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Impactos da corrupção no desenvolvimento econômico

– A Study of the Link Between Corruption and Poverty

4.  A relação entre corrupção e pobreza Risco de não efetivação das promessas constitucionais

4.2.  Impactos da corrupção no desenvolvimento econômico

A corrupção indubitavelmente atua como um elemento desestrutu- rante da ordem econômica, porque ela cria mecanismos de concorrência

Report (1999). Disponível em http://www.u4.no/recommended-reading/corruption-and-

-poverty-a-review-of-recent-literature/. Consultado em 28/12/2017

5 Em tradução livre: “A literatura aponta para a conclusão de que a corrupção, por si

só, não produz pobreza. Na verdade, a corrupção tem consequências diretas sobre fatores econômicos e de governança, intermediários que, por sua vez, produzem pobreza. Assim, a relação examinada pelos pesquisadores é indireta. Este artigo discute dois modelos principais que explicam essa ligação moderada entre corrupção e pobreza: um modelo econômico e um modelo de governança.” Disponível em http://www.u4.no/recommended-reading/corruption- -and-poverty-a-review-of-recent-literature/. Consultado em 28/12/2017.

desleal entre os agentes econômicos. Aquele que corrompe para obter um contrato ou benesses estatais, como financiamento público, isenções fiscais ou menor fiscalização, gozam de vantagens que não se estendem aos agentes que atuam segundo primado da legalidade. A corrupção gera, ainda, cartel, concentração de mercado, manipulação de preços, controle da oferta, associações inescrupulosas, que tem o efeito de desestruturar a Ordem Econômica.

Ainda no âmbito da desestruturação da ordem econômica, a corrupção promovida por agentes econômicos desonestos tem o efeito de gestar uma simbiose nociva com o Estado, que capturado passa a exercer a sua com- petência reguladora e fiscalizadora do mercado no interesse dos agentes desonestos, públicos e privados.

Como prova real do acima afirmado, podemos lembrar que o Brasil vive hoje sobre o impacto de duas grandes operações policiais – Lava Jato e Zelotes – que descortinou essa relação promiscua entre agentes econômicos e o poder público.

A primeira desarticulou um cartel de empreiteiras que, associada a agentes públicos que encobriam o ilícito, por anos simulou um ambiente de plena concorrência, com o intuito de dominar as grandes contratações públicas, direcionando processos licitatórios, elevando artificialmente os preços e influindo diretamente no processo eleitoral mediante o financia- mento ilícito de candidatos.

A segunda, dentre os seus achados, descobriu um mecanismo em que agentes de mercado cooptavam relevantes autoridades nacionais para a “compra” de normas que atendiam aos seus interesses pessoais, gerando vantagens em relação aos seus concorrentes.

Nos dois casos, percebe-se que as práticas corruptivas faziam parte do modelo operacional adotado pelas corporações, que, em determinados casos, mantinham departamentos ou diretorias destinadas exclusivamente a materializar o pagamento de propinas e realizar a lavagem dos recursos ilícitos envolvidos. Ou seja, a corrupção integrava a atuação comercial de empresa, tal qual o singelo pagamento de seus fornecedores.

Esse comportamento promíscuo entre agentes públicos e privados tem o efeito de gerar desequilíbrio na concorrência, favorecimentos pes- soais, intervenção estatal indevida e insegurança jurídica, ou seja, produz um ambiente econômico absolutamente hostil. Como consequência há redução do número de players, inibição de novos investimentos no país,

enfraquecimento do dinamismo econômico, prejuízo ao processo de inovação, com consequências diretas na geração de empregos e de renda. Outro efeito decorrente dessa promiscuidade é o aumento artificial de custos e preços, dificultando, ainda mais, o acesso tanto pelas pessoas como pelo próprio Estado a bens e serviços associados a dignidade humana.

Nesse sentido, partindo da lógica constitucional de que a ordem econô- mica exerce o papel de protagonista na implementação do desenvolvimento econômico, parece-nos óbvio que a subversão de seus pilares tem o efeito de estagnar esse processo evolutivo, gerando relevantes impactos sobre o desenvolvimento social, afastando o Estado Brasileiro do propósito estabelecido no Texto Magno de garantir uma existência digna a todos.

Precisa ser considerado que estabelecido um processo corrosivo sistêmico entre agentes estatais e agentes econômicos, há uma redução do número de agentes com acesso à riqueza em potencial e com capacidade de ofertar vagas de trabalho. A falta de inovação e de investimentos colabora para a estagnação econômica, inibindo que a riqueza circule por outros agentes. O mercado se mantém concentrado, o que infirma o inciso IV do artigo 170 da Constituição.

Portanto, tem-se que Ordem Econômica não evolui horizontalmente, mantendo-se controlada por um pequeno grupo de atores. Nessa dimen- são, ela permanece menor que a própria sociedade, o que significa dizer que, no aspecto subjetivo, a Ordem Econômica não consegue alcançar a integralidade das pessoas, tendo como resultado a concentração da riqueza e exclusão dos grupos não alcançados.

A concentração da riqueza acima referida gera impactos extremamente nocivos a dignidade humana, como i) a incapacidade de se atingir o pleno emprego; ii) a redução dos salários pagos aos trabalhadores, já que a mão de obra disponível se afigura abundante; iii) controle ilícito da oferta de bens produtos e aumento artificial dos preços praticados, dificultando, ainda, mais o acesso a bens e serviços; iv) sendo pouco os atores, havendo menor auto fiscalização do próprio mercado, há maior facilidade de manipulação de ordem econômica e do próprio Estado.

Também na linha de concentração do mercado e da riqueza, é impor- tante destacar que estudos do Banco Mundial detectaram que os custos da corrupção atingem de forma especialmente gravosa as pequenas empresas, cujo poderio econômico não se compara aos das grandes corporações. Tais empresas sofrem para exercer suas atividades empresariais e não raramente

são obrigadas a fechar suas portas achatando o mercado e inibindo uma melhor distribuição das riquezas. Nesse sentido, o já referido relatório subscrito por Eric Chetwynd, Frances Chetwynd e Bertram Spector des- tacou “que uma exame mais profundo dos vínculos entre corrupção e desigualdade

demonstram que os custos da corrupção são particularmente mais pesados para as pequenas empresas”(livre tradução).

No ponto, é imperativo advertir quanto à necessidade de se tomar cui- dado com a análise bruta dos indicadores econômicos, eis que, por vezes, embora os números demonstrem uma evolução da riqueza nacional, tal se dá apenas no aspecto financeiro (quantidade de dinheiro gerado pela economia). Como a corrupção inibe que a ordem econômica cresça também na dimensão horizontal, não alcançando a integralidade da sociedade, uma grande parte das pessoas não compartilham esse crescimento econômico, permanecendo em situação de pobreza.

As percepções acima delineadas também foram observadas no já refe- rido Relatório denominado “Corruption and Poverty – A Review of Recente

Literature”6:

“The Economic Model postulates that corruption affects poverty by first impacting economic growth factors, which, in turn, impact poverty levels. Economic theory and empirical evidence both demonstrate that there is a direct causal link between corruption and economic growth. Corruption impedes economic growth by discouraging foreign and domestic investment, taxing and dampening entrepreneurship, lowering the quality of public infrastructure, decreasing tax revenues, diverting public talent into rent-seeking, and distor- ting the composition of public expenditure. In addition to limiting economic growth, there is evidence that corruption also exacerbates income inequality; regression analysis has shown a positive correlation between corruption and income inequality. Explanations for this link are that corruption distorts the economy and the legal and policy frameworks allowing some to benefit more than others; there is unfair distribution of government resources and services; corruption reduces the progressivity of the tax system; corruption increases the inequality of factor ownership; and lower income households (and businesses) pay a higher proportion of their income in bribes than do

middle or upper-income households. Economic growth and income inequality are important because they link corruption to poverty. Studies show that the absence of economic growth (or negative growth) increases poverty. Inversely, tests have shown that an increase in GDP produces na increase in the income of the poor. However, income distribution is an important mediating factor because economic growth may not always benefit the poor.

...

Several studies have demonstrated a relationship between corruption and income inequality. The theoretical foundations for this relationship are derived from rent theory and draw on the ideas of Rose-Ackerman (1978) and Krueger (1974), among others. Propositions include:

• Corruption may create permanent distortions from which some groups or individuals can benefit more than others.

• The distributional consequences of corruption are likely to be more severe the more persistente the corruption.

• The impact of corruption on income distribution is in part a function of government involvement in allocating and financing scarce goods and services (Gupta, Davoodi, and Alonso-Terme, 1998)7.

7 Em tradução livre: “O Modelo Econômico postula que a corrupção afeta a pobreza

impactando primeiro os fatores de crescimento da economia, que, por sua vez, afetam os níveis de pobreza. Teoria econômica e evidências empíricas demonstram que existe uma ligação causal direta entre corrupção e crescimento econômico. A corrupção impede o crescimento econômico ao desencorajar o investimento estrangeiro e doméstico, taxando e inibindo o empreendedorismo, reduzindo a qualidade da infra-estrutura pública, diminuindo a receita de impostos, desvirtuando o talento público na busca de benefícios e distorcendo a composição da despesa publica. Além de limitar o crescimento econômico, há evidências de que a corrupção também exacerba a desigualdade de renda; A análise de regressão mostrou uma correlação positiva entre corrupção e desigualdade de renda. As explicações para este link são que a corrupção distorce a economia e marcos legais e políticos, permitindo que alguns se beneficiem mais do que outros; Há uma distribuição injusta de recursos e serviços governamentais; A corrupção reduz a progressividade do sistema tributário; A corrupção aumenta a desigualdade dos fatores que garantem a propriedade; as familias de renda mais baixa (e as empresas) pagam uma maior proporção de seus rendimentos em subornos do que as famílias de renda média ou superior. O crescimento econômico e a desigualdade de renda são importantes porque eles ligar a corrupção à pobreza. Estudos mostram que a ausência de crescimento econômico (ou negativo crescimento) aumenta a pobreza. Inversamente, os testes mostraram que um aumento no PIB produz um aumento da renda dos pobres. No entanto, a

Exatamente por conta do efeitos perniciosos que a corrupção estabelece sobre o desenvolvimento econômico, impactando diretamente na dignidade das pessoas, é que muitos países, incluindo o Brasil, que o fez por meio da Lei nº 12.846/2013, passaram a adotar normas, mecanismos e ferramentas tendentes a combater a participação dos agentes econômicos em atos de corrupção envolvendo autoridades e servidores públicos, punindo-os pesadamente enquanto pessoas jurídicas, e impondo-lhe obrigações de adoção de programas de integridade e de self cleaning, como mecanismos de prevenção a novos desvios.

Não é objetivo deste artigo dissecar o conteúdo da Lei nº 12.846/2013, uma vez que o mesmo busca perquirir os efeitos que a corrupção causa sobre o desenvolvimento econômico e social. Mas, na linha do que tra- tamos aqui, é preciso destacar que a norma veio, em grande parte, dar cumprimento ao compromisso assumido pelo Brasil junto à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE, quando da assinatura da Convenção Sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais (promul- gada pelo Decreto nº 3678/2000), de que se dedicaria a punir a corrupção internacional e a responsabilizar as empresas envolvidas enquanto pessoas jurídicas.

Interessante é destacar que, já em seu preâmbulo, a convenção da OCDE deixa evidenciada a grave a preocupação com os efeitos nocivos da corrupção sobre o desenvolvimento econômico, demonstrando que não são áreas dissociadas. Veja que a OCDE é um organismo vinculado à economia,

distribuição de renda é um importante fator porque o crescimento econômico nem sempre beneficia os pobres.

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Vários estudos demonstraram que uma relação entre corrupção e desigualdade de renda. Os fundamentos teóricos desse relacionamento derivam da teoria dos aluguéis e estão descritas nas ideias de Rose-Ackerman (1978) e Krueger (1974), dentre outros. As proposições incluem: • Corrupção tende a criar distorções permanentes das quais alguns grupos ou indivíduos

podem se beneficiar mais que outros.

• As consequências da corrupção da distribuição provavelmente serão mais severas quanto mais persistente for a corrupção.

• O impacto da corrupção na distribuição de renda é, em parte, decorrente da envolvi- mento governamental na alocação e financiamento de bens e serviços escassos (Grupta, Davoodi e Alonso-Terme, 1998).

o que permite constatar que sua preocupação com a corrupção decorre do impacto negativo que esse fenômeno impõe a sua área de atuação.

Nesse cenário, inclusive, há se considerar o papel relevante que os órgãos de controle de concorrência devem exercer para detectar e denunciar processos corruptivos que tem o efeito de promover distorções substanciais no mercado, tais como concentração, concorrência desleal, cartelização e controle de preços.

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