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Seleção dos casos e planejamento da pesquisa

EUA Canada

3.2 Seleção dos casos e planejamento da pesquisa

As pesquisas anteriores mostram que a participação do cliente no processo NSD é um fenômeno ainda pouco presente nas empresas. Por esse motivo a seleção de casos para pesquisa buscou identificar empresas em que essa participação poderia ser mais provável. O livro de Meir e Volpi (2006) foi um ponto de partida, pois descreve 11 casos nacionais de empresas com forte orientação para o cliente e um relacionamento próximo com eles. Entrevistou-se um dos autores com o objetivo de testar uma primeira versão do protocolo de pesquisa e também identificar empresas potencialmente interessadas e receptivas para participarem de uma pesquisa acadêmica.

Também foi consultado um membro da diretoria da ABRAREC (Associação Brasileira das Relações Empresa-Cliente) com o mesmo objetivo. Essas entrevistas foram úteis para testar um protótipo de roteiro de entrevistas, e permitiu aprimorar o foco das questões, esclarecer conceitos, e aferir o tempo necessário para cada entrevista. Com essas primeiras entrevistas, foi possível identificar os executivos mais adequados para um primeiro contato e convite para participar da pesquisa. Essas atividades culminaram com a definição de amostra de pesquisa ilustrada na Figura 3.3.

Figura 3.3 – Delimitação dos casos a serem pesquisados

Fonte: O Autor.

Foram escolhidas empresas de serviços de distintas indústrias, todas atuantes não só no mercado de massa (universo grande de clientes), mas também no mercado B2C (business-to-

customer). Essa característica é importante, pois empresas de serviços que atendem um

grande número de clientes têm maior incerteza na definição do melhor conceito de produto, mais adequado às necessidades do consumidor.

Espera-se que nessas empresas as informações precisas sobre as preferências e necessidades do cliente tenham um alto potencial de contribuição, reduzindo a incerteza de projetos de novos serviços. As empresas selecionadas cobrem uma porção importante do espectro de tangibilidade de serviços (LOVELOCK e WIRTZ, 2006, p. 10), desde o banco em que os aspectos intangíveis prevalecem quase totalmente, até a construção civil em que os aspectos tangíveis estão em balanço com os aspectos intangíveis. Vale notar que a indústria imobiliária, mais acentuadamente na cidade de São Paulo, tem deslocado continuamente o foco concorrencial para adicionar serviços ao produto, seja pela personalização dos imóveis seja pelas facilidades de financiamento, assessoria jurídica e outros serviços.

A Tecnisa, devido a sua situação competitiva de construtora e incorporadora aparentemente é a empresa vanguardista que liderou o movimento de agregação de serviços e elementos

Projeto com maior participação do cliente Unibanco Indústria Bancária Fleury Indústria Saúde Tecnisa Indústria Imobiliária

Projeto com menor participação do

cliente

Projeto com maior participação do

cliente Projeto com menor

participação do cliente Projeto com maior

participação do cliente Projeto com menor

participação do cliente

intangíveis à sua oferta. Essa liderança manifestou-se com amplo destaque na mídia de negócios e motivou a mobilização de diversos concorrentes a imitar elementos de seu modelo de negócios.

Uma metáfora útil para entender a oferta da Tecnisa é o serviço de alfaiate: a Tecnisa consegue entregar produtos “sob medida”, porém trabalha com uma gama limitada de opções de tecido (localizações e áreas dos imóveis). O comportamento de agregação de serviços estudado por Gann e Salter (2000, p. 962) é mais claramente apresentado no Capítulo 6.

É importante notar que diversas pesquisas anteriores em NSD adotaram o projeto como unidade de análise, confrontando casos extremos: um deles representativo de uma situação de sucesso e o outro, de uma situação de fracasso (COOPER e KLEINSCHMIDT, 1987; MARTIN e HORNE, 1993; COOPER et al., 1994; EDVARDSSON et al., 1995; MARTIN e HORNE 1995; deBRENTANI, 1995; JOHNE e STOREY, 1998; STUART, 1998).

Em outras palavras, a pesquisa empregará o método de estudo de caso incorporado (YIN, 1994), comparando casos extremos. Outros critérios importantes foram utilizados na escolha dos casos:

• lançamentos recentes – com o objetivo de facilitar a recuperação de dados históricos e aumentar a confiabilidade dos dados, os projetos escolhidos (maior e menor participação do cliente) devem ter sido lançados com no mínimo 1 ano de antecedência à data de coleta de dados, e no máximo 3 anos. Nas pesquisas de Martin e Horne (1993, 1995) e deBrentani e Kleinschmidt (2004), os autores usaram esse mesmo limite de intervalo de tempo;

• participação no projeto - o entrevistado deve ter sido participante dos times de projeto que desenvolveram os serviços estudados. Além disso, o entrevistado deve ter uma posição hierárquica gerencial ou superior (gerência, diretoria, ou presidência);

• localização – com o objetivo de fazer um contato mais intenso e frequente do pesquisador com os entrevistados, as empresas escolhidas têm sua sede no município de São Paulo.

A escolha de três setores distintos teve como objetivo obter maior riqueza de dados e oportunidade de construir comparações em diferentes contextos industriais e competitivos. Na Tabela 3.2 traça-se um perfil das empresas em termos de porte e atuação, comparando-se

algumas características importantes a serem consideradas nas fases de coleta e análise dos dados.

Tabela 3.2 – Principais diferenças entre as empresas estudadas

Empresa UNIBANCO1 FLEURY2 TECNISA3

Longevidade 85 anos 83 anos + 30 anos

Faturamento (Receita Bruta)

R$ 126 bilhões (ativos) e 10

bilhões (receita bruta) R$ 706 Milhões (2008)

R$ 1,05 Bilhão (vendas contratadas) (2008)

Funcionários 34.217 4.5003 1.164

Clientes 29 milhões (aprox.) Um milhão (aprox.) 10.000 (aprox.)

Estrutura de capital Capital aberto Capital fechado Capital aberto (IPO em 2007) Estrutura

organizacional4 Matricial com dezenas de unidades de negócio Matricial com 4 unidades de negócio Estrutura funcional Posicionamento de

negócio (amplitude de mercados e ofertas) - Lovelock e Wirtz, 2006 (p. 52)

Muitos mercados e muitas

ofertas Mercado estreito (classe A) e muitas ofertas classe A e B) e oferta estreita Mercado estreito (nichos das Estrutura do Processo

de serviço – Kellogg e Nie (1995, p. 324), Silvestro (1992)

Fábrica de serviços

(serviços de massa) (serviços de massa) Fábrica de serviços

Baseada em Projetos (Serviços profissionais ou especializados) Papel da Inovação na estratégia corporativa Lucratividade é o principal objetivo. A Inovação é um meio para atingir maior

lucratividade

4 Inovação é central para a identidade corporativa Inovação é central para a identidade corporativa

Classificação do Serviço - Lovelock e

Wirtz (2006, p. 14) Processamento de Posses Processamento de Pessoas Processamento de Posses Frequência de compra

pelos clientes4 Compra frequente Compra pouco frequente Compra muito pouco frequente 1 Relatório Anual 2007 p.34.

2

website da empresa (acesso em fev/2009).

3 Relatórioanual 2007 (dado de final de 2007) – total de funcionários é de jan/2009. 4 Fonte: O Autor.

Na Tabela 3.2 mostra-se que as três empresas são muito distintas em termos de porte (faturamento e funcionários), estrutura organizacional e natureza do serviço. Com relação à estrutura do processo de serviço, o Unibanco e Fleury são “fábricas de serviços” (KELLOGG e NIE, 1995, p.324), ou “serviços e massa” (SILVESTRO et al., 1992, p. 73). Em outras palavras, os serviços em que o processo de produção caracteriza-se por um alto volume de transações com clientes, tempo relativamente baixo de interação com eles, e baixa modificação ou personalização da oferta, em que a agregação de valor ocorre predominantemente nas atividades de “bastidor” (BackOffice).

É comum, também, nas “fabricas de serviços” que os clientes se desloquem até as instalações físicas da empresa para o “encontro de serviços”, característica mais acentuada para o Fleury, já que o Unibanco tem a alternativa de entregar boa parte de seus serviços por meios virtuais. Ser uma fábrica de serviços significa que, para cada novo serviço lançado comercialmente, são criados processos, sistemas e instalações físicas que serão utilizados de forma integrada e repetitiva para poder entregar o serviço.

A Tecnisa, por sua vez, é uma empresa baseada em projetos, e seu processo de serviços recebe os nomes de “serviços especializados” (KELLOGG e NIE, 1995, p.324), ou “serviços profissionais” (SILVESTRO et al., 1992, p. 73), com características diametralmente opostas às das “fábricas de serviços” descritas acima. Nas empresas baseadas em projetos, cada entrega tende a ser única e, frequentemente, o resultado do projeto em termos de processos, sistemas e instalações, não é de propriedade da empresa, mas do cliente do projeto (KELLOGG e NIE, 1995, p.324). Segundo Silvestro et al. (1992, p. 73) e Kellogg e Nie (1995, p.336), empresas com distintas classificações de processo de serviços apresentam diferenças significativas em termos de estratégia, foco gerencial (orientação para produto ou orientação para processo), controle e aferição de desempenho.

Do ponto de vista da inovação, empresas que operam como “fábricas de serviço” têm a oportunidade de padronizar, aprimorar e inovar continuamente em seus processos. Por sua vez, empresas baseadas em projeto muitas vezes envolvem características não rotineiras que inibem a sistematização, padronização, o que estabelece uma fronteira entre a aprendizagem obtida no projeto e a aprendizagem que a empresa toda experimenta (GANN e SALTER, 2000, p. 957).

Destacar as diferenças essenciais das três empresas estudadas na Tabela 3.2 tem como objetivo estruturar um ponto de referência para comparação quando for feita a análise dos dados, e a construção de tabelas e diagramas para tanto. Pesquisas anteriores destacam que, sobre a inovação, empresas baseadas em projeto podem ter singularidades marcantes quando comparadas àquelas estruturadas funcionalmente (BLINDENBACH-DRIESSEN e VAN DEN ENDE, 2006), algo que é discutido em maior profundidade nos Capítulos 7, 8 e 10.

Para explorar adequadamente a amplitude dos tipos de serviços acima, com base na Tabela 3.2, e a abrangência da pergunta, foi desenvolvido um protocolo de pesquisa com o objetivo

de construir um conhecimento abrangente sobre o modelo de gestão de inovação das empresas (bloco 1 da Figura 3.4). O entendimento preliminar sobre como as três empresas inovam foi usado como ponto de partida para as questões desenvolvidas para conhecer as especificidades sobre os pares de projetos de alta e baixa participações do cliente no processo NSD. A estrutura do protocolo de pesquisa é descrito com base na Figura 3.4.

Figura 3.4 – Estrutura do protocolo de pesquisa

Fonte: O Autor.

Entende-se como modelo de gestão da inovação o conjunto de processos, normas, práticas e ferramentas usadas deliberadamente com alguma frequência para desenvolver novos serviços (inovação). No primeiro bloco empregaram-se questões abertas e descritivas sobre como a empresa se organiza para a inovação e que recursos e ferramentas aplica nessa tarefa. Esse primeiro bloco de questões teve como objetivo entender o modelo de gestão de inovação que a empresa adota, além de, permitir uma reflexão dos executivos sobre como a participação do cliente no processo de inovação ocorre em suas empresas. As bases teóricas para as questões do bloco 1 são apoiadas principalmente nos aspectos de formalização e controle do modelo de gestão da inovação (CLARK e WHEELRIGHT, 1993; EDVARDSSON, HAGLUND e MATTSSON, 1995; EDVARDSSON e OLSSON; 1996).

As questões relativas aos projetos de alta e baixa participações do cliente (blocos 2 e 3) foram planejadas para serem aplicadas na coleta de dados apenas quando as questões do bloco 1 estivessem plenamente respondidas. As questões da primeira versão do protocolo de pesquisa

Bloco inicial – Empresa Questões sobre a estratégia, importância

da inovação, processo NSD, cultura, estrutura organizacional, fontes de ideias

para novos produtos. Bloco Produto 1 – Maior

participação do cliente Questões sobre características do produto, etapas do processo NSD,

participação do cliente, participação do funcionário de atendimento, contexto interno,

contexto externo.

Bloco Produto 2 – Menor participação do cliente Questões sobre características do produto, etapas do processo NSD,

participação do cliente, participação do funcionário de atendimento, contexto interno,

foram motivadas pela análise das pesquisas anteriores conforme descrito no Capítulo 2, fundamentação teórica, com foco na identificação da contribuição dos clientes aos projetos, ou na efetividade de conceito (BROWN e EISENHARDT, 1995, p. 351) e sua participação de forma longitudinal (quais etapas do processo NSD) e latitudinal (intensidade da participação), tendo como base teórica Alam e Perry (2002) e Kaulio (1998) respectivamente.

Uma vez escolhidas as empresas para esta pesquisa, houve uma fase de preparação para entrevistas com o objetivo de aumentar o conhecimento prévio sobre as empresas e, com isso, fomentar a produtividade das entrevistas e maior foco na questão de pesquisa. Durante essa fase foi possível “testar” o roteiro de questões inicialmente planejado, por meio de entrevistas com dois especialistas setoriais que possuem uma rede de relacionamento pessoal muito importante com líderes de empresas de grande porte instaladas no Brasil.

Esses especialistas são: um membro da diretoria da ABRAREC (Associação Brasileira das Relações Empresa-Cliente) e o publisher da revista Consumidor Moderno, também autor do livro “O Brasil que encanta o cliente”. Ambas as entidades relacionam-se com grandes empresas no intuito de fomentar e divulgar boas práticas de gestão do relacionamento com clientes. Essas entrevistas foram valiosas por dois motivos: permitiram não só refinar o questionário e ajustar sua extensão e foco ao tempo estimado disponível para as entrevistas com executivos, como também identificar nomes de executivos-chave para o primeiro contato e realização de entrevistas.

A versão aprimorada do protocolo de pesquisa, aplicado nas entrevistas de coleta de dados, é apresentada no Apêndice desta tese. As empresas foram contatadas previamente por telefone e por carta com o objetivo de convidar e gerar interesse na participação dos executivos nesta pesquisa acadêmica.