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2 HISTÓRICO ACERCA DA INSTALAÇÃO DA ORDEM ECONÔMICA

3.2 ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS

3.2.1 Personalidade e Capacidade Jurídica

Acerca de um conceito sobre organização internacional lembra Mazzuoli que não há uma definição precisa. Relata que na Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1986 consta a simples definição de que uma organização internacional é uma organização intergovernamental.162

Assim, propõe o doutrinador um conceito mais completo, definindo as Organizações Internacionais como “uma associação voluntária de Estados, criada por um convênio constitutivo e com finalidades pré-determinadas, regida pelas normas do Direito Internacional, dotada de personalidade jurídica distinta da dos seus membros”.163

Dessa definição extrai-se que as organizações internacionais são entidades intergovernamentais constituídas por ato de vontade dos Estados, mediante tratado de caráter permanente, e que possuem personalidade jurídica distinta da dos Estados que dela fazem parte.

Esse tratado de caráter permanente da qual decorre a criação de um organismo internacional é denominado “Tratado Constitutivo” ou “Estatuto”. No entanto, outras denominações podem ser utilizadas, como são os casos, por exemplo, das denominações “Carta das Nações Unidas” da qual decorreu a instituição da ONU; e do “Acordo Constitutivo” do qual adveio a criação da OMC.164

Importante observar que “o convênio constitutivo da organização é a sua carta orgânica, sua constituição, em relação à qual todas as demais normas inferiores devem ser subordinadas. Tais instrumentos não estão sujeitos a reservas165 e têm primazias sobre quaisquer outros tratados internacionais comuns”.166

162 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 4ed. rev. atual. e ampl. RT: São Paulo, 2010, p. 553.

163 Ibidem. 164

VARELLA, Marcelo D. op. cit., p. 262. 165

Tal qual previsto nas Convenções de Viena sobre Direitos dos Tratados de 1969 e 1986, reserva pode ser definida como “uma declaração unilateral, qualquer que seja a sua redação ou denominação, feita por um Estado ou por uma organização internacional ao assinar, ratificar, aceitar

De igual modo que os Estados, os organismos internacionais também possuem personalidade jurídica. Sendo assim, são eles sujeitos do Direito Internacional.

Lembra, no entanto, Cretella Neto que o reconhecimento dessa personalidade jurídica, se comparada aos Estados, é relativamente recente. Isso porque, “o reconhecimento de uma organização internacional como sujeito de Direito Internacional surgiu de modo expresso e inequívoco, pela primeira vez, no parecer consultivo (...) proferido pela Corte Internacional de Justiça em 1949”.167 Nesse

parecer no qual se tratava da reparação de danos sofridos por funcionário a serviços das Nações Unidas na Palestina, consignou-se:

Isto significa que a Organização é uma questão de Direito Internacional, [uma] vez que tem a capacidade de ter direitos e deveres internacionais, bem como a capacidade de fazer valer seus direitos mediante reclamações internacionais.168

Salienta-se, no entanto, que o aparecimento de uma Organização Internacional foi no início do século XIX, quando na “Conferência de Viena previu[- se] a constituição das comissões fluviais”, datando a primeira Comissão – Comissão fluvial de Rio Rhein – de 1831 constiuída pela Convenção Mayence.169 O que se

atribuiu recentemente, mediante a decisão da Corte Internacional de Justiça – CIJ, foi a personalidade jurídica de Direito Internacional a essas Organizações.

Fato é que atualmente não há óbice, tampouco divergência doutrinária conhecida, em se reconhecer às Organizações Internacionais personalidade jurídica de Direito Internacional. Ocorre que a personalidade jurídica atribuível a esses organismos encontra limite de competência que é predeterminado pelos Estados no próprio tratado constitutivo.

Assim, conquanto ambos os sujeitos possuam personalidade jurídica de Direito Internacional, diferenciam-se pelo modo como exercem suas capacidades. Os Estados por serem sujeitos básicos do Direito e criadores dos demais sujeitos, possuem ampla competência para exercerem seus direitos e deveres na seara ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar os efeitos jurídicos de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado ou a essa organização”.

166 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. op. cit., p. 556.

167 CRETELLA NETO, José. Empresa transnacional e direito internacional: exame do tema à luz

da globalização. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 53.

168 Ibidem, p. 53.

internacional. Já a capacidade das organizações internacionais está adstrita ao disposto nos seus estatutos constitutivos.

Acerca dessa diferenciação, expõe Laviña:

Há, assim, importante diferença entre a personalidade jurídica internacional do Estado e dos Organismos Internacionais; enquanto o Estado, como sujeito básico e primário do direito internacional e criador dos demais sujeitos do Direito das Gentes, tem a totalidade de direitos e deveres – que os reconhece o Direito Internacional –, os Organismos Internacionais, como sujeitos criados pelos Estados, derivados ou secundários, somente podem fazer aquilo para o qual estão autorizados, de forma expressa ou implícita, em suas cartas constitutivas.170

No mesmo sentido é o comentário de Varella:

Os Estados atribuem capacidade às Organizações Internacionais. Atende- se ao princípio da especialidade, ou seja, a Organização Internacional tem capacidade apenas para os fins específicos para os quais foi criada. Neste sentido, as organizações têm uma capacidade funcional, ou seja, para aquelas funções para as quais foram criadas, e não uma capacidade universal, como os Estados, que têm irrestrito poder de agir no âmbito de sua soberania.171

Essa limitação na competência atribuída às organizações internacionais advém dos próprios Estados no momento de instituição delas. Assim, “são os Estados que atribuem capacidades internacionais de controle às Organizações Internacionais”.172

Portanto, pode-se afirmar que, conquanto essas organizações possuam personalidade jurídica de Direito Internacional e são por este regidas, a capacidade a elas atribuídas deverá ser exercida nos limites dos tratados constitutivos.

Nesse ponto é importante diferenciar as Organizações Internacionais das Organizações Não-Governamentais – ONGs. É que enquanto as primeiras, conforme mencionado, são regidas pelo ordenamento internacional, as ONGs, em regra, subordinam-se às normas internas do país cuja sede estão registradas. Assim, parte da doutrina entende que as ONGs – em que pese, às vezes, serem mencionadas em alguns tratados – não possuem personalidade jurídica de Direito Internacional.

Nesse sentido menciona Soares:

Quanto às ONGs, reafirmamos o que dissemos em linhas anteriores: o fato de estarem mencionadas em tratados internacionais e instituídas como espécie de órgãos de implementação e supervisão de normas pactuadas (e

170

LAVIÑA, Félix. op. cit., p. 26.Tradução livre. 171 VARELLA, Marcelo D. op. cit., p. 269. 172 Ibidem, p. 262.

caso tivesse havido a instituição de qualquer organização intergovernamental, seriam assimiláveis aos Secretariados das mesmas), não lhes confere a personalidade de Direito Internacional.173

Vê-se, portanto, que pela doutrinada clássica não é razoável a atribuição de personalidade jurídica de Direito Internacional às Organizações não- Governamentais. Importante ressalvar que a doutrina internacionalista reconhece tal personalidade jurídica ao Cômite Internacional da Cruz Vermelha, em que pese possuir características de uma ONG.

Comentando sobre esse Cômite, pondera Soares:

Nesse particular aspecto, merece destaque o Cômite Internacional da Cruz Vermelha, o CICV, entidade de Direito suíço, responsável pela proposta de negociações de importantes convenções multilaterais sobre Direito Humanitário, e encarregada, por expressa determinação dos Estados, nas quatro Convenções de Genebra de 1947 e em seus dois Procotolos de 1974, de importantes funções internacionais, a ponto de hoje ser pacífico, na doutrina internacionalista, o reconhecimento de sua personalidade jurídica internacional, conquanto não seja uma organização pública interestatal.174