• Nenhum resultado encontrado

Transformar opiniões preconceituosas sobre a Educação Física constitui um enorme desafio para os professores da disciplina no ensino médio. No entanto, desenvolver um ensino inclusivo pode ajudar a superar o já referido histórico da disciplina – que, em muitos momentos, pautou-se por selecionar indivíduos aptos e inaptos. Deve-se levar em conta também que, mesmo alertados para a exclusão de grande parte dos alunos, muitos professores apresentam dificuldades em refletir e modificar procedimentos e atividades excludentes, devido ao enraizamento de tais práticas.

Quando o professor desenvolve efetivamente uma atitude inclusiva? Quan-do apóia, estimula, incentiva, valoriza, promove e acolhe o estudante.

Todos os alunos precisam ouvir de seus professores: – Você pode! Incentivo este que não precisa ser expresso necessariamente por palavras, mas por atitudes de ajuda efetiva.

Por sua posição, o professor exerce grande influência sobre os alunos: a forma como os vê interfere não só nas relações que estabelece com eles, mas também na construção da auto-imagem de cada estudante. Se o professor não acredita que o aluno possa aprender, acaba por convencê-lo disso. Mesmo que não explicite verbalmente, sua forma de agir, suas expressões, seu tom de voz podem conter mensagens que dizem muito.

Cabe ao professor valorizar todos os alunos – independentemente de etnia, sexo, registro lingüístico, classe social, religião ou nível de habilidade – assim como favorecer discussões sobre o significado do preconceito, da discriminação e da e x c l u s ã o . A s s i m , o p ro c e s s o d e e n s i n o e d e a p re n d i z a g e m s e e n r a í z a n o esclarecimento sobre as diferenças e na compreensão e no entendimento destas pelos jovens e adultos. As estratégias escolhidas devem não apenas favorecer a inclusão, como também discuti-la e torná-la clara para os alunos.

Alguns estudantes podem não ter tido anteriormente oportunidades adequadas de participar de atividades de movimento mais sistematizadas e organizadas, quer em jogos, esportes, lutas, ginásticas, quer em atividades rítmicas e expressivas. Nessas circunstâncias, desempenho e eficiência não devem ser radicalmente determinantes.

Educação Física

153

As lembranças, positivas ou negativas, que os alunos trazem sobre as aulas de Educação Física devem servir como ponto de partida do programa no ensino médio. Por isso, ressalta-se a necessidade de fazer uma sondagem junto aos alunos sobre suas experiências anteriores, com o professor como mediador, garantindo espaço para que todos participem ativamente da aula, expondo seu pontos de vista e oferecendo sugestões.

Contextualização

De acordo com os PCNEM, o tratamento contextualizado é o recurso de que a escola deve lançar mão para retirar o aluno da condição de espectador passivo do processo de conhecimento. Ao longo da transposição didática, o conteúdo contextualizado propicia aprendizagens significativas que mobilizam o estudante, estabelecendo uma relação de reciprocidade entre ele e o objeto do conhecimento. É possível generalizar a contextualização como recurso para tornar a aprendizagem significativa ao associá-la a experiências da vida cotidiana ou a conhecimentos adquiridos espontaneamente. As visões, fantasias e decisões sobre o próprio corpo e a saúde, base para um desenvolvimento autônomo, poderão ser mais bem orientadas se as aprendizagens escolares estiverem relacionadas significativamente com as preocupações comuns na vida de todo jovem – preocupações como aparência, sexualidade e reprodução; hábitos de alimentação; limites, capacidade física; consumo de drogas; papel do esporte; repouso, atividade e lazer; padrões de beleza e saúde corporal impostos pela mídia e pelo contexto. Caberá ao professor de Educação Física reconhecer e estar atento a esses temas, revendo cientificamente a importância dessas questões e passando a tratá-las pedagogicamente em suas aulas, de modo a tornar a aprendizagem mais significativa para os alunos.

Em anos de Olimpíadas ou de Copas do Mundo, por exemplo, todos são submetidos a um bombardeio de informações sobre os jogos e os seus resultados. O p ro f e s s o r p o d e r i a a p ro v e i t a r e s s e s r i c o s m o m e n t o s p a r a a p ro f u n d a r o conhecimento dos alunos sobre os temas relacionados ao fenômeno esportivo.

Conhecer o corpo humano não é apenas saber como funcionam os muitos aparelhos do organismo, mas também entender como funciona o próprio corpo e que conseqüências isso acarreta em decisões pessoais da maior im-portância, tais como fazer dieta, utilizar anabolizantes, praticar exercícios físicos e exercer a sexualidade.

A atividade deve adequar-se ao aluno, e não o aluno à atividade. O professor que se mantiver rígido em atividades que não despertem nenhum interesse dos alunos termina por afastá-los da disciplina.

Interdisciplinaridade

A interdisciplinaridade deve ir além da mera justaposição de disciplinas, e deve evitar ao mesmo tempo a diluição delas em generalidades. Parte-se do princípio de que todo conhecimento mantém um diálogo permanente com os outros: a relação entre as

disciplinas pode ir da simples comunicação de idéias até a integração mútua de conceitos, da epistemologia, da terminologia, da metodologia e dos procedimentos de coleta e análise dos dados.

Nesta perspectiva é importante ressaltar que a interdisciplinaridade supõe um eixo integrador, que pode ser o objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um plano de intervenção. Desse modo, como afirmam as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio,

[...] a interdisciplinaridade deve partir da necessidade sentida pelas escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários. (p. 89)

A interdisciplinaridade deve estimular o aluno a ver a importância ou sentir a necessidade de recorrer a outras disciplinas para compreender aquela com a qual está trabalhando em determinado momento. Como já se assumiu no capítulo de introdução à área, imaginar que os alunos captem as relações porventura existentes entre as diversas disciplinas e as diversas áreas é ingenuidade. Por isso, também na disciplina de Educação Física deve-se prever a necessidade de indicar ou explicitar essas relações ou, no mínimo, disponibilizar recursos para que os alunos o façam.

Reitera-se que a interdisciplinaridade não invalida os contornos específicos de cada disciplina, até porque não se pode falar em interdisciplinaridade sem disciplinas, assim como não há internacional sem nações. Ela não se confunde com polivalência e, portanto, não anula o conhecimento específico nem o papel de cada profissional. A organização do currículo do novo ensino médio em áreas não pressupõe que o profissional seja um gênio e domine todos os conhecimentos de uma área, mas que entenda a relação de sua disciplina com as da mesma área e com todo o currículo.

Assim, a interdisciplinaridade e a contextualização são recursos para ampliar as inúmeras possibilidades de interação entre as disciplinas e entre as áreas nas quais as disciplinas venham a ser agrupadas.

Por exemplo, é possível estabelecer diversas relações entre saúde e atividade física pela integração das áreas de conhecimento em torno de um projeto interdisciplinar:

• A área de Ciências da Natureza pode subsidiar o conhecimento necessário à compreensão do funcionamento do corpo humano e propiciar o estabelecimento das relações entre alimentação e gasto energético;

• A área de Língua Portuguesa pode organizar, com os alunos, roteiros de entrevista para buscar informações de campo sobre práticas de atividade física entre a população da área: quantos a realizam, que tipo de atividade, os locais onde elas são praticadas, quantas vezes por semana ocorrem etc. Essas informações poderão subsidiar a produção de textos sobre o conhecimento adquirido, além, evidentemente, de enfatizar aqueles conceitos do eixo da Comunicação e Expressão necessários a uma leitura adequada da linguagem corporal;

• A Matemática poderia participar, colaborando na interpretação das informações coletadas e na construção de gráficos com os dados, o que também configura um exercício de leitura e produção textual, lato sensu, para os quais também concorrem os conceitos específicos da área.

Educação Física

155

Para além do esporte. Em função da ênfase esportiva, a Educação Física tem deixado de lado importantes expressões da cultura corporal produzidas ao longo da história do homem bem como o conhecimento sobre o próprio corpo. Tais expressões – as danças, as lutas, os esportes ligados à natureza, os jogos – e conhecimentos podem e devem constituir-se em objeto de ensino e de aprendizagem. Por exemplo, as danças podem estar presentes com mais freqüência nas aulas de Educação Física. Diferentes experiências demonstram que, especialmente quando se considera o interesse do jovem em diferentes ritmos e danças e seu conhecimento sobre eles, esse trabalho é bem-sucedido.

Como iniciar a abordagem? Para desenvolver o tema dança, um levantamento sobre informações e conhecimentos que estudantes de diferentes contextos e regiões do país já detêm sobre ritmos e danças poderia ser um excelente ponto de partida. Na condução do tema, o professor poderia também propor aos jovens fazer um levantamento das músicas mais ouvidas, assim como dos ritmos mais dançados pelo grupo – em casa, em festas, pelos pais, pelas garotas ou pelos rapazes etc. Os próprios alunos poderiam analisar esses dados em conjunto com o professor. Em seguida, cada grupo de alunos elegeria um estilo de dança que gostaria de conhecer de maneira mais aprofundada – forró, valsa, samba, capoeira, catira, frevo, entre outros.

Em geral, os professores de Educação Física sentem-se inseguros para de-senvolver temas que fogem dos aspectos ligados aos esportes tradicionais e ao ensino de suas técnicas.

Isto ocorre porque, durante sua formação profissional, estes eram os conhecimentos privilegiados, além do fato de muitos guardarem experiências positivas apenas em relação à prática dos esportes mais tradicionais. Na verdade, com auxílio de pesquisas, de depoimentos de pessoas da comunidade e com a incorporação da experiência dos próprios alunos, pode-se, em conjunto com os jovens, construir outros conhecimentos que avancem e aprofundem a compreensão da cultura corporal.

Como aprofundar os conhecimentos? Os alunos poderiam pesquisar sobre temas como a importância das danças para a cultura de um povo; do exercício e do movimento para o ser humano; do lazer para o exercício da cidadania. Essas pesquisas poderiam ser feitas em livros, jornais, revistas, vídeos, na internet, com outros professores, por meio de entrevistas com cidadãos da comunidade etc. Num segundo momento ou concomitantemente, os membros de cada grupo poderiam vivenciar o estilo de dança pelo qual optaram. O trabalho final poderia ser apresentado em forma de dramatização, incluindo o contexto do estilo de dança estudado pelo grupo, em textos verbais que contextualizassem historicamente o estilo escolhido ou em painéis com fotos e sínteses da pesquisa. Além disso, poderiam apresentar o resultado da experiência em coreografias simples para a própria turma ou em outros eventos.

Ampliando o trabalho. Esse trabalho pode ser ampliado, transformando-se num projeto interdisciplinar. As relações com Arte são por si evidentes; a Sociologia poderia desenvolver o conhecimento do contexto sociocultural e das construções culturais ligadas às diferentes modalidades de dança. A Filosofia poderia colaborar tratando dos significados e sentidos subjacentes à expressão veiculada pela dança. Na Biologia, poderiam ser explicitadas as dimensões biológicas do homem que se movimenta, os sistemas muscular, respiratório e cardíaco. A História poderia desenvolver o contexto de surgimento e as transformações das diferentes manifestações ligadas às danças. Com Língua Portuguesa, poder-se-ia estabelecer uma relação entre estilos literários e danças.

Na elaboração dos projetos escolares, a via de integração não é única, isto é, as demais áreas também podem se valer dos temas básicos da disciplina, buscando se integrar de forma eficiente com as questões afeitas à Educação Física.

A construção do projeto