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3 REFERÊNCIAS CONCEITUAIS

4 O ESTADO DA ARTE EM AVALIAÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS DOS GRANDES EMPREENDIMENTOS DE INFRA-

4.2 GRANDES EMPREENDIMENTOS: PLANEJAMENTO X AIA?

Os grandes empreendimentos de infra-estrutura no Brasil são caracterizados por longos períodos de planejamento, algumas vezes com solução de continuidade. Para entender o modo como a AIA se insere nesse processo, somando-se ou contrapondo-se, há que ter em vista o ciclo dos projetos (apresentado, em linhas gerais, no capítulo anterior, seção 3.1), e as mudanças nele introduzidas com a PNMA, a partir da década de 1980.

O Ciclo dos Projetos e o advento da PNMA

A vontade política resgata e dá forma a propostas que, via de regra, estão previamente colocadas há muitos anos ou décadas. Para citar apenas alguns exemplos, assim se fez, no Brasil, a construção de Brasília na década de 50. Assim estão saindo do papel hoje, com todas as implicações e condicionantes impostos pela crescente preocupação com as questões ambientais, antigos projetos de hidrovias (Paraguai — Paraná, Tocantins — Araguaia, Madeira — Amazonas). Assim se busca, atualmente, viabilizar política e ambientalmente projeto para captar e aduzir água do rio São Francisco para a porção setentrional do Semi- Árido brasileiro — cenário de obras e intervenções marcadas pelo clientelismo político.

A partir daí, entra em cena a Engenharia Consultiva e de Projetos, formulando propostas de estudos e projetos, resgatando e desenvolvendo estudos preliminares; enfim, dando forma à vontade política. Começam então a surgir as grandes alternativas de projeto, em termos de localização, arranjo, porte, faseamento, etc. O interesse público que esses projetos despertam ajuda a alavancar os recursos inicialmente necessários para essas etapas iniciais do ciclo do projeto.

Partindo dos estudos preliminares e da formulação de alternativas que caracterizam estudos de pré-viabilidade, com base em anteprojetos, reúnem-se as condições necessárias para a contratação dos estudos de viabilidade propriamente ditos. Trata-se da etapa em que são procedidas às análises econômicas, comparando-se alternativas pré-selecionadas. Foi dito, em 3.1 (p.70), que a dimensão socioambiental é atualmente considerada nos estudos e

projetos de Engenharia, desde a etapa de pré-viabilidade. Com efeito, em muitos casos, os tradicionalmente chamados Estudos de Viabilidade Técnico-Econômica passaram a ser referidos como Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental, embora essa não seja uma regra geral. Desde o início dos anos 80 (época em que foi promulgada a Lei n.º 6.931/81, instituindo a PNMA) os estudos de viabilidade passaram a conferir alguma importância aos aspectos ambientais.

Entretanto, a mudança consistia, na verdade, em realizar as necessárias análises técnico- econômicas, acrescidas de outras considerações, quanto a vantagens e desvantagens das alternativas estudadas. Embora as mudanças introduzidas não caracterizassem, em absoluto, uma ruptura com práticas vigentes, cresciam em importância os aspectos sociais, presentes nas análises econômicas. Além disso, agregavam-se aos estudos considerações de natureza ambiental acerca das alternativas selecionadas. Em muitos casos, porém, essas considerações mostravam-se superficiais e apenas qualitativas.

Em questão de alguns anos, estabeleceu-se e consolidou-se a cultura da AIA, com a exigência de elaboração de Estudo de Impactos Ambientais, acompanhado do Relatório de Impactos sobre o Meio Ambiente, EIA/RIMA. A elaboração e apresentação desses estudos, como parte do processo de planejamento e projeto dos grandes empreendimentos, passou a ser vista como um passo seguinte aos estudos de viabilidade, suprindo adequadamente a crescente demanda da sociedade por projetos social e ambientalmente seguros (com maior profundidade do que antes e também com o estabelecimento de indicadores quantitativos). Impunha-se ao planejamento um novo paradigma, o da gestão ambiental, demandando um conjunto de medidas e procedimentos que, adequadamente aplicados, propiciassem a maximização dos benefícios e impactos socioambientais positivos, bem como a prevenção e minimização dos impactos negativos dos empreendimentos — antes tidos à conta de externalidades, com altos custos rateados pela coletividade.

Tornou-se assim necessário reformular e ampliar instrumentos, consolidados em um modelo antigo de planejamento, não integrados a essa nova realidade, a esse novo paradigma. Instrumentos de natureza jurídica, administrativa, gerencial e técnica, determinantes nos processos decisórios referentes aos grandes empreendimentos de infra-estrutura. A AIA, instrumento de PNMA, materializou-se em instrumentos que visam à comparação das vantagens e desvantagens dos projetos e suas intervenções, contemplando, além dos aspectos técnicos, econômicos e sociais, aqueles relacionados ao meio físico, biótico e cultural, inserindo assim as questões ambientais, lato sensu, nas estratégias de desenvolvimento.

As mudanças no planejamento estatal, em termos de políticas de desenvolvimento, são exigências de um discurso, do qual não se ousa discordar, pela inclusão, nas novas estratégias de crescimento econômico para o País, do valor de capital dos recursos naturais — programando-se o manejo dos estoques, controlando-se a qualidade e buscando-se políticas econômicas mais adequadas às exigências ambientais, via mecanismos de regulação, incentivos, estabelecimento de indicadores de situação e desempenho, mudanças institucionais, etc.

Traça-se, assim, um caminho para a sustentabilidade, via maximização de benefícios e prevenção, mitigação e/ou compensação dos prejuízos ambientais, possíveis a partir da geração de projetos em que os componentes socioambientais sejam tratados como essenciais à sustentabilidade. Todavia, o estado da arte com relação ao gerenciamento ambiental dos grandes empreendimentos de infra-estrutura leva à constatação de que, ainda hoje, o empreendedor — na maioria dos casos, o próprio Estado — tem dificuldade em planejar, implantar e operar os empreendimentos do modo mais eficiente, do ponto de vista ambiental.

Por outro lado, também as instituições governamentais de meio ambiente — o Estado licenciador — restringem-se à aplicação dos dispositivos econômicos e demais disposições legais com relação aos empreendimentos propostos, segundo categorias pré-estabelecidas. O processo de avaliação de impactos fica, assim, reduzido e restrito à AIA e ao processo de licenciamento ambiental — instrumentos nos quais não se esgota o processo, como parece ser o entendimento de muitos técnicos, gestores, procuradores, etc.

Também a participação popular, reconhecida como de fundamental importância, em função da constatação de que é a sociedade como um todo quem arca, direta e indiretamente, com os prejuízos e custos associados à degradação do meio ambiente, fica restrita às audiências públicas da fase de licenciamento. A essa altura, o caminho já percorrido em termos de estudos e projetos, por vezes bastante longo, propicia todo o tipo de jogos de interesses e manipulações (ver seção 4.3, a seguir).

Planejamento e AIA – O Setor de Irrigação

O setor de Irrigação, por sua importância no cenário do desenvolvimento regional e da integração nacional, movimentando complexas obras de infra-estrutura e demandando elevados investimentos públicos54, serve de exemplo para compreendermos como o processo

54 Empreendimentos planejados e implantados pelo poder público federal (por meio da CODEVASF e do DNOCS) ou dos estados, com o apoio financeiro do primeiro, sobretudo na região Nordeste, mas presentes em quase todo o território nacional, envolvendo obras de: barragens de acumulação, captação, bombeamento,

de Avaliação de Impactos Ambiental se insere no planejamento, estudos e projetos para a implantação de grandes empreendimentos.

Até o início da década de 1990, os projetos de governo voltados para o desenvolvimento da região Nordeste, onde se concentra a maior parte dos perímetros públicos de irrigação, visando ao crescimento econômico estratégico e à integração nacional, não contemplavam o componente ambiental. Excetuando-se os problemas relacionados a cheias ribeirinhas, navegabilidade dos grandes rios e outras questões específicas que surgissem. As áreas prioritárias para investimentos eram alvo de ações setoriais, geralmente determinadas de acordo com a perspectiva de apresentarem respostas positivas aos estímulos ofertados no mais curto prazo possível. Quanto à Irrigação, destaca-se que o modelo era invariavelmente o mesmo ao longo de quase toda a metade do século passado, com perímetros formados por lotes familiares, de subsistência, sem fins comerciais.

Distante do contexto do desenvolvimento almejado para o País e sem um efetivo controle das ações implementadas, esse modelo não possuía sustentabilidade econômica e, muito menos, ambiental. Com o advento do chamado Novo Modelo de Irrigação, a partir de meados dos anos 199055, o poder público federal passou a conferir maior importância à economicidade dos empreendimentos e à incorporação da variável ambiental nos processos decisórios, a partir da formulação de novas políticas setoriais. Como assinalado em NASCIMENTO Júnior (1999), muda radicalmente a orientação das ações de governo, com a busca de parcerias com estados e municípios para a implementação e apoio aos projetos, o incentivo ao associativismo e cooperativismo entre os irrigantes, a introdução de culturas de maior valor agregado nos perímetros, a capacitação e treinamento dos agricultores e outras ações que, em última instância, visavam à delegação da gestão dos perímetros para os usuários.

Cabe registrar, no entanto, que o chamado Novo Modelo de Irrigação não prevaleceu com a força que imaginaram seus idealizadores, no auge do período neoliberal. O choque entre um modelo que era praticamente a negação do modo que agir que até então prevalecia e

adução, reservação, pressurização e distribuição de água. Podem ser ainda necessárias infra-estrutura elétrica e viária. Os investimentos necessários, assim, podem variar de US$ 1,000 a US$ 10,000 por hectare irrigado. Existem atualmente, em fase de planejamento, implantação e recuperação, dezenas de perímetros irrigados cujos orçamentos das obras de infra-estrutura superam R$ 100,0 milhões.

55 Conforme documento, não publicado, apesar da ampla divulgação do Novo Modelo, e de ter servido como balizamento para implementação das ações do poder público federal no setor de Irrigação, a partir do primeiro período de governo de Fernando Henrique Cardoso (1995/1998): Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, “Marco Referencial para o Desenvolvimento do Novo Modelo de Irrigação”, Brasília, 1996.

históricas resistências a mudanças de paradigmas em termos de políticas públicas na região tiveram, talvez, como efeito dos mais notáveis, o emperramento do modelo.

O Novo Modelo, uma iniciativa do governo federal, a partir de encontros e discussões com a participação de técnicos do Ministério do Planejamento e da área de irrigação, tanto da administração direta, com a Secretaria de Irrigação (à época afeta ao Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal), como da indireta, com a CODEVASF e o DNOCS, braços executivos do poder público nesse setor, além do Banco do Nordeste, com suas linhas de crédito para o desenvolvimento de projetos hidroagrícolas, surgiu no rastro da Resenha Setorial de Irrigação. Elaborada a partir de um trabalho de cooperação técnica internacional na área de Irrigação, entre o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD e a Secretaria Nacional de Irrigação, trata-se de um documento publicado em 1988, que reviu e detalhou aspectos importantes da Política Nacional de Irrigação (PNI)56, que não estava cobertos em lei.

Assim, como assinalado em NASCIMENTO Júnior (1999), observando o disposto na PNI, a CODEVASF passa a possibilitar que seus projetos sejam mais bem planejados e mais efetivos no alcance de seus objetivos e metas em termos de irrigação. Bem como em termos ambientais, conforme disposto nas Diretrizes Ambientais para o Setor de Irrigação (IBAMA/SENIR/PNUD/OMM, 1992) abrangendo todas as etapas do planejamento/elaboração, implantação/execução, operação e manutenção de projetos de irrigação. De acordo com a nova metodologia operacional, aquela Companhia passa a estabelecer áreas prioritárias com características bem diferentes das daquelas identificadas em um passado recente, marcado pelo clientelismo político e práticas paternalistas.

Detalhando essa metodologia, o referido autor destaca o fato de se conferir, a partir de então, maior importância ao planejamento regional, com a análise do potencial para o desenvolvimento econômico e social da região a ser atendida. Nessa linha de ação da CODEVASF, a fase de planejamento, estudos e projetos passou a contemplar diversas etapas, processos e atividades, ao tempo em que se buscava maior integração com outros órgãos governamentais e uma efetiva participação destes no apoio à implantação das demais infra- estruturas de desenvolvimento regional, essenciais ao desenvolvimento dos empreendimentos hidroagrícolas. Baseado em um trabalho de OLSON57, NASCIMENTO Júnior (1999)

56 Instituída com a Lei n.º 6.662, de 25 de junho de 1979.

57 OLSON, Douglas C. Planejamento geral de projetos de irrigação. Brasília: Secretaria de Irrigação, 1993. In NASCIMENTO Júnior (1999).

apresenta um fluxograma com a seqüência geral de planejamento, projeto e implantação de perímetros irrigados pela CODEVASF (figura 3).

O fluxograma indica as etapas da fase de planejamento e projeto: pré-estudo, estudos de reconhecimento, seleção de planos, priorização de áreas, seleção final de áreas e formulação de plano de ação; antecedendo à elaboração dos estudos de pré-viabilidade e viabilidade, projetos básicos e executivos (únicas etapas claramente definidas no “modelo” anterior). Além disso, reflete a importância dada à integração com outros órgãos, ao indicar, como referência inicial, além da PNI, outras políticas setoriais; e ao atrelar as etapas preliminares de planejamento e projeto aos condicionantes do planejamento regional. Incorporam-se ainda as referidas Diretrizes Ambientais para o Setor de Irrigação e, por conseguinte, privilegia-se a participação social, ao prever atividades de envolvimento, nos diversos níveis, antes de se dar início aos estudos e projetos de Engenharia propriamente ditos.

Figura 3 – Seqüência geral de planejamento, projeto e implantação de projetos de irrigação pela CODEVASF Fonte: NASCIMENTO Júnior (1999, p. 102)

Assinale-se ainda a importância de os estudos incorporarem, além dos fatores técnicos e econômicos, os sociais, os ambientais e os políticos. Apesar de todo o esforço que caracteriza

Diretrizes Ambientais para o Setor de Irrigação Planejamento Regional

Priorização de Áreas

Seleção final de Áreas

Formulação de Plano de Ação

Atividades de envolvimento local, regional e nacional

Estudos (Pré-Viabilidade e Viabilidade), Projetos (Básico e Executivo), Construção, Implantação, Operação, Manutenção

Fatores políticos Fatores ambientais Fatores socioeconômicos Pré-estudo Estudos de Reconhecimento Seleção de Planos Política Nacional de Irrigação Outras Políticas Nacionais

essa mudança de paradigma no planejamento da Irrigação na área pública federal, o mesmo autor reconhece, em um capítulo seguinte, que:

É na fase de projetos (em específico a do projeto básico) que observamos as primeiras ações que, por lei, são definidas como AIA, mais especificamente com o desenvolvimento do EIA/RIMA, adotando-se as primeiras providências para licenciamento ambiental. (NASCIMENTO Júnior, 1999, p. 126).

Mais ainda, assinala-se que essa nova abordagem dos projetos, traduzida em ações e programas ambientais para a mitigação de impactos negativos e potencialização de impactos positivos gerados pelo empreendimento, só se concretiza a partir do licenciamento, após a aprovação, pelo órgão ambiental, dos EIA/RIMA — posto de modo tardio, em relação a outros setores, decorridos quase 10 anos da regulamentação da AIA pelo CONAMA, em 1986.

Diante desse quadro, que, em nossa opinião, reflete muito do estado da arte com relação à AIA e ao desenvolvimento dos grandes empreendimentos de infra-estrutura no Brasil hoje, NASCIMENTO Júnior (1999) ressalta que a CODEVASF não tem se restringido a seguir o disposto no processo de licenciamento. Aquela Companhia, órgão executor do poder público federal na área de Irrigação, vem estabelecendo, gradativamente, instrumentos de atuação ambiental complementares aos propostos no EIA/RIMA58, que podem ser caracterizados

como compromissos ambientais junto às comunidades, órgãos ambientais e outros, promovendo uma maior mobilização e sensibilização de todos para as questões ambientais. Se essa é uma contribuição concreta do Estado empreendedor no setor de Irrigação para o aprimoramento de uma nova visão dos sistemas de licenciamento ambiental, o tempo dirá.

Planejamento e AIA – O Setor Elétrico

Em termos de infra-estrutura, o Setor Elétrico é, tradicionalmente o que possui uma das mais completas regulamentações infralegal. Isso de deve, em grande parte, à necessidade de longos períodos de estudos e projetos para fazer face às necessidades de aumento da oferta de energia demandada pelo crescimento econômico do País. Como nossa matriz energética é predominantemente composta pela geração hidrelétrica, a construção de novas usinas, de médio e grande porte, para interligação ao Sistema Elétrico Nacional depende do prévio conhecimento do potencial de geração de energia remanescente por região, bacia hidrográfica

58 Instrumentos que incluem a promoção dos Planos de Inserção Regional dos projetos, contendo um conjunto de programas e subprogramas de apoio, elaborados a partir do diagnóstico, do zoneamento territorial e do prognóstico ambiental das áreas de influência; além de ações na área de educação ambiental, essenciais para o processo de mudanças que se quer implantar.

e curso d’água, consubstanciado em estudos de inventário. Estes, por sua vez, são realizados tomando por base planos de expansão de longo prazo para o setor.

Não obstante, como os demais setores de infra-estrutura, enfrenta dificuldades por conta do modo como o processo de avaliação de impactos e a AIA propriamente dita se incorporaram ao ciclo de projetos das barragens, usinas hidrelétricas (UHE) e linhas de transmissão. A elaboração dos estudos necessários ao licenciamento depende de indicações oriundas dos Estudos de Viabilidade, apenas disponíveis quando esses já se encontram em fase final de elaboração. Em decorrência disso, a obtenção das LP, mesmo nos casos em que há uma adequada identificação e tratamento das questões socioambientais mais relevantes, coincide com a etapa de elaboração do projeto básico. Resta, assim, um prazo muito exíguo para a adoção das medidas recomendadas com relação ao planejamento e projeto, com vistas à obtenção das LI, sem que haja solução de continuidade na contratação do detalhamento dos projetos e execução das obras.

Cabe lembrar que todo o trabalho de planejamento para a expansão da oferta de energia no País foi objeto de questionamentos, em função do racionamento de energia a que a sociedade se viu obrigada em um passado recente (2001/2002). Embora pareça óbvio que o comprometimento das metas de expansão seja, em muito maior escala, um produto da falta de recursos para investimentos em níveis compatíveis com as nossas necessidades, neste limiar do século XXI, do que fruto de deficiências do planejamento setorial, todas as atenções voltaram-se, e ainda estão voltadas, para este último. Destaca-se, então, a questão dos possíveis entraves ambientais para a viabilização das obras necessárias em termos de novas usinas e linhas de transmissão.

Resultou daí a preocupação manifesta pelo Conselho Nacional de Política Energética – CNPE, que, em novembro de 2002, criou um grupo de trabalho para tratar, especificamente, das medidas necessárias para assegurar que todos os empreendimentos de infra-estrutura destinados à expansão da oferta de energia elétrica possam dispor, em prazos compatíveis com os cronogramas de estudos, projetos e licitações, de licença ambiental prévia59. O trabalho desenvolvido por esse grupo colocou em evidência o descompasso entre planejamento e AIA, ressaltando a necessidade de se obter as LP antes do início do desenvolvimento dos projetos básicos, assegurando assim condições mais favoráveis para o atendimento às exigências da AIA e a obtenção das LI em tempo hábil para evitar solução de

continuidade na transição da fase de planejamento, estudos e projetos, para a fase de implantação (de elaboração do projeto executivo e início das obras)60.

Assegurar as condições para tanto é, em última instância, garantir o cumprimento da Resolução CONAMA n.º 237/97 ao estipular que o licenciamento ambiental prévio deve ser concedido na fase preliminar do planejamento do empreendimento, aprovando sua localização e concepção e estabelecendo condicionantes específicos para as próximas fases. No entanto, o projeto básico de uma UHE, no caso do setor Elétrico, é precedido, pela ordem, dos estudos de viabilidade, do inventário do potencial hidrelétrico e dos planos decenais de expansão. Desse modo, se a AIA, em termos práticos, só se inicia com as ações que visam à obtenção da LP, resta em aberto a questão sobre como agregar, ou melhor, sobre como tem sido agregado o componente ambiental ao planejamento para a construção de uma UHE, desde as fases iniciais do processo.

Com efeito, se não há, antes da exigência dos estudos ambientais para o licenciamento, nenhum mecanismo formal que propicie a participação do público e/ou o envolvimento dos órgãos ambientais (do Estado licenciador), isso não significa que a preocupação com o meio ambiente tenha estado ausente do planejamento para o setor, mormente após o advento e consolidação da PNMA. Essa preocupação, no entanto, fica única e exclusivamente a critério e dependente da iniciativa do empreendedor — que, no caso das grandes obras e infra- estrutura para o setor e nas fases iniciais do processo de planejamento, é o próprio Estado.

Como forma de institucionalização da AIA de modo mais precoce do que ocorre atualmente, existe no meio técnico uma discussão sobre como associar uma Agenda Ambiental e procedimentos de Avaliação Ambiental Estratégica às fases de elaboração dos