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Parte II Da condição ampla da profissão de professor

3.7 Dimensões da docência universitária em sua profissionalidade

3.7.3 Idade e feminização:

Tenti Fanfani (2007) considera que a idade é um atributo importante em qualquer categoria social, pois um ofício exercido por pessoa mais jovem é diferente do exercido por indivíduo mais velho. Nesse sentido, a idade pode dar indícios de mecanismo regulador da profissão. Ao discutir a docência da educação básica, o autor faz referência à idade como se vê abaixo:

En el caso de la docência, digamos que se trata de un viejo oficio el que se accede a edades relativamente tempranas en comparación com otras atividades profesionales clásicas, que requieren mayor inversión de tiempos en estudios, obtención de títulos, exámenes de acceso, etc. En todos los países también existen limites precisos que indicam um máximo de edad más allá del cual no es posible trabajar. Así, en muchos países los docentes obtienen los requisitos de la jubilación en edades relativamente más tempranas que otras categorias ocupacionales. (TENTI FANFANI, 2007, p.31)

Prosseguindo sua análise, ele chama a atenção para a importância das características sociodemográficas dos docentes, pois elas informam aspectos sócio-históricos e culturais que incidem sobre os lugares que esse grupo ocupa na sociedade.

Ainda acerca dessa questão, Altbach (2009) e Musselin (2011) constataram que os docentes universitários estão mais numerosos, mais feminilizados e mais velhos.

Quanto ao envelhecimento, Musselin (2011) atribui esse fenômeno, principalmente, ao grupo de professores provenientes de países que massificaram o sistema de ensino superior. Nesses casos, no ano de 2006, quando foi realizada a pesquisa, a idade média dos docentes era de 53 anos para os professores e 44 anos para os auxiliares.

Acerca da feminização, vários estudos têm apontado uma alteração no quadro da docência universitária. Muitas análises sobre esse fenômeno têm sido realizadas levando-se em conta relações de gênero, por entender que tal mudança reflete relações de poder historicamente produzidas. A esse respeito, argumenta Costa (1995):

Tratar de gênero é uma maneira de indicar que o modo de ser dos sexos é uma construção fundamentalmente social. O lugar que a mulher ocupa na vida e no mundo sociocultural decorre do sentido que adquirem suas ações nos processos interativos concretos do social. O que ela faz não é tão importante como o significado que é socialmente atribuído ao que ela faz. (COSTA,1995, p.158)

Nessa perspectiva, no âmbito do mundo do trabalho, a feminização tende a ser acompanhada de processos de desvalorização do trabalho. Sobre a docência na educação básica, cuja feminização é predominante, vários estudos contribuíram para desvelar os processos ambíguos que recaíam sobre o acesso da mulher a esta profissão, sobre os seguintes temas: visão do ensino como atividade extensiva das tarefas domésticas; baixos salários justificados na crença de que o trabalho da mulher não era o mais relevante na renda familiar; concepção da mulher como mais dócil e submissa às autoridades, entre outros. Ao mesmo tempo, a igualdade de salário entre mulheres e homens no setor público, que era favorável à igualdade de gênero, muitas vezes, era desconsiderada havendo homens ocupando mais cargos de chefias que as mulheres. (ENGUITA, 1991; COSTA, 1995; HYPÓLITO, 1999)

Como se observa, os estudos sobre a feminização do magistério foram desvendando processos relacionados ao lugar da mulher na docência. Nesse sentido, verificou-se maior presença de mulheres no âmbito da educação básica em comparação com a educação superior.

No entanto, estudos recentes têm demonstrado que, cada vez mais, as mulheres estão ascendendo à educação superior e chegando à docência universitária. Nessa dinâmica, algumas evidências de desigualdades de gênero têm sido apontadas: “La feminización

universitaria, que parece una tendencia común al desarrollo de la educación superior en el

mundo, no se ha venido traduciendo en mejoras hacia la igualación laboral y económica

Por outro lado, nas análises de Teixeira et al (2010), a feminização no trabalho tende a ser um fenômeno precedido ou acompanhado de perda de status, de poder aquisitivo e de um processo de proletarização. Nesse sentido, argumentam que talvez esse processo esteja se constituindo com os docentes do ensino superior.

Ademais, alguns estudos mostram que a ciência foi historicamente considerada como uma atividade masculina e a inserção das mulheres, no âmbito acadêmico tem sido acompanhada por processos de desigualdade de distribuição entre as diversas áreas. Assim, há menor concentração do sexo feminino nas áreas mais valorizadas e maior concentração nas áreas menos valorizadas. Dizem, ainda, que as mulheres tendem a evoluir mais lentamente nas carreiras acadêmicas. (LETA, 2003)

O reconhecimento científico30 de mulheres, tendo acesso ao financiamento das pesquisas e à ocupação de cargos administrativos importantes também é um fator que vem sendo analisado. León (1999), por exemplo, ao analisar a situação das professoras universitárias que alcançavam o cargo de catedráticas, nas universidades espanholas, verificou que elas eram uma minoria e nessa perspectiva, essa autora argumenta:

Os números refletem apenas grosseiramente os obstáculos que o poder acadêmico, eminentemente masculino, impõe as mulheres. Existe uma ampla gama de ‘discriminação ocultas’, difíceis de explicitar e sistematizar e, portanto, difíceis de controlar e erradicar. Mesmo as profissionais altamente qualificadas são reticentes em explicitá-las publicamente. Há uma espécie de ambivalência em reconhecer que, apesar de sua alta qualificação, foram discriminadas como mulheres. (LEÓN, 1999, p.232, grifos da autora)

Essa análise corrobora os argumentos de Teixeira et al (2010). Segundo essa autoras, na cultura organizacional, as discriminações de gênero são produzidas de maneira formal e informal por meio de linguagens e práticas que estabelecem comportamentos mais ou menos apropriados para cada sexo. Esses comportamentos vão sendo introjetados e naturalizados pelos sujeitos. Aliás, analisando mulheres docentes em um curso de Física, as pesquisadoras perceberam a dificuldade delas em reconhecerem processos discriminatórios nas relações de gênero, no âmbito acadêmico. No entanto, apesar de grandes esforços e alta qualificação,

30 Pasqualini (2013), ao fazer a apresentação da revista Medicina da Argentina ressalta que, desde sua

instituição, o prêmio Nobel já foi dado a 839 pessoas, e destas, apenas 43 eram mulheres. Nas áreas consideradas mais nobres como: medicina, física e química já tinha sido atribuídos 300 prêmios dos quais, apenas 15 foram recebidos por mulheres.

essas mulheres revelaram os obstáculos encontrados na carreira, cujo referencial é predominantemente masculino:

A entrada de mulheres em cursos como de Física ainda gera reações de desconforto, sentimentos de inadequação e desgaste emocionais. O preço em seguir as carreiras acadêmicas ainda é alto, porém pior para mulheres e especialmente nas áreas científicas e tecnológicas. A possibilidade de constituir família e ao mesmo tempo ser produtiva no trabalho ainda é um desafio para muitas mulheres. A gravidez é adiada até que a idade permita. A vida acadêmica tem, portanto, um impacto significativo nas vidas pessoais destas mulheres. (TEIXEIRA et al, 2010, p. 535)

Terminada a pesquisa, as autoras concluíram que o ingresso das mulheres nos cursos tradicionalmente masculinos não indicavam igualdade na distribuição de poder. Isso porque as relações de gênero que regulam a vida profissional no âmbito acadêmico geram desigualdades, com consequentes perdas emocionais e materiais.

Com efeito, os estudos sobre feminização demonstram que essa dimensão é imprescindível na análise da docência. Historicamente, a presença feminina na educação básica é marcante e seu o processo de feminização na educação superior vem ocorrendo de maneira semelhante. Em torno desse fenômeno, encontram-se várias nuances socio-históricas que posicionam as mulheres em situações de discriminação afetando-as pessoal e profissionalmente.