• Nenhum resultado encontrado

151O estudo permite ainda verificar que o terceiro setor cultural apresenta dificuldade em encon-

trar mecanismos de financiamento adequados, sendo possível notar a coexistência entre asso- ciações mais jovens e empreendedoras, e associações tradicionais, bem como a tendência recente para a alteração do estatuto legal de algumas associações para empresas privadas.

O estudo conclui que as organizações da sociedade civil cumprem funções ligadas à preserva- ção e transmissão da cultura e das artes, constituindo um espaço de expansão, para as práticas de inovação social. Conforme reconhecido pelo Observatório Interarts (1999:54), muitos festivais e celebrações da cultura popular teriam desaparecido sem o compromisso e esforço de organizações e pessoas, através das associações culturais:

“(…) these popular celebrations are still an awesome field of innovation and social relation and the highest representatives of cultural diversity of Europe. They are probably the organisations that be- lieve and guarantee the sense of community in many towns and districts”.

3.6 - O terceiro setor em Portugal

A designação de terceiro setor constitui, segundo Nunes, Reto e Carneiro (2001), a mais apro- priada para a realidade portuguesa, embora, também se utilize o termo economia social, com alguma regularidade (Franco, 2004). Investigação conduzida no âmbito do CIRIEC (2000) posi- cionava o terceiro setor, em Portugal, num contexto de emergência, tendo por base, por um lado, o nível de notoriedade no âmbito da comunidade científica e nos mass media e, por outro lado, o reconhecimento registado por parte das autoridades públicas. Conforme refere Ribeiro (2002:6):

“Em Portugal, apesar do uso da terminologia ainda não ser corrente e assumido, a existência do terceiro setor pode ser observada no já longo percurso histórico do associativismo de base presente desde o século XIX, prolongando-se por todo o século XX com intensidades diversas nas mais dife- rentes variantes, com predominância para as dimensões recreativo-cultural e de proteção social”.

A génese do associativismo em Portugal situa-se no final do século XVIII e início do século XIX, sob influência da Revolução Francesa e do associativismo anglo-saxónico decorrente da Revolu- ção Industrial. Assim, a criação das primeiras organizações da sociedade civil remontam ao início do processo de industrialização, no qual os operários começam a organizar-se, no sentido de en- contrar respostas para as necessidades de proteção social e de instrução. Conforme descreve Costa Goodolfim (1974) citado por Martins (2004:1):

“O operário, associando-se ao operário, tirando todas as semanas da sua féria uma pequena par- cella, garante os recursos para os dias de doença, e por esta forma, sem vender, sem empenhar, sem os seus morrerem de fome, recupera a saúde no regaço da família. Eis a associação de soccorros mú- tuos…” (…) “O operário precisa ter uma associação sua, onde todos os sócios sejam seus companhei- ros, onde elle passe uma parte da noite, lendo ou estudando em livros ao alcance da sua intelligencia e do seu saber. Estas sociedades podem ser chamadas de instrucção popular ou de temperança”.

152

O associativismo, num sentido abrangente, de caráter sociocultural e comunitário, desenvolve- -se em Portugal no início do século XIX, com as sociedades filarmónicas, associações de instrução e recreio, associações de bombeiros, cooperativas e sociedades recreativas (Martins, 2004; Melo e Carmo, 2008). Inevitavelmente, a sua história encontra-se relacionada com evolução sociopolí- tica da sociedade portuguesa, tendo os vários momentos políticos influenciado a realidade destas organizações. Deste modo, há que registar o enfraquecimento do associativismo pelo regime po- lítico de ditadura, que predominou durante quase quatro décadas, no século XX (Moreno, 2002a). No entanto, em 1949, a federação de associações socioculturais de origem republicana estimava a existência de três mil coletividades no país em 1940, com cerca de dois milhões de associados, sendo cerca de 40% de caráter informal (Melo, 2001:337). Deste modo, estima-se que, cerca de metade das associações que existem hoje em Portugal, decorrem do 25 de Abril de 1974, tendo-se também assistido a uma diversificação das suas atividades, no sentido em que emergiram ou se reforçaram, outros tipos de associativismo, tais como a defesa do património, ambiente e na área social (Martins, 2004:21).

Contudo, como nota Soromenho-Marques (2005:135), o movimento ambientalista encontrou dificuldades em se impor na realidade portuguesa, até meados da década de 1980, uma vez que a opinião pública se encontrava focada noutras prioridades, nomeadamente na consolidação da de- mocracia e no combate à pobreza.

Em Portugal, vários acontecimentos apontam para o aumento da importância atribuída ao pa- pel e ao valor acrescentado do terceiro setor nos últimos anos, sendo de destacar, a constituição da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Local (ANIMAR) em 199316, a criação da Coo-

perativa António Sérgio para a Economia Social em 2009 (Decreto-Lei nº 282/2009, de 7 de Outu- bro), a criação do Conselho Nacional para a Economia Social17 e, mais recentemente, a publicação

da Lei de Bases da Economia Social, Leiº 30/2013 de 8 de Maio, que vem reconhecer as seguintes entidades, como parte integrante da economia social:

(i) As cooperativas;

(ii) As associações mutualistas; (iii) As misericórdias;

(iv) As fundações;

(v) As instituições particulares de solidariedade social não abrangidas pelas alíneas anteriores; (vi) As associações com fins altruísticos que atuem no âmbito cultural, recreativo, do desporto e do desenvolvimento local;

(vii) As entidades abrangidas pelos subsetores comunitário e autogestionário, integrados nos termos da Constituição no setor cooperativo e social;

(viii) Outras entidades dotadas de personalidade jurídica, que respeitem os princípios orienta- dores da economia social previstos no artigo 5.º da mesma lei e constem da base de dados da economia social.

16 Com o objetivo de promover a igualdade de oportunidades no acesso ao desenvolvimento da qualidade de vida e da redução de assimetrias, numa lógica territorial, de organizações, grupos e indivíduos. Conta com 69 associados coletivos e mais de uma centena de associados individuais (maioritariamente colaboradores de associações, centros de investigação e universidades).

17 Órgão de acompanhamento e de consulta do Governo no domínio das estratégias e das políticas públicas de promoção e desenvolvimento da economia social (neste âmbito foi constituído em 2011 um Grupo de Trabalho para a reforma legislativa do setor da economia social e solidária).

153

Outline

Documentos relacionados