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Das respostas relativas às impressões dos sujeitos sobre as atividades por eles selecionadas, P3 afirma que as três atividades escolhidas são acessíveis aos seus alunos, por isso aplicaria com o seu grupo-sala; enquanto P4 indica que a atividade com o gênero textual carta é muito complexa, por esse motivo não a aplicaria com seus alunos; e P5 afirma que a proposta com o gênero textual fábula é desmotivadora, entretanto aplicaria com os seus alunos.

Queremos problematizar nessa análise as falas de P4 e P5 em relação às propostas por elas selecionadas.

Observemos em P4 que a complexidade do gênero carta, em sua versão formal, é apontada como fator que impede a docente de, “possivelmente”, desenvolver a proposta com seus alunos. Essa fala também é presenciada na categoria “7 – A compreensão docente sobre a relação fala-escrita” -, em que a mesma professora sinaliza ter maior interesse em tratar o gênero com os alunos sob uma perspectiva de carta informal, visto que a versão mais formal não seria acessível a eles.

A ausência de promoção de oportunidades de reflexão sobre o uso da língua oral, assim como o da escrita, em seu registro mais formal, pode representar a falta de clareza da docente sobre o objetivo da proposta. É válido registrar que P5 parece não ver a aproximação entre a proposta de utilização da carta e do gênero textual tirinha, analisada por ela na Categoria V, em que o personagem agradece ao amigo usando o superlativo “obrigadão”. O grau de intimidade presente na relação entre os amigos representados no HQ (menino Maluquinho) é o mesmo dos interlocutores da carta (Carta a Ângela). O diferencial entre as propostas é que o foco da atividade com a carta é a aproximação de um texto escrito formal com um outro informal, pondo em relevo a aproximação dessa informalidade escrita com a informalidade no uso da fala, o que culmina na exploração das relações entre fala e escrita.

A negação do trabalho com a proposta de escrita da carta em sua versão formal, sob a alegação de que o tipo de linguagem não é familiar ao aluno, pode indicar, dentre outras perspectivas, a não observância do professor para o próprio ensino da oralidade, se considerarmos que:

Ensinar língua oral deve significar para a escola possibilitar acesso a usos da linguagem mais formalizados e convencionais, que exijam controle mais consciente e voluntário da enunciação, tendo em vista a importância que o domínio da palavra pública tem no exercício da cidadania. Ensinar língua oral não significa trabalhar a capacidade de falar em geral. Significa desenvolver o domínio dos gêneros que apóiam a aprendizagem escolar de Língua Portuguesa e de outras áreas e, também, os gêneros da vida pública no sentido mais amplo do termo. (PCN, 1998, p. 67).

Vemos também, na fala de P5, que embora a docente alegue que o trabalho com a fábula é desmotivador para os seus alunos, os quais já têm muita familiaridade com esse gênero textual, não há hesitação em declarar que levaria a proposta para a sala de aula. A nosso ver, os saberes da prática fazem com que a professora tome uma posição aparentemente antagônica. Por um lado, ela nega a relevância e, por outro lado, ela assume que é importante na medida em que seleciona a atividade e a toma como proposta possível de ser aplicada com o grupo-sala.

Parece-nos que em um primeiro momento P5 se coloca no lugar dos alunos, reconhecendo suas demandas e potencialidades; em outro momento, se centra na importância de não privá-los de um gênero textual, cuja importância é vista por ela à medida que o considera essencial para discutir a dimensão moral na vida dos sujeitos, como vimos na “Categoria 8 - A Compreensão Docente sobre a Oralização do Texto Escrito”.

OBJETIVOS

No que diz respeito aos objetivos das docentes para a possível aplicação das atividades selecionadas com os seus alunos, P3 afirma que, ao selecionar a entrevista e a HQ (Carol), seu objetivo seria desenvolver a oralidade e o questionamento. Vemos que a professora faz a separação entre o eixo de ensino, a oralidade, e uma habilidade, que seria o questionamento. Se considerarmos que uma das habilidades necessárias para ser competente oralmente é a capacidade de questionar, de argumentar, etc., o que justificaria a separação de ambas? Será que P3 atribui a capacidade de questionar

apenas à escrita? Não teria ela a compreensão de que tal habilidade pode ser desenvolvida na oralidade?

Ao selecionar o gênero textual tira, P3 afirma que seu objetivo seria tratar da adequação do registro. Ela reafirma a sua análise da proposta, ao focar-se no conteúdo tratado de forma explicita pela atividade: a dimensão do registro.

Em P4, vemos que todas as atividades selecionadas são indicadas com objetivo de desenvolver a oralidade. Notamos que a docente assume uma postura que parece guiada pelo desdobramento das atividades por ela analisadas nas categorias anteriores. É importante lembrar que P4 não assume, no momento em que analisa a atividade com o gênero textual fábula, o fato de que a proposta não visa a desenvolver a oralidade e sim a leitura em voz alta (ver categoria 7). Entretanto, no momento da investigação desta categoria, percebemos que a docente atribui à atividade objetivos voltados para o oral.

Dentre as possíveis possibilidades de compreensão dessa proposta, podemos inferir que P4 toma a fábula no conjunto das demais propostas, sem fazer distinção. Outro ponto de inferência também pode ser a possível compreensão por parte da professora de que a fábula é um gênero oral. Assim, o foco estaria no gênero e não na proposta. Entretanto, temos que considerar que a questão por nós levantada diz respeito ao objetivo que a docente teria ao desenvolver as atividades selecionadas. Sob esse prisma, P4 concebe a oralização como atividade oral, perspectiva esta conceitualmente equivocada (MARCUSCHI, 2001a).

Em P5, não há menção ao termo oralidade para nenhuma das atividades por ela selecionadas, diferente de como ocorreu no momento em que a docente analisava de forma pontual atividade por atividade. A sua análise remete a objetivos tais como “ensinar as várias formas de falar”, para a atividade com o gênero HQ (Carol); “abordar a questão das gírias”, para a atividade do HQ (Menino Maluquinho); “considerar o outro na hora da escrita”, para o gênero carta; “comparar textos”, para o gênero entrevista e “aprender a se comunicar” para o gênero fábula.

Dentre os objetivos pretendidos por P5 para a aplicação das atividades, gostaríamos de destacar aquele atribuído ao gênero entrevista: “comparar textos e aprender a se comunicar”. Se levarmos em consideração os vários objetivos da atividade, que aborda o processo de construção e execução do gênero entrevista, vemos que para P5 a comparação entre textos é o único objetivo da proposta e a única competência ou capacidade visada é a de se comunicar, como se outros gêneros também não promovessem essa capacidade. O direcionamento do objetivo da atividade,

conforme indica P5, não oportuniza um olhar mais específico sobre o gênero, mas garante apenas o cumprimento de uma das etapas da proposta: leitura e confronto entre o conteúdo textual.

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