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O portal de São Pedro de Moissac

No documento DA ARTE HISTÓRIA (páginas 81-85)

(c. 1115-1131)

Portal da igreja de São Pedro de Moissac, Tarn-et-Garonne.

© Rapho.

D

epois de terminar a construção do claustro, o abade Ansquitil idealizou, cerca de 1110--1115, a construção de uma torre-pór tico, onde figurariam, no portal Oeste, o tímpano e as ombreiras actuais. Após a morte de Ansquitil, este conjunto seria transferido para a fachada Sul. A superfície esculpida foi notavelmente aumentada sob a influência do tímpano de Cluny.

Descrição

O enorme tímpano de 6,55 m de largura encon-tra-se protegido por um profundo alpendre. Numerosas cenas em relevo expandem-se sobre o tímpano, as ombreiras e as faces do alpendre.

Sobre o tímpano surge a visão do capítulo IV do Apocalipse de S. João, anunciando o fim do mundo. Ao centro, Cristo em majestade, entronizado, rodeia-se dos quatro símbolos dos evangelistas: à sua esquerda, o touro de S. Lucas e a águia de S. João; à sua direita, o leão de S. Marcos e o anjo de S. Mateus. Duas figuras de anjos muito alongadas enquadram o grupo central. Aos pés de Cristo e avultando de um lado e de outro do tímpano, em registos sobrepostos, 24 anciãos cantam a glória de Deus, sustentando cada um nas mãos uma taça e uma cítara. Sob o tímpano, o lintel é decorado de rosáceas envolvidas de cordames saídos das guelas de dois monstros.

Ao centro do vão do portal, o mainel é ornado de casais de leões inspirados nos ricos tecidos orien tais que se viam então nos tesouros das igrejas, enquanto sobre as faces laterais figuram S. Pau -lo e o profeta Jeremias.

O lintel de cada lado sobre as ombreiras recor-tadas tem uma aparência oriental. Sobre o lado direito insere-se a estátua do profeta Isaías e, à esquerda, a de S. Pedro, que comprime contra si as suas chaves de porteiro celeste. As personagens, franzinas, parecem tomadas de um movimento rítmico duma enorme elegância decorativa.

Esquema explicativo do portal.

tímpano arquivoltas

lintel colunelos

mainel flancos do portal

pés-direitos 1 2 3 4 5 6 7 066-081.qxd:Minerva 10/11/07 11:25 Page 80

Tímpanodo portal: A visão do Apocalipse © Dagli Orti. O profeta Jeremias © Serge Chirol. Esculturas do portal São Pedro © Champollion/TOP. Pormenordo tímpano. Os anciães © Vieil/Rapho.

Comentário

Após a sua instalação na Europa e até ao século XII, o cristianismo ignorou a arte da escultura. Num primeiro tempo, o baixo relevo retoma o efeito chão da pintura de manuscritos. Em Moissac, pela pri-meira vez, o escultor tem o sentimento dos volu-mes, que liberta nitidamente do fundo. Utiliza pro-porções muito próximas da realidade, alcançando um intenso sentimento de vida, pela variedade das atitudes e pela orientação dos olhares dos vinte e quatro anciãos, todos dirigidos para Cristo.

Sob os seus pés, uma dupla banda, evocando as ondulações do oceano, desmultiplica os efeitos de vibração, onde não se vê mais que terror e frenesi. O friso perlado que borda o tímpano à esquerda e à direita, retoma ele também os mesmos efeitos, através dos seus meandros de incomparável imagi-nação.

Na Idade Média, os escultores tinham por fun-ção instruir o povo, que esta visão do apocalipse conservava no receio do castigo eterno.

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Catedral de Notre-Dame, Amiens.

© Lessing/Magnum.

O

adjectivo “gótico” é inventado pelos huma-nistas do Renascimento italiano. Designa, de forma pejorativa, como sendo bárbara (dos godos, que invadiram a Europa no início da Idade Média), a cultura que se desenvolveu no Ocidente entre os séculos XII e XVI. Este qualificativo aplica-se de início à arquitectura, depois ao conjunto das artes e, enfim, à cultu -ra de todo este período. Du-rante muito tempo, a arte gótica foi considerada com desdém, não se hesitando em destruir as suas obras e seria necessário aguardar pelos românticos do sé -culo XIX para assistir à sua reabilitação.

A arte gótica emerge nos meados do século XII, com a construção de cabeceira da basílica de Saint-Denis, por iniciativa do abade Suger. Muito rapidamente, porém, expande-se em todo o domínio real francês e, a partir deste, irradia pela Europa inteira.

Este primeiro período de inovações e de expansão corresponde ao do gótico clássico. A partir da segunda metade do século XIII, os diferentes países da Europa libertam-se do modelo francês. Cada região confere à arte gótica uma inflexão original, segundo o seu pró prio génio, sem, com isso lhe alterar os fun-damentos. É a época dos góticos regionais.

A área de expansão da arte gótica cobre um espaço geográfico muito importante. Ao Norte, implanta-se até à Escandinávia (que desenvol-ve uma arquitectura de tijolo); a Este atinge a Polónia e, ao Sul, conquista uma parte do Oriente latino, encontrando-se presente em Chipre e em Rodes. A cultura gótica aparece, afinal, como o cimento unificador desta Europa politicamente fragmentada.

Contudo, a Itália afirma-se como excepção, permanecendo longamente fechada ao influxo da arte gótica, da qual realiza uma interpretação completamente original, retendo apenas o aspec-to decorativo. De resaspec-to, desde os meados do século XIV que uma arte nova se desenvolve na Toscana: o Renascimento, o qual porá fim ao rei-nado da arte gótica.

Capítulo6

A arte gótica

Rosáceada fachada ocidental da catedral de Notre-Dame, Reims. © Dagli Orti.

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CONTEXTO

A arte gótica

A

arte gótica está intimamente ligada ao nas-cimento das cidades, por oposição ao românico, cujo carácter fora sempre rural. Com o século XII, a Europa entra num claro perío-do de expansão, perío-do qual se reconhece o forte cres-cimento demográfico. Este fenómeno desenca-dearia a formação de numerosos centros urbanos e, com isso, a Europa medieval, composta de pequenas estruturas isoladas evolui no sentido de uma maior unidade. À cidade estará reservado um papel cultural e social de primordial impor tân-cia, que virá a convertê-la no motor de numerosas transformações.

Para responder às necessidades de abasteci-mento das cidades, desenvolve-se consideravelmen-te o comércio, servindo-se da rede dos caminhos de peregrinação e criando novas vias marítimas*. As cidades da Itália da Norte*, nomeadamente, afir-mam o seu domínio sobre o mar e ocupam um lugar de primeiro plano neste processo de desen-volvimento comercial.

Porém, a reactivação dos circuitos mercantis fa -vo rece a circulação das ideias e os séculos XII e XIII constituem um período de grande emulação intelectual, com o nascimento das primeiras uni -ver sida des*, onde se ensinam agora a filosofia grega e os au tores clássicos antigos. Representam igualmente centros de propagação das grandes cor-rentes escolásticas e teológicas, agrupadas em duas grandes tendências opostas: a que defende o idealismo e o mis ticismo e a que preconiza a racio-nalização da fé e o naturalismo, postulados ideoló-gicos esses que, aliás, virão a estar na base das novas formas artísticas.

À universidade e à catedral gótica pertence a responsabilidade da divulgação de um saber que não é mais reservado a uma elite monástica, isolada do mundo. Também a religião reveste um carácter mais acessível e mais humano. A diversidade geo-política da Europa continua sendo extrema. Em França, os monarcas esforçam-se por impor o seu poder sobre uma extensão territorial ainda frag-mentada e Filipe Augusto, no início do século XII, reconquista os territórios que haviam passado à soberania inglesa. Mais tarde, o reinado de S. Luís (1226-1270) assinalará o triunfo do poder dos Cape-tos. Na Alemanha, a situação permanece confusa: ao longo da segunda metade do século XIII, a auto-ridade imperial desagrega-se e, por detrás da unida-de aparente do Sacro Império Romano Germânico, são os poderes locais que governam.

Inversamente, as grandes cidades de Itália do Norte, tal como as da Hansa, no Báltico e no Mar do Norte, suas parceiras e rivais, gozam de uma real autonomia e os seus comerciantes convertem-nas Fachada da Catedral de Reims,(XIIIe- XIVes.).

© Artephot/Brumaire.

Lição na UniversidadeMiniatura do séc. XV. Biblioteca Mazarina. © J Vigne.

No documento DA ARTE HISTÓRIA (páginas 81-85)