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Capítulo 2 – Educação Intercultural, um Imperativo da Globalização

2.3 Educadores com uma nova visão

Nesse sentido, educar para a diversidade se transforma num grande desafio a que instituições de ensino, educadores, profissionais da educação, autoridades educativas, políticas e religiosas e a sociedade de uma forma geral não podem esquivar-se. Todos têm de se juntar para encontrar a melhor via de conseguir esse desiderato visando um mundo menos desigual, mais justo, mais inclusivo e mais solidário. Um mundo em que os interesses individua is não se sobreponham aos interesses da coletividade, mas em que o viver coletivo saiba adotar noções de valores, comportamentos e atitudes que facilitem a vida em sociedade, sobretudo quando se trata de contextos marcadamente diversos.

Nessa tarefa de transformação social do indivíduo em agente transformador da sua sociedade, uma grande responsabilidade pesa sobre os ombros dos professores e educadores. Para Alves e Backes (n.d.) “o fato da diversidade ser presença no nosso cotidiano, enquanto seres humanos e sociais que somos, não quer dizer que isto seja algo simples, pois, nos coloca dentro de uma área de constante conflito, repleta de contradições e desafios” (p. 10). Por essa razão, afirmam os mesmos autores, existe uma “[...] grande dificuldade em se discutir a diversidade, posto que a nossa relação com a diferença é algo desafiador, que por vezes nos causa medo e insegurança” (ibid.). O medo do desconhecido, do desigual, do diferente. Torna-se, pois, urgente e inadiável a construção de uma nova abordagem de ensino aprendizagem que vise não apenas formar, mas sensibilizar, capacitar e equipar os educadores com as ferramentas necessárias para lidarem com as novas realidades de aprendizagem que hoje se impõem.

À semelhança do que defende Edgar Morin (referido por Cardoso, 2013: 93), não se trata de “encher a cabeça” dos professores de retórica, de discursos repetitivos (e às vezes contraditórios), de práticas pedagógicas desfasadas que em muito pouco contribuem para os ajudar a enfrentar os desafios e a complexidade de um ambiente de aprendizagem marcado pela diversidade étnico-cultural dos seus membros. Para além de uma formação contínua e permanente para a capacitação dos docentes em matéria de conhecimentos gerais e específicos, precisa-se de professores e educadores sensíveis e sensibilizados,

capazes de formar e de educar; de formar competências, de moldar personalidades, de ajudar a desenvolver nos alunos o espírito crítico e a capacidade de participar na construção do seu próprio conhecimento; de educar para a cidadania. Precisa-se de professores e de educadores com uma nova mentalidade, abertos às mudanças que a globalização trouxe e traz consigo, despidos de toda e qualquer forma de preconceito e que possam ver no aluno, acima de tudo, a pessoa humana que é, indepe ndentemente do estatuto social, da sua proveniência, ou das suas características culturais, políticas ou religiosas. Precisa-se de professores e de educadores que possam “contribuir para a construção de uma prática pedagógica de valorização da diversidade étnico racial […]” (Alves & Backes, n.d., p. 9), “condição indispensável para a construção de uma educação mais comprometida com as causas sociais” (p. 11). Em suma, precisa-se de professores e de educadores com uma nova visão do mundo e da vida, que consigam traduzir essa visão em ações concretas e visíveis em benefício dos cidadãos e da sua forma de aprender. Para Gomes (2003),

Esta formação exige dos docentes, dos cursos de graduação e pós -graduação, o desenvolvimento conjunto de competência teórica e prática que seja capaz de acompanhar as diferentes formas de aprender e de conhecer desenvolvidas pelos alunos e professores co mo sujeitos sócio culturais, relacionando-as à diversidade cultural.

(in Alves e Backes, n.d., p. 11)

Facto é que formação por si só também não faz mudar mentalidades. A menos que haja abertura ou pré-disposição para a mudança, formações não operam milagres. Ruiz (2003: 64) subscreve a afirmação de Sacristan (1998) quando afirma que “assistimos a uma crise importante nos discursos que têm guiado a escolarização nesta segunda metade do século XX. As práticas, no entanto, parecem seguir velhas seguranças, como se nada es tivesse acontecendo […]”. E revisitando a tese de Alarcão (2001: 2), “[...] as inovações não se fazem por decreto, requer dos professores um espírito de pesquisa próprio de quem sabe e quer investigar e contribuir para o conhecimento sobre a educação”. Assim, a nova visão que se pretende dos educadores envolve uma profunda mudança de mentalidades, comportamentos e atitudes no relacionamento dos professores com a diversidade, inequivocamente demonstrada no contexto onde desenvolvem a sua atividade profissional. Precisa-se de professores reflexivos, inovadores, criativos e ousados, dispostos a desafiar o conforto monótono do tradicional e ir ao encontro do novo, do diferente.

Ruiz (2003) acredita que nisso a filosofia da educação pode ser uma grande aliada. Segundo esta investigadora, “[…] cabe à filosofia da educação empenhar-se na construção de uma imagem de homem como sujeito da educação, buscando uma visão integradora que leve em consideração a historicidade desse ser” (p. 60). “A filosofia pode contribuir para que a educação seja pensada, analisada e refletida, saindo assim do ativismo, ou seja, do fazer pelo fazer, sem respaldo que norteie o porquê e o para quê destina -se esse fazer” (p. 58).

Por seu lado, especialistas em matéria da conceção curricular para a diversidade acreditam que as ações de formação docente não podem estar desgarradas da componente curricular. Defendem que, se quisermos, de facto, uma educação comprometida com a diversidade, essa diversidade tem de estar expressamente retratada nos planos curriculares concebidos e nas políticas e práticas educativas adotadas, respeitando as diferenças culturais e identitárias dos aprendentes. Suárez-Orozco e Qin-Hilliard (2004) defendem que os educadores precisam desenvolver uma agenda que facilite a incorporação do número crescente de crianças imigrantes à volta do mundo, bem como programas curriculares e pedagógicos que visem a transmissão das competências interculturais necessárias ao desenvolvimento das crianças no seu momento histórico, para que possam emergir como agentes de mudança para o combate às crescentes desigualdades globais. Na sua opinião,

“globalização sem justiça social dói e ameaça a todos nós” (p. 16).

Para Alves e Backes (n.d.), “a ausência da diversidade, grande lacuna nos currículos escolares, tem trazido grandes prejuízos à formação, tanto dos alunos como dos professores, situação que se torna mais grave quando se fala de escola pública” (p. 2). Nessa perspetiva , a educação moderna precisa encarar a diversidade com novos olhares e criar modelos educativos, de gestão escolar e de formação docente de forma a contemplar a riqueza social, étnica e cultural de todos os atores envolvidos no processo para que o professor possa realmente ser visto como verdadeiro mediador de aprendiza gem e facilitador da construção do conhecimento nesses contextos multiculturais e diversos.

CAPÍTULO 3 – O Professor Intercultural como mediador de