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5 RASTREANDO O PROCESSO DE FORMAÇÃO DO CAMPO DE AÇÃO

5.3 HIPÓTESES DAS PESQUISAS

O emprego das hipóteses neste trabalho destoa de seu uso nas perspectivas causais mais tradicionais. Não há o objetivo de refutar ou confirmar as hipóteses utilizando testes estatísticos. Esse entendimento vai de encontro com a perspectiva metodológica adotada nesta pesquisa, que busca um entendimento mais processual para a explicação de fenômenos complexos que ocorrem em períodos de tempo mais longos. A visão acolhida na tese enfatiza o encadeamento de ocorrências que conformam determinado processo social. Portanto, utilizamos as hipóteses como um instrumento de auxílio para a análise dos dados coletados e para a formulação das conclusões do presente estudo

As hipóteses que apresentaremos a seguir são respostas provisórias aos questionamentos já expostos, nas quais foram destacados os principais aspectos que aparentaram relevância durante a pesquisa exploratória que originou o problema de pesquisa. A hipótese A possui caráter teórico. Já a hipótese B e seus desdobramentos guardam relação mais próxima com o ambiente empírico em questão, embora também estejam ancorados nos elementos teóricos da problemática.

Hipótese A) Embora a teoria dos campos de ação estratégica corrobore com a

perspectiva do equilíbrio pontuado ao atribuir a eventos estruturais externos ao campo as raízes dos processos de mudança e constituição de novos campos, o direcionamento dessas mudanças e a estrutura das novas ordens sociais de nível meso são determinadas pelas dinâmicas internas e pelos relacionamentos entre os campos já existentes.

Apresentamos a hipótese de que, apesar de crises macrocontextuais colocarem em xeque o status quo das estruturas dos campos e criarem condições para as transformações, a direção dessas mudanças será definida pelos vínculos entre campos próximos e suas atividades interiores.

A hipótese A está baseada na proposta de Fligstein e McAdam (2012) para equacionar a oposição entre as perspectivas externalistas e internalistas sobre as causas dos processos de mudança social. Entendemos que a explicação do surgimento do campo de ação estratégica da política de assistência social estará completa somente com a articulação entre esses dois fatores. A posição externalista permite mapear as condições que tornaram esse processo possível. No entanto, o conteúdo dessa mudança é formatado pela dinâmica interna de alguns campos e pela estrutura de relações de campos próximos da temática da assistência social.

Hipótese B) A instabilidade institucional gerada pelo contexto de redemocratização

criou condições para alterações estruturais no sistema de proteção social brasileiro. Todavia, a constituição da assistência social como um campo de políticas públicas e a adoção do paradigma dos direitos como norteador desse campo se deu por dois fatores:

B1) Pela dinâmica interna do campo da previdência social: nesse espaço foi gestada e ganhou força a necessidade da criação de um conjunto de serviços e benefícios – objetos específicos da assistência social – destinados a todos os cidadãos que necessitassem. Esses serviços deveriam estar totalmente desvinculados da obrigatoriedade de contribuição e da estrutura de recursos e de burocracia da previdência social.

B2) Pela dinâmica interna do campo acadêmico da assistência social: o redirecionamento teórico que superou o marxismo althuseriano e que incorporou a ideia do Estado como um espaço legítimo de luta dos assistentes sociais para construir uma sociedade mais igualitária foi fundamental para que os profissionais e acadêmicos da

área passassem a defender a assistência social enquanto política pública e direito do cidadão, corroborando e fortalecendo a alternativa defendida pelo campo da previdência no processo constituinte.

As hipóteses B1 e B2 estão baseadas na importância da construção de mundos simbólicos compartilhados para a conformação e o direcionamento das ações coletivas. Acompanhamos os modelos de análise de políticas públicas que salientam a importância das ideias nos processos de definição de agenda, formulação e implementação de políticas. Ademais, as duas hipóteses procuram incorporar a relevância do conhecimento especializado técnico no processo em análise, conforme ressaltado pelo modelo das comunidades epistêmicas.

Na hipótese B1, destaca-se o papel de técnicos e acadêmicos do setor previdenciário que, amparados pelo conhecimento técnico da área, criaram uma visão de política social que auxiliou na conformação da assistência social tal como a conhecemos hoje. Essa hipótese tem como referência a primeira etapa do processo analisado, momento em que o campo da previdência deteve o protagonismo das ações. A hipótese B2 aborda a possibilidade de um redirecionamento teórico protagonizado por um grupo de especialistas que visavam transformar não apenas o seu modo de conceber o mundo, mas também a sua forma de ação, com impacto para além da academia. Essa hipótese apresenta uma resposta provisória acerca de fenômeno ocorrido na segunda etapa do processo analisado: a entrada dos profissionais e acadêmicos do Serviço Social como atores preponderantes para a aprovação e sanção da LOAS.

Quadro 3 – Elementos teóricos e correspondentes empíricos mobilizados por hipótese Elementos teóricos

mobilizados Correspondente Empírico

Hipótese A

(1) Macrocontexto político (2) Dinâmica interna dos campos (3) Relação entre campos

Hipótese teórica

Hipótese B1

(2) Dinâmica interna dos campos Dinâmica do campo da previdência

(3) Relação entre campos Relação do campo da previdência com os demais na defesa de sua posição política dominante

(4) Atores habilidosos e coletivos e paradigmas de política

Defesa da necessidade de um conjunto de serviços e benefícios mínimos desvinculados da previdência

Hipótese B2

(2) Dinâmica interna dos campos Redirecionamento teórico no campo acadêmico do Serviço Social

(3) Relação entre campos Disseminação dessa nova concepção do campo acadêmico para o campo dos profissionais do Serviço Social

(4) Atores habilidosos e coletivos e paradigmas de política

Formação e defesa do paradigma da assistência social como um direito a partir do redirecionamento teórico

Fonte: Elaboração própria.

Assim como na delimitação das questões orientadoras do problema de pesquisa, as hipóteses também tiveram como objetivo a articulação entre as temáticas empírica e teórica, conforme sistematizado no quadro acima.