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Legislação sobre doutoramentos e do terceiro ciclo em Portugal e na UNL

Efectuou-se uma Análise documental de documentos públicos, como a legislação e os regulamentos do terceiro ciclo das escolas UNL. Foram ainda analisados relatórios anuais produzidos pela universidade. Pretendeu-se caracterizar o perfil de doutorandos que emergem dos regulamentos do terceiro ciclo e do processo de monitorização da avaliação de supervisão proposto, identificando semelhanças e diferenças entre as escolas da UNL.

Uma das primeiras referências legislativas aos doutoramentos surge no Decreto-Lei n.º 216/92, de 13 de outubro, após o inicio da implementação de processo de Bolonha (1999) no primeiro e segundo ciclo, onde se define o que se entende por doutoramento: "O doutoramento prova a realização de um contributo inovador e original para o progresso do conhecimento, um alto nível cultural numa determinada área de conhecimento e capacidade de realizar o trabalho científico independente" (Capítulo III, artigo 17 (1)). O texto legislativo do Decreto-Lei n.º 216/92 está relacionado aos procedimentos organizacionais, não definindo o perfil do orientador ou do estudante de doutoramento, as regras de supervisão, os objetivos, o trabalho de supervisão, a monitorização e a avaliação. De fato, a única referência ao papel do supervisor nesta legislação relaciona-se aos procedimentos que este deve realizar para informar sobre a evolução do trabalho de pesquisa do aluno. "O orientador deve informar anualmente o órgão competente da universidade, através de um relatório sobre o andamento do trabalho do candidato" (Capítulo III, artigo 23).

Em 2006, através do Decreto-Lei n.º 74, de 24 de março de 2006, a República Portuguesa aprova a organização da educação superior em três ciclos e os descritores de Bolonha baseados na aquisição de aprendizagens e no desenvolvimento de competências. Esta lei enfatiza uma mudança de paradigma, de um modelo passivo de educação baseado na aquisição do conhecimento, para um modelo baseado no

Escola Orgãos Composição/cargo Membros

Conselho de escola Individualidades externas (Presidente ) 3 Docentes ou investigadores 7

Estudantes 1

Direção Director 1

Subdiretor 1

Secretária 1

Conselho de gestão Presidente 1

Suddirector 1

Secretária 1

Conselho Científico Presidente 1 Vice-Presidente 1 Docentes e investigadores 15 Conselho Pedagógico Presidente 1 Vice-Presidente 1

Docentes 4

Estudantes 6

desenvolvimento de competências, das simples (instrumental, treino) às mais complexas (interpessoal, específicas de uma área).

Dois anos depois, e após a aplicação do processo de Bolonha ao primeiro e segundo ciclo, um novo decreto-lei (Decreto-Lei n.º 107/2008, de 25 de junho) reforça o que se pretende com o terceiro ciclo e regula a existência não só de estudantes que possuem doutoramentos a tempo parcial, mas reforça a necessidade de monitorizar e avaliar a implementação do processo de Bolonha, ouvindo todas as partes interessadas (professor, alunos, supervisor).

O processo de Bolonha provocou mudanças na estrutura dos doutoramentos, sendo o a escolarização99 um deles (Alves & Azevedo, 2010). O Decreto-Lei n.º 107/2008, de 25 de junho, sublinha

alguns dos objetivos de Bolonha para o ensino superior e regula como eles podem ser monitorizados e avaliados: "(...) A transição de um sistema educacional baseado na transmissão do conhecimento a um sistema baseado no desenvolvimento das competências dos alunos, onde os componentes do trabalho experimental ou de projeto, entre outros, e a aquisição de competências transversais devem ter o papel decisivo (...)". O artigo 28 do mesmo Decreto-Lei refere-se ao perfil das competências do aluno de doutoramento após a conclusão do diploma, que atende ao quadro de qualificações apresentado e aprovado em Bergen (2005). Neste artigo pode ler-se "1 - O grau de doutor é conferido para aqueles que demonstram: (A) a capacidade de compreender sistematicamente um campo científico de estudo; (B) as habilidades, aptidões e métodos de pesquisa associados a um campo científico; (C) Capacidade de projetar, projetar, adaptar e realizar uma investigação significativa em relação aos requisitos impostos pelos padrões de qualidade e integridade académica; (D) realizou um conjunto significativo de trabalhos de pesquisa originais que contribuíram para a extensão das fronteiras do conhecimento, parte das quais merece divulgação nacional ou internacional em publicações com um comité de seleção; (E) Ser capaz de analisar, avaliar e sintetizar idéias novas e complexas criticamente, (F) Ser capaz de se comunicar com colegas, o resto da comunidade acadêmica e sociedade em geral sobre a área onde são especializados; (G), em uma sociedade baseada no conhecimento, para promover o progresso tecnológico, social ou cultural em um contexto acadêmico ou profissional. "Ainda assim, não há perfil de supervisor nem práticas de supervisão propostas.

De acordo com a autonomia universitária, as universidades podem fazer seus próprios regulamentos, desde que sigam as recomendações nacionais e internacionais subjacentes ao processo de Bolonha, à Estratégia de Lisboa, respeitem os parâmetros/descritores internacionais propostos pela Associação Europeia de Universidades (EUA). Neste contexto, cada universidade pode definir e aprovar regulamentos. Pode também criar e adotar um perfil de supervisor, assessorar as práticas de supervisão e implementar processos de monitorização e avaliação da supervisão doutoral.

99 Tal como estas autoras enfatizam, o Decreto-Lei n.º 107/2008, de 25 de junho, não impõe a escolarização dos doutoramentos,

Na UNL promove-se a autonomia das escolas a partir de uma plataforma de entendimento sobre objectivos comuns. Em relação ao terceiro ciclo há poucas regulamentações comuns, verificando-se que os regulamentos dos cursos de doutoramento são as peças mais importantes do terceiro ciclo.

As condições de acesso ao doutoramento estão na página do próprio curso doutoral, sendo importante referir que, em geral os estudantes devem possuir o grau de mestre ou um grau equivalente quando, o seu currículo académico, científico e profissional sejam reconhecidos pelos conselhos científicos das escolas como atestando a usa capacidade de frequentar um programa doutoral. Em geral todos os regulamentos referem que a seleção e a seriação dos candidatos é baseada no seu currículo académico e profissional, tendo em atenção a adequação e a formação recebidas no primeiro e no segundo ciclos (ou outros graus pré-bolonha) e os requisitos do programa doutoral.

Pela observação das matrizes curriculares dos doutoramentos na UNL verifica-se que, efectivamente houve a opção por um currículo específico formal. No primeiro ano em geral os estudantes frequentam disciplinas relacionadas com as metodologias do trabalho de investigação. Esta opção poderá estar relacionada por um lado com o crescente número de doutorandos, e com o crescente número de doutorandos por supervisor, o que poderá dificultar a interacção orientador-doutorando e por consequência o desenvolvimento das competências de investigação. Por outro poderá ser um veículo de socialização e de integração dos estudantes na academia. Os “currículos” (Unidades curriculares/disciplinas integrantes bem como os seus ECTS) de cada curso doutoral estão na página de cada escola bastando consultar as mesmas. Atualmente (ano de 2018) no primeiro ano do doutoramento o estudante deverá realizar quatro unidades curriculares de uma gama de disciplinas curriculares propostas, sendo a sua escolha condicionada pela área de especialização. O tema da pesquisa doutoral pode ser escolhido pelo estudante doutoral, com a ajuda de um tutor, do coordenador de curso e ou de um Orientador. O registo da unidade curricular – tese está condicionada à aprovação do seu projecto de tese. O projecto de tese é acompanhado por um tutor, e deverá ser apresentado após o primeiro ano de doutoramento. Este projecto consiste numa monografia que deverá incluir, entre outros elementos, a descrição de uma pesquisa detalhada sobre o state-of-the-art, o trabalho relacionado com os tópicos de pesquisa, a descrição do problema a ser resolvido e o trabalho de pesquisa. Este projecto tese será avaliado num exame público por um júri que será proposto pelos coordenadores e professores do curso doutoral. Após a aceitação do projecto tese, o candidato levará a cabo o seu plano de pesquisa com vista à elaboração de uma tese original. Este trabalho de pesquisa será supervisionado pelo orientador e/ou pelo coorientador(es).

Foram analisados os seguintes documentos que regulam o terceiro ciclo em cada uma das escolas: da FCT - regulamentos n.º 905/2010 e n.º 209/2014; da FCSH - regulamento n.º 438/2008; da Nova SBE - regulamento nº 488/2010; da FCM - regulamento n.º 320/2015 e n.º 8774/2015; da FD - regulação de doutoramentos aprovada em 21/05/2014; do IHMT - regulamentos: n.º 474/2012 e n.º 761/2015; da NOVA IMS - regulamentos n.º 287/2010; do ITQB - regulamento n.º 269/2008; e do

ENSP o aviso n.º 21553/2008. Cada curso de doutoramento poderá ter normas/regulamentos específicos, estando na Tabela 27, algumas informações relativas à supervisão doutoral.

Na UNL, a orientação científica é atribuída pelo regulamento ao supervisor, que geralmente tem como atributo o grau de doutor100 e ser nomeado pela comissão científica do programa de doutoral. Um

dos deveres de supervisor em algumas escolas da UNL é fazer um relatório anual sobre o progresso do trabalho do estudante e monitorizar a evolução do projeto de pesquisa. A avaliação da supervisão de doutorandos não está contemplada nos regulamentos do terceiro ciclo nem nas competências de supervisão do supervisor.

A partir da Análise das regulamentações gerais dessas escolas ou da regulamentação dos programas de doutoramento, verifica-se que a monitorização do processo de supervisão é feito pelas comissões de monitorização (Nova IMS, FCT, ENSP), comissões de tese (ITQB, FCM) ou comissão tutorial (IHMT). A partir dos objetivos, a composição e a natureza dos relatórios de monitorização é prossível assumir que correspondem a diferentes conceitos e modelos. Não foi possível verificar a existência de comissões de acompanhamento de tese na Nova SBE, FCSH e FD, uma vez que não são mencionadas no regulamento ou nos documentos publicados na página de internet dessas escolas. Um resumo das informações sobre supervisão e monitorização é apresentado na Tabela 27.

A orientação científica está regulada em quase todas as escolas (Tabela 27). A co-orienção pode ser realizada em todas as escolas por um pesquisador/investigador com o doutoramento. É interessante notar o uso da palavra orientação em vez da supervisão em documentos oficiais. Em português estas palavras têm significados diferentes, a orientação é mais restrita do que a supervisão. A supervisão está relacionada com a observação, monitorização, ensino, coaching, mostrar o caminho, cuidado, atenção, ajuda, suporte. A orientação sugere "mostrar o caminho", dar uma direção, dar orientação.

Também é possível verificar, a partir dos regulamentos de doutoramentos que, a qualidade do conhecimento produzido durante o doutoramento, em alguns programas doutorais, é certificada não só pela comissão científica de cada curso, mas também pela avaliação por pares. Na FCT, FCM e Nova SBE, a publicação de artigos baseados na pesquisa de doutoramento, antes da aceitação do pedido de defesa da tese, é formalmente necessária.

Algumas das medidas aplicadas nos últimos anos aos doutoramentos na UNL, vêm ao encontro de alguns documentos internacionais que se debruçaram sobre este tema. Dos documentos emanados por organizações internacionais destaca-se o publicado em 2011, pela “Organisation for PhD Education in

Biomedicine and Health Sciences in the EUropean System (ORPhEUS)” relativo a indicadores de qualidade para

os doutoramentos permitindo assim que as universidades tenham um referencial de qualidade. Neste documento, o artigo 1.º refere-se a indicadores de qualidade do ambiente de pesquisa doutoral, o artigo

100Em algumas Universidades, a orientação científica é levada a cabo por um supervisor experiente que poderá ter como

coadjuvante um supervisor menos experiente (Berry; 2013). Na Austrália os supervisores têm que ter cursos de supervisão e um tempo de prática (hands-on) com um supervisores mais experientes, antes de orientarem doutorandos como orientadores

2.º aos programas de doutoramento, o artigo 3.º à supervisão do doutoramento, o artigo 4.º às teses de doutoramento, o artigo 5.º é específico para a área da organização, referindo-se a programas de doutoramento de especialização clínica combinados, e o artigo 6.º às perspectivas dos estudantes (Document approved by the ORPHEUS Executive Committee, Prague 12 October 2011 e retirado de www.orpheus-med.org em 2 Julho de 2018.)

O artigo 4.º é muito importante, para este trabalho, uma vez que se refere indicadores de qualidade relativos à supervisão doutoral destacando-se a clarificação das qualificações para se ser supervisor, bem como das regras e regulamentações da sua actividade e ainda das responsabilidades dos supervisores e das instituições participantes. Neste artigo pode ler-se: “Effective supervision and a two-way process between supervisor and student are important factors in a successful PhD programme. The PhD supervision can be described at various levels, where the following quality indicators seem to be of primary importance:

• Clearly defined qualifications for faculty staff to be supervisor and the extent to which supervisors are formally authorized according to local rules or regulations.

• The formal requirement(s) for becoming a primary or main PhD supervisor include formal qualifications (PhD or equivalent) plus expertise in the specific field, affiliation to an eligible institution, research funding.

• The responsibilities of a supervisor, as indicated by the extent to which the supervisor gives advice on the project, monitoring and documenting of the progress, taking care of ethics and proper scientific conduct, support for further career development of the PhD candidate.

• The relationship between the supervisor and the PhD candidate as indicated by regular meetings, availability for consulting, provision of constructive feedback, respect for academic autonomy of the PhD candidate, and promotion of personal development.

• The efficiency, effectiveness and sustainability of the supervision process as indicated by the number of PhD students enrolled, and number of theses finalized successfully within the assigned period. The number of papers (and impact factor) published by supervised PhD students

• Availability of formal courses for supervisors and the extent to which supervisors take these courses.

• The use of a “thesis committee” as advisors to the PhD student and the supervisors regarding the development of the PhD project.”

Podendo verificar-se pela leitura de documentos oficiais, que algumas destas recomendações já estão a ser aplicadas na UNL, mas outras ainda não foram aplicadas.

Parte II| Estudo empírico. A supervisão doutoral na Universidade Nova de Lisboa

Tabela 27 Informação extraída dos regulamentos das escolas da UNL (http://www.unl.pt/escolas/escolas).(Elaboração própria).

UNL Schools

Orientação científica Comisssão de acompanhamento/de tese Elaboração do relatório anual do trabalho de pesquisa doutoral

Regulamentos

Professores Investigadores (com

doutoramento) Peritos na área

Investigadores com experiência

Definição da

Composição Funções / objetivos Frequência de encontros Relatórios de monitorização Estudante Supervisor

FCT

x

x

x

x

x

x

n.º 905/2010 e n.º 209/2014

FCSH

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n.º 438/2008

Nova

SBE

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x

nº 488/2010

FCM

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n.º 320/2015 e n.º 8774/2015

FD

Regulação aprovada em 21/05/2014

IHMT

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n.º 474/2012 e n.º 761/2015

Nova

IMS

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n.º 287/2010

ITQB

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n.º 269/2008

ENSP

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Aviso n.º 21553/2008

1. Evolução do número de alunos inscritos e diplomados