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TÁCITO TÁCITO EXPLÍCITO

2.4 A Gestão da Inovação – avanços de pesquisas em manufatura e serviços

2.4.1 Pesquisas clássicas sobre inovação

O crescente dinamismo da economia e sociedade expresso por Nordström e Ridderstrale (2001) mostra que a competição global não mais se dá com base em ativos físicos e posições

geográficas. A nova competição ocorre pela disputa dos melhores cérebros, capazes de gerar as ideias mais criativas, sintonizadas com as tendências da sociedade e capazes também de transformar ideias em produtos e serviços. Já faz muito tempo que governos, entidades e pesquisadores dedicam esforços para o entendimento do fenômeno de inovação e seu impacto na sociedade e na economia. Para poder estudar a inovação, é necessário definir o que é o fenômeno da inovação e, entre as muitas definições existentes, a escolhida para este estudo é:

“A inovação começa com uma ideia, passa pelo desenvolvimento de um novo produto, processo ou serviço e chega até o mercado, como um bem que satisfaz necessidades físicas, econômicas e sociais.” (MARQUIS, 1969).

Entender o conjunto de processos e inúmeros fatores internos e externos à inovação na empresa é o objetivo da área de pesquisa em gestão da inovação. O Manual de Oslo publicado pela OCDE (Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento) dá um entendimento mais amplo do interesse em pesquisar a gestão da inovação:

“A expressão ‘economia baseada no conhecimento’ foi cunhada para descrever as tendências, verificadas nas economias mais avançadas, e a maior dependência de conhecimento, informações e altos níveis de competência e a uma crescente necessidade de pronto acesso a tudo isto. ... Dentro de uma economia baseada no conhecimento, a inovação parece desempenhar um papel central. Até recentemente, no entanto, os processos de inovação não eram suficientemente compreendidos. Um melhor entendimento surgiu em decorrência de vários estudos feitos nos últimos anos. No nível macro, há um substancial conjunto de evidências de que a inovação é o fator dominante no crescimento econômico nacional e nos padrões do comércio internacional. No nível micro — dentro das empresas — a atividade de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) é vista como o fator de maior capacidade de absorção e utilização pela empresa de novos conhecimentos de todo o tipo, não apenas conhecimento tecnológico.” (Manual de Oslo, 2004, p. 31).

Conforme apresentado na seção 1.3, a inovação tem sido estudada por diversas óticas e linhas de pensamento das quais se destacam a de pesquisa econômica e a de pesquisa organizacional, sendo a organizacional o foco desta tese. Nas décadas de 1970 e 1980, importantes pesquisas foram desenvolvidas aprofundando o conhecimento sobre os aspectos organizacionais da inovação e que influenciaram um grande corpo de pesquisas subsequentes.

Segundo Brown e Eisenhardt (1995, p. 345), as pesquisas dessa época caracterizam-se pelo objetivo comum de medir a influência positiva e negativa de um grande número de fatores organizacionais, em projetos de novos produtos que obtiveram sucesso e fracasso. Os principais seriam: na Inglaterra, o projeto SAPPHO Studies (ROTHWELL ET AL, 1974); nos EUA, o MIT estudou a comunicação interna e externa em times de projeto (ALLEN, 1977); no Canadá foi desenvolvido o projeto NewProd (COOPER, 1979; COOPER e KLEINSCHMIDT, 1987), e nos EUA foi desenvolvido o projeto Stanford Innovation Project (ZIRGER e MAIDIQUE, 1990).

Embora essas pesquisas não tenham confluído para um conjunto comum de conclusões sobre quais sejam os fatores de sucesso e fracasso sobre projetos de novos produtos, a análise abrangente e contextualizada de distintas regiões do mundo motivou o desenvolvimento de pesquisas com foco mais estreito e consequentemente mais aprofundadas.

Com a emergência do desenvolvimento de novos produtos como o motor de uma nova tônica competitiva mundial, a partir das décadas de 1970 e 1980, e a clara liderança do Japão nessa nova economia, foram desenvolvidas pesquisas comparativas entre as práticas e modelos de inovação japonesas e ocidentais, particularmente na indústria automobilística (CLARK e FUJIMOTO, 1991; CUSUMANO e NOBEOKA, 1998). Outras obras derivaram de pesquisas em setores industriais diversificados que não só o automotivo (CLARK e WHEELRIGHT, 1993; e REINERTSEN, 1997).

Essas pesquisas, que com o tempo receberam o nome de NPD – New Product Develoment -, caracterizam-se por desenvolver modelos normativos de como gerir a inovação (projetos de desenvolvimento de novos produtos) elaborando cientificamente recomendações, modelos, ferramentas e melhores práticas, com o objetivo de estruturar a empresa para seus esforços de inovação. Duas contribuições são particularmente importantes para esta tese, a primeira é o modelo chamado de “funil de inovação” (CLARK e WHEELRIGHT, 1993, p. 291-362), ilustrado na Figura 1.2 que sintetiza os principais elementos estratégicos e táticos que compõem a gestão da inovação. A segunda contribuição é a classificação de quatro tipos de time de projeto (funcional, lightweight, heavyweight e autônomo), associando aspectos de autonomia e liderança do time com os tipos de inovação perseguidos (CLARK e WHEELRIGHT, 1993, p. 524-532).

Uma vez desenvolvidos e apresentados os primeiros modelos normativos de desenvolvimento de novos produtos, houve uma segunda geração de pesquisas mais específicas para aprimorar os modelos. Alguns exemplos são como gerir a inovação em organizações de grande porte que desenvolvem uma grande quantidade de projetos simultaneamente (CUSUMANO e NOBEOKA, 1998), e como estruturar um processo decisório alinhado com a estratégia da empresa que estabeleça critérios para alocação de recursos e para a escolha dos melhores projetos para receber esses recursos (COOPER, EDGETT e KLEINSCHMIDT, 2001).

São importantes também as pesquisas de revisão da literatura que classificam distintas linhas de pensamento, organizam os temas e apontam oportunidades de contribuição para o conhecimento, em que se destacam Brown e Eisenhardt (1995), Krishnan e Ulrich (2001) com foco na inovação na manufatura, e Johne e Storey (1998) com foco na indústria de serviços. Na revisão de Brown e Eisenhardt (1995), as autoras analisaram um conjunto de pesquisas empíricas de 1969 a 1995, classificando-as em três correntes de pensamento: “plano racional”, “rede de comunicações” e “resolução disciplinada de problemas”. Segundo as autoras, apesar de haver uma sobreposição de objetivos de pesquisa, cada corrente de pensamento mantém foco em aspectos específicos do desenvolvimento de produtos. A corrente “plano racional” não parte de uma teoria dominante para explicar a inovação, mas busca, de forma abrangente, identificar fatores determinantes do desempenho financeiro das inovações na empresa. A corrente “rede de comunicação” possui um foco bem mais estreito, buscando entender os efeitos da comunicação interna e externa, e o processamento de informações sobre os projetos de inovação. Por sua vez, a corrente “resolução disciplinada de problemas” também parte da teoria de processamento da informação e analisa como a organização se estrutura em termos de times, líderes, estratégias, ferramentas, e fornecedores mobilizam-se e como esses cooperam para vencer os problemas típicos de um projeto de novo produto. (BROWN e EISENHARDT, 1995, p. 345-347).

A revisão das contribuições dessas correntes de pensamento permitiu a construção de um modelo lógico de fatores organizacionais que afetam o sucesso de projetos de novos produtos, destacando-se as relações entre os fatores e sua robustez comprovada por pesquisas empíricas (BROWN e EISENHARDT, 1995, p. 346). Esse modelo, ilustrado na Figura 1.1 do Capítulo 1, é de particular relevância para esta pesquisa, pois destaca as relações de influência dos clientes como um dos fatores de sucesso nos projetos de novos produtos.

Segundo Brown e Eisenhardt (1995, p. 351), um dos resultados em que houve consenso nas pesquisas clássicas em NPD (SAPPHO, NewProd, e Stanford Innovation Project) foi na identificação do fator “vantagem de produto” (product advantage) como um dos principais fatores de sucesso para projetos de novos produtos. “Vantagem de produto” é o nome dado ao conjunto de atributos tangíveis e intangíveis (benefícios, qualidade, status, custo, entre outros) que são percebidos como valor para os clientes, pois esse conjunto de atributos soluciona eficientemente as necessidades dos clientes.

Com significados similares, a “vantagem de produto” recebeu outros nomes nas distintas correntes de pensamento em NPD. A corrente “plano racional” entende que para construir “efetividade de produto” é necessário um planejamento rigoroso e execução eficiente de um processo de desenvolvimento de novos produtos (BROWN e EISENHARDT, 1995, p. 353).

A corrente “rede de relacionamentos”, porém, entende que o desempenho do projeto de novo produto é fortemente afetado pela intensidade de comunicação externa do time de projeto, em que um dos principais atores é o cliente como fonte de informação para desenvolver conceitos de produto. Mais especificamente, essa comunicação externa ocorre pela presença de indivíduos no time de projeto que expandem as fronteiras de informação e conhecimento devido à sua intensa e rica rede de relacionamentos, que tem os clientes como um ator importante dessa rede (BROWN e EISENHARDT, 1995, p. 358).

A corrente “resolução disciplinada de problemas” considera que uma característica de um projeto de sucesso é a “integridade de produto”, ou seja, em que proporção o novo produto mantém coerência com a imagem da empresa e com as competências da empresa. A integridade de produto, por sua vez, é construída por meio de dois fatores: a “visão do produto” (entendimento do conceito de produto) disseminada ao time de projeto pela alta direção da empresa e a liderança de gerentes de projeto com alta autonomia (BROWN e EISENHARDT, 1995, p. 363).

Brown e Eisenhardt (1995, p. 346) sintetizam o significado dos distintos conceitos relacionados com a “vantagem de produto” (como chamado nas pesquisas clássicas) e definem “efetividade de conceito de produto” como um fator de sucesso de projetos de novos

produtos composto por dois elementos: o grau de adequação do produto às necessidades do mercado, e o grau de adequação do produto às competências da empresa.

De forma complementar, a revisão da literatura de Krishnan e Ulrich (2001, p. 3) abrange pesquisas publicadas entre 1988 e 1998 e traz uma contribuição importante para identificar e diferenciar quatro tipos de linhas de pesquisa em NPD: Marketing, Organizações, Projeto de Engenharia, e Gestão de Operações. Cada linha de pesquisa possui diferentes perspectivas sobre o que é o novo produto, que métricas são utilizadas e que fatores são críticos para o sucesso, aspectos descritos na Tabela 1.1 do Capítulo 1 desta pesquisa.

Adicionalmente, Krishnan e Ulrich (2001, p. 5-8) classificam as pesquisas históricas em NPD conforme sua relação com as principais decisões típicas de um projeto de novo produto e com as decisões necessárias para definir uma estrutura organizacional na empresa dedicada a planejar e executar projetos de novos produtos. Essas classificações foram valiosas para buscar pesquisas relacionadas com o problema de pesquisa desta tese, e delimitar a perspectiva teórica adotando as linhas de pesquisa de Marketing e Gestão de Operações (vide seção 1.2 do Capítulo 1). As revisões da literatura de Brown e Eisenhardt (1995) e de Krishnan e Ulrich (2001) apresentam dois pontos em comum: são fundamentadas exclusivamente em pesquisas na indústria de produtos manufaturados (serviços não foram considerados), e o objetivo de explorar o que acontece “dentro da caixa preta” do que ocorre dentro da empresa, ou seja, os aspectos organizacionais da inovação.