• Nenhum resultado encontrado

123A existência de diferentes critérios de definição originou uma variedade de denominações para

este tipo de organizações. A título ilustrativo, terceiro setor, setor não governamental ou eco- nomia social constituem termos utilizados no contexto da Europa continental. A denominação setor voluntário (voluntary organizations, charitable organizations) predomina no Reino Unido e nos países nórdicos, setor não lucrativo ou setor das organizações não lucrativas assume rele- vância no contexto americano.

A denominação organizações da sociedade civil é mais recente, embora não seja consensual, com base na argumentação de que também o setor público e privado servem a sociedade civil. Os diferentes contextos históricos contribuíram para a impossibilidade de encontrar uma definição mundialmente aceite, no entanto, a designação de terceiro setor é aquela que reúne maior con- senso a nível internacional, entre os investigadores (Almeida, 2001; Defourny, Develtere e Fonte- neau, 1999; Ferreira, 2004; Franco, 2004; Kendall, 2005; Nunes, Reto e Carneiro, 2001). Em 1987, aquando da primeira edição do livro The Non-profit Setor: A Research Handbook, os seus autores notavam, por um lado, o facto de estas organizações se encontrarem na periferia do debate aca- démico e político e, por outro lado, a ausência de dados comparativos a nível internacional sobre a dimensão do setor não lucrativo.

Na última década do século XX, é de reconhecer os esforços com vista ao desenvolvimento de es- tudos comparativos a nível internacional. O papel, a natureza e a tradição do terceiro setor é bas- tante diferente nos dois continentes, pelo que um cuidado especial deve ser tido na transferência de lições da literatura americana para o contexto europeu. A diversidade de denominações coloca em evidência a riqueza do fenómeno e as formas distintas de proceder à sua análise. É previsível que o próprio debate teórico, em torno destes conceitos, venha a assumir crescente complexidade, contudo, o mesmo não constitui objeto de análise na presente investigação.

Com vista a ultrapassar o problema da invisibilidade estatística, investigadores da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos da América, procederam à criação de uma conta satélite para as Organizações Sem Fins Lucrativos, projeto este desenvolvido em parceria com a Divisão de Es- tatística das Nações Unidas e que culminou com a publicação do Handbook on Non-Profit Institu-

tions in the System of National Accounts, em 2003. A definição estrutural-operacional utilizada no

projeto Johns Hopkins tem vindo a ser alvo de críticas, no que respeita à desadequação da sua apli- cação no contexto europeu, devido à interpretação limitada das organizações não lucrativas, que coloca ênfase na não lucratividade, excluindo as componentes das cooperativas e das fundações, tão presentes no contexto europeu (CIRIEC, 2000; Defourny, Monzon e Campos, 1992; Defourny, Develtere e Fonteneau, 1999; Vaillancourt, 2008).

Vários são os fatores que contribuíram para a invisibilidade institucional do terceiro setor, até à última década do século XX, de entre os quais se destacam, como principais, a inexistência de uma definição conceptual rigorosa quanto aos aspetos partilhados por estas organizações, a prolifera- ção de denominações para o designar e a ausência de consenso quanto às mesmas e, por conse- quência, a ausência de um sistema periódico de recolha de dados comparativos a nível internacio- nal. No entanto, mais recentemente, vários foram os fatores que determinaram o reconhecimento

124

crescente da sua importância e o aumento da visibilidade, por parte da academia, da comunicação social e do poder político (Halfpenny e Ride, 2004). Em primeiro lugar, o seu significado econó- mico em termos de emprego, a título de exemplo, o setor representa cerca de 10% do emprego to- tal em países como a Bélgica, a Irlanda e a Holanda (Defourny e Pestoff, 2008); em segundo lugar devido à expansão da investigação associada à criação de centros de investigação e de produção científica, tais como o CIRIEC (Centre International de Recherches et d`Information sur l`Économie

Publique, Sociale et Coopérative); a International Society for Third Setor Research e o Johns Hopkins Centre for Civil Society Studies.

A partir da década de 1970, e da década de 1980, em particular, começa a consolidar-se o pen- samento neoliberal, que contribuiu para que as organizações não lucrativas se posicionassem no centro do debate público. Na origem esteve o assumir de um novo modelo de gestão pública decor- rente do desenvolvimento de políticas neoliberais nos Estados Unidos da América e no Reino Uni- do, assente num novo entendimento no que respeita à posição do Estado no modelo de bem-estar social, predominante até então: “Reagan and Thatcher pointed to the non-profit setor and philan- thropy as the answer, thus increasing the visibility and policy relevance of these long-neglected institutions” (Anheier e Salamon, 2006:92).

Neste período de crise, regista-se uma quebra na evolução continuada e no consenso existente quanto à figura do Estado Providência. Entre as razões para a crise do Estado-Providência en- contram-se a redução dos recursos financeiros do Estado e as críticas sobre a eficácia da inter- venção pública. A desregulação do mercado de trabalho conduziu a fenómenos de desemprego e de exclusão social, assistindo-se à incapacidade das políticas públicas para dar resposta ao in- cremento destes fenómenos.

As décadas posteriores caracterizam-se pelo desenvolvimento de experiências inovadoras, por parte das organizações do terceiro setor, orientadas para processos de integração social e econó- mica. Os casos de França e Itália são particularmente interessantes. Em Itália, destacam-se as ex- periências das cooperativas de solidariedade social, nascidas da iniciativa de associações volun- tárias. Na França, é de salientar as experiências das Régions de Quartier, estruturas de reinserção social e profissional, com intervenção em pequenos bairros.

As iniciativas de desenvolvimento económico comunitário (Développement Economique Commu-

nautaire), durante as décadas de 1980 e 1990, no Québec, constituem, segundo Monteiro (2002a),

uma aproximação às experiências em meio rural e urbano, da França e Itália, que articulavam uma dimensão económica, centrada na valorização dos recursos locais e apoiada em parcerias entre as organizações da comunidade e os setores público e privado, uma dimensão local, assente na revi- talização económica e social de um território e, finalmente, uma dimensão comunitária, centrada na comunidade como motor associativo de revitalização (Favreau e Lévesque, 1996). Para Léves- que (2005), a orientação adotada por estas iniciativas corresponde a uma nova conceção de desen- volvimento local como espaço de concertação, o que representa um avanço, a partir da contesta- ção ao modelo de desenvolvimento fordista, que deu lugar a uma nova visão do desenvolvimento, a partir das iniciativas locais.

125

Outline

Documentos relacionados