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No que diz respeito às formas de intervenção na proposta didática das atividades escolhidas pelas docentes, vemos que P3 sinaliza para o trato do gênero história em quadrinho e entrevista. Em relação ao primeiro gênero, a docente afirma que faria modificações no sentido de pedir que os alunos passassem a produzir outro texto escrito; para o segundo gênero (a entrevista), a sua intervenção se daria sob dois focos: o primeiro diz respeito a atividades de apropriação do sistema de escrita alfabético, no sentido de explorar as rimas, as aliterações e produção de novas rimas, a partir dos poemas, textos que servem como base para a atividade de entrevista (Ver atividade na Categoria 10). O segundo foco se estabelece a partir dos poemas, sendo esses o foco da intervenção na atividade, a exploração de conteúdos da matemática, tais como o uso de gráficos para ilustrar a ocorrência de alunos que tenham irmão menor.

Vemos que o olhar de P3 traz para a proposta dimensões não pretendidas na superfície da atividade. A realidade de sua sala de aula, cujos alunos se encontram em fase de consolidação da escrita, bem como as possibilidades de uso das informações contidas no texto para o trato de outra área do saber, desenham focos de investimento e intervenções que se desviam do investimento com a oralidade e aproximam-se de dimensões que parecem ser de maior domínio em sua prática.

P4 também seleciona o gênero textual entrevista e elege como alteração didática uma nova produção com o mesmo gênero. Entretanto, a atividade não seria a oral, como sugere a proposta inicial, mas passaria a ser produzida na modalidade escrita.

Eu poderia colocar o seguinte, já que a gente ta trabalhando a entrevista, uma entrevista coletiva né, que todos iriam fazer a pergunta, eu poderia trabalhar também a questão do gênero entrevista também da forma escrita, né. Agora você vai entrevistar né, você vai criar perguntas é é vai formular as perguntas que vocês fizeram, vocês fizeram como? Falando, agora vocês vão formular perguntas escrevendo. Vai escolher ou você não têm irmão menor, ai vocês vão entrevistar uma pessoa que tem irmão menor, ou um vizinho ou um colega. Vocês vão fazer essas mesmas perguntas e vão entrevistar ele.

Entendeu? Eu acrescentaria isso, que ai já trabalharia a questão do texto escrito. Eu faria isso (P4).

Percebemos que P5 caminha também na mesma direção do caminhar de P4. Vejamos, a seguir, como isso acontece:

[...] como já tem dois (refere-se a dois textos que servem de apóia a discussão) eu ampliaria para o seguinte, em cima disso a gente tem a fazer um texto escrito coletivo a sua visão do que é ser irmão menor e irmão maior, ou ser filho único que é interessante também não só ele porque aqui parece a entrevista. Aqui eu acho que melhor que a entrevista esse aqui, então eu acho melhor do que a entrevista seria na hora ler os dois textos ver as opiniões; e ai como é o texto irmão menor, mais velho, filho único. Então faria um texto coletivo, neste daqui (P5).

Vemos que a intervenção de P4 e P5 dá-se na dimensão da modalidade escrita do texto, tendo em vista que não há sugestões de mudanças que alterem de forma profunda a proposta didática do livro.

Como vimos ao longo das nossas análises, promover a escrita é a tônica nas sugestões de ampliação das atividades orais. A atividade oral parece ser sempre o primeiro passo de uma proposta que resultará como culminância em uma produção escrita. Esse cenário nos remete ao que Marcuschi acenava em 2005, em seu artigo - Oralidade e ensino de língua: uma questão pouco “falada”:

A fala é uma atividade muito mais central do que a escrita no dia-a-dia da maioria das pessoas. Contudo, as instituições escolares lhe dão atenção quase inversa à sua centralidade na relação com a escrita. Crucial nesse caso é que não se trata de uma contradição, mas de uma postura. Seríamos demasiadamente ingênuos se atribuíssemos essa atitude ao argumento de que a fala é tão praticada no dia-a-dia a ponto de já ser bem dominada e não precisar ser transformada em objeto de estudo em sala de aula. O fato é que hoje se torna cada vez mais aceita a ideia de que a preocupação com a oralidade deve ser também partilhada pelos responsáveis pelo ensino de língua. Mas nem tudo é como parece que deveria ser. (MARCUSCHI, 2005, p. 21, grifo do autor).

O que o autor afirma pode ser remetido à postura de nossos sujeitos, na medida em que eles sinalizam para a aceitação de atividades que se voltem para a oralidade em sala de aula, embora deem mais importância à escrita. Os encaminhamentos que as docentes vislumbram para ampliar uma proposta oral são voltados exclusivamente para esta modalidade da língua. Seríamos ingênuos se não compreendêssemos que essa

postura é fruto de uma tradição escolar, bem como das reais demandas dos sujeitos em sua prática pedagógica.

As realidades das demandas dos sujeitos são vistas em todos os pontos analisados em nossa investigação, assim vimos P3, quase sempre sinalizando como demanda a necessidade de consolidar o SEA com os seus alunos; P4, embora reconheça a necessidade de desenvolver a oralidade, traz a escrita como proposta para reforçar o ensino dos gêneros textuais; P5, por sua vez, recorre às atividades de escrita na maior parte das alterações didáticas por ela proposta. O que esse cenário indicia? Ele nos dá pistas de que, além das demandas vivenciadas pelas professoras em sala de aula, todas parecem ter maior segurança no desenvolvimento de atividades escritas, visto que a oralidade ainda é um eixo que busca se afirmar em suas práticas.

Na ordem da investigação dos saberes, observamos que todos os sujeitos mobilizaram saberes de ordem “cognitiva” na escolha e na intervenção das propostas por eles escolhidas (GUIMARÃES, 2004, p. 134). Em Guimarães, podemos compreender que um dos tripés dos saberes cognitivos está relacionado à ação do docente em função da “construção de conhecimentos sistematizados socialmente”. Essa compreensão aporta a análise das três docentes em foco, cujos dizeres evidenciam ações de ampliação da proposta do livro didático, estruturados nos eixos de análise linguística e na área de conhecimento matemático (proposta interdisciplinar) (P3), bem como para a produção de texto - (P3, P4, P5).

Nesse movimento também enxergamos, nas ações de intervenção docente, a fabricação de táticas. A transformação feita pelos sujeitos a partir das proposições ofertadas pelos livros didáticos é legitimada em função de suas demandas, o que lhes move a fabricarem/transformarem a partir do que lhes é apresentado como modelo oficialmente planejado (CHEVELLARD, 1998; FERREIRA, 2005).

Guimarães (2004), em suas investigações, afirma que no cotidiano as escolhas não são determinadas por uma lógica determinista, mas por diferentes fatores. Assim, é o campo da ação que irá mover o sujeito a mobilizar saberes, selecionar, modificar, arrumar, controlar e agir. Nesse contexto, vimos as professoras agindo em sua margem de manobra, operando a partir de uma variável explícita em seus discursos - a demanda dos seus alunos.

(IN) CONCLUSÕES

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