• Nenhum resultado encontrado

O ensino de atitudes e valores em contextos de diversidade: perspetivas

Capítulo 4 – Educação Intercultural e o Ensino de Atitudes e Valores

4.2 O ensino de atitudes e valores em contextos de diversidade: perspetivas

E ao falarmos de atitudes e valores , estamos a referirmo-nos exatamente a esse conjunto de normas e padrões de convivência social considerados essenciais para que os cidadãos possam conviver em paz e harmonia, respeitando os direitos, a liberdade, as opções pessoais e as diferenças individuais dos membros que formam o tecido da sociedade em que se encontram inseridos.

A nosso ver, revela-se pertinente lançar aqui um olhar analítico crítico sobre a posição de alguns autores a respeito do ensino de atitudes e valores em instituições de ensino formal, no intuito de descobrir até que ponto as preocupações expressas por esses autores aparecem (ou não) refletidas no discurso e nas práticas concebidas para o setor educativo por parte de autoridades com responsabilidades na tomada de decisões em matéria de políticas públicas. A nossa preocupação prende-se com a importância atribuída ao desenvolvimento de competências éticas e de valores necessários à formação dos indivíduos, uma vez que as posições relativas a essa matéria nem sempre granjeiam opiniões convergentes.

De entre os autores ligados à problemática do ensino de atitudes e valores na escola, começaríamos por destacar Miguel Zabalza, influente psicólogo, pedagogo e investigador, em especial nas áreas de desenvolvimento curricular e de formação de professores, como acérrimo defensor da necessidade de se incorporar o ensino de atitudes e valores no currículo escolar, assente “numa sólida perspectiva didáctica: ou seja, aquela que faz do

acto de ensinar uma acção consciente – fundada e sistemática” (Zabalza, 2000: 11). Mas, para Zabalza, essa questão não se resume à uma simples prática do ensino desses conteúdos. Para além de ensinar os conteúdos é igualmente importante definir mecanismos para a sua avaliação, pelo que no seu artigo intitulado “O Discurso Didático

sobre Atitudes e Valores no Ensino” (in Trillo, 2000) faz centrar a sua atenção na

componente avaliação, isto é, como e porque avaliar, de forma criteriosa e objetiva, o processo de aquisição de atitudes e valores no contexto de aprendizagem.

Do discurso de Zabalza (2000) depreende-se que o autor pretende não uma abordagem ligeira ou superficial dessa problemática, sujeita a critérios de subjetividade ou a juízos valorativos. Pretende, sim, que o ensino desses conteúdos esteja assente em premissas claras e objetivas que permitam “clarificar o campo de intervenção didática no ensino de atitudes e valores, delimitar os contextos de atuação desses conteúdos, precisar o tipo de aprendizagem pretendida e os critérios de avaliação a adotar. Pretende ainda que seja estabelecida uma diferenciação clara entre aquilo que se considera “atitudes e valores morais e aqueles que são mais propriamente científicos” (ibid., p. 12). Por outras palavras, conteúdos que podem ser observados, analisados e avaliados como resultado de uma aprendizagem planificada, sistemática e evolutiva. O autor refere um novo discurso didático onde o saber ser, o saber estar, o saber comportar-se e o saber respeitar sejam elementos-chave para uma sã convivência na base da compreensão, da não-violência, da justiça social e do respeito pelas diferenças, à semelhança do que é defendido por Delors

et al (1996) e por Michael Byram (1997). Nesse sentido, o ensino de atitudes e valores

revela-se de extrema importância para uma aprendizagem adequada às sociedades contemporâneas culturalmente diversas e em constante transformação e crescimento.

No entanto, Zabalza (2000) admite que, apesar da importância da incorporação desses conteúdos no ensino, a sua avaliação não se afigura de muito fácil abordagem devido ao elevado grau de complexidade que envolve, mesmo sendo gerida por profissionais com experiência e conhecimentos sólidos nessa matéria (p. 19). E se alguma dúvida houvesse quanto à dimensão do grau de complexidade que o referido autor confere à essa questão (avaliação de atitudes e valores), ficaria decerto dissipada ao constatarmos, efetivamente, o número de vezes que utiliza os termos complexo e complexidade ao longo da sua narrativa, no já mencionado artigo (O Discurso Didáctico sobre Atitudes e Valores no Ensino): processo complexo, tarefa complexa, propósito complexo, entidades complexas,

natureza complexa, complexidade da atitude, etc. (pp. 19-97), termos esses também muito

utilizados por Bolívar (2000) para versar sobre o tema “Educação em valores” (in Trillo, 2000). Com efeito, avaliação, seja de que natureza for, ou em que contexto for, nunca é tarefa fácil. A Professora Alice Trindade (referida por Cardoso, 2013: 172) diz que, “a avaliação é sempre um processo complicado e, como tal, tem de ser bem gerido por parte do professor. A avaliação envolve também uma relação de poder que não pode (ou não deve) ser exercida de forma discricionária”.

Na perspetiva de Zabalza (2000), “valores e atitudes estão intrinsecamente ligados [sendo que] “as atitudes possuem uma componente valorativa, [...] algo semelhante à cristalização dos valores assumidos” e os valores são “uma espécie de elemento concomitante da atitude” (p. 20). Para o autor, “o tema das atitudes adquiriu uma relevância especial no novo modelo curricular, ao ter sido incluído explicitamente como um dos conteúdos básicos da formação que se pretende oferecer nas escolas”, fenómeno recente na história da educação (p. 21). Por sua vez, Bolívar (2000: 137) define atitudes como “predisposições, adquiridas ao longo da aprendizagem que impelem a manifestar-se de determinadas formas perante os objetos ou as situações”. E Rubal (2000: 103) define

valores como “um tipo de crenças, crenças firmes, perspectivas que se referem a estados finais da existência (valores morais) ou a modos específicos da conduta ou estados desejáveis de conduta (valores instrumentais)”. Zabalza (2000) acredita existirem muitas definições a esse respeito, mas argumenta que não basta definir conceitos, importa

clarificá-los. Defende que é importante perceber que uma atitude envolve uma disposição,

por sua vez sustentada por um conjunto de conhecimentos, afetos e condutas a respeito do objeto da nossa atitude; envolve uma atuação, que por sua vez engloba um aspeto emocional que poderá provocar uma reação positiva ou negativa, de aproximação ou de rejeição, a respeito do objeto da nossa atitude; as atitudes podem ser projetadas numa grande diversidade de objetos, reais ou figurados, concretos ou abstratos, animados ou inanimados. Portanto, não basta definir uma atitude como “uma disposição pessoal ou colectiva que leva a actuar de uma determinada maneira em relação a certas coisas, ideias ou situações” (p. 23). Há que saber descodificar as mensagens implícitas nessa definição e perceber as implicações de cada um dos seus componentes no comportamento humano para se chegar à essência da sua compreensão.

Citando os contributos de Fishbein e Azien (1977) e de Keil (1985) sobre a problemática das atitudes, Zabalza (2000) explica que: 1) Trata-se de uma dimensão ou de um processo interior das pessoas que leva a agir de uma determinada forma; 2) Atitude é uma condição adaptável às circunstâncias que surgem e mantêm-se na interação que o indivíduo tem com os que o rodeiam; 3) Atitudes não são imutáveis ou inalteráveis. Constroem-se, ensinam-se, modificam-se, substituem-se. 4) Atitudes são fenómenos humanos complexos envolvendo componentes cognitivos, emocionais e comportamentais, sendo esses entendidos, respetivamente, como: aquilo que se sabe sobre o objeto da atitude; os afetos/reações que esse objeto pode provocar; as ações que esse objeto poderá desencadear no indivíduo (pp. 26-27). Assim sendo, atitudes possuem conteúdos e caraterísticas assinaláveis que permitem que sejam incluídas no curriculum escolar como ob jeto de formação e de aprendizagem.

O mesmo autor refere que estudos levados a cabo apontam no sentido de haver consenso entre os estudiosos no que respeita ao ensino de atitudes e valores na escola, pelas vantagens daí advenientes para a pessoa humana. No entanto, trata-se de uma tarefa que exige a intervenção multipartida de vários atores sociais e educativos pois o papel da escola nessa área, apesar de crucial, é muito limitado ( ibid., pp. 28-29). Neste aspeto, a família, os pares, a escola, os meios de comunicação social, as igrejas, os partidos políticos, as associações desportivas, as organizações de defesa do ambiente, de entre outros, não podem demitir-se do seu papel educativo, formativo e informativo porque são todos corresponsáveis pela formação de cidadãos íntegros, responsáveis, pró-ativos, tolerantes, amantes da paz, do ambiente, da liberdade, da cidadania e da democracia.

A família, por exemplo, constitui a instituição responsável em primeira instância pela educação dos seus filhos. Ela é a base afetiva do indivíduo e a ela compete não apenas a responsabilidade de satisfazer as necessidades básicas da criança logo à nascença e fazer o seu acompanhamento para a vida, mas também cuidar da sua socialização. É através da socialização que o indivíduo se torna num ser social reflexivo, crítico e atuante, uma vez que isso lhe permite assimilar as normas, os comportamentos e os valores do grupo social em que se encontra inserido. Quanto à escola, apesar das limitações a que se encontra sujeita, continua sendo a instituição por excelência mais vocacionada e preparada para a assunção da responsabilidade de transmissão de atitudes e valores aos cidadãos , por diversas razões, algumas das quais apontadas por Zabalza (2000: 30): a) tem a vantagem

de poder fazer um trabalho mais sistemático e continuado no domínio da formação; b) pretende-se que a formação de atitudes e valores seja feita de forma consciente e crítica, e isso a escola pode fazer; c) sempre se considerou que atitudes constituem uma parte substancial das mensagens educativas que a escola transmite aos seus educandos. Além disso, a escola possui metodologias e estratégias didático-pedagógicas apropriadas para o ensino desses conteúdos, integrando valores, normas e comportamentos. E neste ponto o autor regozija-se com as mudanças que a Reforma do Sistema Educativo [de 1990] veio imprimir ao sistema educativo do seu país (Espanha), admitindo e aceitando, de forma explícita, a inclusão nos programas das diferentes áreas curriculares da componente “formação de atitudes e valores”. “Desta maneira, os correspondentes Desenhos Curriculares oficiais recolhem não só os conteúdos de informação que os alunos/as têm de assimilar nas diferentes disciplinas do curriculum, como também as atitudes que pretendemos comunicar-lhes ao abrigo do trabalho escolar nas diferentes áreas curriculares” (ibid.). Trata-se, nessa perspetiva, de um ensino transversal e interdisciplinar.

Depreende-se assim que, no rol das preocupações demonstradas por Zabalza quanto a importância da incorporação de atitudes e valores no ensino, transversalmente a todas às áreas curriculares, essas decisões educativas introduzidas pela Reforma (de 1990) tenham representado, para o autor e os seus pares, o coroar, com sucesso, de uma luta que vinha sendo travada ao longo dos tempos sobre essa mesma problemática.

O mesmo autor não deixa de ressaltar a importância do papel do professor nesse processo, pois considera o docente a trave mestra na implementação desse projeto educativo. Para o ensino de atitudes são necessários modelos atitudinais de referência para os alunos, e “os professores são sempre modelos”, com uma grande capacidade de persuasão para atuarem nessa área (Zabalza, 2000: 45). “A actuação do professor como modelo de atitudes faz com que o tema de ensino das atitudes transcenda a natureza fundamentalmente técnica do ensino de outros conteúdos” (p. 46) e entre na esfera do humano onde as componentes cognitiva, afetiva e comportamental se entrecruzam. A pedagoga Maria José Ruiz (2003 : 63) reforça esta tese quando afirma que “faz-se necessário acreditar, com Gadotti, que, apesar da educação não poder sozinha transformar a sociedade em questão, nenhuma mudança estrutural pode acontecer sem a sua contribuição”.

Em síntese, diríamos que temos toda uma argumentação estruturada e fundamentada por parte de alguns autores, especialmente Zabalza (2000), no sentido de incentivar e defender a incorporação de atitudes e valores no ensino, mas que não deixa de revelar um cenário de certa forma dicotómico. Por um lado, parte das preocupações em relação à essa nova perspetiva didático-pedagógica visando o ensino de atitudes e valores se desvanece perante as seguintes constatações: 1) A existência de um consenso geral (segundo afirma Zabalza, 2000: 28) quanto ao ensino de atitudes e valores na escola, pelas assinaláveis vantagens para os cidadãos daí resultantes; 2) A relevância especial adquirida pelo tema, ensino de atitudes e valores, no novo modelo curricular, ao ser incluído explicitamente como um dos conteúdos básicos da formação que se pretende oferecer nas escolas (p. 21);

3) O destaque dado pela Reforma ao ensino de atitudes e valores na escola, determinando

a sua inclusão explícita nos Desenhos Curriculares oficiais (p. 30); 4) A conclusão de que atitudes podem efetivamente ser ensinadas, aprendidas, construídas, modificadas, substituídas, não sendo, portanto, estáticas nem imutáveis (p. 27); 5) A confirmação de que o sucesso da formação nessa matéria depende basicamente do tipo de informação transmitida, dos métodos de ensino utilizados, da atitude e postura dos professores envolvidos e do papel das instituições escolares enquanto modeladores de atitudes (p. 47);

6) O reconhecimento de que os professores desempenham um papel notável no processo

de aquisição de atitudes e valores por parte dos alunos e de que “a escola constitui o cenário por excelência para potenciar e estimular o desenvolvimento cognitivo, ampliar a riqueza e a diversidade de experiências e nutrir o repertório de informações sobre os objetos das atitudes” (p. 37); 7) Evidências que indicam que o “ensino de atitudes e valores” se irá desenvolver respeitando escrupulosamente os princípios gerais de todo o processo de intervenção educativa (p. 49); 8) A importância da avaliação como peça- chave no ensino de atitudes e valores e a necessidade de ser convertida num momento privilegiado do processo educativo (p. 65), pelo que deverá situar-se sempre no contexto de um projeto curricular e de uma programação (p. 68), onde o feedback revela-se de grande utilidade (p. 74); 9) A convicção de que a avaliação de atitudes é sobretudo uma avaliação formativa (ibid.), opinião também partilhada por Rubal (2000: 117).

Mas por outro lado, existem aspetos menos positivos dignos de nota, suscetíveis de dificultar em grande medida o sucesso do projeto. Entre eles se destacam: 1) O facto da aprendizagem de atitudes e valores ser um processo complexo que tem de passar por

diferentes etapas até atingir a sua maturação (Zabalza, 2000: 35), isto é, até produzir resultados visíveis; 2) A grande complexidade do processo educativo que poderá fazer perigar as estratégias utilizadas pelos professores, acabando por produzir efeitos contrários aos desejados (p. 48-49); 3) O facto da ação dos professores por si só não poder garantir a assimilação efetiva das atitudes por parte dos alunos (p. 49); 4) O facto de, em algumas ocasiões, as atitudes desenvolvidas na escola poderem entrar em conflito com os valores assumidos no grupo social dos alunos (p. 53); 5) Dos muitos problemas doutrinais e técnicos que rodeiam a avaliação de atitudes, praticamente nenhum deles está relacionado com a avaliação formativa (p. 56); 6) A incerteza quanto à posição da avaliação de atitudes e valores perante a avaliação geral das outras componentes das disciplinas em termos de cálculo da média (p. 60); 7) É por demais complexo fazer uma avaliação de atitudes que respeite o direito à individualidade das pessoas, o seu direito a manter e expressar as suas próprias opiniões e valores, o seu direito à liberdade de consciência (p. 62); 8) A subjetividade e a própria orientação pessoal do professor podem exercer uma forte influência na valorização que confere às atitudes e aos valores dos outros (p. 62); 9) Atitudes não possuem uma estrutura objetiva e palpável, pelo que não se lhes pode aceder diretamente por não serem observáveis de per si (p. 76).

A historiadora, psicóloga e investigadora Helena Marchand (2001) defende que “a educação moral não é uma ideia nova”, remontando o seu surgimento à história da própria educação, embora só tenha sido regulamentada em Portugal na década de 1980 (p. 1). Marchand (2001) afirma que “em termos dos conteúdos, [...] a generalidade dos autores foi particularmente sensível aos processos psicológicos da formação pessoa l e social, e que a maior parte se centrou na educação dos valores” (p. 2). Propõe para o efeito a utilização do modelo de Kohlberg, centrado na discussão de dilemas e a organização

democrática das escolas, ou a abordagem de Raths, centrada na clarificação de valores,

ideia também partilhada por Zabalza (2000). Mas ao contrário de Zabalza, Marchand (2001) é perentória ao afirmar que (no caso de Portugal, por exemplo), a proposta da educação para os valores expressa na Reforma do Sistema Educativo (de 1986), na opinião de diversos autores, não teve o sucesso desejado (assim como as reformas subsequentes), tendo sido as principais causas do insucesso o facto de: “a) querer mudar sem ter em

conta os factores de resistência à mudança; b) haver um grande divórcio entre a teoria e a prática (elaboração de reformas de costas viradas para os principais actores –

professores, alunos e outros agentes educativos); c) haver uma grande falta de sentido de

pertença e de cultura da escola [...]”; d) e por último, mas não menos importante, haver um grande défice de formação dos docentes para desempenharem tais tarefas (p. 3). E

constatações dessa natureza têm sido apontadas como sendo a causa do insucesso na implementação de determinadas reformas pretendidas para os sistemas educativos de vários países, onde se enquadra Cabo Verde, por exemplo, devido a essa visão unilateral e não partilhada das autoridades com responsabilidades nessa matéria, e m relação aos atores que se encontram efetivamente no terreno. Constata-se ainda que Marchand (2001) não partilha da opinião de Zabalza (2000) quanto à existência de um consenso geral no que toca ao ensino de valores na escola, afirmando mesmo que esta questão é extremamente controversa e tem dividido os docentes em dois grandes grupos – o pró e o contra (ibid.).

Embora reconhecendo a necessidade e a importância da introdução desses conteúdos nos curricula visando um mundo melhor, Marchand (2001) diz existir alguma reticência em relação a determinados aspetos funcionais dessa questão. Mesmo assim, afirma que “o papel da escola na promoção dos valores torna-se particularmente importante numa época em que milhões de crianças recebem muito pouca educação moral na família, e em que a Igreja perde gradualmente influência” (p. 4). E realça que “nenhuma forma de educação

é neutra ou independente de valores”, mas não deve entrar na esfera da doutrinação, ou

como diz Zabalza, da inculcação de crenças. Na verdade, a questão da neutralidade na educação é refutada por vários autores (Perrenoud, 1999; Zabalza, 2000; Canen, 2001; Marchand, 2001; Candau, 2008; Cardoso, 2013; Valente, (n.d.), etc.) que acreditam que o professor na sala de aula tem de ter uma posição profissional definida e assumida em relação aos conteúdos que leciona.

Para a professora e investigadora Maria Odete Valente (n.d.), “o ensino de valores não se pode evitar”. Defende que “a educação para os valores realiza-se em todos os momentos, permeia o curriculum e também todas as interações interpessoais na escola e as relações desta com a família e a sociedade” (p. 1). Tudo aquilo que se faz ou se utiliza como recurso didático na escola gira à volta de valores e comportamentos éticos e morais. Se assim é, Valente (n.d.) diz não perceber a hesitação sobre o benefício do ensino de valore s na escola, ou o medo daquilo que essa ação possa despertar nas pessoas. À semelhança de Marchand (2001), aconselha os educadores a apoiarem-se nas abordagens de Raths, baseada na teoria de clarificação dos valores, ou de Lawrence Kohlberg, centrada na

discussão de dilemas e a organização democrática das escolas, para orientar as suas

estratégias pedagógicas visando o ensino de conteúdos tão importantes na educação e formação do cidadão que se quer global hoje.

O professor e investigador Roberto Carneiro, possuidor de uma vasta experiência na área da educação, a vários níveis , e um dos catorze elementos integrantes da Comissão Internacional para a Educação no Século XXI, oficialmente criada pela UNESCO em 1993, por sua vez afirma que “o homem é um ser mora l e que essa propensão para a distinção entre o bem e o mal é parte indissociável da natureza humana [pelo que] a aprendizagem dos valores, na esfera das instâncias básicas de socialização, é componente básica da sua sobrevivência como ser moral [...]” (Carneiro, 2008: 51). No entanto, essas instâncias básicas de socialização têm vindo a sofrer várias e profundas alterações como consequência inevitável do “caldeamento de gentes” que passaram a constituir a textura das sociedades a nível planetário devido a diversidade cultural que passou a caracterizar o mundo na decorrência do fenómeno da globalização. Alguns dos aspetos maléficos daí advenientes são, por exemplo, o impacto exagerado das novas tecnologias sobre a vida humana, a corrida para o consumismo material ilimitado, o individualismo gratuito, a falta de solidariedade e de humanismo e “o alastramento de um ambiente competitivo global sem descanso, em todo o lugar e a todo o momento […]” (ibid., p. 53).

Carneiro (2008) afirma que tudo isso tem gerado uma fragmentação de valores sem precedentes que não pode ser vista apenas como mero fenómeno conjuntural. “O ascenso de uma nova ordem, diversa e multicultural, gerou uma doutrina adversa à afirmação das instâncias básicas de socialização, ou seja, das instituições de enquadramento axiológico: estamos defrontados com uma questão estrutural e estruturante da sociedade” (p. 54). E o autor vê essa inversão de estruturas e valores de convivência social como a tradução de