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Educar jovens pesquisadores, desenvolver competências em fases iniciais do seu percurso investigativo é crucial para um caminho de sucesso. Este percurso é marcado pelo entendimento que os supervisores têm das competências supervisivas que possuem e do seu entendimento de processos de aprendizagem que ocorrem durante o tempo de supervisão. Alguns modelos de supervisão focam não só o processo mas os procedimentos inerentes a uma supervisão de estudantes. Partilham geralmente conceitos como estabelecimento de relações, conhecimentos-bàsicos dos estudantes, o processo de treino e de aprendizagem durante o processo de pesquisa (Ismail, Abiddin, Hassan & Ro’is, 2014). O relacionamento entre supervisor e estudante deve ser construído com base numa boa comunicação, na confidencialidade e gerindo as expectativas. O estudante concorda com os objetivos e os “Outputs” introduzidas no processo pelo supervisor.

5.1 A supervisão doutoral

A alteração dos contextos políticos e económicos nas sociedades, nos anos oitenta e noventa do século XX, em países como os Estados Unidos da América, Canadà, Austràlia, Noruega, Finlândia e Grã- Bretanha, impuseram alterações nos estudos doutorais e desafios às Universidades. Alguns desses desafios são por exemplo, a implementação da avaliação nos programas doutorais, o enfoque no trabalho de supervisão da pesquisa doutoral, a avaliação do processo de supervisão, a avaliação e monitorização das publicações, as taxas de submissão de publicações bem como a definição externa de padrões de qualidade para os programas doutorais e investigativos (Park, 2005).

Um dos desafios que enfrentam tanto as universidades como os supervisores é a diversidade de estudantes doutorais (Alves & Azevedo, 2010). A presença de estudantes maduros48, por vezes designados

por lifelong learners ou hobby PhD students, não só em ciências sociais e humanas mas também em ciências da

48 No original Mature students. A noção “Mature studentes” contrapõe-se à de “novice”. Tal como Filery-Travis e Robinson (2018) referem

o estudante maduro “ is no longer a novice but brings with them expert knowledge of their professional field of their enquiry and the ontology/ epistemology operating with it”. Tradicionamente um estudante de doutoramento é considerado um novice “irrespective of competence or experience” (Filery-Travis & Robinson, 2018).

saúde, cujo perfil é diferente do estudante tradicional, uma vez que executam o doutoramento nos tempos livres ou a meio-tempo é um desafio para os sistemas de educação superior tradicionais (Salzburg, 2005; Lee, 2009 a e b; UK Council for Graduate Education, 2009; Alves & Azevedo, 2012; Baptista, 2014 e 2015; Severinsson, 2015). Esta nova situação levou a uma reflexão sobre quais eram os objetivos dos doutoramentos: preparar e treinar investigadores ou preparar e realizar treino vocacional ou ainda ser a continuação de uma aprendizagem ao longo da vida. A diversidade de estudantes com diferentes expectativas, necessidades, preocupações e interesses levou ainda a uma reflexão sobre a eficàcia, os direitos, as responsabilidades e a preparação que efetivamente os doutoramentos dão, mas também ao repensar de práticas de supervisão (Green, 2005; Lee, 2009 a e b; Lee & Green, 2009; Halse & Malfroy, 2010; Maxwell & Smyth, 2010 e 2011; Lee & McKenzie, 2011; Lafont, 2014; Baptista, 2015; Mello, Fleisher & Woehr, 2015; Severinsson, 2015). Neste contexto é importante saber como os estudantes fazem a sua aprendizagem numa situação que já não inclui a sala de aula, onde predomina a sua interação com outros (trabalho colaborativo), que pode ou não ocorrer num determinado local e que envolve sempre seleção e processamento de informação, a autonomia e autorregulação do estudante.

A partir de trabalhos de pesquisa foi possível identificar três aspetos que influenciam o processo de construção do conhecimento durante o doutoramento. O primeiro é o modo como o supervisor lida com a criatividade, percebe a metacognição, desenvolve a meta comunicação, propõe formas/ideias para alcançar os objetivos (sabe como selecionar e resolver problemas) encorajando e estimulando os estudantes (Kam, 1997; Gatfield, 2005; Wolf 2010; Bengtsen, 2011; Lonka & Heiskanen, 2012). O segundo é a necessidade de mecanismos que garantam que o estudante faz progressos e desenvolve a auto eficàcia (Coutinho, 2007; Overall et al., 2011; Pyhältö et al., 2012). O terceiro é a relação que é estabelecida entre o supervisor e o estudante, que implica a integração e envolvimento do estudante no ambiente de investigação e supervisão e o entusiasmo para ouvir, argumentar e debater (Kyvik & Smeby, 1994; Heath, 2002; Denicolo, 2004; Mainhard et al., 2009; Halse 2011; Christensen & Lund, 2014; Määttä, 2015; Olehnovica, Bolgzda & Kravale- Pauline, 2015; Hunter & Devine, 2016).

Alguns dos pontos fracos encontrados nestas investigações sobre supervisão doutoral foram: o tempo de conclusão; a qualidade dos programas doutorais; a forte dependência da conclusão do doutoramento da relação que se estabelece entre estudante e supervisor; a impreparação a nível educacional, metacognitivo e comunicacional dos supervisores; o reduzido número de comunicações, indicativo da não inclusão ou integração do estudante no seio da comunidade de investigadores ou na cultura investigacional (Deem, & Brehony, 2000; Lee et al., 2008). Deve ainda ser realçado o facto de que, as competências que os estudantes deveriam de ter antes de iniciarem um doutoramento (Lee, 2009 a e b; Baptista & Huet, 2012) e a aquisição de competências e níveis de desenvolvimento cognitivo dos mesmos após completarem o doutoramento pode ser desigual para diferentes programas de doutoramento e diferentes processos de supervisão (King & Kitchener, 2004; Olehnovica et al, 2015; Mello et al, 2015).

A supervisão é um processo inter-relacional, que inclui factores internos e externos, bem como individuais, que se desenvolve entre supervisor e estudante e depende de como gerem a sua relação. O supervisor deve criar e manter uma atmosfera criativa, e produtiva e providenciar mecanismos para resolução de problemas que poderão surgir da pesquisa, sendo por isso importantes as competências de supervisão (Ismail, Abiddin, Hassan & Ro’is, 2014).

5.2 A Supervisão da pesquisa durante o doutoramento, no contexto português

A supervisão doutoral pode ser identificada no contexto português com a orientação de estudantes que estão a realizar doutoramentos, podendo somente ser referido que esta ocorre durante a execução da pesquisa doutoral. O que se faz (orientador e orientando) durante este período, que estratégias são aplicadas, como é monitorizada e avaliada pelos intervenientes e pela instituição, como são ajudados/suportados pela instituição os doutorandos ou os orientadores, são alguns dos temas de que se sabe pouco e urge conhecer. Esta necessidade surge não só porque estamos inseridos na União Europeia, mas sobretudo porque numa sociedade que se pretende desenvolvida, que pretende uma educação de qualidade tal só acontecerà se os métodos, estratégias e práticas de ensino forem públicos e a avaliação dos conhecimentos adquiridos e/ou das competências desenvolvidas bem como os seus critérios forem transparentes.

Em Portugal foram publicados nos últimos dez anos alguns artigos sobre a educação pós bolonha onde se reflecte um pouco sobre a educação doutoral em contextos específicos (doutoramentos em Ciências da Educação) (Alves, Neves, Azevedo & Gonçalves, 2010), sobre o processo de supervisão durante o doutoramento, as expectativas, as limitações e as dificuldades encontradas pelos estudantes portugueses durante o período do doutoramento, que práticas de supervisão vivenciam ou que capacidades e que competências os alunos efetivamente desenvolvem ou percepcionam desenvolver durante este período (Azevedo, 2012; Baptista & Huet, 2012; Baptista, 2014; Baptista, 2015). Em 2013 Ana Baptista, orientada por Isabel Huet, defendeu uma tese de Doutoramento intitulada “Qualidade do Processo de Supervisão da Investigação Doutoral: Desenho de um referencial para a sua avaliação e monitorização”, cujos objectivos são no dizer da autora “construir um referencial de qualidade do processo de supervisão da investigação doutoral, em particular na ‘corporização’ dos perfis de qualidade dos dois mais importantes intervenientes - supervisores e estudantes de doutoramento – pela identificação de competências transversais às mais variadas áreas disciplinares.” Neste trabalho é apresentado um referencial de qualidade da supervisão da investigação doutoral (Baptista, 2013: 499). Contudo há pouco conhecimento sobre o que realmente se faz na supervisão doutoral, que práticas/ estratégias são utilizadas, como se monitoriza a supervisão e como se avalia a supervisão. Que paradigma(s)49 tem subjacente a supervisão doutoral em Portugal e como é que esta

é operacionalizada?

49Paradigma- palavra do latim tardio, provém do grego παράδειγμα, derivado de παραδείκνυμι que significa “mostrar, apresentar,

confronta”. Neste contexto considera-se, tal como Khun que "um paradigma, é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em pessoas que partilham um paradigma", sendo importante para a comunidade científica "o estudo dos paradigmas como o que prepara basicamente o estudante para ser membro da comunidade

Na legislação da República Portuguesa as referências à orientação são escassas (artigo 23.º do decreto Lei 216/92 de 13 de Outubro de 1992) limitando-se a mencionar a obrigatoriedade do orientador entregar um “relatório escrito sobre a evolução dos trabalhos do candidato.” No que se refere ao que se espera do supervisor do projeto doutoral, o decreto-Lei nº 216/92 de 13 de outubro refere somente que “O orientador informará, anualmente, o órgão competente da universidade, por meio de relatório escrito, sobre a evolução dos trabalhos do candidato” (capítulo III, artigo23º).

Em Portugal não foram encontrados muitos estudos sobre supervisão doutoral como já foi referido. Destacando-se a tese de doutoramento de Baptista (2013) realizada na Universidade de Aveiro, cujo tema principal é a qualidade da supervisão doutoral.

Neste contexto, o presente trabalho de investigação visa construir conhecimento sobre a supervisão doutoral em Portugal, focando-se numa instituição do ensino superior, a Universidade Nova de Lisboa, uma vez que cada instituição tem autonomia, mas também porque a Legislação da República Portuguesa, remete para as instituições a definição de normas relativas ao “ Processo de nomeação do orientador ou dos orientadores, condições em que é admitida a coorientação e regras a observar na orientação” (alínea c), do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 115/2013 de 7 de agosto, atualmente em vigor.

científica na qual atuará mais tarde" (Khun, 1978). Um paradigma define um modelo de algo, sendo uma representação de um padrão, uma teoria (conhecimento) ou realização científica com métodos e valores a ser seguidos que são concebidos como modelo;