Terceira fase: 1986 a 1994

A escolha do Uruguai para se dar início a nova rodada de negociações não foi por acaso. Pretendia-se por essa rodada dar ênfase à participação dos países em desenvolvimento.

Da Reunião Ministerial iniciada 14 de setembro de 1986, resultou, após uma semana de intensas negociações, em 20 de setembro do mesmo ano, uma declaração denominada Declaração de Punta del Este. Nessa declaração previu-se os seguintes temas que seriam objetos de negociações no desenvolver da Rodada Uruguai: medidas tarifárias e não tarifárias; produtos tropicais; produtos obtidos da exploração de recursos naturais; têxtil e tecido; agricultura; artigos do GATT; medidas de salvaguardas; códigos da Rodada de Tóquio; subvenções e medidas

119 _{Organización Mundial del Comercio. op. cit., p. 207.} 120 _Ibidem.

compensatórias; solução de controvérsias; aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio; medidas em máteria de investimentos relacionadas com o comércio; funcionamento do sistema GATT e comércio de serviços. Tratava-se da rodada de negociações mais ambiciosa que jamais fora realizada.121

Para a análise e deliberação de cada um desses temas instituiu-se quinze grupos de negociação que iniciaram seus trabalhos em fevereiro de 1987. Ao final de 1998, na Reunião Ministerial realizada em Montreal, seis grupos de trabalho apresentaram resultados. Os demais, principalmente os que tratavam da agricultura, medidas de salvaguarda, têxtil e tecido, não haviam obtido sucesso nas negociações.122

Desses, o tema mais controvertido continuava sendo a agricultura em especial pelas desavenças entre os Estados Unidos e as Comunidades Europeias, tal como se verifica no Informe sobre o Comércio Mundial de 2007:

Os Estados Unidos insistiram na supressão de todos os subsidios causadores de distorção no comércio da agricultura e propuseram um acordo sobre medidas de reforma no curto prazo. As Comunidades Europeias, por outro lado, somente estavam dispostas a fazer reduções limitadas e graduais dos subsídios agrícolas. Esse entrave em relação à agricultura freiou as negociações sobre outros temas que ainda estavam por resolver.123

Aliás, o tema agricultura dominou o debate nos anos transcorridos entre a reunião em Montreal e a reunião de Bruxelas, em dezembro de 1990. As posições norte-americana e das Comunidades Europeias permaneciam em conflito o que resultou em fracasso desta Reunião Ministerial tendo em vista que o prazo para a conclusão do trabalhos – 1º de junho de 1991 – se aproximava. Um mês antes deste prazo, o Congresso norte-americano aprova a prorrogação por dois anos para que o Presidente, George Herbert Walker Bush, pudesse exercer a faculdade de negociar por medida provisória. Desse modo, as negociações com os Estados Unidos se tornariam mais céleres, haja vista serem realizadas pelo próprio Presidente.124

A par disso, as negociações recebem ainda outro estímulo com a decisão das Comunidades Europeias em reformar a sua Política Agrícola Comum – PAC. Com isso, as negociações avançaram de forma considerável e iniciou-se a elaborar um

121

Organización Mundial del Comercio. op. cit., p. 207. 122

Ibidem.

123 _{Ibidem, p. 205. Tradução livre.} 124 _{Ibidem, p. 207.}

projeto que daria termo a Rodada Uruguai. O projeto denominado “Projeto de Ata Final” que contemplava, inclusive, um mecanismo unificado de solução de controvérsias e a instituição de uma nova organização internacional do comércio que substituísse o GATT foi publicado em dezembro de 1991.125

No entanto, os governos não estavam dispostos a adotá-lo porque ainda havia discordâncias acerca do tema agricultura. Discordâncias essas decorrentes, principalmente, das continuas divergências das Comunidades Europeias com os Estados Unidos.126

Os países participantes expressavam seus desapontamentos com a rodada de negociações especialmente em virtude de a data final – 1º de junho de 1993 – para o término dos trabalhos se aproximar. Nesse estágio, os observadores apostavam que a Rodada Uruguai continuaria por alguns anos posteriores.

A fim de evitar o insucesso dessa rodada de negociações, em março de 1993, trinta e sete país – desenvolvidos e em desenvolvimento – enviam uma carta aos governos dos Estados Unidos, das Comunidades Europeias e do Japão pedindo que estes dessem a devida prioridade que a Rodada Uruguai merecia.127

Em abril, Estados Unidos e as Comunidades Europeias parecem ter acatado o recado ao chegarem a um consenso sobre alguns temas. Além disso, o Congresso norte-americano prorroga até 15 de abril de 1994 a faculdade – que concedera em 1991 ao Presidente Bush – de negociação por medida provisória ao Presidente Bill Clinton.128

Com essas atitudes, as negociações são retomadas e passam a registrar consideráveis progressos principalmente no que tange o acesso aos mercados e serviços. Naqueles últimos dias as negociações foram intensas terminando na manhã do dia 15 de dezembro de 1993. Nesse mesmo dia, no período da tarde, o Diretor Geral, Peter Sutherland, anunciou a conclusão dos trabalhos informando que as negociações haviam sido obtidas mediante o consenso de todos os participantes. Bastava, agora, a assinatura da Ata Final da Rodada Uruguai.129

125 _{Organización Mundial del Comercio. op. cit., p. 207.} 126 Ibidem, p. 208. 127 Ibidem. 128 _Ibidem. 129 _{Ibidem, p. 208-209.}

Finalmente, em 15 de abril de 1994, na cidade de Marraqueche, no Marrocos, a Ata Final é assinada pelos cento e dezessete países participantes das negociações.

Comentando a Rodada Uruguai, pondera Amaral Júnior que: “a longa duração da Rodada se explica pelos frequentes impasses surgidos a assinalar as tensões entre os países desenvolvidos e as nações em desenvolvimento, além da complexidade dos temas com que os negociadores se depararam”.130

Encerrava-se, assim, após quase oito anos de intensas negociações comerciais multilaterais, a terceira fase que resultou numa ampla reforma do sistema multilateral do comércio desde 1947 quando se instituíra o GATT.

2.4.4. Resultados da Rodada Uruguai – Instituição da Organização Mundial do