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5. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

5.15. O dano à imagem

Existe atualmente uma confusão entre o dano moral e o dano à imagem. Do ponto de vista prático-processual, as decisões judiciais, muitas vezes, fixam indenização a título de dano moral, quando era caso de dano à imagem. Claro que não é exatamente um problema da sentença, pois o pedido inicial também já põe o processo como se fosse de dano moral, tornando o pleito confuso e ignorando que a questão era de dano à imagem.

Ora, vimos que dano moral é dor, cuja origem é variada (dano físico, perda de ente querido, ofensa pessoal etc.). Uma das causas possíveis do dano moral é o dano à imagem — imagem-retrato e imagem-atributo; no entanto, quando alguém sofre um dano moral por essa via, está, na verdade, sofrendo dois tipos de danos diferentes: o dano à imagem e o dano moral.

Em tese, não há nenhum óbice em que uma pessoa sofra dano à imagem sem o consequente dano moral117.

Explicamos.

Uma pessoa pode, por exemplo, ter seu nome lançado indevidamente nos chamados serviços de proteção ao crédito sem, com isso, sofrer qualquer abalo psíquico, sem padecer de qualquer dor, não se incomodando com o evento ilegalmente praticado. Aliás, pode acontecer — como acontece — de o consumidor descobrir-se abusivamente

negativado e, sem esbravejar demais, reclamar junto ao fornecedor que o negativou, este perceber o erro e cancelar o registro, e tudo ficar por isso mesmo, sem maiores consequências. Não há aí propriamente dano moral, uma vez que não houve sofrimento. Mas houve dano à imagem, violação objetiva do nome — imagem-retrato — de alguém na sociedade.

Some-se a isso o caso do uso indevido do nome ou da imagem de alguém. Por exemplo, uma revista utiliza sem

autorização a fotografia de uma pessoa conhecida para fazer sua publicidade. Digamos que esse uso indevido enalteça a pessoa, que fale bem dela, isto é, não está causando nenhum tipo de dano à imagem, objetivamente falando. Mas, como a revista não tinha autorização daquela pessoa, pode sofrer ação para indenizá-la pelo uso indevido da imagem.

Quais serão os critérios para a fixação da indenização nesses casos de dano à imagem, na qual não se constate um dano moral e uso indevido da imagem?

No que tange ao puro dano à imagem, parece-nos que os mesmos critérios já apresentados para a fixação da indenização por dano moral podem servir de parâmetro.

Mas, no caso do uso indevido da imagem, parece-nos que dois são os caminhos: a) o da utilização dos mesmos parâmetros acima indicados;

b) outro parâmetro condizente com o próprio ato ilegal é o benefício que o infrator dele auferiu. Por exemplo, digamos que se trate de uma revista que utilizou uma página inteira com a foto não autorizada. O magistrado pode usar como base para a fixação da indenização a tiragem da revista e seu preço de capa, o preço cobrado pela revista para inserção de publicidade do tamanho da foto utilizada etc.118.

5.16. Pessoa jurídica

Por tudo quanto foi dito, percebe-se que pessoa jurídica não pode sofrer violação à sua honra, nem à intimidade. Não sofre, também, dano estético. Mas pode sofrer violação à sua privacidade, bem como dano à imagem.

Contudo, é importante destacar que a pessoa jurídica não padece, propriamente, de dano moral, uma vez que, evidentemente, ela não sente dor. Mas sofre, sim, dano à imagem, como de resto pode ter sua imagem utilizada sem autorização (o que pode ocorrer também com a pessoa física).

Assim, o uso do nome da pessoa jurídica sem autorização (isto é, violação de sua imagem-retrato) ou a atitude que denigra seu bom nome ou reputação (violação da imagem-atributo) representam abusos praticados contra os direitos garantidos constitucionalmente. Da mesma maneira, a divulgação de um segredo industrial, o uso de uma fórmula privada etc. são violações da privacidade da pessoa jurídica.

Em todos esses casos a pessoa jurídica tem o direito de agir preventivamente, de forma a evitar o dano, bem como pode pleitear indenização pelo dano sofrido. Havendo perda material nessas violações, a apuração e a fixação do quantum se dará de maneira simples: prova do dano emergente e do lucro cessante. Todavia, há um problema no que respeita ao chamado dano moral da pessoa jurídica. Já dissemos que não acreditamos nessa espécie de dano, uma vez que pessoa jurídica não sofre (nem pode sofrer) dor. Logo, somente de forma figurativa é que se pode falar em dano moral da pessoa jurídica. Acontece que também vimos que pode haver (e há) dano à imagem da pessoa jurídica. E, se é certo que, de um lado, o dano à imagem pode ser evitado por medidas preventivas, é difícil responder, de outro lado, como fixar-se o quantum da indenização desse dano após causado, uma vez que não há parâmetros legais.

dano de “moral”119. No entanto, há alternativas para solucionar tal problema.

A Constituição reconhece, como exposto, o direito à imagem, tanto da pessoa física quanto da pessoa jurídica. Havendo dano material em qualquer caso, ele será apurado e fixado o quantum devido. A violação da imagem da pessoa física (e também outras violações, por exemplo, perda de um bem num acidente, morte de um ente querido etc.) gera dano moral, dor. A doutrina e a jurisprudência acabaram definindo critérios para a fixação do quantum devido a título de dano moral, conforme já o demonstramos.

Nossa sugestão, então, é a de que se utilizem para a fixação da indenização devida pela violação à imagem da pessoa jurídica (ou como querem alguns, dano “moral” à pessoa jurídica) os mesmos critérios que os utilizados para a fixação do quantum devido pelo dano moral à pessoa física com pequenas variações e adaptações relativas aos itens “b”, “c” e “h” anteriormente retratados120.

Veja-se que, com as alterações, os parâmetros encaixam-se perfeitamente no caso de pessoa jurídica. Repassemo-los um a um, já com as mudanças, para termos certeza:

a) a natureza específica da ofensa sofrida;

b) a intensidade real, concreta, efetiva do ato lesivo praticado;

c) a repercussão da ofensa, no meio comercial, mercado e clientela específica da ofendida; d) a existência de dolo por parte do ofensor, na prática do ato danoso e o grau de sua culpa; e) a situação econômica do ofensor;

f) a capacidade e a possibilidade real e efetiva de o ofensor voltar a praticar e/ou vir a ser responsabilizado pelo mesmo fato danoso;

g) a prática anterior do ofensor relativa ao mesmo fato danoso, ou seja, se ele já cometeu a mesma falta; h) as práticas atenuantes realizadas pelo ofensor visando diminuir os danos da ofendida;

i) necessidade de punição.

Dessa forma, para a fixação da indenização do dano causado à pessoa jurídica observar-se-ão os critérios abordados no item 5.13.1, retro, nas letras “a”, “d”, “e”, “f”, “g”, e “i”, com as mesmas explicações. Vejamos, agora, apenas as adaptações feitas para as outras três alíneas.

b) Intensidade real, concreta, efetiva do ato lesivo praticado

Quando nos referimos à pessoa física dissemos que, da mesma maneira que não se poderão avaliar fatos e danos abstratamente, seria necessário examinar-se a intensidade real, concreta, efetiva do sofrimento do consumidor. Agora, no caso da pessoa jurídica não há que se falar em dor. Por isso, a atenção deve estar voltada para os eventos danosos, mas no sentido de avaliar sua intensidade.

E, da mesma maneira como no caso consumidor-pessoa física, cujo aspecto do sofrimento por ser subjetivo é

inavaliável, obrigando o aplicador do direito a trabalhar com presunções, o mesmo tem de ser feito no caso da pessoa jurídica.

Sem outra alternativa, então, é de se trabalhar com presunções fundadas em máximas de experiência e relacionadas a casos similares anteriores.

Será, por óbvio, presunção juris tantum, que poderá ser desconstituída pelo acusado de ter causado o dano ou seu responsável.

É trabalhoso, mas o magistrado terá de utilizar desse método para buscar entender e delimitar o grau real do ato lesivo praticado.

E ao final, após a colheita direta das provas capazes de apontar a intensidade do ato lesivo praticado, o magistrado deverá utilizar-se de outros elementos mais gerais (standarts), mais abstratos, obtidos pela experiência e tomados de outros feitos análogos já julgados para fixar a real intensidade do mal.

c) Repercussão da ofensa, no meio comercial, mercado e clientela específica da ofendida Dependendo do fato gerador do dano, a pessoa jurídica será mais ou menos afetada.

A questão aqui é análoga à da pessoa física. Lá dissemos — e mostramos com um exemplo — que é necessário levar em conta o meio social em que vive o consumidor e se o dano o atingiu naquele meio e de que forma, expondo-o aos demais, o que por certo fará variar o dano moral.

Diga-se o mesmo no tocante à pessoa jurídica. Se se trata, por exemplo, de uma negativação indevida do nome de uma pessoa jurídica no cadastro de inadimplentes e, uma vez descoberto o ato ilegal, é ele incontinenti cancelado, o efeito — e o dano — é um. Mas se a negativação ilegal é feita, e um banco que oferece crédito regular para capital de giro dessa pessoa jurídica descobre, o efeito é outro, muito pior.

Não se deve esquecer que, dependendo da repercussão no meio da clientela, o negócio todo da pessoa jurídica pode ruir. Tome-se o exemplo real ocorrido na capital de São Paulo — embora não na esfera das relações de consumo — da Escola de Base, que teve suas portas fechadas, quebrou, por culpa direta de informações falsas passadas pela polícia e publicadas pela imprensa.

h) Práticas atenuantes realizadas pelo ofensor visando diminuir os danos do ofendido

Da mesma maneira como no caso da pessoa física, além disso tudo, para fixação da indenização nos casos que envolvem os chamados produtos e serviços de massa, é preciso levar em consideração as ações do infrator após a ocorrência do dano.

haverá defeito e, logo, dano. E a boa-fé é objetiva: um standart a ser respeitado121.

Já a atitude do infrator posterior ao dano tem tudo de subjetivo: ele pode tanto ignorar a pessoa jurídica lesada (agindo com desprezo, arrogância, negligência e/ou má-fé) quanto acolhê-la e ajudá-la na diminuição de seu dano. Nesta hipótese o infrator assume a responsabilidade e demonstra boa-fé (subjetiva) em relação às circunstâncias que atingiram a atividade da pessoa jurídica no momento posterior ao evento.

Quando essa atitude louvável, legítima e de boa-fé ocorre, o magistrado deve levá-la em consideração para fixar o quantum de indenização em valores menores que os usuais.

Novamente entra em jogo aqui o caráter exemplar da fixação da indenização. Se o infrator, logo ao tomar ciência do evento danoso, corre em atendimento à pessoa jurídica, ele deve ser louvado e a indenização fixada em pequeno valor deve servir de exemplo positivo, exatamente para “inspirar” os demais agentes fornecedores a terem a mesma salutar atitude para com aqueles que eventualmente possam atingir.

É por isso que, em contrapartida, o inverso é verdadeiro: quando não há atendimento à pessoa jurídica, o quantum deve ser maior.

Todos os demais parâmetros funcionam tal e qual apresentados acima para o caso da fixação da indenização a favor do consumidor pessoa-física. Remetemos o leitor para os nossos comentários relativos àquelas outras alíneas.

De todo modo, veja-se um exemplo de fixação de indenização por dano à imagem da pessoa jurídica:

“DANO MORAL — Responsabilidade civil — Prestação de serviços —Telefonia — Relação de consumo caracterizada — Desprestígio e desconfiança sofridos por pessoa jurídica, microempresa, decorrentes de um telefone que não atende e nem lhe enseja contactar sua clientela e desenvolver bem o seu negócio — Idoneidade e imagem desta desgastadas — Indenização arbitrada em R$ 20.000,00”122.

PARTE 2