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Por meio da arte, subentende-se que é possível revelarem-se significados, modos de criação e comunicação sobre o mundo da natureza e da cultura.

Para compreender melhor o papel da disciplina no ensino médio e sua integração na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, é preciso enfatizar que a arte é considerada como linguagem, e, como tal, uma forma de comunicação humana, impregnada de valores culturais e estéticos. Por isso, na concepção de alguns autores, a arte não deve ser entendida no quadro de parâmetros puramente lingüísticos mas, como diz Pierre Francastel, “em sentido mais amplo” e envolvendo múltiplas relações. Isso fica evidente nas palavras do ensaísta Omar Calabrese, ao afirmar que

[...] do ponto de vista teórico, as análises do campo do espetáculo, da fotografia, da publicidade, dos objetos e da arquitetura devem acertar as contas com o tema do iconismo, da multiplicidade dos códigos, dos ‘estilos’, dos gêneros, do texto. (1987, p. 147)

Existem algumas interseções entre a estrutura da linguagem poética e a estrutura de outras linguagens – como a publicitária, por exemplo. Logo, partindo dos mesmos sistemas de investigações de linguagens da arte, é possível analisarem-se diferentes formas. Por outro lado, há particularidades próprias de cada linguagem – o que pode ser percebido nitidamente quando distinguimos, por exemplo, comunicação publicitária de comunicação artística. No dizer de autores como Gombrich, o que distingue a arte de um trabalho publicitário é que este indica um único caminho interpretativo. Já na produção artística, várias são as interpretações possíveis, dependendo da época ou de cada indivíduo, sua história, suas experiências socioculturais e estéticas.

Conhecer arte é saber produzir, apreciar e interpretar formas artísticas e culturais em uma dimensão crítica e contextualizada, segundo os sistemas simbólicos que integram cada linguagem própria da arte.

As linguagens artísticas constituem-se de sistemas de signos – como os visuais, sonoros, corporais – que percebemos como elementos próprios das linguagens e são compreendidos nas criações simbólicas. Deste modo, a imagem visual pode ser decomposta em elementos icônicos e plásticos. Tais elementos também são aspectos do signo visual, que se consolida nas relações entre a forma, o significado e a matéria. Os signos não-verbais podem modificar-se de acordo com a época, cultura ou região, mas existe uma universalidade característica de todos eles.

• Tomando como exemplo o signo gestual, observa-se que existem diferenças em sua apresentação de acordo com o período histórico ou os países, mas todos os seres humanos podem se comunicar com gestos, ainda que de forma rudimentar.

• Com relação ao signo sonoro, convém fazer uma ressalva: quando estamos tratando da música e seus aspectos expressivos, podem encontrar-se efeitos de sentido decorrentes de categorias técnicas presentes na sua construção. Por exemplo, uma oposição de ritmos acelerados ou com desaceleração pode

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produzir sensações de euforia ou introspecção.

• Nas canções, poderemos encontrar a articulação do signo lingüístico (palavra) e a simbologia referente a ele na melodia. Assim, uma canção romântica tem a melodia articulada ao romantismo da letra.

Ressalte-se que as modalidades artísticas podem ser consideradas separa-damente ou articuladas entre si.

• O espetáculo teatral, por exemplo, além da linguagem dramática inclui a corporal, a visual (luz, tridimensionalidade), assim como efeitos sonoros (com a eventual incorporação de sistemas audiovisuais), chegando até a se constituírem poéticas de encenação.

• Um exemplo de espetáculo que integra várias modalidades artísticas é Parade, obra que foi exposta em São Paulo (2001/2002), no Parque do Ibirapuera, em um conjunto arquitetônico projetado pelo arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer, Pavilhão Lucas Nogueira Garcez, conhecido como Oca. O tratamento cenográfico dado à mostra fez com que o imenso pano de boca de cena (pintado por Picasso em 1917, para o balé Parade) se integrasse plenamente à arquitetura, constituindo com ela um todo artístico.

Além da imensa cortina de 160 m2, Picasso criou também os cenários e figurinos. Com música de Erik Satie (suíte de peças para orquestra, da qual fazem parte sons de máquinas de escrever, sirene, piano...), direção de Serge Diaghilev e coreografia de Léonide Massine, Parade é um marco na história da arte moderna. O projeto inicial é de Jean Cocteau, também autor do “poema cênico” original, como lembra Anne Guillemet, no catálogo da exposição:

O “balé moderno” de Cocteau tem como tema a festa popular parisiense. As personagens interpretadas pelos dançarinos são artistas saltimbancos que desfilam em parada diante de uma barraca, convidando os curiosos a assistir ao espetáculo no interior. [...] a cortina pintada pelo artista aparece ao público no início e no fim do espetáculo, acompanhado por um ‘prelúdio à cortina vermelha’, cujo tema era retomado no final do balé. [...] os cenários e os trajes de Parade provêm de outra linguagem, integrando construções cubistas [...] (Parade. São Paulo: 2001. p. 285)

• Outro exemplo de articulação entre as linguagens de arte são as criações artísticas desenvolvidas com tecnologias digitais, que integram imagens, sons, movimentos em processos virtuais – e, por vezes, interativos –, abrindo espaços para novos entendimentos culturais e estéticos.

Em situação escolar, pode-se pensar em projetos de arte que incluam exposição dos trabalhos para a comunidade – por exemplo, no campo das artes visuais. Nesse caso, será necessário o estabelecimento de critérios para a seleção e exibição dos trabalhos elaborados, um projeto espacial da mostra, execução da montagem, da comunicação visual, organização de convites e divulgação. Tais projetos expandem a gama de saberes, competências e habilidades que habitualmente são mobilizados na escola, aproximando das práticas sociais as práticas docentes.

Essas idéias estão contempladas nos Parâmetros Curriculares Nacionais, que indicam o uso das linguagens como um saber a ser desenvolvido e aprofundado em diferentes situações ou contextos – como nas práticas socioculturais –, incluindo os interlocutores, ou seja, públicos. Considerando a linguagem como produção humana, entendida ao mesmo tempo como produto e produção cultural, os PCNEM destacam “seu caráter criativo, contraditório, pluridimensional, múltiplo e singular, a um só tempo” (p. 125).

Conhecer a complexidade da arte é essencial para que os alunos participem criticamente das manifestações culturais – aqui analisadas sobretudo em seu recorte estético.

É necessário, para tanto, que o ensino de Arte articule conceitos, procedimentos e valores, no exercício das competências que levarão os estudantes ao fazer, ao fruir e ao refletir sobre arte, respeitando a natureza intrínseca desse campo do conhecimento.