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Desde as mais remotas épocas que a localização de pessoas, bens e equipamentos no território não se opera ocasionalmente, mas sempre atendendo a diversos factores, dos quais Felisberto Reigado (2000), salienta: maximização dos lucros dos produtores, ou das utilidades dos consumidores, a optimização da utilização dos recursos naturais e humanos, estratégias militares ou prazeres individuais.

O ordenamento do território surgiu como resultado das necessidades das populações e dos territórios, assumindo-se como o resultado da actuação de vários factores externos. Ele consiste portanto, numa “forma voluntária de valorizar um espaço, tendo em consideração as relações internas e externas que ele mantém”, constituindo uma resposta específica “a motivações diversas”(Baud, Bourgeat e Bras, 1999).

2.4.1 Ordenamento do território e urbanismo

Cronologicamente, o urbanismo, enquanto instrumento de intervenção na cidade, surge primeiro que o ordenamento do território, fruto da necessidade de actuar nos solos urbanos. As autoridades públicas apenas resolviam problemas identificados e sectoriais, dentro das áreas urbanas e dos núcleos habitacionais, em questões essencialmente relacionadas com estética e salubridade. Fora dessas áreas existia um respeito mútuo na relação do Homem com o ambiente, pela consciência de que a sobrevivência da espécie humana dependia do contacto com o meio natural, o que levava o Homem a preservar o território.

Esta ligação deixou, contudo, de existir quando a sociedade passou de uma economia de base agrária para uma economia de base industrial (Frade 1999). Iniciou-se uma nova dinâmica económica e de transformação do uso do território, que originou desequilíbrios regionais, não só em termos económicos mas também, ao nível de oportunidades para a população. Surgiu a necessidade de planear áreas territoriais mais vastas, considerando interesses mais abrangentes do que aqueles que o urbanismo visava. Nesta perspectiva, o ordenamento do território passou a integrar “múltiplos sectores e políticas, que coordena na sua vertente de espacialidade, atingindo uma autonomia conceptual e funcional de base urbanística de onde surgiu (...)” (Frade 1999).

2.4.2 Solução dos problemas territoriais

Para além disto, a política de ordenamento do território surgiu ainda com vista à “(...) realização espacial da política económica e para a busca de uma alteração ao panorama do desequilíbrio regional.” (Frade 1999).

Também corrobora tal afirmação Oliveira (2002) quando afirma que “o ordenamento do território teve a sua origem na planificação económica tendente à correcção dos referidos desequilíbrios.” Ambas as autoras consideram que as movimentações da economia e suas evoluções em conjunto com a crescente urbanização do espaço foram o mote da definição do ordenamento do território. Com base nestes problemas o ordenamento do território foi ganhando densificação, fruto não só do desenvolvimento das sociedades mas também, das necessidades por este importadas.

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2.4.3 O Ordenamento do território nos modelos europeus

Na Europa, o ordenamento do território evoluiu de modos diferentes, em termos cronológicos e espaciais nos diversos países.A expressão do ordenamento do território surge nos anos 20, no Reino Unido e na Alemanha, derivando da “necessidade de limitar o desenvolvimento das cidades dentro do seu âmbito territorial (“hinterland”)” (Oliveira 2002).

Como supra-referido, foi utilizado pela primeira vez como expressão jurídico-administrativa, em França, em 1950, por Claudius Petit, na época, Ministro Francês da Reconstrução e do Urbanismo.

Neste país, o ordenamento do território surge inicialmente como resposta à necessidade de reorganização das cidades destruídas pela guerra, e mais tarde como forma de resolver os problemas gerados pela existência de disparidades regionais, em termos económicos e sociais. Claudius Petit (referido por Oliveira, 2002), definiu-o como sendo a “(...) procura, no quadro geográfico de França, de uma melhor repartição dos homens em função dos recursos naturais e das actividades económicas”. Pretendia valorizar-se o território e alcançar desenvolvimento, sempre numa perspectiva económica.

A política de ordenamento do território conseguiu, no entanto, desenvolver-se tornando-se o seu conceito muito mais vasto e dinâmico: inicialmente incluía apenas aspectos geográficos, económicos e físicos, passando posteriormente a integrar também o ambiente, e a qualidade de vida.

Outros países, tais como Espanha e Itália, incorporaram no seu sistema de planeamento o modelo francês de ordenamento do território. No caso de Espanha, Luciano Parejo Alfonso (referido por Frade, 1999), “confirma que a experiência espanhola esteve sempre ligada ao modelo francês, ou seja, a uma concepção tecnocrática do ordenamento do território como planificação regional que traduz espacialmente tanto a política económica, como a base da política de urbanismo, que pressupõem um sistema político administrativo centralizado.” As primeiras medidas a alcançar sucesso ocorreram entre 1964 e 1975, aquando da criação dos Planos de Desenvolvimento Económico e Social, que vieram aplicar os princípios da planificação economicista ao ordenamento do território.

Em Itália, o ordenamento do território foi pela primeira vez introduzido em 1962, aquando da revisão da Lei do Urbanismo. Esta “previa para as regiões a obrigação de adoptarem um Piano Regulatore Generale que coordenasse as grandes linhas do ordenamento do território com as opções da planificação económica nacional” (Frade 1999), orientação que se manteve presente nos planos territoriais italianos até hoje.

Nestes três países, a política de ordenamento do território foi considerada durante muito tempo como uma competência da administração central. Em França tal situação manteve-se até 1986, quando foram criadas as regiões autónomas, como forma de se combater mais directamente os desequilíbrios regionais, passando estas a desempenhar algumas competências naquele domínio. Em Espanha, o ordenamento do território foi competência do Estado até à altura em que foram criadas as Comunidades Autónomas (promulgação da Constituição de 1978) que passaram, cada uma, a ter total competência sobre o ordenamento do respectivo território. Em Itália, até 1962, o modelo de gestão do ordenamento do território que vigorava era o da concertação entre Estado e municípios; depois dessa data com o “projecto sullo” que trouxe novidades ao plano territorial, a gestão do território passou a ser feita ao nível da região, ainda que contando sempre com a participação do Estado e dos municípios.

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Noutros países da Europa houve algumas diferenças em termos da orientação da política do ordenamento do território, quer em termos do peso da planificação económica, quer em termos do papel estadual.

Em Inglaterra, desde os finais do séc. XIX, já se sentiam pressões no sentido de se criar um desenvolvimento regional do território. A política desenvolvida assentou em duas premissas: a valorização “da mesma forma todos os elementos que se inscrevem no espaço, sejam económicos, sociais ou ambientais”; a segunda premissa é a existência de “uma estrutura administrativa descentralizada que procura suprimir a rigidez formal da Administração central” (Frade 1999), ou seja, é o Parlamento quem legisla, o Governo executa.5A especificidade da integração dos vários domínios

do território no modelo inglês, desencadeia um movimento intelectual e político denominado de «Regional Planning», e que se entende como uma técnica de gestão integrada dos diversos aspectos – geográficos, urbanos, rurais, económicos e ecológicos – que se inscrevem numa dada área” (Coma, referido por Frade 1999).

Na Alemanha, “a política de ordenamento do território tem raízes ainda antes da Segunda Guerra” (Frade 1999). Este país é composto por Länder (Estados federados) com grande autonomia, que possuem cada um deles a sua lei de ordenamento.6

Uma nova visão do ordenamento do território desenvolveu-se especialmente no Reino Unido e na França, ganhando terreno científico durante as décadas de 60 e 70: “(...) uma moderna função pública orientada para dar uma resposta global aos problemas que a utilização do espaço coloca, traduzindo a materialização de um modelo territorial e sendo, por conseguinte, uma matéria que obriga a uma análise interdisciplinar”(Oliveira 2002).

Apesar de terem sido os grandes propulsores das questões de modelar o território e as suas actividades, estes dois países desenvolveram de forma diversa o conceito de ordenamento do território. Se na França se desenvolvia o conceito de ordenamento do território e os pensadores avançavam neste tema, em contrapartida no Reino Unido explorava-se o conceito de planeamento. As suas origens foram separadas e distintas, no entanto, rapidamente vários autores começaram a conjugar estes dois conceitos, uns dando-lhes o mesmo significado e confundindo os seus objectivos, outros utilizando-os como processos separados mas, necessários um ao outro para uma correcta actuação no território.

Assim, falar de ordenamento do território implica falar de planeamento pois estes conceitos interagem entre si de forma constante e complementam-se.

5 Desta forma, o modelo anglo-saxónico não regista uma intervenção marcadamente economicista, tal como nos modelos anteriores.

6 Na Alemanha, em 1965, foi aprovada a Lei Federal de Ordenamento do Território, completada em 1990, aquando da criação do Regulamento Federal de Ordenamento do Território, que “compreende as ideias fundamentais e os princípios essenciais do ordenamento do território, as regras destinadas à planificação a cumprir nos Länder e o procedimento do Estudo de Impacto Territorial (uma avaliação dos efeitos das medidas territoriais adoptadas) ” (Frade, 1999).

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