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A ECONOMIA DO SETOR PÚBLICO TRADICIONAL

4.2. O Modelo de Greenwald-Stiglitz

Partindo da crítica a modelos que se baseiam na presença de informação perfeita, Greenwald e Stiglitz desenvolvem um modelo para analisar as externalidades provenientes da presença de informação imperfeita. Segundo os autores, uma das principais forças desse modelo viria de sua natureza mais ampla, que abrangeria, inclusive, o “caso excepcional” do modelo de Arrow-Debreu:

“The new theory has had to look for more primitive, more fundamental notions of equilibrium, notions for which, under traditional assumptions of perfect information, it can be proved that equilibrium is characterized by market clearing and unique prices”

112 Nesta seção, apresentaremos as principais características do modelo de Greenwald-Stiglitz107, para, então, analisar as principais manifestações do problema de informação assimétrica em uma economia real, bem como as propostas de intervenção do Estado.

No modelo desenvolvido pelos autores, as famílias (households) são maximizadoras de utilidade, sujeitas à seguinte restrição:

j J hj h h h q x I d x1    

 sendo:  x ,h xh

1 - os vetores de consumo do consumidor h, sendo o primeiro o do

consumo do bem numerário e o segundo o dos N-1 bens não numerários;

q – o vetor de preços dos bens não numerários;

 - os lucros da firma j; j

h

I - uma transferência lump sum do governo para o consumidor h ;

dhj - fração da propriedade da firma j pelo consumidor h (sendo

1 

H hj d )

Os autores assumem, ainda, a presença de um vetor zh, que representa outras

variáveis que afetam a utilidade do consumidor família h108. A função de despesa da família h, que representa a despesa mínima necessária para a obtenção da utilidade uh,

é dada por: ) , , ( h h u z q E

As firmas, por sua vez, maximizam a seguinte função de lucros:

j j j y p y    1  onde:

107 A apresentação simplificada do modelo na presente seção é baseada no artigo original dos autores:

Greenwald e Stiglitz (1986).

108 Conforme esclarecem Greenwald e Stiglitz (1986:236), as externalidades não-pecuniárias

(poluição,  qualidade  média  dos  produtos  consumidos,  etc.)    geralmente  “entram”  na  função  de  utilidade   do  indivíduo  na  forma  de  “variáveis   z”.  Trata-se de fatores que afetam a utilidade do indivíduo, mas que não dependem diretamente das suas decisões (como, por exemplo, o comportamento dos demais indivíduos  ou  os  “custos  de  busca”  em  uma  situação  de  informação  imperfeita).

113

j j

y

y ,1 - o vetor de produção da firma, em que

j

y1 é o vetor de produção do bem numerário e yj é o plano de produção dos N-1 bens não numerários ( j 0

K

y representa um insumo)

p – vetor de preços dos produtores para os N-1 bens não numerários

Analogamente, os autores assumem a presença de um vetor zj que representa

outras variáveis que afetam a firma j, sendo a função de maximização de lucros da firma dependente também desse vetor:

*j (p,zj)

Por fim, o governo é caracterizado por não produzir nada, coletar impostos e, posteriormente, distribuir os recursos arrecadados. A receita líquida do governo é, portanto,

   H h I x t R

onde t é a diferença entre q (preço do consumidor) e p (preço do produtor), t =(q - p) e x é o somatório do consumo dos bens não numerários.

O equilíbrio, na ausência de impostos (ou seja, quando p=q) e, consequentemente de compensações (I=0), é dado por:

J j z p y z I q x( , , ) ( , ) (p=q)

A equação acima é a condição de demanda igual à oferta.

Os autores afirmam, então, que um teste simples de eficiência desse equilíbrio é questionar se haveria um conjunto de impostos/subsídios e transferências

lump sum que :

i) Deixariam as famílias com a mesma utilidade do equilíbrio competitivo;

ii) Aumentariam as receitas do governo.

Se esse conjunto de impostos/subsídios existir, o equilíbrio do mercado livre não é Pareto-eficiente. Isso porque, após esta intervenção, todas as famílias

114 permanecem com a utilidade inalterada, enquanto a situação de um dos agentes melhorou   (o   “governo”). O problema então pode ser analisado desenvolvendo a maximização das receitas do governo, sujeito à restrição proveniente do equilíbrio competitivo:

   h h I x t R max (1) s.a. h hj j h( , h, h) u z q E d I

  (2)

Note que, nesse caso, zh

, zj,  , p e q são funções de t e I; j u , por sua vez, h

representa a utilidade do indivíduo h no equilíbrio competitivo.

O lado esquerdo de (2) representa, como vimos, a função de despesa da família h e o lado direito,   o   somatório   de   duas   “receitas”:   a   compensação   que   a   família recebe do governo após a intervenção (Ih) e o lucro proveniente de sua fração

de propriedade da firma j (

dhjj). A ideia por trás dessa restrição é que, para que

a intervenção seja qualificada como uma melhora de Pareto, ela não pode diminuir a utilidade de nenhuma das famílias. Assim, o nível de utilidade pré-intervenção (u ) h

deve ser preservado, o que poderá requerer uma compensação monetária (Ih) por parte

do governo (suponhamos que um imposto seja implantado, o que diminui os lucros da firma j e aumenta os custos do consumo para a família h. Para poder adquirir a mesma cesta de consumo que a família adquiriria no equilíbrio sem a intervenção, a sua renda, que foi comprometida pelo imposto, deverá ser suplementada por uma compensação do governo).

Se o equilíbrio competitivo no mercado livre for Pareto-eficiente, não há nenhuma intervenção do governo na economia que possa ser caracterizada como uma melhora de Pareto, ou seja,

t* = 0

Os autores então desenvolvem o sistema de equações buscando demonstrar quando o equilíbrio competitivo é Pareto-eficiente, ou seja, quando a solução de (1) leva a t=0. Após uma série de procedimentos109, os autores chegam ao seguinte conjunto de equações:

115 ) ( t t B dt x d t dt dR (3) Onde: dt dzj J j z t

  (4)

H h h z t dt dz E B (5)

Já vimos que, segundo Greenwald e Stiglitz(1986), para que o equilíbrio competitivo seja Pareto-eficiente, t*=0. Para que isso se confirme, devemos ter:

0 

dt dR

(6)

Isso porque, no equilíbrio competitivo, não há nenhuma intervenção do governo na economia que seja Pareto-eficiente. Nesse caso, o governo não irá intervir na economia e sua receita líquida será igual a zero (consequentemente, a derivada em (6) será igual a zero).

Ademais, como t = 0, o primeiro termo do lado direito de (3) – dt

x d

t  - será igual a zero. Então, no equilíbrio competitivo:

0 )

(tBt (7)

Os autores concluem, assim, que a eficiência de Pareto do equilíbrio competitivo depende diretamente da ausência de qualquer z que se altere com os impostos/subsídios e, consequentemente, afete os lucros das firmas (representada pelo termo ) e/ou as utilidades dos consumidores (representada pelo termo Bt). A

existência dessas externalidades “will make the initial equilibrium inefficient and

guarantee the existence of welfare-improving tax measures” 110 (Greenwald e Stiglitz, 1986:237).

110 Exceto no improvável caso em que se cancelem. t

116 Mais do que fornecer a base para a afirmação de que, na presença de externalidades, o equilíbrio competitivo não é Pareto-eficiente, o conjunto de equações (3), (4) e (5) expressos acima permitiria o cálculo do conjunto de impostos/subsídios ótimos. Como para atingirmos o ótimo de Pareto, , então os níveis ótimos poderiam ser expressos por:

) ( t Bt dt x d t          (8) 1 ) (            dt x d B t t t (9)

O lado direito de (8) representa os benefícios provenientes da redução das externalidades, enquanto o lado esquerdo representa o peso-morto associado com a distorção que a tributação gera no consumo. O ponto ótimo é dado pela igualdade entre o ganho marginal da redução de externalidade e a perda marginal de peso morto do imposto (Greenwald e Stiglitz, 1986:238).

As equações (8) e (9) embasam o desenho de intervenções ótimas do Estado na economia na presença de externalidades, segundo Greenwald e Stiglitz. Desse modo, ao analisarmos as formas mais comuns pelas quais o problema de informação imperfeita se manifesta no mercado, retornaremos recorrentemente a esse conjunto de equações para avaliar a viabilidade/desejabilidade de uma intervenção do Estado no mercado.

Notamos, uma vez mais, que, na ausência de externalidades (zh

=zj = 0),

então (tt)0

B e, consequentemente, 0

dt dR

. Logo, tal como estabelecido no modelo de Arrow-Debreu, em um mercado sem externalidades, o equilíbrio competitivo é Pareto-eficiente e, portanto, não há necessidade de intervenção do Estado na economia.

O modelo corroboraria, assim, a visão anteriormente apresentada de Stiglitz de que as conclusões do Primeiro Teorema do Bem-Estar somente se sustentam em condições restritivas, ou seja, na ausência de externalidades. Contudo, na visão de Stiglitz, essas externalidades manifestam-se de modo recorrente na forma de informações imperfeitas:

0 

dt dR

117

“(…)   there   may   be   situations,   particular   markets,   in   which   information costs are low, and in which the traditional theory does apply: the Law of Supply and Demand and the Law of the Single Price remain valid. Our contention is only that there are many situations where information costs are significant, and where the nature of the market equilibrium is, as a result, significantly altered. To understand consumer and firm behavior in these situations and to understand the consequences of various kinds of governmental intervention requires an explicit analysis of how information affects the  market  equilibrium” Stiglitz (1985a:30).

Nas subseções seguintes deste capítulo, analisaremos as principais situações nas quais o problema de informação imperfeita se manifesta, além de suas diferentes formas. Ao final de cada análise, procederemos a uma aplicação do modelo de Greenwald-Stiglitz apresentado, visando justamente a entender as formas pelas quais a intervenção governamental apregoada pelos autores afetaria o equilíbrio de mercado, resultando, teoricamente, em uma alocação de recursos mais eficiente:

“(...) economies in which there are incomplete markets and imperfect information are not, in general, constrained Pareto efficient. There exist government interventions (e.g. taxes and subsidies) that  can  make  every  one  better  off” (Greenwald e Stiglitz,

1986:230).

4.3. Principais fontes de assimetria de informação