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Diversos autores do campo da Saúde Coletiva apresentam formulações sobre os

modelos de atenção ou modelos assistenciais (PAIM, 2002; MERHY, 1997, 1998;

CAMPOS, 1992; SCHRAIBER, 1990) afirmando que estes representam um ideário sócio-historicamente situado e orientam os sistemas de saúde. No caso brasileiro, o SUS apresenta princípios e proposições que defendem a emergência de dada consciência sanitária, a participação cidadã e a vinculação da saúde com lutas políticas e sociais mais amplas (PAIM, 1997).

Para MERHY (1998), um modelo de atenção se refere aos modos como a sociedade e o Estado desenvolvem e utilizam tecnologias para produzir e distribuir ações de saúde. Estes modelos se materializam e conformam nos micro-espaços e no cotidiano dos serviços, expressando-se por um conjunto de processos de trabalho e de práticas de saúde. A análise destes modelos deve levar em consideração os seguintes aspectos: as concepções de saúde em vigor, os saberes/instrumentos/trabalhadores que estão envolvidos, e as disputas presentes no contexto sócio-histórico (MERHY, 1998).

Nessa mesma linha, PAIM (2002: 374) concebe que o “modelo de atenção é

uma dada forma de combinar técnicas e tecnologias para resolver problemas de saúde e atender necessidades de saúde individuais e coletivas”. Este autor também ressalta

que os modelos de atenção não se constituem enquanto um padrão. Eles representam uma racionalidade, uma razão de ser, ou seja, uma lógica orientada para a ação.

PAIM (2002:338) identifica 3 concepções de modelos assistenciais ou modelos de atenção, correspondendo a: “(1) uma noção genérica oficial, que enfatiza a

organização de serviços, a gestão e o planejamento (em documentos oficiais); 2) uma

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Neste texto optamos por utilizar o termo modelo de atenção em detrimento de modelo assistencial, apesar dos mesmos serem tomados como sinônimos por autores que discutem o tema (PAIM, 2002). Para CANDEIAS (1992) a substituição do termo assistência pelo termo atenção partiu de uma leitura ideológica sobre a passividade dos usuários reportada ao termo assistência não condizente com novas ações no campo da Saúde Pública. Pretendeu-se com o novo termo, delimitar novas ações mais adequadas ao novo ideário discursivo. Fazemos, entretanto, uma ressalva a essa questão lembrando, inclusive, dos marcos jurídicos do SUS, nos quais a noção de assistência é incorporada e representa um dos componentes da noção de atenção, visto esta última englobar a promoção, a proteção, e a recuperação (assistência e a reabilitação) em saúde (Lei 8080/1990).

noção mais ampla, que reconhece intermediações entre o técnico e o político (em Gastão Campos Wagner); 3) uma noção mais precisa, delimitada pela dimensão técnica das práticas de saúde (em Lilia Schraiber)”.

Para CAMPOS (1992) os modelos de atenção se inscrevem em um movimento que nunca se completa, em um processo produtor de ações de afirmação deliberadas que deve manter dispositivos críticos, também produtores de negatividade, de maneira a garantir a abertura para a mudança, a projeção para o devir. Considerando que as técnicas e tecnologias estão relacionadas a questões sociais mais amplas, os modelos de atenção possuem um triplo caráter administrativo, técnico e político (MERHY, 2003).

PAIM (2002) assinala que os modelos de atenção hegemônicos e os alternativos expressam determinados interesses e se inscrevem em determinados contextos históricos que favorecem sua emergência. Modelos hegemônicos e alternativos também apresentam distinções referentes a aspectos tais como: seus propósitos em relação à alteração nos problemas de saúde; seus métodos e processos de trabalho predominantes; e suas formas de organização e gestão dos serviços (PAIM, 2002).

Além disso, para CAMPOS (2000a), os modelos alternativos devem pressupor uma produção de cuidado centrada nos usuários, mas também devem considerar a realização dos trabalhadores. Essa centralidade no usuário deve ser compreendida não apenas como a resolução de seus problemas mais imediatos, mas o estímulo à sua maior participação e protagonismo na reflexão e ação sobre a saúde como direito e responsabilidade de todos. Pressupõe o desenvolvimento de uma consciência sanitária que permita ampliar suas concepções de mundo e seu envolvimento na busca por uma sociedade mais justa e democrática (CAMPOS, 2000a).

Diversas convergências podem ser estabelecidas entre as concepções dos autores acima apresentados. Todos eles assinalam que um modelo de atenção deve ser orientado por um ideário discursivo ético-político, operacionalizando-se a partir de processos de trabalho e tecnologias que materializam práticas de cuidado visando justamente aproximar-se do ideário proposto.

Entre os diversos autores também há distintas caracterizações de modelos tradicionalmente hegemônicos. PAIM (2002) designa esse modelo hegemônico de

médico assistencial-privatista, contextualizando-o em relação à conformação das

assistência filantrópica e da medicina liberal, não sendo representativo apenas do setor privado, pois também se reproduz no setor público. Caracteriza-se por ser centrado na demanda espontânea ou numa oferta de serviços dependente da lógica de mercado, sendo um ato produzido institucionalmente, mas operado individualmente na consulta direta do médico.

Outros autores como SÁVIO & GULJOR (2004), assinalam variações dentro do que denominam de modelo médico hegemônico, tais como os dispositivos assistenciais ambulatoriais, visto estes ficarem circunscritos a ações pautadas exclusivamente em consultas médicas ou psicológicas respaldadas teoricamente no paradigma racionalista

problema-solução, tomando como objeto de cuidado a doença mental (SÁVIO &

GULJOR, 2004: 222).

O modelo médico hegemônico se fundamenta teoricamente na racionalidade médica moderna, que inspirou o modelo biomédico e o modelo psiquiátrico tradicionais. Estes operam com uma concepção reducionista de saúde e loucura, adotando uma visão mecânica e cindida entre corpo e mente, e ambos estabelecem o hospital como seu cenário primordial de práticas, estendendo-se aos ambulatórios médicos. Neste modelo o processo de trabalho em saúde é centralizado na figura do médico e os demais profissionais entram como co-adjuvantes. O modelo asilar ou psiquiátrico tradicional representa um equivalente deste modelo médico hegemônico no campo da saúde mental.

Entretanto, conforme o momento histórico, distintos modelos de atenção podem vigorar, conforme demonstra ALVES (2001) ao fazer uma caracterização histórica dos distintos modelos de atenção em saúde mental (Quadro1).

Quadro 1 – Modelos de Atenção Psiquiátrica.

Período Pressupostos Serviço

Até os anos 70 Preventivismo Especialização

Simplificado Hospícios