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O Estado e a Construção Social do Espaço Moderno

dos. Portanto, para estes pensadores ao qual o autor se reporta, ainda não há uma idéia clara de nação.24

Na ótica de Lefebvre, o filósofo Rousseau (século XVIII) é o que mais se aproxima da teoria da soberania característica do pensamento ocidental: “essa pessoa pública, que

se forma assim pela união de todas as outras, levava antigamente o nome de cidade (“cité”) e leva hoje o nome de república ou de corpo político, o qual é chamado pelos seus membros. Estado quando é passivo; soberano, quando ativo; potência, quando comparado a seus pares”.25 Segundo Lefebvre, a filosofia política com Rousseau descobre relações de equivalência, de identidade, de legalidade e de igualdade, relações efetivamente constitutivas do Estado moder- no, introduzindo efetivamente o conceito de totalidade e sua conexão com o econô- mico e o político.

A contribuição de Engels à teoria difere da de Marx e a complementa. Para Engels,

“o conjunto da sociedade civilizada se resume no Estado. Em alguns períodos, este Estado se revela instrumento da classe dominante, possuindo características inerentes à sua criação: resumo oficial de uma sociedade inteira e de sua história, simples instrumento político exprimindo a desigualdade no seio da sociedade”26. Ele admite que a propriedade privada e a família fornecem a base sobre a qual se constroem as sociedades, mas não considera o efeito inverso, ou seja, que a propriedade e mesmo a família se modificam sob a pressão e o impulso do Estado. Lefebvre considera um equívoco a construção da teoria de Engels, pois está incompleta. Segundo o autor, Engels não distingue bem a passagem da modalidade da propriedade imobiliária baseada na terra (monopólio feudal) para a riqueza derivada do modo de produção capitalista, cujos processos estão ambos baseados na propriedade do solo, porém, de maneira distinta. Nessa perspectiva, Lefebvre argumenta que Engels não contempla a hipótese plau- sível de Marx, segundo a qual o Estado se afirmaria ultrapassando as condições sócio-econômicas e as circunstâncias históricas de seu aparecimento, chegando com isso a uma especificidade do político em relação ao econômico e social, todavia, sem dissociar-se destes. A redução da esfera política para a econômica nos leva a um dilema. Para Lefebvre, esta dificuldade se atenuará “se introduzirmos descontinuidades -

rupturas políticas – ao invés de procurarmos a explicação somente nas forças produtivas, cujo progresso e crescimento possuem na realidade um caráter contínuo”. O Estado dificilmente se

integra às categorias clássicas de origem filosófica: sujeito e objeto, sistema e totali- dade, lógica e a dialética. Entretanto, essas categorias são indispensáveis para análise. O trabalho desenvolvido por Foucault27 durante 20 anos, estabelece uma investiga-

ção comparativa entre o poder e as formas de resistência. O autor teoriza a questão do Estado por outro viés metodológico tendo como tema central a sujeição do indivíduo às relações de poder através de estratégias antagônicas - sanidade e insani- dade, legalidade e ilegalidade, sexualidade, crime, relação pais e filhos, homens e mulheres - correlacionando teoria e prática cotidiana. Nessa perspectiva, cada estra-

apologia do Leviatã que teria comprometido enquanto ima- gem, o símbolo da irracionalidade do poder le- vado ao seu grau absoluto. 2424242424 No século XVIII, na Fran- ça, é que emerge a nação, com o civil e a civilidade, es- pecialmente por intermédio das idéias de Rousseau.

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25 ROUSSEAU, Jean Jaques.

Contrato Social – I:6,fim do capítulo. Citado In: LEFEBVRE,H. A Respeito Do Estado.Tomo III:capítulo 1) 26 26 26 26

26 ENGELS, Frederico. Ori-

gens da família, da proprie- dade privada e do Estado.Ed. Costes, p.233.Citado In: LEFEBVRE, H.,De l”État. Tomo III: A respeito do Esta- do. cap.1. 1977. Tradução Jorge Oseki ( mimeo).

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2727 FOULCAULT, Michel.

Afterword. The Subject and Power. In: Hubert L. Dreyfus and Rabinow. Michel Foucault – Beyond Structuralism and Hermeneutics. 2ª edition. Chi- cago: The University of Chi- cago Press. 1983. Pp. 208- 226.

tégia do espaço visa determinados objetivos, já que o espaço abstrato, manipulado e manipulador, detém “propriedade”, organizando o “centro” como lugar de decisão, de riqueza e de informação. Dessa forma, o autor compara o Estado com uma nova forma de sujeição, uma nova forma de poder pastoral.

Para Foucault, todas essas forças quebram o movimento individual separando-o da vida comunitária, restringindo-o à sua própria individualidade de forma cons- trangedora. O Estado moderno, portanto, é uma sofisticada estrutura política onde a individualidade é submetida a modelos específicos, visando atender os interesses de uma classe dominante, criando uma constante tensão entre as opções individuais e o que a sociedade oferece.

É nesse contexto que temos de compreender as tentativas altamente diversificadas em diferentes nações-Estado de chegar a arranjos políticos, institucionais e sociais que pudessem acomodar a incapacidade do capitalismo de regulamentar as condi- ções essenciais de sua própria reprodução. O equilíbrio de poder, especialmente no modernismo, tenso, mesmo assim firme, prevalecia entre o trabalho organizado, o grande capital corporativo e a nação-estado, e que formou a base da expansão de pós-guerra como resultado de um processo e de muitas lutas.

A associação indissolúvel de elementos, tais como, a coação, a autoridade, a lógica e a moral, mostra como a constituição do Estado acompanha a extensão das trocas e das comunicações. Na concepção de Lefebvre, “o processo social, que sujeita

seres da natureza a entrarem na identidade forçada, toma a forma relativamente pacífica do símbolo e do signo, do saber, do conceito e do julgamento. De outro lado, ele dá lugar à extensão da autoridade dita “legítima” ou pública”, isto é polí- tica. De um lado, a coação se subordina às condições da troca intelectual ( coerência e veracidade, aceitação das metáforas,etc.) De outro coação, e violência se desenvolvem, tor nam-se maiores e continuamente dominantes. A filosofia e sua história acompanham conflituosamente o Estado e sua história.”28

Segundo Harvey29, a derrota dos movimentos operários radicais que ressurgiram

no período pós-guerra imediato, por exemplo, preparou o terreno político para os tipos de controle de trabalho e de compromisso que possibilitaram o fordismo.30A

disseminação do fordismo produziu um surto de expansões internacionalistas de alcance mundial que atraiu para a rede inúmeras nações descolonizadas. Este expan- são do modo de produção capitalista se explica na reconstrução patrocinada pelo Estado de economias devastadas pela guerra, na renovação urbana, na expansão geográfica dos sistemas de transporte e comunicações e no desenvolvimento de infra-estruturas dentro e fora do capitalismo avançado. Coordenados por certos centros financeiros interligados, tendo como ápice da hierarquia os Estados Unidos e Nova Iorque, essas regiões – chave da economia mundial absorviam grandes quan-

2828282828 LEFÉBVRE, H., 1977, cap.2.

2929292929 HARVEY, David. Condição Pós – Moderna. 9ª ed. São Paulo: Loyola, 2000.p.124- 125.

3030303030 Harvey explica como o sistema fordista constituiu uma história que se estendeu por meio século (1930 - 1980), resultado da conju- gação de decisões que esta- beleciam vínculos imediatos entre o capital corporativista e o fortalecimento da nação- Estado. Ao longo desse perí- odo, o capitalismo alcançou nos países centrais taxas for- tes, mas relativamente está- veis de crescimento econô- mico.

tidades de matérias-primas do resto do mundo não-comunista e buscavam dominar um mercado mundial de massa crescentemente homogêneo com seus produtos. Nessa perspectiva, podemos afirmar que a concepção dialética do espaço estreita- se e renova-se com a intervenção do Estado, no passado e no presente, segundo uma lógica, tornando-se uma prática evidente. O Estado e seus aparelhos (burocrático e político) atuam sem cessar no espaço e se servem do espaço instrumental para intervir em todos os níveis e em todas as instâncias do econômico. De maneira que a prática social (global) e a prática política tendem a se reunir na prática espacial, ganhando assim uma coesão e mesmo uma coerência lógica. O Estado promove ações no espaço a partir da produção de valores de uso, notadamente na criação de infra-estrutura. Ao mesmo tempo em que o torna homogêneo, acaba por diferenciá-lo, ou seja, o espaço ao ser dotado de condições básicas para sua homogeneização de forma a possibilitar a circulação de mercadorias, força de trabalho e capital, torna-se desigual. Nesse contexto, podemos afirmar que o Governo do Estado do Espírito Santo assumiu muitos papéis na configuração sócio-espacial do aglomerado urbano de Vitória a partir de políticas que respondiam a decisões do planejamento estratégico nacional. A produção da “diferenciação/homogeneização” do espaço dada pelo Estado resultou, definitivamente, no rompimento da estrutura econômico-espacial de Vitória, configurando assim, uma nova paisagem urbana.

Nesse contexto ideológico, o Estado se destaca usando seu poder extra-econômico de ator social e centralizador de excedente, e aparece como o grande acumulador de capitais em todos os setores do Espírito Santo. Tal situação fez com que o governo estadual estivesse presente especialmente no processo de produção espacial do mu- nicípio, empreendendo políticas públicas que visavam adaptar o sítio físico à expan- são urbana necessária à modernização da cidade.

De fato, para conseguir tal propósito, passa a ter forte participação no mercado de terras urbanas, seja através da anexação de áreas por meio de aterros (terrenos alagadiços, mangues ou mesmo aqueles conquistadas ao mar), seja desempenhando o papel de construtor imobiliário ou estruturando novos planos para o desenho urbano da capital. Nesse sentido, fica claro que os interesses dessa expansão conver- giam para a região litorânea, ou seja, a região nordeste. Esta trajetória se verifica ao longo de todo o século XX e de forma mais proeminente a partir da década de 1970.

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