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3 REFERÊNCIAS CONCEITUAIS

3.5 EXPERIÊNCIAS E TENDÊNCIAS

A força das Avaliações de Impactos Ambientais como instrumentos de decisão prende- se, em seu nascedouro, à uma cultura que privilegia as mais diversas formas de organização da sociedade civil, visando a uma efetiva participação nos processos decisórios que afetam o interesse público. As questões ambientais, por sua vez, desde há muitos anos têm assumido um papel de destaque nos interesses comuns dos cidadãos, mormente nos países desenvolvidos e com maior grau de instrução e conscientização de suas populações.

Nesse contexto, é que o NEPA (EUA) veio institucionalizar a Avaliação de Impactos Ambientais como mais um instrumento de decisão, colocado à disposição do poder público e

da sociedade civil organizada, capaz de determinar a formulação e seleção de alternativas com base em critérios que, até então, seriam tidos como, no mínimo, pouco ortodoxos. Adotada nos países da Europa, a AIA assume contornos novos, inclusive metodológicos. Mantém-se, no entanto, o princípio que a caracteriza como instrumento de decisão, em contextos sociais favoráveis à sua efetiva utilização para discussões que afetam os projetos, em todo o seu ciclo (conforme discutido acima, em 2.1.1 e 2.1.2).

De um modo geral, os objetivos AIA variam pouco, mesmo quando se comparam as experiências de países com diferentes graus de desenvolvimento econômico e social. BISWAS e QU GEPING41 (apud ANDRÉ et al., 1999), pesquisando a AIA em países em

desenvolvimento, assinalam, como objetivos comuns:

1. definir os problemas ambientais que podem ser antecipados;

2. incorporar, nas ações para o desenvolvimento, medidas mitigadoras apropriadas;

3. determinar os benefícios e os custos ambientais do projeto, bem como sua aceitabilidade econômica e ambiental pela comunidade;

4. definir os problemas ambientais críticos, que exigem novos estudos ou um monitoramento;

5. examinar as diferentes opções válidas disponíveis e fazer a escolha da opção ótima;

6. levar o público a se engajar no processo de decisão associado ao meio ambiente;

7. assistir a todas as partes engajadas com o meio ambiente e o desenvolvimento, para compreender seus papéis, suas responsabilidades e interrelações42 (ANDRÉ et al., 1999, p. 279).

Apesar das diferenças que possam ter surgido com relação ao processo de avaliação de impactos e à AIA propriamente dita (compreendendo a elaboração do EIA/RIMA), mercê de 30 anos de evolução, em mais de 100 países, ANDRÉ el al. (1999) opinam que tais objetivos ainda prevalecem. PETTS (1999) vai além e, considerando a experiência de diversos países (na Europa, Ásia, África e Américas), afirma que:

Há claras evidências de que a AIA tem assegurado que o meio ambiente integre as decisões visando ao desenvolvimento e que a mitigação de impactos seja levada em conta. Algumas das mais consistentes avaliações de impactos ambientais de que se tem notícia, citadas nesta obra, oferecem exemplos de processos com ganhos em termos de abertura, abrangência, transparência e relevância das decisões que levam em conta o meio ambiente43 (PETTS, 1999, p. 8).

41 BISWAS, A. K. et QU GEPING. Environmental Impact Assessment for Developing Countries. London: United Nations University, Ticooly International, 1987.

42 Tradução do autor. 43 Tradução do autor.

Por outro lado, a autora reconhece também, a partir de sua análise da experiência internacional, que oportunidades fundamentais de se assegurar abordagens necessariamente mais integradas estariam sendo desperdiçadas. Essas oportunidades, em sua visão, dizem respeito: ao reconhecimento do complexo relacionamento físico e emocional entre os seres humanos e o meio ambiente; à tomada de decisões referentes aos grandes empreendimentos de modo integrado com políticas e estratégias determinantes para sua implementação; à possibilidade de ampliar, com base na AIA, o leque de ferramentas de auxílio ao processo decisório; e à integração das análises da fase de planejamento e projeto com a operação e manutenção dos empreendimentos.

No texto introdutório de sua obra, tratando da qualidade e efetividade da AIA, PETTS (1999) conclui que é preciso examinar e avaliar em maior profundidade o estado da arte dos sistemas de avaliação de impactos ambientais implementados nos mais diversos países, nas três últimas décadas do século passado, a partir da promulgação do NEPA. Só assim será possível identificarmos, realisticamente, as barreiras políticas, sociais, econômicas e técnicas que de fato existem para o aperfeiçoamento dessa poderosa ferramenta para o Desenvolvimento Sustentável em todo o mundo.

ANDRÉ et al. (1999) opinam que o grande potencial da AIA, como instrumento de gestão ambiental, reside nos princípios que devem nortear todo e qualquer processo de avaliação de impactos bem conduzido, qualquer que seja o contexto em que esse instrumento é aplicado. Princípios que são assim formulados por esses autores:

1. a elaboração do EIA/RIMA requer uma abordagem interdisciplinar; 2. o EIA/RIMA se insere em um processo de planejamento e deve contribuir

para a tomada de decisão;

3. o EIA/RIMA apresenta uma abordagem flexível, pela resolução do problema;

4. o processo de EIA/RIMA é aberto, transparente e bem enquadrado; 5. o EIA/RIMA apresenta uma abordagem científica;

6. o EIA/RIMA leva em conta o contexto do desenvolvimento;

7. o EIA/RIMA favorece a contribuição das comunidades afetadas em todas as fases do processo, desde a avaliação prévia até o monitoramento pós- implantação44 (ANDRÉ et al., 1999, p. 279).

Pode-se afirmar que existe hoje, apesar das diferenças entre os países, bastante consenso em relação a esses princípios e à importância da AIA. KENNEDY (1999) descreveu a experiência de cinco grandes organismos financiadores internacionais com relação à AIA, presentes num grande número de países em todo o mundo: Banco Mundial, Banco Africano

de Desenvolvimento, Banco Asiático de Desenvolvimento, Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento e Banco Interamericano de Desenvolvimento. Em suas conclusões, ele afirma que, assim como cada uma dessas instituições possui uma esfera de operações e área geográfica de atuação próprias, cada qual possui também, com relação à AIA, uma abordagem que lhe é própria.

Não obstante, pode-se afirmar que, desde algumas décadas, a necessidade da AIA é reconhecida pela comunidade dos organismos multilaterais de financiamento, inclusive em termos formais. Ademais, embora os procedimentos para sua implementação variem de um organismo para outro, é mais importante notar que tanto as equipes técnicas dos bancos como os países tomadores de empréstimos aceitam a necessidade e reconhecem a utilidade da AIA no desenvolvimento, implantação e operação de projetos de desenvolvimento.

Por fim, é interessante notar algumas tendências com relação à AIA, apontadas por ANDRÉ et al. (1999), com base na experiência dos países francofônicos. São estas:

1. transferência do EIA de projetos para programas; 2. participação do público mais adaptada ao contexto; 3. melhoria da eficácia do processo;

4. concordância entre os indivíduos e as equipes técnicas; 5. maior desregulamentação e afastamento do Estado;

6. integração do EIA como ferramenta de implementação do desenvolvimento sustentável45 (ANDRÉ et al., 1999, p. 290).

Essas tendências são claramente identificáveis, em maior ou menor grau, também no Brasil — cuja prática, na opinião de AB’SABER (1998), seria representativa dos procedimentos para avaliação de impactos em países em desenvolvimento.

* * *

Tratamos, neste capítulo, dos aspectos teóricos, objetivos, limitações e tendências da AIA. No capítulo seguinte, abordaremos, detalhadamente, o estado da arte em AIA relativa aos grandes empreendimentos de infra-estrutura no Brasil, examinando o modo como esse instrumento se soma ou se contrapõe ao planejamento e projeto para a implantação de grandes obras.

4 O ESTADO DA ARTE EM AVALIAÇÃO DE IMPACTOS