• Nenhum resultado encontrado

Donato B RAMANTE (1444-1514), igreja de San Pietro in Montorio, Roma

No documento DA ARTE HISTÓRIA (páginas 133-137)

© Artephot/ Nimatallah.

A

pós uma estadia no Milanês, onde trabalha como pintor e arquitecto, Bramante chega a Roma em 1499, com 55 anos de idade. Estu-da as ruínas antigas, elaborando levantamentos que estimularão a sua reflexão arquitectónica. A partir de 1502 edifica para os Reis Católicos espanhóis, sobre o monte Janículo e no local onde teve lugar a crucificação de S. Pedro, o pequeno Tempietto.

Descrição

Construída no claustro de uma igreja mais anti-ga, a pequena capela circular repousa sobre um envasamento de três degraus e, ainda que as suas dimensões sejam reduzidas (o diâmetro interior não excede os 4,5 m), as suas proporções confe rem--lhe notável imponência.

O primeiro nível é constituído por uma colunata toscana (ordem dórica enriquecida) períptera que contorna toda a construção, com um entablamento dórico. No seu interior, a parede é ritmada de pilas-tras que delimitam tramos ocupados por uma alter-nância de janelas rectangulares e de nichos arredon-dados, que introduzem no edifício um segundo ritmo, enriquecendo o próprio ritmo regular da colunata. O segundo nível apresenta uma balaustrada pousada sobre a cornija do entablamento do nível precedente. As aberturas da parede retomam aqui o mesmo ritmo que as do primeiro nível. O entablamento suporta a cúpula hemisférica, provida de um falso lanternim.

Comentário

O Tempiettoconstituiria o ensaio para o gigantes-co projecto de Bramante para a Basílica de S. Pedro. Assume-se igualmente como corolário de uma série de experiências renascentistas, também pictóricas (Perugino, Rafael), realizadas em torno da planta centrada, tema derivado das estruturas circulares e poligonais dos templos romanos e dos inícios do Cristianismo e que constantemente perpassa na obra de arquitectos (Brunelleschi, projecto para Santa Maria degli Angelide Florença, 1434; Giuliano da Sangallo, Santa Maria delle Carceride Prato, 1485) e tratadistas (Piero della Fran cesca, Alberti), os quais, para além do seu valor estético, sublinham a sua importância enquanto derivação do círculo, forma por definição perfeita e natural e, portanto, imagem directa da própria razão divina. Na atenção que Bru-nelleschi lhe dedica pesa, contudo, também o interes-se que desperta o princípio antigo da parede esculpi-da, que permite outorgar à arquitectura uma extrema plasticidade, pela estreita interligação dos elementos construtivos, que surgem como que modelados na própria alvenaria. De facto, a contemplação dos monumentos romanos desenvol ve ria em Bra mante o sentido da composição no espaço e da nobreza das proporções. Sob o impacte do sua própria formação, contudo, o artista trata a arquitectura com um tempe-ramento de pintor, procurando definir um equilíbrio empírico entre os efeitos de luz e sombra produzidos pelos cheios e vazios (uso da coluna ou da pilastra, das paredes rasgadas de nichos ou janelas) e criando, assim, zonas iluminadas ou de penumbra, onde a pró-pria forma arredondada do plano do edifício produz gradações subtis, que o inscrevem nas experiências pictóricas de Leo nardo da Vinci. Na verdade, o Tem-piettoconsti tui-se basicamente como uma pesquisa sobre o claro-escuro, assumindo-se assim mais como um problema de composição do que de construção. A leveza e variedade das soluções arquitectónicas conferem-lhe, de facto, uma espantosa plasticidade, que o opõe ao gosto linear das primeiras construções renascentistas, convertendo-o num perfeito represen-tante da arquitectura romana do século XVI. A ordem e a simplicidade dos volumes, aliadas à sobriedade da ordem dórica e à harmonia das proporções, fariam de Bramante uma figura chave do beloarquitectónico.

RAFAEL(1483-1520), Os Esponsais da Virgem(1504). Pinacoteca de Brera, Milão. © Dagli Orti.

Elevação: estudo sobre as relações geométricas. EG=EF= número de ouro

EF FG

O rectângulo ABCD = rectângulo de ouro

134

Rosso FLORENTINO(1494-1540), Descimento da Cruz Pinacoteca de Volterra. © Alinari/Giraudon.

E

mbora já consagrada, a expressão “Manei -rismo”, que utilizamos para designar a produção artística do período que decorre entre c.1520 e o final do século XVI, revela-se pouco adequada aos objectivos que se propõe. De facto, o termo foi criado em função da pin-tura (e depois alargado às outras disciplinas estéticas) e radica em Vasari, o primeiro histo-riador da arte que, no século XVI, definiria a manieracomo o traço individual da expressão de um artista.

Este conceito, ainda que distinguindo a maniera moderna, própria da época em que Vasari vivia, da bella maniera, apanágio dos três grandes – Leonardo, Miguel Ângelo e Rafael – trazia implícita a noção de que os mes-tres do período que designaríamos por Manei-rismo teriam por objectivo imitar os seus ante-cessores do princípio do século, revelando-se, assim, falhos de originalidade. Nesse contexto, a sua arte constituiria, pois, tão somente um prolongamento, necessariamente decadente, da etapa gloriosa que fora o Renascimento.

Todavia e muito pelo contrário, uma análise cuidadosa do espólio legado por esses artistas revela a sua intrínseca originalidade e o esfor-ço que fizeram para encontrar novas vias de criação num universo em rápida mudança e desajustado já aos ideais de harmonia cunha-dos pelos homens da rinascità. São gente que vive num mundo de valores em desagregação, no interior do qual se esforçarão por encontrar saídas individuais. E se é certo que o caminho que seguiram lhes foi indicado por esses mes-mos a quem reconhecemes-mos paternidade do que denominamos de Renascimento Pleno (mas em cujas obras perpassam já fortíssimas tensões), não é menos verdade que, sobretudo em Itália, onde a sua atitude irreverente se revelou mais consciente, os representantes do Maneirismo seriam responsáveis por algumas das obras cimeiras da arte universal.

Capítulo 9

O Maneirismo

Giovanni BOLOGNA(1529-1608), O Rapto das Sabinas. Loggia dei Lanzi, Florença.

© Scala.

136

CONTEXTO

O Maneirismo

S

e o Renascimento nasce sob a égide do opti-mismo e de uma fé generalizada nas capacida-des do génio humano, émulo da divindade na sua força criadora, o processo histórico em que ele se desenvolve não tardaria a contradizer esse hori-zonte ideal, opondo-lhe com crueza a realidade dra-mática dos factos. A sociedade que emerge no sécu-lo XVI, sécu-longe de caminhar no sentido da felicidade colectiva, parece antes projectar-se num abismo cuja extensão os contemporâneos têm dificuldade em perceber.

A arte produzida nos últimos setenta e cinco anos da centúria constituirá o reflexo dessa interro-gação que pesa sobre todos em relação ao devir da

Humanidade e da pluralidade de respostas com que se procurou exorcizá-la.

Na verdade, tudo nesse alvorecer do século XVI contribuiria para aprofundar a inquietação geral que se apoderara dos espíritos: a Florença mercantil e democrática, pátria da rinascità, convertera-se em poucos anos num principado aristocrático, igual a tantos outros que enxameavam a Itália desse tempo e, como eles, perpetuamente mergulhado em confli-tos. Pior, um monge alucinado, Savonarola, toma-do de ira contra os aspectos pagãos que o movimen-to apresentava, mergulhara a cidade no terror, quei-mando e destruindo livros e obras de arte que se perderam para sempre. Roma emergiria, então, MIGUELÂNGELO(1475-1564). O Juízo Final.

Pormenor das pinturas da Capela Sistina, Vaticano, Roma. © Scala.

No documento DA ARTE HISTÓRIA (páginas 133-137)