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Fig 1.3 Fig 1.3 Fig 1.3

Fig 1.3 Fig 1.3 Natureza sítio ori- ginal da Praia do Canto (re- gião nordeste - Vitória). Fonte: Nau/UFES.

Fig 1.4 Fig 1.4Fig 1.4

Fig 1.4Fig 1.4 O rei Gilgamesh, se- nhor soberano da cidade. Fonte: www.galeon.com/ …/ Isabelle / sum – gilg.html. Fig 1.5

Fig 1.5Fig 1.5

Fig 1.5Fig 1.5 Batalha travada en- tre Gilgamesh e EnKidu, ser da natureza. Ao ser vencido pelo processo civili\zatório, arrepende-se em seu leito de mor te. Fonte: www.google.com.br/ epopéia Gilgamesh.

1.4 1.5

Na análise das primeiras abordagens conceituais acerca da natureza, sempre foi atribuída à natureza a noção de “sagrado, divino”, e à arte ou atividade humana o sentido de “mundano”. Um dos primeiros textos a descrever a busca do ser humano pelo significado da vida, os conflitos inerentes à natureza humana e as ambivalências estabelecidas com a natureza a partir de sua apropriação refere-se à epopéia de Gilgamesh (2500 a.C). Em sua tese de doutorado, Catharina Lima7, estabelece

sucessivas aproximações do seu objeto de estudo apresentando a trajetória dramática de Gilgamesh. A autora elege assim, momentos emblemáticos que embasam conceitos e fundamentos acerca da natureza e da paisagem.

O poema, pleno de alegorias, descreve Gilgamesh como personagem superior aos seus súditos em força e em beleza. Senhor da poderosa e rica cidade de Uruk8

desafia os deuses a enviarem um homem à sua altura. Enkidu, ser natural da floresta e guardião do ambiente selvagem, é enviado à cidade, e no caminho dos campos até a chegada na cidade de Uruk, aprende hábitos civilizados e fica exultado com as novidades prazerosas que lhes são oferecidas. Assim, deixa-se civilizar, perde a inocência e o espírito selvagem. Na luta que se desenrola entre o civilizado e o selvagem, vence o primeiro. Em seu leito de morte, arrependendo-se, amaldiçoa seus educadores.

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99 LIMA, Catharina P. C. dos

Santos. In: Natureza e Cultura – O Conflito de Gilgamesh. Paisagem e Ambiente: ensaios n°18. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2004. p.12.

Ao narrar com propriedade esta epopéia, Lima estabelece uma correlação da saga de Enkidu com o processo de civilização do ser humano. Enkidu abandona o ambiente selvagem, passa pelos campos até chegar, por fim à vida urbana. Nesse sentido, os personagens simbolizam a transgressão às coisas da natureza e os desdobramentos nefastos desta ação, além de revelar a ira dos deuses da natureza manifestada por meio de dilúvios e secas.

Na atualidade, é comum encontrar reflexões que remetem ao conceito de natureza desenvolvido pela Grécia clássica. Segundo Lima9, para os chamados filósofos pré-

socráticos (Tales, Heráclito e Demócrito, entre outros), natureza era physis, um conceito, cuja dimensão holística, assemelha-se a uma busca, no contemporâneo, de um conceito mais abrangente de natureza.

Para Tales de Mileto “tudo está cheio de misteriosas forças vivas; a distinção entre natureza

animada e inanimada não tem fundamento algum; tudo tem uma alma.”

Aristóteles no século XII dá idéia de natureza como “o impulso indiviso, a

causalidade produtora imanente que pertence à obra da formação, desenvolvimento e características dos seres.”

Rousseau (séc. XVIII), considera que a natureza com toda a sua falta de ordenação e de cultura é perfeita, o homem é que deveria ser modificado.

Hegel afirma que a arte é a habilidade que o homem tem em transformar e que muitas vezes tem a capacidade de transcender e provocar momentos de êxtase superior à da natureza.

Deste modo, uma série de visões da natureza pode ser revista em conformidade com a relação histórica de cada sociedade e a complexidade das áreas do conhecimento. A filosofia aborda com propriedade esta questão, entretanto vamos nos deter na investigação dialética da produção humana que explica as primeiras transformações expressivas da natureza pelos seres humanos.

Marx analisa a natureza nos Manuscritos de 1844. Para ele, uma definição da natureza, talvez seja inútil, tanto na arte como na ciência e mesmo porque suprimiria sua autonomia e movimento. Tornar-se-ia uma abstração metafísica. Assim, Marx parte do pressuposto que, transformada, a natureza aparecerá sem cessar no conteúdo da vida humana. Dessa forma, a natureza poderá expressar-se poética, plástica e cientificamente.

Fig 1.6 Fig 1.6Fig 1.6 Fig 1.6

Fig 1.6 Árvore (Museu do Louvre, 1822). Fonte: www. google.com.br/pinturas romantismo. Fig 1.7 Fig 1.7Fig 1.7 Fig 1.7

Fig 1.7 Tempestade de neve no Vale da Aosta - As forças da natureza retratadas na pin- tura do Romantismo inglês de Joseph Constable(1776- 1837). Fonte: www. artchi- ve.com/c/constable.html.

“A natureza não é inerte, nem uma alma; não é exterioridade (conjunto de objetos), nem interioridade (conjunto de sujeitos), pois, objeto e sujeito, surgem e aparecem pressupondo a natureza.”

Marx

Segundo Marx, o homem sempre estabeleceu essa relação de ambivalência com a natureza, ou seja, uma relação dialética e contraditória. Dessa forma, ele aborda a questão da natureza afirmando que “a natureza é interna e externa ao homem”.

Ele inicia sua argumentação afirmando que a consciência mais alta é aquela que associa e integra homem e natureza, condição de existência, “a natureza condicionada”. O homem foi antes de tudo uma possibilidade biológica. Essa possibilidade se traduz por uma larga luta, na qual o homem assumiu a responsabilidade pelo seu ser. Sua atividade envolve poder, ou seja, mediante a práxis social, ele ganha dolorosamente consciência. O homem se converte tanto em conhecimento como em energia carnal. Possivelmente, essas energias ao mesmo tempo são um refinamento como um esgotamento de energias fundamentais. Adquire várias formas: evolução, revolução, declínio e ascensão.

Num primeiro momento, o homem se afasta num certo sentido da natureza, e posteriormente, estabelece uma relação mais profunda, uma unidade mais elevada. Pelo homem a natureza se separa, se opõe a si mesma, entra consigo em uma luta profunda: entre indivíduos e espécies biológicas. Entretanto, este homem limitado, torna-se sujeito ativo através de sua atividade, comporta-se como um todo. Ser

finito abre infinitas possibilidades. É capaz de elevar-se a um grau superior de existência e superar seu ponto de partida. Sua limitação o transforma em poderio.

Fig1.8 Fig1.8Fig1.8

Fig1.8Fig1.8 Aparição na floresta – A princípio, o homem se afasta diante das energias vi- tais da natureza -pintura do Romantismo alemão - Moritz Von Schwin ( 1804-1871). Fonte: www.ar tcyclopedia. com/ar tists/schwin-moritz- von.html.

Fig 1.9 Fig 1.9Fig 1.9

Fig 1.9Fig 1.9 Peregrino sobre o mar de brumas – O homem tem uma relação dialética com a natureza: aproximação e distanciamento - pintura do Romantismo alemão - Casper Friederich (1774-1840). Fonte: www.ibiblio.org/wm/ paint/auth/friedrich. Fig 1.10 Fig 1.10Fig 1.10

Fig 1.10Fig 1.10 Floresta. O ho- mem culto não compartilha da ameaça esmagadora da natureza selvagem. Fig 1.11 Fig 1.11Fig 1.11

Fig 1.11Fig 1.11 O homem encon- tra dificuldades diante da na- tureza selvagem - pintura Romantismo em Portugal - Jean Pillement (1728-1808). Fonte: www.fress.pt/por t/ expos/pillement.html. Fig.1.12 Fig.1.12Fig.1.12

Fig.1.12Fig.1.12 Pastores atraves- sando a ponte. - Jean Pillement (1728-1808). Esta paisagem é um belo exemplo do tratamento típico que Jean Pillement deu a este gênero, e no qual se destacou, onde a natureza, geralmente de- senvolvendo-se em planos sucessivos, cria um for te contraste com as figuras hu- manas que habitualmente in- tegram as suas composi- ções. Fonte: www.google.- com.br/pinturas romantismo.

O homem culto não compartilha com a ameaça esmagadora da natureza selvagem. A natureza experimentada existencialmente pelo homem, sempre foi como

exterioridade e dependência. Os objetos que satisfazem os instintos naturais do homem são exteriores a ele. Sua necessidade, sua força vital transforma-se em impotência e privação. Por isso, num primeiro momento o homem teve que se afastar dela, para depois através de sua técnica, sua arte e sua cultura, dominá-la. O ponto de partida da produção humana encontra-se na natureza biológica e natural. Dessa forma, a história social do homem é a história da apropriação da natureza pelo homem, e de sua própria natureza. A atividade do homem modifica a natureza e cria uma “natureza humana”. As cidades, portanto, são decorrentes do processo natural e histórico da atividade humana concernente às suas necessidades.

1.8 1.9

Ao mesmo tempo em que o homem tem outros seres como objeto, este mesmo homem torna-se objeto para outros seres. Sujeito e objeto opostos pelo inseparável: sujeito sensível, explicado biologicamente pelo organismo e pela consciência biológica elementar, encerrando uma relação com outros seres, objetos de seus desejos. Os seres estão estranhamente unidos e dependem uns dos outros, da exterioridade. Para o autor, um ser que não é objeto de desejo de outro ser carece de existência.

Fig 1.13 Fig 1.13 Fig 1.13 Fig 1.13

Fig 1.13 Ilha das Caieiras. O homem se adapta às condições do sítio geográfico e cria “uma natureza segunda”. Fonte: Projeto Terra. Fig 1.14 Fig 1.14 Fig 1.14 Fig 1.14 Fig 1.14 Verticalização na praia de Camburi. O objeto social se opõe à natureza. Fonte: acervo pessoal.

“A história do homem é a luta do homem contra a natureza, segundo Marx, é uma tentativa de superação. O homem ativo modifica a natureza em torno dele e nele mesmo. O homem cria sua própria natureza e se supera nela. Em sua atividade cria novas necessidades. Cria produtos. Progride, resolvendo ativamente os problemas gerados pela sua própria ação. A atividade supera a oposição entre sujeito e objeto e descobre uma objetividade superior à objetividade natural.”

Lefebvre

“Os objetos humanos não são mais naturais imediatos. Os sentimentos humanos, tais como se manifestam objetivamente, não são a objetividade natural humana, a necessidade brutal, a sensibilidade natural. A natureza deve estar presente imediatamente e adequadamente ao homem.”

( Marx,1844) 1.13

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10 LATOUR, Bruno. Jamais

Fomos Modernos. São Paulo: Editora 34, 2000... 11 11 11 11 11 Idem, p.81. 12 12 12 12 12 LATOUR, B., 2000. p.42. 13 13 13 13

13 Leviatã é uma referência

ao livro do Jô, monstro sagrado que surge das profundezas ao chamado do Senhor, capaz de fazer o bem e o mal, mais freqüentemente o pior : ele ser ve aos desígnios de Jeová, princi- palmente de sua cólera. O Leviatã é comparado ao poder político na obra de Hobbes, cientista político do século XVII. 14 14 14 14 14 Idem, p.36 e 42.

No mesmo sentido, Latour10 compartilha da relação dialética existente entre homem

e natureza. Considera a produção humana, os híbridos de natureza, os quase-objetos como fatos socializados e humanos que transformaram o mundo natural representado pelo moderno. “Os quase-objetos gera a proliferação inédita de um certo tipo

de ser, o objeto construtor do social que uma vez expulso do mundo social, atribuído a um mundo transcendente que, no entanto, não é divino, e que produz por contraste, um sujeito flutuante portador de direito e de moralidade.” Esta contradição insuperável entre sujeito e objeto deve ser balizada pela mediação. Desse modo, deve-se ressaltar a importância dos mediadores e da inserção do contexto geral para que ocorra a viabilização e o consentimento da ciência.

“Como podemos explicar a capacidade do objeto de exercer tanto fascínio sobre os homens nesses tempos modernos, a ponto de não sabermos o limite dessa interdependência? E Latour, prossegue: “Possuímos centenas de mitos contando como o sujeito construiu o objeto , entretanto, não temos ,nada para nos contar o outro aspecto da história: como o objeto faz o sujeito. “

Latour 11

Nessa perspectiva, Latour discute a importância da atribuição dada à ciência e a política social que tentam explicar o mistério do mundo por concepções distintas, ou seja, mantendo a independência entre ciência, natureza e sociedade, apesar dessas dimensões serem construções do homem social. Para ele, o dualismo natureza / sociedade é indispensável aos modernos, para que possam justamente aumentar a escala dos mistos objetos e sujeitos.

“È nesta dupla linguagem que reside a potência crítica dos modernos: podem mobilizar a natureza no seio das relações sociais, ao mesmo tempo em que a mantêm infinitamente distante dos homens; são livres para construir ao mesmo tempo em que tornam suas leis inevitáveis , necessárias e absolutas.”

Latour 12

Dessa forma, ele prossegue na argumentação em que natureza e humanidade sustentam-se mutuamente, sendo impossível dissociá-las. A seguir alguns de seus trechos revelam a propriedade do seu pensamento, indicando que a sociedade nunca funcionou de acordo com a divisão que funda seus sistemas de representação do mundo: a separação radical entre a natureza de um lado, e a cultura de outro.

“Não são os homens que fazem a natureza, ela existe desde sempre e sempre esteve presente, tudo que fazemos é descobrir os seus segredos. Se a natureza não é feita pelos homens nem para eles, então ela continua a ser estrangeira, para sempre longínqüa e hostil. Sua própria transcendência nos esmaga ou a torna inacessível. Simetricamente, se a sociedade é feita apenas pelos homens e para eles, o Leviatã13, criatura artificial da qual somos ao

mesmo tempo a forma e a matéria, não seria capaz de se sustentar. Sua própria imanência irá dissipá-lo imediatamente na guerra de cada um contra os outros. Mas não é separadamente que devemos considerar estas duas garantias constitucionais, a primeira assegurando a não-humanidade da natureza e a segunda, a humanidade do social. Que enorme vantagem pode inverter os princípios sem que haja mesmo uma aparência de contradição. A natureza transcendente permanece, apesar de tudo, mobilizável, humanizável, socializável.”

Como podemos observar, a natureza conhece um processo de humanização cada vez maior.Torna-se cada vez mais culturalizada, mais artificializada, mais humanizada. Na interpretação de Milton Santos, a relação do homem com a natureza é progressiva, dinâmica. A natureza vai registrando e incorporando a ação do homem, dele adquirindo feições, que correspondem às feições do respectivo momento histórico. Desse modo, o autor admite que “o processo de culturalização da natureza

torna-se, cada vez mais, o processo de sua tecnificação.”15

Um esforço de síntese acerca das questões da natureza nos permite chegar à construção aproximada do conceito de natureza primeira e natureza segunda. Assim, as particularidades de um território dependem da natureza primeira, ou seja, o sítio geográfico e seus recursos, estabelecendo diferenças pautadas pelas características físicas do lugar. Esta seria a diferença induzida que permanece no interior de um conjunto ou sistema segundo uma certa lei, sendo constitutiva dele. A produção do homem sobre a natureza constitui-se em natureza segunda. Lefebvre16 avalia a

teoria formal da diferença considerando que as diferenças induzidas no interior de um modo de produção co-existem primeiro com as diferenças produzidas que as impelem até seu fim.A diferença produzida supõe ao contrário a explosão de um sistema que nasce dela; tal conjunto engendra para além de seus limites, um outro conjunto totalmente diferente. Na lógica de reprodução, há produção e indução. Portanto, a diferença produzida é igualmente produtiva.

15 15 15 15 15 SANTOS, M., 1988. p.89. 16 16 16 16

16 LEFEBVRE, Henri. A Pro-

dução do Espaço. cap. VI. 1986.Tradução do Prof. Dr. Jorge Oseki ( mimeo). Fig 1.15

Fig 1.15 Fig 1.15 Fig 1.15

Fig 1.15 Sítio original da Praia do Canto tendo o Convento ao fundo ( 1950): a natureza ainda se impõe na paisagem. Fonte: Arquivo Público P.M.V.

Fig 1.16 Fig 1.16 Fig 1.16 Fig 1.16

Fig 1.16 O homem por meio das técnicas modifica o sítio original e cria uma “natureza segunda”. O bairro Praia do Canto tendo o Convento ao fundo. Foto: acervo pessoal.

Fig.1.17 Fig.1.17 Fig.1.17 Fig.1.17

Fig.1.17 Vista do Convento da Penha situado no município de Vila Velha (1950) Fonte: Arquivo Público P.M.V. Fig 1.18

Fig 1.18 Fig 1.18 Fig 1.18

Fig 1.18 Vista do Convento cuja acessibilidade foi garantida pela tecnologia de ponta (construção 3ª Ponte). Fonte: acervo pessoal.

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A teoria clássica do movimento dialético revela a necessidade de um aprofundamento das causas que no curso histórico estabelecem as diferenças resultantes da obra humana. Assim, as diferenças anunciam um modo de produção novo no interior da sociedade medieval que se acumularam no curso do próprio processo de acumulação, para provocar uma tumultuosa transição e finalmente a implosão das sociedades e do modo de produção existente.

A despeito dessas considerações pertinentes ao processo de produção, não fossem os esforços dos movimentos conservacionistas, e mesmo a própria mudança positiva de percepção da sociedade urbana em relação à natureza, provavelmente a memória da natureza selvagem teria sucumbido ao avanço do capitalismo predatório. No âmbito dos profissionais do paisagismo, o pensamento ambientalista e o contexto de degradação urbana favoreceram o desenvolvimento de suas idéias, permitindo a formulação de projetos e teorias que enfatizassem os aspectos estéticos e morais na apreciação da paisagem. Importantes contribuições advindas do paisagismo inglês ou norte-americano suscitaram uma nova percepção de natureza na cidade, ampliando-se a visão ambiental do urbano no sentido da incorporação de vários processos, fossem sociais ou naturais.

Para Catharina Lima17, é justamente nos Estados Unidos do século XIX que o

confronto entre natureza e sociedade se revestiu de dramaticidade e dimensões sem precedentes na história, emergindo uma ética preconizadora de outros valores com relação à paisagem e a natureza. Atribui-se a Henry Thoreau e Frederick Law Olmsted a mudança na percepção da natureza. Thoreau preconizava a harmonização do imanente espírito da natureza com o homem, a ponto de desenvolver-se uma relação simbiótica. No que diz respeito à similaridade de suas idéias com o corolário do movimento ambientalista percebe-se a afeição pelo ambiente naturalmente menos processado.

Olmsted buscava formalizar, em seus projetos, uma visão claramente seletiva e antrópica de natureza, no sentido da incorporação dos vários processos operantes no urbano, fossem naturais ou sociais. O paisagista tinha o cuidado em seu desenho de aliar os efeitos visuais e psicológicos aos seus projetos. Olmsted almejava por fim, o melhoramento e o aperfeiçoamento da sociedade americana; imbuído das idéias sanitaristas, previu a criação de Instituições Públicas de Cultura e Recreação, incluindo parques que deveriam ser acessíveis a todos, destacando-se o Central Park de Nova Iorque e o Fens de Boston18. Dessa forma, o paisagismo consolida-se

na América do Norte, como profissão estabelecida e com a marca da ética de Olmsted na avaliação das relações entre processos humanos e naturais.

O investimento requerido para se projetar ou adaptar a cidade de acordo com a natureza respeitando seus processos, requer uma grande soma de capitais. Este desafio é particularmente agudo nas cidades que crescem vertiginosamente. Desse modo, a atividade projetual em paisagismo, como arte de jardins, dilui-se nessa ampla gama de complexidades, que se configura na virada do século XX, e no qual os novos arquitetos-paisagistas imaginaram uma contribuição mais abrangente em face das novas realidades.

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17 LIMA, Catharina Pinheiro

Cordeiro dos Santos et alli. In: Paisagem e Ambiente: ensaios n°18. São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, 2004. p.35-49. 18 18 18 18 18 Na visão de Spir n,

Frederick Olmsted ao propor para a área da Back Bay na cidade de Boston, um plano que objetivava tanto o controle sanitário quanto o das enchentes, usou técnicas muito eficientes que ainda hoje representam o que há de mais avançado. O parque denominado Fens Bay foi criado pela dragagem dos baixios de maré em uma bacia e ajardinamentos com plantas tolerantes às periódicas mudanças no nível da água.

A pesquisa desenvolvida pela paisagista Anne Spirn19 tenta mostrar que a cidade

faz parte integrante da natureza: “a natureza é um continuum, com a floresta num

dos pólos e a cidade no outro”. Entretanto, para a autora, os mesmos processos naturais operam na floresta e na cidade. Nessa perspectiva, “a cidade é um jardim

de granito, composto por muitos jardins menores num mundo jardim. Partes do jardim de granito são cultivadas intensivamente, mas a maior parte não é reconhecida e é negligenciada(p.20)”. Todavia, segundo a autora, os problemas urbanos continuam sendo tratados como fenômenos interligados resultantes de intervenções humanas corriqueiras e exarcebados por uma desconsideração dos processos naturais.

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19 SPIRN, Anne. O jardim de

granito. São Paulo: Edusp, 1995. p.32-39 Fig 1.19 Fig 1.19 Fig 1.19 Fig 1.19 Fig 1.19 A sociedade reintroduz a natureza na cidade através dos seus parques e jardins. Parque Pedra da Cebola (região nordeste). Fonte: acer vo pessoal.

Fig 1.20 Fig 1.20 Fig 1.20 Fig 1.20

Fig 1.20 Coqueiros na orla. Embelezamento ar tificial recriando a natureza. Fonte: acervo pessoal.

Nesse sentido, o valor social da natureza precisa ser reconhecido e não ignorado. Segundo Spirn, para aproveitar as oportunidades inerentes ao ambiente natural da cidade, para ver além dos custos e benefícios, para perceber as inúmeras ações desconexas que fazem o cotidiano da cidade, e para coordenar milhares de ações incrementalistas, é necessária uma nova atitude para com a cidade e sua conformação.

“A natureza tem sido vista como um embelezamento artificial, como um luxo, mais do que uma força essencial que permeia a cidade”.

Anne Spirn

“È tempo de empregar um dos maiores talentos humanos, a capacidade de manipular o ambiente, para transformar um ambiente que se tornou hostil à própria vida num habitat

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