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Os docentes das Universidades Nacionais da Argentina no contexto atual

Parte II Da condição ampla da profissão de professor

CAPÍTULO 4: EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL E NA ARGENTINA

4.2 A educação na Argentina

4.2.4 Os docentes das Universidades Nacionais da Argentina no contexto atual

As características socio-históricas da universidade argentina e suas estreitas relações com a política; seu papel na formação da elite, da classe média e posteriormente, da camada popular; a predominância do ensino profissionalizante; a massificação do acesso; as idas e vindas da gratuidade e outros elementos mais, têm estreita relação com a ação dos atores universitários em geral e com o papel da educação no âmbito da sociedade argentina.

A propósito, para Buchbinder (2005) “el papel de la educación, incluso la universitária, conserva en el imaginário de los argentinos como instancia para el ascenso social y la fuerza de las nociones coletivas en torno a la responsabilidad indelegable del Estado en su promoción, aun en estos tiempos” (BUCHBINDER, 2005, p.231)

Essas considerações remetem à análise da docência no âmbito universitário argentino na atualidade. Para tal, recorreu-se a alguns autores e aos dados oficiais disponíveis com o intuito de mapear as características dos docentes das universidades nacionais da Argentina, suas formas de organização e condições de trabalho em geral.

Assim sendo, começando pela composição do corpo docente das universidades nacionais,

conforme dados registrados no anuário estatístico de 2008, da Secretaria de Políticas

Universitárias do Ministério da Educação da Argentina, à epoca desta pesquisa, havia

Adjunto e em Docentes Auxiliares: Jefe de Trabajos Practicos (JTP), Ayudante de 1ª y 2ª.

Essas categorias são definidas pelo ingresso na instituição e a progressão nos cargos docentes são por tempo de serviço, independentemente da titulação, sendo predominante a organização dos professores em cátedras.

Observa-se nessa organização uma hierarquia piramidal, tendo um professor Titular como referente para a equipe composta pelos demais professores (asociado e adjunto) e os docentes auxiliares (Jefe de Trabajos Practicos, Ayudante de 1ª y 2ª) que são aqueles que compõem a base.

A tabela a seguir visualiza a composição dos docentes das universidades nacionais da Argentina em 2008:

TABELA 11:Composição das categorias dos docentes das universidades nacionais na Argentina Categorias Docentes Números % Titular 16.387 11,5% Associado 5.686 3,9% Adjunto 33.219 23,2%

Chefes de Trab. Práticos 39.037 27,3%

Ajudante de 1ª. 37.999 26,6%

Ajudante de 2ª. 10.439 7,3%

Total 142.767 100%

Fonte: SPU- Ministério da Educação da Argentina – Anuário estatístico 2008.

Essa tabela evidencia o número de professores Titulares, Associados e Adjuntos correspondendo apenas a 38 % do conjunto total de docentes, indicando predominância de docentes auxiliares com percentual de 62%.

Observa-se, porém, a reduzida formação em mestrado e doutorado entre os docentes argentinos. Comparando-se com os dados do Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) de 2011 a 2020 do Brasil, verifica-se que essa formação na Argentina ainda é bastante tímida:

existem no Brasil 1,4 doutores titulados por cada mil habitantes na faixa etária entre 25 e 64 anos e na Argentina, apenas 0,2 doutores titulados. Constata-se, assim, uma distância nos índices de doutores entre os dois países.

Diferentemente do Brasil, os docentes argentinos não usufruem da titulação como requisito para progressão na carreira; é o tempo de trabalho, conhecido como antiguidade, o critério de maior peso. Por outro lado, a própria constituição de uma carreira acadêmica não conta com uma normalização comum a todos os docentes das universidades nacionais, no contexto atual. A lei de educação superior vigente (24.521/95) atribui às universidades a autonomia para estabelecer o regime de acesso, permanência e promoção, prevendo a admissão por meio de concurso público de livre concorrência.

Em 2012, a Federación Nacional de Docentes Universitarios (CONADU), realizou um congresso e lançou um informe reinvindicando a construção de um plano de carreira nacional para os docentes universitários.

Outro fator que permite identificar a composição do corpo docente das universidades diz respeito ao regime de tempo dedicado ao trabalho semanalmente. Os docentes com dedicação exclusiva trabalham 40 horas semanais; a dedicação semiexclusiva compreende 20 horas semanais; e a dedicação simples, 10 horas semanais. A dedicação exclusiva não impede o docente de ter outros vínculos laborais em outras instituições, no tempo excedente às 40 horas.

A tabela seguinte visualiza a evolução dos regimes de trabalho nas universidades nacionais da Argentina entre 1994 a 2008:

TABELA 12:Número de docentes e regime de dedicação nas universidades nacionais argentinas Dedicação Exclusiva Dedicação semiexclusiva Dedicação simples Outros Total 1994 11.719 12,1% 20.780 21,6% 64.077 66,3% - - 96.576 1996 12.349 12,6% 19.388 19,7% 66.455 67,7% - - 98.192 1998 13.995 13,6% 22.473 21,9% 65.849 64,1% - - 102.726 1999 14.551 13,9% 24.130 23,0% 63.547 60,6% 2.660 2,5% 104.887 2003 15.160 13,1% 24.177 20,1% 71.767 61,1% 4.838 4,1% 115.942 2004 15.383 13,4% 25.278 22,03% 74.071 64,5% 114.732 2005 15.450 12, 9% 26.360 22.0% 77.529 64,9% - - 119.339 2006 17.059 13,2% 28.671 22,3% 82.584 64,3% 128.314 2007 17.928 13,2% 28.631 21,1% 88.567 65,5% 135.126 2008 18.641 13, 0% 28.711 20.1% 94.415 66,8% 142.767

Fonte: Anuario de Estadísticas Universitarias (1996, 1997, 1998, 1999/2003 a 2008).

Catani e Azevedo (2005), ao correlacionar as transformações ocorridas na universidade argentina na década de 1990, aponta, como discrepância, o fato de que nas universidades nacionais a população estudantil aumentara, mas o número de docentes com dedicação exclusiva não apresentou crescimento significativo. Segundo eles: “para se construir uma universidade de qualidade, com um ambiente bem desenvolvido de ensino, pesquisa e extensão (são as finalidades ideais desde a Reforma de Córdoba), é imprescindível que parte substantiva do corpo de professores trabalhe em regime de dedicação exclusiva.” (CATANI e AZEVEDO, 2005, p.50)

Esse fato fica mais evidente ao cruzar os dados dedicação com a categoria docente. Verifica- se, então, que mesmo entre os professores das categorias mais elevadas (Titular, Associado e Adjunto), que dispõe de mais disponibilidade para o ensino e pesquisa na universidade, ou seja, apenas 39% da população total de professores, a maior concentração está na dedicação simples. Eis os dados na tabela abaixo:

TABELA 13:Classificação dos docentes das universidades nacionais e tempo de dedicação ao trabalho

Categoria/ Dedicação

Exclusiva Semiexclusiva Simples Total

Professores Titular 4.054 24,7% 4.243 25,8% 8.090 49,3% 16.387 100% Associado 1.982 34,8% 1.149 20,2% 2.555 44,9% 5.686 100% Adjunto 6.000 18,06 7.601 22,8 19.618 59,05 33.219 100% Docentes Auxiliares JTP 4.796 12,2% 10.449 26,7% 23.792 60,9% 39.037 100% Ajudante 1 1.809 4,7% 5.269 13,8% 30.921 81,3% 37.999 100% Ajudante 2 - - - - 10.439 100% 10.439 100% Total geral 18.641 13,0% 28.711 21,1% 95.415 66,0% 142.767 100%

Fonte: Anuário Estadístico SPU/2008.

No grupo dos docentes auxiliares, perfazendo 61,7% da população total de professores, predomina dedicação simples, ocupando 74,4% dessa condição.

Mollis (2010), ao analisar os dados relativos ao ano de 2005, também percebeu essa heterogeneidade da condição de trabalho dos docentes das universidades nacionais na Argentina, pois

…se puede observar que del 41% de los profesores de las universidades nacionales, el 20,2% a su vez, tiene dedicación exclusiva (dedicación exclusiva a las tareas de enseñanza e investigación con 40 horas semanales), el 25,3% tiene dedicación semi-exclusiva (20 horas semanales) y el 54,5% tiene dedicación simple (menos de 10 horas semanales). A su vez entre los auxiliares docentes, sólo el 8% tiene dedicación exclusiva y el 20% semi exclusiva, en tanto que el 72 % restante tiene dedicación simple. (MOLLIS, 2010, P.522)

Comparando-se os dados relativos aos anos de 2005 e 2008, verifica-se que a população geral de docentes aumentou 20%, enquanto a dedicação exclusiva entre os professores Titulares, Associados e Adjuntos apresentou um pequeno recuo.

Acerca desse quadro heterogêneo, a análise de Mollis (2010) ajuda a entender a repercussão dessa situação sobre a organização do ensino nas universidades:

Desde el punto de vista de las estrategias de enseñanza estos indicadores sugieren que la mayor parte del tiempo de clase de nuestros jóvenes

universitarios, están en contacto con jóvenes profesionales, sin experiencia profesional ni pedagógica. Las causas de esta deficiente distribución de nombramientos y dedicaciones tiene un fundamento financiero: es más barato contratar muchos jóvenes ad honorem o con salarios bajos para atender una población estudiantil masiva, que contratar profesionales con expertisia, antigüedad y máxima dedicación. Aparece una tendencia en nuestro sistema universitario muy clara: en aquellas unidades académicas donde recae la responsabilidad docente en los profesores más que en los auxiliares, donde hay mayor dedicación horaria y mayor número de docentes con diplomas o certificados de pos grado, se eleva la calidad de la enseñanza de los cursos. Sin embargo la masividad de la matrícula privilegia el reclutamiento de docentes jóvenes sin experiencia. (MOLLIS, 2010, P.522)

Depreende-se desse trecho, que a expansão de atendimento nas universidades nacionais acentua um processo de desvalorização do trabalho docente universitário, reduzindo seu trabalho apenas ao ensino, que é traduzido em horas/aulas.

Por sua vez, a esse respeito, Buchbinder (2005) acrescenta que o principal problema é que a maior parte dos docentes atuantes nas universidades não são concursados o que restringe a participação política no âmbito universitário. Para esse autor, “la falta de renovación del cuerpo docente ha permitido que se perpetue en el poder una elite que actúa en forma corporativa y que defiende con dureza sus privilegios.” (BUCHBINDER, 2005, p. 233)

Diante desses dados e das análises apresentadas, afirma-se que as características do corpo docente das universidades nacionais da Argentina revelam a heterogeneidade da sua composição em relação às categorias ocupadas e os tipos de vínculos estabelecidos, partilhando entre si, o pouco tempo de dedicação semanal ao trabalho como docente nas universidades e a ausência de um plano de carreira docente comum.