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2.2.2.3 OS TEXTOS DE NEGOCIAÇÃO

Diferentemente da Conferência de 1958, que tinha como base de trabalho projectos de artigos preparados pela CDI, a III Conferência não tinha qualquer texto base de negociação, tendo herdado do Comité de Fundos uma vasta gama de propostas e uma lista de tópicos. Durante a

58 Segundo o artigo 40º nº 2 do Regulamento Interno a expressão “Estados participantes” designa “todo o Estado

cujos representantes se tenham inscrito junto do Secretariado da Conferência como participantes na sessão em questão e que não tenham feito saber ao Secretariado que se retiraram da sessão ou de uma parte dela. O Secretariado tem um registo para este fim”.

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segunda Sessão, em 1974, a Conferência debateu um número considerável de propostas e projectos de artigos apresentados pelas diversas delegações, mas o andamento dos trabalhos era muito lento, pois o seu primeiro objectivo era tentar, através de negociações, reduzir o mais possível o número de textos que tinha perante si.

O problema foi, em parte, resolvido, em 197560, quando a Conferência decidiu confiar a cada um dos Presidentes dos Comités Principais61 a tarefa de preparar um texto formado por artigos, texto esse que iria servir de base de discussão. Os textos elaborados ficaram conhecidos por Texto Único (ou Simples) de Negociação (Oficioso)62. Estes textos, compostos por três partes, redigidas, separadamente, por cada um dos Presidentes dos três Comités Principais, reflectiam os resultados de todas as discussões formais e informais, sem prejuízo para a posição de qualquer delegação. Os textos eram meros instrumentos de trabalho e base de negociação, não representando “nem um texto negociado, nem um compromisso aceite”63. Em 1976, os textos foram revistos pelos Presidentes dos Comités e o Presidente da Conferência resolveu preparar um texto de negociação sobre a solução de controvérsias, que não fazia parte da agenda dos três Comités Principais, o qual passou a constituir a quarta parte do Texto Único de Negociação (Oficioso)64.

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A delegação de Singapura foi a primeira a apresentar, em 7 de Abril de 1975, uma proposta, no Comité Geral, no sentido de que a Conferência devia adoptar um documento simples, para servir de base de discussão. Logo de seguida, a delegação chilena fez uma intervenção no mesmo sentido. Outras delegações, no entanto, levantaram reservas a um tal método, nomeadamente a delegação chinesa e polaca. Por exemplo, o delegado russo disse perante o Comité Geral: “querer estabelecer neste momento um documento único seria lançar-se numa aventura perigosa e ilusória”. Apesar disso, o Plenário, no seu 55º encontro, em 18 de Abril, aprovou o método dos textos de negociação -

in KOH, Tommy T. B. and JAYAKUMAR, Shanmugam - Negotiating Process of the Third United Nations

Conference ..., cit., p. 114-115; NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el

Derecho del Mar: Documentos Oficiales. Nueva York : Publicación de las Naciones Unidas. Vol. IV, 1975. Número

de venta: S. 75.V.10, p. 145.

Os textos que ao longo da Conferência apareceram foram:

- 7 de Maio de 1975: Texto Único (ou Simples) de Negociação (Oficioso); - 6 de Maio de 1976: Texto Único de Negociação (Oficioso) Revisto;

- 6 de Maio de 1976: Texto Único de Negociação (Oficioso) - Solução de Controvérsias; - 23 de Novembro de 1976: Texto Único de Negociação (Oficioso) - Solução de Controvérsias; - 15 de Julho de 1977: Texto Integrado (ou Composto) de Negociação (Oficioso);

- 28 de Abril de 1979: Texto Integrado de Negociação (Oficioso) / Revisão 1; - 11 de Abril de 1980: Texto Integrado de Negociação (Oficioso) / Revisão 2;

- 28 de Agosto de 1980: Projecto de Convenção sobre o Direito do Mar (Texto Oficioso); - 28 de Agosto de 1981: Projecto de Convenção sobre o Direito do Mar.

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Cada Presidente de cada Comité Principal seguiu um método diferente para a preparação do texto simples de negociação. Assim, pelo que toca ao Comité I, o seu Presidente, Engo, pediu a Christopher W. Pinto, presidente do Grupo de Negociação Informal, para preparar o texto e fixou-lhe um prazo para o efeito. Muito embora Pinto tivesse preparado o texto, não o entregou dentro do prazo estipulado, pelo que não foi incorporado no texto de negociação. O texto posto a circular foi da autoria de Engo e de alguns amigos seus - KOH, Tommy T. B. and JAYAKUMAR, Shanmugam - Negotiating Process of the Third United Nations Conference ..., cit., p. 116.

62 Doc. A/CONF.62/WP.8, de 7 de Maio de 1975, in NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las

Naciones Unidas sobre el Derecho del Mar ..., vol. IV, cit., p. 145.

63 NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el Derecho del Mar:

Documentos Oficiales. Nueva York : Publicación de las Naciones Unidas. Vol. V, 1976. Número de venta: S.76.V.8,

p. 142.

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Devido ao carácter de negociação global presente na Conferência, as negociações reais baseadas no princípio do “dá e recebe” não podiam ter lugar sem um texto contendo artigos sobre todos os assuntos da agenda. Por isso, a Conferência recomendou, em Setembro de 1976, que o seu Presidente e os Presidentes dos três Comités, em conjunto, preparassem um texto composto, abarcando todos os assuntos que estavam a ser tratados. Esse texto foi preparado em 1977, com base nos textos preliminares, no trabalho dos três Comités Principais e grupos formais e informais de negociação. O resultado foi o Texto Integrado (ou Composto) Oficioso para Fins de Negociação65.

Enquanto a revisão dos textos de negociação anteriores estava a cargo dos Presidentes dos Comités e do Presidente da Conferência, a revisão do Texto Integrado Oficioso para Fins de Negociação deveria resultar das próprias negociações e não da iniciativa de uma simples pessoa66. Por isso, o texto passou a ser revisto colectivamente pelos quatro presidentes, Presidente da Conferência e Presidentes dos três Comités Principais, em colaboração com o Presidente do Comité de Redacção e do Relator Geral67. Assim nasceu o Collegium68. O Texto Integrado Oficioso para Fins de Negociação Revisto de 1979 (8ª Sessão)69 foi seguido de uma segunda revisão, na 9ª Sessão da Conferência, na Primavera de 198070. No final da 9ª Sessão resumida, no

65 Doc. A/CONF.62/WP.10, in NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el

Derecho del Mar: Documentos Oficiales. Nueva York : Publicación de las Naciones Unidas. Vol. VIII, 1978.

Número de venta: S.78.V.4, p. 1-67 .

66 NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el Derecho del Mar:

Documentos Oficiales - Informes de las Comisiones y de los Grupos de Negociacion. Nueva York : Publicación de

las Naciones Unidas. Vol. X, 1978. Número de venta: S.79.V.4, p. 5-9, maxime § 11, p. 8 - “A revisão do Texto Integrado Oficioso para Fins de Negociação será da responsabilidade colectiva do Presidente da Conferência e dos Presidentes dos Comités Principais, que actuarão conjuntamente como uma equipa presidida pelo Presidente. Com esta equipa colaborarão o Presidente do Comité de Redacção e o Relator Geral”.

67 Aliás, já o Texto Integrado Oficioso para Fins de Negociação, por decisão da III Conferência, tomada na 78ª

Sessão plenária, em 28 de Junho de 1977, foi preparado em conjunto pelo Presidente da Conferência e pelos Presidentes dos três Comités Principais - NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas

sobre el Derecho del Mar ..., vol. VIII, cit., p. 69.

68 Sobre o collegium disse Koh, Presidente da Conferência, em 9 de Dezembro de 1982: “o collegium da

Conferência é um órgão único; não está referido em nenhuma parte das regras de procedimento, mas revelou-se útil para facilitar o desenrolar dos trabalhos da Conferência” - in NATIONS UNIES - Troisième Conférence des Nations

Unies sur le Droit de la Mer ..., vol. XVII, cit., p 105.

69 Doc. A/CONF.62/WP.10/Rev. 1.

No ano de 1979, Portugal propôs aos seis países de língua oficial portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné, Moçambique e S. Tomé e Príncipe) a tradução em língua portuguesa da Convenção. As reuniões realizaram-se no Mindelo, em Cabo Verde, em Junho de 1981, no Rio de Janeiro, em Janeiro de 1982, em Lisboa, em Junho do mesmo ano, em S. Tomé e Príncipe, em Fevereiro de 1983, em Maputo, Moçambique, em Janeiro de 1984. Além destas reuniões, realizaram-se numerosas sessões de trabalho, tendo todo esse labor levado à elaboração de uma versão portuguesa da Convenção, contida in MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS E MINISTÉRIO DO MAR - Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar: Versão em Língua Portuguesa com Anexos e Acta

Final da Terceira Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Lisboa : 1985. Biblioteca Diplomática -

Série C.

70 NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia sobre el Derecho del Mar: Texto Integrado Oficioso para

Fines de Negociacion/Revision 2 (A/CONF.62/WP.10/Rev.2, 11 abril 1980). Nueva York : Publicación de las

Verão de 1980, a Conferência decidiu elevar o estatuto do Texto Integrado, já com algumas modificações, à categoria de Projecto de Convenção (Texto Oficioso)71. Era, ainda, um texto de negociação, com carácter informal.

O texto oficial do Projecto de Convenção72 apareceu em 28 Agosto de 1981 (10ª Sessão) com algumas alterações de redacção e com disposições relativas à sede da Autoridade (Jamaica) e do Tribunal do Direito do Mar (Hamburgo), com o que ficou concluída a fase oficiosa das negociações. Apesar de ser já um texto oficial, nada obstava a que as delegações continuassem as negociações e apresentassem alterações. As últimas modificações foram feitas na 11ª e última Sessão e resultaram, não de propostas formais de alterações apresentadas pelas diversas delegações, que foram retiradas, mas sim de propostas feitas pelo collegium e pelo Presidente da Conferência, numa tentativa de vencer a oposição americana ao regime jurídico do fundo do mar. Aliás, a Sessão final da Conferência foi dedicada, essencialmente, às questões ligadas com a criação da Comissão Preparatória da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos e do Tribunal Internacional do Direito do Mar e à protecção a ser concedido aos investimentos preparatórios das actividades mineiras do fundo do mar, feitos antes da entrada em vigor da Convenção. Com base nas deliberações da Conferência, foram incorporadas algumas alterações no projecto de convenção e foram preparados projectos de resoluções sobre a Comissão Preparatória, os investimentos pioneiros e participação de outras entidades que não Estados. Finalmente, o Plenário decidiu que se tinham esgotados todos os esforços para adoptar o projecto de convenção por consenso e, a pedido do representante dos Estados Unidos da América (EUA)73, foi feita uma votação registada, em 30 de Abril de 1982 e a Convenção juntamente com as Resoluções I a IV, como um todo, foram adoptadas. Os Estados Unidos da América votaram contra74 (porque não concordavam com

71 NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia sobre el Derecho del Mar: Proyecto de Convencion sobre el

Derecho del Mar - Texto Oficioso (A/CONF.62/WP.10/Rev.3, de 22 de septiembre 1980). Nueva York :

Publicación de las Naciones Unidas, 1982. A.

72 Doc. A/Conf.62/L.78, in NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el

Derecho del Mar: Documentos Oficiales. Nueva York : Publicación de las Naciones Unidas. Vol. XV, 1983.

Número de venta: S.83.V.4, p. 195-274.

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NACIONES UNIDAS - Tercera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el Derecho del Mar:

Documentos Oficiales. Nueva York : Publicación de las Naciones Unidas. Vol. XVI, 1984. Número de venta:

S.84.V.5, p. 154 § 26, também referido pelo Presidente na sua informação transcrita na página 158, § 8: “... antes da sessão recebeu uma carta dirigida pelo chefe da delegação dos Estados Unidos, cujo texto era o seguinte: ‘tendo em conta de que temos tido dificuldades com o conjunto das propostas que foram apresentadas, respeitosamente solicito que se proceda a uma votação nominal registada’”.

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Antes do encontro plenário informal da III Conferência, em finais de Setembro de 1982, para adopção, pelo Comité de Redacção, das alterações finais, o Reino Unido e a República Federal da Alemanha pediram, de novo, ao Grupo dos onze para fazer uma última tentativa no sentido de ser melhorada a parte da Convenção relativa ao fundo do mar. Nessa altura, a Administração americana enviou missões de alto nível aos diversos países da Europa Ocidental e ao Japão, tendo conseguido convencer o governo japonês, francês, alemão e inglês a não assinarem, de imediato, a Convenção ou, pelo menos, não a ratificarem, de imediato - SCHMIDT, Markus G., op. cit., p. 278-279. Sobre as consequências para os Estados Unidos da não participação na Autoridade Internacional e seus órgãos ver JONES,

o regime jurídico do fundo do mar) bem assim como, embora por razões diferentes, a Turquia, a Venezuela e Israel. Abstiveram-se a Bélgica, Bulgária, Bielorrússia, Checoslováquia, República Democrática Alemã, República Federal da Alemanha, Hungria, Itália, Luxemburgo, Mongólia, Países Baixos, Polónia, Espanha, Tailândia, Ucrânia, URSS e Reino Unido da Grã Bretanha e Irlanda do Norte. A adopção formal da Convenção acabou o trabalho substantivo da Conferência, após noventa e três semanas de encontros, desde a 1ª Sessão organizatória, que teve lugar em Nova Iorque, em Dezembro de 1973. O Comité de Redacção encontrou-se em Julho e Agosto de 1982 e a Conferência reuniu, de novo, em Nova Iorque, entre 22 e 24 de Setembro, para apreciar as recomendações do Comité de Redacção. Durante estes três dias, a Conferência completou, formalmente, o seu trabalho, aprovando, no total, mais de 5000 alterações técnicas recomendadas, desde 1980, pelo Comité de Redacção. A Conferência, também, aprovou o projecto de Acta Final, contendo o texto da Convenção e documentos conexos e uma breve história narrativa dos acontecimentos verificados e da evolução da Conferência, desde 1974. Ao aprovar o projecto de Acta Final, a Conferência concordou que o título do tratado seria “Convenção Das Nações Unidas Sobre o Direito do Mar”.

A Resolução I, aprovada ao mesmo tempo que a Convenção, prevê que, quando a Convenção obtiver cinquenta assinaturas ou adesões, a Comissão Preparatória inicia o seu funcionamento. Por seu turno, o artigo 308º da Convenção prevê a sua entrada em vigor um ano após o depósito do sexagésimo instrumento de ratificação ou adesão. Houve 119 assinaturas e a ratificação do Fiji, na data em que a Convenção foi aberta à assinatura, em 10 de Dezembro de 1982. A Convenção continuou aberta à assinatura até 9 de Dezembro de 1984, no Ministério dos Negócios Estrangeiros da Jamaica e desde 1 de Julho de 1983 até 9 de Dezembro de 1984, também, na sede das Nações Unidas.

Nos anos seguintes, houve a preocupação, especialmente na 38ª e 39ª Sessões da Assembleia Geral das Nações Unidas, de preservar o carácter unificado da Convenção e respectivas Resoluções e da necessidade de todos os Estados se absterem de tomar qualquer acção no sentido de minar a Convenção ou de prejudicar os seus objectivos e propósitos. A Assembleia Geral, frequentemente, apelava para a Resolução nº 37/66, de 3 de Dezembro de 1982, e para o 3º parágrafo do Preâmbulo da Convenção, que referem a relação íntima entre os problemas do espaço oceânico e a necessidade de serem considerados como um todo75.

Ambassador William B. - The International Sea-Bed Authority Without U.S. Participation. Ocean Developmant and International Law Journal. New York: Crane Russak. ISSN 0090-8320. 12, number 3-4: (1983), p. 151-171.

75 SIMMONDS, Kenneth R. - A. 1. Introduction and appendices. In SIMMONDS, Kenneth R. (Ed.) - «New

Directions in the Law of the Sea (New Series)». London. Rome. New York: Oceana Publications, Inc., 1994 (August). ISBN 0-379-16550-3, p. 1 e 2.

Relativamente ao regime internacional do fundo do mar, podemos distinguir dois períodos no trabalho da Conferência: um primeiro período até 1976, caracterizado pela bipolarização pelo Grupo dos 77, que apoiava um mecanismo internacional forte, com poder discricionário, relativamente às actividades no fundo do mar, e por alguns países industrializados, favoráveis à participação dos Estados Partes da Convenção e suas entidades em tais actividades, à luz de um sistema internacional de licenciamento flexível; em 1976, com o aparecimento da ideia do sistema paralelo começou um novo período. O sistema paralelo foi um sistema pensado para permitir a outras entidades, que não a Autoridade, desenvolver actividades no fundo do mar. Assim sendo, quer a Autoridade quer os Estados Partes da Convenção, bem assim como entidades públicas e privadas por estes patrocinadas, podem desenvolver actividades de exploração e aproveitamento dos recursos do fundo dos mares.

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