nos domínios da comercialização agrária, fomento de agroindústrias, promoção do empresariado nacional e desenvolvimento de serviços financeiros que cubram as zonas rurais118; e, d) destacar a importância do combate à corrupção, bem como a necessidade de mudança de atitude por parte das instituições públicas e seus agentes no relacionamento com os cidadãos.

118Alguns entrevistados afirmaram que uma estratégia de crescimento pró-pobre também requeria uma política e ambiente que estimulasse o setor privado a acelerar a criação de emprego e aumentar as oportunidades para geração de rendimentos através de autoemprego.

156 Quadro 4.1. O PARPA no Sistema de Planeamento Público. Fonte: PARPA I (2001: 8)

Em termos de visão estratégica, diferentemente do anterior PARPA (2000 - 2004) que enfatizou as medidas com vista a beneficiar aos pobres a curto prazo, o seu substituto, PARPA I (2001-2005), alargou a perspetiva ao reconhecer, também, a importância de medidas de médio e longo prazos no combate à pobreza, com destaque para políticas que sustentassem um crescimento económico rápido e abrangente.

Tendo-se verificado que a dinâmica do desenvolvimento humano e a do crescimento inclusivo e abrangente são interdependentes, defendeu-se que uma estratégia que combinasse

Sistema de Planeamento Público: Articulação de Instrumentos

PROGRAMA DE MÉDIO PRAZO

Plano de Ação para a Redução da Pobreza Absoluta (PARPA) Afetação dos Recursos Harmonização da Política e estratégia sectorial

Planos Estratégicos sectoriais e Provinciais Integração da política e estratégia sctorial Enquadramento dos recursos e afetação intersectorial

Cenário Fiscal de Médio Prazo (CFMP)

Limites para o investimento (recursos internos e externos)

Programa Trienal de Investimento Público (PTIP)

PROGRAMA DO GOVERNO

PLANOS OPERACIONAIS ANUAIS

PLANO ECONÓMICO E SOCIAL (PES) Consistência da orçamentação com ações e objetivos da política ORÇAMENTO DO ESTADO (OE) Integração dos objetivos e metas + Coordenaçã o no processo da monitoria Integração dos objetivos e metas sectoriais Cenário macro e sectorial Limites da Despesa Orçamento de Investiment o

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programas para benefício dos pobres no curto prazo juntamente com políticas que os beneficiassem a médio e longo prazos, promovendo um crescimento rápido e equilibrado, ofereceria uma melhor oportunidade para a criação dum “ciclo virtuoso” de progresso acelerado e sustentável, na luta contra a pobreza absoluta.