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1. O DESIGN NO BRASIL

1.4. O CONTEXTO QUE ANTECEDE A CRIAÇÃO DA ESDI

O período anterior à criação da Escola Superior de Desenho Industrial foi de grande importância para o surgimento de uma consciência do design. Após a Segunda Guerra Mundial, um cenário de maior estabilidade e a crença no progresso contribuíram na implantação e formação de instituições culturais no país. A arquitetura era um exemplo da implementação da modernidade associada à urbanização das cidades. A euforia modernista tinha como símbolos a indústria automobilística e a construção de Brasília.

A produção de mobiliário vinha se desenvolvendo com a busca por uma linguagem moderna e brasileira, em meio às influências do modernismo internacional e dos imigrantes europeus. Este momento é singular, pois o design “nasce” no país em meio às múltiplas referências européias e a prosperidade econômica proveniente de capital estrangeiro (americano, em grande parte). Sobre esta época, Cardoso (2004, p. 160) exemplifica os desafios do design brasileiro através do olhar sobre o trabalho de Joaquim Tenreiro:

o design brasileiro se viu levado a gerar soluções à altura dos grandes desafios sociais e culturais da época. Os designers da segunda fase modernista se viram divididos entre nacionalismo e internacionalismo, entre tradição artesanal e progresso industrial, e os resultados foram tão diversos quanto as personalidades envolvidas nos debates.(...) Os móveis criados por Tenreiro nesta época (1947) trazem o uso característico de madeiras de lei, como jacarandá, e de palhinha, materiais que remetem à mais antiga tradição moveleira brasileira, datando da época colonial. Os seus móveis demonstram também uma consciência nítida do fazer e do ofício artesanais, atribuíveis certamente à sua passagem pelas marcenarias da rua da Conceição, velho reduto da indústria moveleira luso-carioca. Contrastando, porém, com essa profusão de raízes, as linhas dos seus projetos refletem já na década de 1940 uma forte influência do estiolo Internacional, principalmente na sua vertente de encontro com o Modernismo escandinavo e a produção americana de empresas como a Knoll e a Herman Miller. (...) Porém, diferentemente dos seus contemporâneos americanos, Tenreiro projetava e fabricava os seus móveis em esquema artesanal, não somente por limitações de demanda do mercado local, mas também por se posicionar contrário à fabricação industrial.

Estes contrastes e desafios eram parte do trabalho de muitos outros designers. É interessante pensar na adoção dos princípios estilísticos e conceituais do modernismo, embora o país estivesse em uma espécie de transição, procurando transformar a produção artesanal em industrial, num ritmo acelerado, para cumprir os mandamentos do progresso, alardeados na política, economia, etc. O ideário moderno integrava a criação dos designers brasileiros nestes anos 1950 e 1960, porém não contemplava a fabricação e produção de seus produtos como eram idealizados. Para COELHO (1944, p.10), o modernismo

é, antes de mais nada – embora esta palavra esteja em desuso -, um estilo. Uma linguagem, um código, um sistema ou um conjunto de signos com suas normas e unidades de significação. Implica uma visão de mundo – o que levou Henri Lefebvre a escrever que por “modernismo” pode-se entender a consciência que cada uma das gerações sucessivas teve de si mesma.

Esta visão do mundo era partilhada por muitos setores da sociedade brasileira nos anos 1950. E foi esta visão que direcionava as idéias de implantação de instituições culturais, como os museus, as universidades, unindo aos princípios modernos, como o valor da ciência e do conhecimento. As

instituições culturais estão inseridas nas “utopias modernas, que estiveram no fundamento dessas instituições – divulgar e democratizar as grandes criações culturais, valorizadas como propriedade comum da humanidade (...).”(GARCÍA CANCLINI, 1997, p. 61)

Foi nesse período que surgiram as primeiras tentativas de implantar um curso de design no país. Inicialmente, foram as iniciativas de alguns empresários e industriais, que pretendiam investir na criação de instituições culturais, pautados na concepção do avanço e desenvolvimento e nas iniciativas feitas no exterior. Segundo Niemeyer (1997, p.63), foi nesta época que

se consolidou a idéia de que as instituições culturais, além da conservação e exposição de obras de arte consagradas, deveriam se abrir para apresentar a arte livre e renovada de sua época, organizando também exposições temporárias e atividades didáticas, culturais e sociais. Essa idéia, que se concretizou com a fundação do Museu de Arte Moderna de Nova York, em 1929, frutificou também na Europa no pós-guerra, onde a primeira instituição no gênero foi o Museu de Arte Moderna de Paris. Segundo esta concepção foi criado no Brasil, em 1947, o Museu de Arte de São Paulo.

O empresário Assis Chateaubriand (1892-1968) estava decidido a fundar “uma das maiores galerias de arte do mundo” (NIEMEYER, 1997, p. 63). Quando o jornalista italiano Pietro Maria Bardi veio ao Brasil, trazendo uma exposição de arte italiana, Chateaubriand o convidou para organizar o seu projeto, que viria a ser o MASP. (NIEMEYER, 1997).

Pietro Maria Bardi fundou, em 1951, o Instituto de Arte Contemporânea, junto ao Masp em São Paulo. O instituto foi pensado inicialmente como um curso voltado para o ensino de Teoria e História da Arte (LEON, 2005). Contava com artistas e arquitetos importantes da época; entre os professores estavam o pintor Lasar Segall, a arquiteta Lina Bo Bardi, Roberto Sambonet e Max Bill6 (LEON, 2005; NIEMEYER, 1997), convidado por Pietro Maria Bardi.

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A influência do suíço Max Bill (1908-1994), ex-aluno da Bauhaus, foi percebida na arte concreta e no design brasileiro. Bil realizou uma exposição retrospectiva no Masp, em 1951, com obras, produtos gráficos e objetos. Na I Bienal Internacional de São Paulo, no mesmo ano, foi premiado com a escultura Unidade Tripartida.Em 1953, manifestou a Pietro Maria Bardi o interesse em levar um aluno brasileiro para estudar na Escola de Ulm. Bardi indicou Geraldo de Barros, que cedeu a vaga para Alexandre Wollner. (STOLARSKI, 2006).

O IAC funcionou de 1951 a 1953 e trazia conferencistas para proferir palestras, reunindo um grupo de artistas sempre envolvidos com as discussões da escola. Com influências da Bauhaus, o ensino era composto por um curso preliminar e um curso de especialização, de dois anos cada. Entretanto, o curso durou três anos e formou apenas uma turma. Segundo Pietro Maria Bardi, a escola fechou por falta de recursos e não conseguiu apoio de empresários dispostos a financiarem a continuidade do instituto. (LEON, 2005).

Uma segunda tentativa aconteceu no Rio de Janeiro, na década de 1960. A contribuição de cursos ministrados pelos designers Tomás Maldonado e Otl Aicher, que lecionavam na escola alemã Hfg-Ulm, estimulou a criação da Escola Técnica de Criação, com sede no Museu de Arte Moderna. Os esforços resultaram na fundação da ESDI em 1963, mas a iniciativa persistiu e em 1968, sob a coordenação de Karl Heinz Bergmiller (ex-aluno de Ulm) fundou-se o Instituto de Desenho Industrial do Museu de Arte Moderna (IDI-MAM). O instituto teve um papel importante com as exposições nacionais e internacionais que abrigava, promovendo a discussão sobre design na época. Em 1968 realizou o evento Desenho Industrial 68, uma bienal internacional de design na qual foram apresentados trabalhos de profissionais brasileiros, incluindo trabalhos da Esdi e de mais três países: EUA, Canadá e Grã-Bretanha. Nos anos seguintes, o IDI- MAM realizou bienais que trouxeram trabalhos da Alemanha e da Suíça, inclusive alguns produtos premiados com o selo gute form, conceito alemão correspondente ao good design americano. (LEON, 2005).