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O caminho-de-ferro do pinhal de Leiria

4. C AMINHOS DE FERRO NOS DEBATES PARLAMENTARES

4.1. Primeira metade do século

4.2.2. O Governo do Marquês de Loulé

4.2.2.7. O caminho-de-ferro do pinhal de Leiria

Durante a discussão do contrato Peto, Rodrigues Xavier Cordeiro alude a uma proposta apresen- tada em Agosto de 1856 por Luís Teixeira de Sampaio, Duarte Medlicot, Jorge Croft, o Conde de Far- robo e Thomas Rumball para a construção de um caminho-de-ferro entre o porto de S. Martinho e o

264 Afirmava que alguns ingleses tinham-lhe dito que apresentariam propostas se houvesse concurso, o que é impossível de saber se é verdade ou não.

265 Aproveitava para criticar o Governo por não ter rescindido o contrato com Peto, mas ter renegociado as condições, que seriam mais lesivas para Portugal. Um ano perdido a contratar para só apresentar uma proposta sem significado. Esta discussão não se limitou a este contrato, ampliando-se a críticas à acção do Governo em todo o sector ferroviário. Foi um autêntico duelo entre Carlos Bento e Lobo de Ávila a respeito das invectivas que um e outro dirigiam entre si por causa ou do Caminho-de-ferro de Leste ou o do Norte.

266 Havia sempre a possibilidade de o Governo pedir depois nova autorização à Câmara para emitir novas inscrições. 267

O taquígrafo refere que não ouviu o que o deputado disse, mas como Albino Figueiredo refere que esta linha poupava 200 quilómetros e atravessava uma zona rica e desenvolvida, parece indicar que seria a Beira.

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A mesma opinião de Faria Maia: o concurso, teoricamente, era o preferível. Neste caso, porém, em que a linha apre- sentava poucas vantagens e Portugal não tinha crédito suficiente, o mais provável era apenas aparecerem a concurso aven- tureiros, traficantes e especuladores e não pessoas sérias.

Caminhos-de-ferro nos Debates Parlamentares (1845-1860) Hugo José Silveira da Silva Pereira

previsto Caminho-de-ferro do Norte, passando pelo pinhal de Leiria, pela fábrica de vidros da Marinha Grande e pela cidade do Lis. No entanto esta proposta não tinha merecido a consideração do Governo, que preferira construir um caminho de madeira entre o porto de S. Martinho e o pinhal de Leiria.

Em Janeiro de 1859, o assunto voltaria ao parlamento através do projecto de lei n.º 70, que pre- tendia continuar o caminho parcialmente construído, através da construção de um americano puxado a cavalo, para aumentar o preço dos pinheiros daquela mata nacional – esperava-se que o preço de cada tronco passasse de 120 para 1 000 reis assim que se construísse o americano269. A colocação de carris onde já existia um passadiço de madeira justificava-se pelos seguintes factores: pouca durabilidade da madeira portuguesa; por esta oferecer pouca tracção no Inverno; poder ser usado para transportar os produtos resinosos e os vidros da Marinha Grande; e pelo facto de a mata passar a render 20 ou 30 contos (contra os cinco contos correntes). Esse aumento de rendimento era razão suficiente para con- trair um empréstimo de 150 contos, cuja garantia era precisamente esse rendimento das matas270 (embora se previsse o recurso a outros rendimentos públicos, caso aquele não fosse suficiente). Decerto a possibilidade de satisfazer os deputados de Leiria também pesou na consciência dos gover- nantes.

Vários deputados tomaram a palavra sobre este assunto. Pinto de Almeida, por exemplo, preferia que o caminho acabasse na Figueira, porém não apresenta a proposta para não ser acusado de defender interesses de campanário. Sá Nogueira lamentava a falta de estudos definitivos, o que era contrariado por Mouzinho de Albuquerque (havia estudos do engenheiro Margiochi e de um engenheiro espanhol que Sá Nogueira não tinha visto porque quando fora convidado ao gabinete do Ministro para os ver estava indisposto), para quem a directriz devia ser a mais directa possível para bem do transporte a partir do pinhal de Leiria. Rebelo Cabral preocupava-se com o facto de o caminho-de-ferro poder ser usado de graça por indivíduos e companhias que não estivessem ligados ao pinhal (Carlos Bento sos- segava-o com a garantia de que tal não era possível). Jerónimo José de Melo era o mais optimista de todos, pois via neste tipo de caminho-de-ferro o futuro do País. O deputado alentejano gostava mesmo de ver os caminhos distritais ou pelo menos as capitais dos distritos, onde havia mais movimento comercial e político, ligadas por este tipo de caminho-de-ferro, que era muito mais precioso e econó- mico que os caminhos-de-ferro com tracção a vapor. Aliás os caminhos-de-ferro tradicionais estavam em crise: em Inglaterra, as empresas tinham de se associar; em França, as suas acções caíam, excepto se tivessem garantia de juro do Estado. Contudo, lamentava a necessidade de se contrair um emprés- timo (ainda para mais a um juro excessivo de 7%) quando em Espanha se faziam as obras por arrema- tação pela iniciativa privada. Mouzinho de Albuquerque achava que, neste projecto, a iniciativa pri- vada não era tão produtiva como a iniciativa pública, dada a falta de interesse na exploração, pelo menos até que o porto de S. Martinho fosse melhorado e este caminho-de-ferro servido de estradas. De qualquer modo, o Estado podia contratar apenas a construção da obra e depois arrendar a exploração. Para Carlos Bento, isto já não era possível. O Estado não podia dar a uma empresa a exploração de um negócio cujos rendimentos iam servir de hipoteca ao empréstimo. Para salientar a utilidade da obra, referia que se a mata fosse particular há muito que tinha sido construído o caminho-de-ferro (como acontecera com o transporte de produtos químicos da fábrica da Verdelha, muito antes do Estado ini- ciar a construção de caminhos-de-ferro). Mesmo assim, o empréstimo ficava pago em seis anos sem ser necessário lançar impostos. Quanto à alegada crise dos caminhos-de-ferro, o que realmente estava a acontecer era o Estado deixar as obras de arte, aterros e exploração às companhias e tomar a seu cargo o resto. Paulo Romeiro, deputado por Leiria, claro, aprovava o projecto, mesmo perante uma taxa de juro máxima de 7%. Mas se o Governo esperava que as suas críticas cessassem por este motivo, enganava-se redondamente. De facto Romeiro aproveitava o ensejo para oferecer um bill de indemnidade ao Governo por ter construído o caminho-de-ferro de madeira sem autorização legisla- tiva. A par disto, lamentava que o porto de S. Martinho e a própria administração do pinhal não fos- sem também alvo de melhoramentos. Estes dois pontos seriam também apontados ao Governo por mais deputados. Lobo de Ávila era um deles. Afirmava que uma vez que o caminho-de-ferro ainda ia demorar a construir, durante esse tempo podia-se melhorar também o porto e a exploração do pinhal, tanto mais que o Estado estava obrigado a fornecer madeiras do pinhal, tarefa que seria facilitada pela existência de boas vias de comunicação (na altura havia queixas da Companhia do Caminho-de-ferro do Sul em relação ao Estado precisamente por causa das madeiras). Essas eram as decisões mais pre-

269 Neste caso o melhoramento teria o condão de aumentar o preço dos produtos. 270

Isto levantava dúvidas em Sá Nogueira: se para pagar o empréstimo era preciso vender pinheiros, então Portugal ficava sem madeira para conservar e construir os caminhos-de-ferro de que necessitava. Carlos Bento respondia que as madeiras que se vendiam eram para a construção de casas e não para as travessas dos caminhos-de-ferro.

mentes, preferíveis a levar o caminho-de-ferro até à Linha do Norte271, pois a Linha do Norte ainda não existia. O seu único receio era ver os 150 contos do empréstimo serem desviados desta aplicação.

Para Carlos Bento a discussão da administração da mata ou dos melhoramentos do porto de S. Martinho não eram oportunas (mas adiantava a sua opinião em relação àquela infra-estrutura portuá- ria: o seu problema não era a falta de qualidade, era a falta de barcos). Naquele momento discutia-se a obra e o empréstimo. O seu juro era também alvo de censuras. O que o Governo propunha era o máximo a que estava autorizado a contrair o empréstimo. No entanto, havia deputados (Pinto de Almeida e Rebelo Cabral) que o achavam excessivo (preferiam 6%). Ávila relembrava que 7% era o máximo a que o Governo esta autorizado a negociar, mas mesmo assim não o achava desmesurado, dada a urgência da obra. Perante aquele juro, a construção seria feita mais rapidamente e por isso sai- ria mais barata à Fazenda.