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Unibanco – o processo de desenvolvimento de novos produtos

TECNISA Início: abril

4 UNIBANCO RESULTADOS EMPÍRICOS SOBRE O MODELO DE GESTÃO DA INOVAÇÃO

4.4 Unibanco – o processo de desenvolvimento de novos produtos

Como visto, a estratégia corporativa não tem a inovação como um elemento central, o que se confirma na estrutura organizacional, em que não há uma estrutura nem comitê específico para a promoção da inovação. Mas a inovação é uma realidade histórica na trajetória do Unibanco, seja em produtos, seja em processos, seja ainda em parcerias vanguardistas com outros setores da economia. É importante destacar que não há um processo formalizado de desenvolvimento de novos produtos, não há documentos que expliquem como essa atividade é conduzida passo a passo no Unibanco.

Essa realidade exigiu um esforço adicional nas entrevistas e também confirmação entre os entrevistados. A cada entrevista realizada, o pesquisador organizava os dados num modelo sequencial de etapas, que era confirmado ou modificado na próxima entrevista. Após a análise de material secundário (relatórios anuais) e cinco entrevistas com dois superintendentes (Produto e TI), foi possível construir um entendimento de como o desenvolvimento de novos serviços ocorre na prática rotineira do banco. Embora não exista a formalização do processo de desenvolvimento de um novo produto, com a função de guiar e padronizar as atividades de desenvolvimento de produto existe um padrão “tácito” de quatro etapas que devem ser cumpridas, e são amplamente reconhecidas pelos gestores. Essas quatro etapas são descritas na Figura 4.3:

Figura 4.4 – etapas de um projeto de novo produto no Unibanco

Fonte: O Autor, com base nas respostas coletadas nas entrevistas.

Ideias de

Novo Produto Business Case

Comitê de Investimentos

Desenvolvimento e Lançamento

Uma característica importante é a ausência de formalização no processo de desenvolvimento de um novo produto, em outras palavras, não há um processo geral instituído no banco que guie e padronize as atividades de desenvolvimento de produto.

Na prática, isso significa que diferentes executivos de produtos podem configurar as atividades de desenvolvimento da forma que considerar mais adequada. Embora exista uma flexibilidade em como executar o projeto, há quatro etapas obrigatórias para qualquer projeto de novo produto, descritas a seguir.

Etapa 1 - Ideias de novo produto

Não existe um programa formal interno de geração de ideias para novos produtos. Elas podem surgir de qualquer área da empresa e são discutidas ampla e abertamente em todos os níveis hierárquicos. Porém o ambiente mais profícuo de geração e aprimoramento de ideias são as reuniões frequentes de executivos nos níveis de Vice-Presidência Executiva, Vice- Presidências, Diretorias e Superintendências. Embora não existam reuniões com o objetivo específico de geração de ideias, as diversas reuniões operacionais naturalmente derivam para o compartilhamento de ideias entre executivos, sobre novos produtos, novos negócios ou até mesmo tendências do mercado.

As camadas superiores da hierarquia em particular desempenham um importante papel, pois dedicam muito de seu tempo pessoal para gerar e discutir ideias com suas equipes, e também em acompanhar de perto o desenvolvimento dessas mesmas ideias com o objetivo de acelerar o tempo de desenvolvimento (time to market). As seguintes frases exprimem o ambiente essencialmente informal e competitivo na geração de ideias e busca de resultados:

“ ... estamos em brainstorming o tempo inteiro”. “Eu tenho reuniões semanais estruturadas com a área de vendas para acompanhamento de negócios, para saber o que está acontecendo, que produto andou, qual produto não andou etc. Fora as reuniões de trabalho específicas de cada projeto”.

“Algumas coisas não têm nem dono, pode haver áreas concorrentes que estão perseguindo a mesma ideia. Quem vai executar essa ideia? Quem fizer primeiro.”

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

É comum que um Vice-Presidente Executivo forneça uma mesma ideia a áreas distintas gerando certo grau de competição interna. Nitidamente se valoriza mais a implementação e a geração de resultados do que a geração de ideias por si só.

Esse comportamento encontra sintonia com pelo menos dois valores promovidos pelo Jeito Unibanco: “cabeça nas nuvens, pés no chão”, e “o que vale é o placar”. As demais camadas hierárquicas contribuem também para direcionar o trabalho de desenvolvimento de novos produtos. Segundo as entrevistas, as áreas de Vendas e Atendimento a Clientes são áreas importantes que fornecem informações valiosas para a concepção de um novo produto ou executar aprimoramentos nos produtos atuais.

“As áreas comerciais demandam muito a área da área de produto, é uma peça importantíssima em sinalizar limitações dos produtos que afetam as vendas. Trazem informações como: o banco tal está fazendo esse negócio e nós não”.

“Eu garanto uma visão do que está acontecendo com os produtos atuais em termos de resultado, e em termos de concorrência, e informações da ponta sobre problemas”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

A área de atendimento a clientes foi abordada nas entrevistas como uma fonte valiosa de informações, porém marcada por dificuldades de captura e transmissão de informações com a área de produto.

“A área de atendimento também direciona a área de produto, porém menos que a área comercial. É mais por um mau uso nosso da área de atendimento do que qualquer outra coisa. A área de atendimento não fornece informações que geram

insights, eu fico procurando, fico puxando ... Ou eles não me informam ou a

informação que vem não é valiosa. Esse é o issue de uma área de atendimento que recebe por volta de 80 mil ligações/mês para falar só de um produto. Não consigo ver muita inteligência vindo daí”.

“Ela [a operadora de atendimento telefônico] pode ser uma excelente atendente, mas não consegue traduzir para dentro uma coisa que o cliente precisa, ou algo que o cliente tem lá fora e não tem aqui”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

Quando o projeto demanda um conhecimento mais apurado das opiniões dos clientes a área de Produto lança mão de alternativas.

“Uma das atividades que o pessoal faz é ir ouvir ligações, e gastar um tempo nas ligações com clientes. Dá um pouco mais de contato e insight, já que a resposta não vem organizada por limitação do atendente em entender o que o cliente está precisando na ponta”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

A área de TI, em particular, é muito envolvida no desenvolvimento de novos produtos, porém sua atuação concentra-se essencialmente nas etapas de desenvolvimento e teste, com pouca influência na criação de ideias de novos produtos. As entrevistas demonstram que a área de TI tende a se aproximar cada vez mais das áreas de negócios para contribuir em todas as etapas do processo de inovação.

“O Gartner traz uma linha de evolução de uma área de TI, em que ele começa como um tirador de pedido, depois se torna parceiro estratégico da área de negócios, e, na posição de maior maturidade, ele vira um consultor para área de negócios. A gente não traz, ainda, essa inovação para a área de produtos. Eu acho que hoje estamos em nível de parceria com a área de negócios”.(sic) “A estrutura de TI busca dar foco nos pilares de negócio e foco em atendimento. A gente precisa dar o outro passo saindo do foco de atendimento partindo para o foco em consultoria”. “A tecnologia é um fator facilitador e acelerador da inovação importante, e sofre muita influência de fora”. A área de TI dá apoio no aconselhamento e melhoria dos conceitos dos sistemas que dão suporte aos produtos.

“O nível de parceria interna ainda depende das pessoas envolvidas, a força do relacionamento pessoal”.

(entrevista com Superintendente de TI Varejo)

Embora exista um entendimento do valor que a área de TI poderia aportar para a área de negócios, na prática ainda há pouca contribuição daquela área na fase de criação de ideias de novos produtos. A área de Produto, por sua vez, entende o valor da contribuição de TI e busca uma aproximação maior.

“Por exemplo, para ir a um congresso eu pedi que ele [Superintendente de TI] fosse comigo. Nos dividimos nas diferentes palestras buscando agregar o conhecimento tecnológico para os negócios”.(sic

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

)

Etapa 2 - Business Case (plano de negócio)

Nesta etapa, a ideia de novo produto já recebeu diversas contribuições em discussões internas e sinais de que pode ser viável. A partir deste ponto, o processo ganha mais formalização por meio da preparação do documento/formulário chamado de AGR (Avaliação de Gestão de Risco). A AGR é uma ferramenta qualitativa que visa garantir que novas iniciativas das áreas de negócios sejam implantadas de maneira planejada e controlada por meio de uma criteriosa avaliação de riscos por todas as áreas impactadas.

O executivo da área de Produto, dono do projeto, terá de consultar todas as áreas envolvidas da empresa para apresentar a ideia de novo produto e coletar a avaliação formal de risco e outros comentários. São consultadas as áreas de TI, Jurídico, Marketing, Finanças, Atendimento, Operações e outras, conforme a natureza do projeto. Todas as áreas envolvidas têm de ser consultadas sem exceção, e seu parecer registrado no formulário AGR. Sem o formulário AGR preenchido, um projeto não pode ser submetido à aprovação do Comitê de Aprovação.

É importante destacar que o executivo da área de produtos tem autonomia total para avaliar o estágio de amadurecimento da ideia e decidir o melhor momento para iniciar os contatos internos e gerar o documento AGR. Esse contato prévio à aprovação do projeto é importante também para construir cooperação entre os gestores, o que facilitará o

desenvolvimento/execução do projeto na etapa seguinte. Uma vez completado o formulário AGR, o projeto é submetido à aprovação pelo Comitê de Investimentos que se reúne semanalmente ou em frequência suficiente para administrar a “fila” de projetos para aprovação.

Etapa 3 - Aprovação do Business Case pelo Comitê de Investimentos

O Comitê de Investimentos, liderado pelo Vice-Presidente Executivo de Planejamento, Controle, Operações e RI, é composto por executivos de diversas áreas do banco (gestão de riscos, jurídico/compliance, contabilidade, tributária, crédito, tecnologia da informação, e operações). Os critérios de decisão empregados pelo comitê contemplam três aspectos: o resultado financeiro projetado para o novo produto, a aderência às políticas de risco (de crédito, de mercado, e operacional) e o cumprimento de exigências regulatórias.

Há também um Subcomitê Técnico de Investimentos, composto por representantes das mesmas áreas que compõem o Comitê de Investimentos, ele possui duas funções: pré- aprovações de caráter técnico em projetos, e a aprovação de projetos de menor porte. Os limites de alçada de aprovação são divididos em três níveis. Projetos já previstos e orçados na verba anual de investimentos podem ser aprovados diretamente pelo Diretor de Produtos com o Diretor de Tecnologia da Informação, desde que o valor total não ultrapasse R$ 1 milhão. Projetos não previstos no orçamento anual de investimentos e que tenham valor inferior a R$ 1 milhão são aprovados pelo Subcomitê Técnico de Investimentos. Projetos com valor superior a R$ 1 milhão, estando previstos ou não no orçamento, são aprovados pelo Comitê de Investimentos.

É interessante notar que nos critérios de aprovação do Comitê de Investimento e Subcomitê Técnico de Investimentos não se julga o alinhamento estratégico do novo produto, ou grau de inovação do projeto. Isso é responsabilidade da área de Produtos.

“Eles aprovam se o projeto faz sentido ou não faz, se está bem estruturado, o risco está OK. Se há outro projeto conflitante, eles têm como identificar... mas a estratégia e a decisão do negócio não estão com eles, estão aqui [área de produto]”.

Uma vez aprovado pelo comitê, a aprovação fica documentada na FAP (Formalização de Aprovação de Projeto) em que há uma descrição do projeto, seus objetivos e resultados. Nesse momento, também há a abertura de um centro de custos para ele no sistema de controle financeiro do banco. Segundo as entrevistas, o sucesso ou fracasso de projetos realizados no passado exerce pouca influência na aprovação. Não há mecanismos ou ferramentas que facilitem a recuperação histórica de projetos anteriores.

“O único meio de recuperar informações de projetos anteriores é a memória pessoal dos membros do comitê. A controladoria tem o arquivo da FAPs já aprovadas e pode ser uma fonte de consulta”.

(entrevista com Superintendente de TI Varejo)

Em outras palavras, o comitê pode argumentar que esse mesmo projeto foi realizado no passado e não obteve os resultados desejados, porém na prática isso raramente ocorre, uma vez que essas experiências passadas não estão documentadas e são recuperadas unicamente pela memória dos membros do comitê. O comitê, porém, tem um papel importante ao avaliar possíveis redundâncias de esforços entre projetos similares.

“É comum haver certas áreas cinzentas de atuação, ou seja, a ideia que você está desenvolvendo está sendo desenvolvida por outra área também, .... algum overlap é barrado aqui (Comitê de aprovação)”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

“Houve uma ocasião em que uma unidade do banco entrou com um projeto muito similar a um projeto já em andamento em outra área.

O comitê negou o projeto”.

(entrevista com Superintendente de TI Varejo)

Ao aprovar um projeto, o comitê limita-se apenas à liberação dos recursos financeiros simplesmente e cria uma unidade contábil de custo no sistema de controle financeiro. O comitê não se envolve na alocação de recursos humanos nem no prazo de projeto. Isso é responsabilidade de negociação do executivo da área de Produtos. O comitê possui autonomia para a aprovação de projetos com orçamento até R$ 1 milhão, acima desse valor, é necessária uma segunda aprovação do Vice-Presidente Executivo de Planejamento, Controle, Operações e RI.

Uma vez aprovado o projeto e liberado o orçamento, o controle sobre o projeto é deixado totalmente nas mãos da área de Produto. Não existe um escritório de projetos que acumula a gestão do conjunto de projetos em carteira (também chamado de PMO – Project Management

Office), apesar do grande volume de projetos executados simultaneamente por todas as áreas

de produto do banco.

Etapa 4 - Desenvolvimento e Lançamento

O executivo de Produto tem autonomia total sobre o escopo, prazo, custos e lançamento do produto, lembrando que os custos são limitados ao investimento total do projeto aprovado pelo comitê. A autonomia chega a ponto de permitir ao executivo de Produto decidir por mudanças de escopo, de cronograma e decidir se o produto será lançado.

O executivo de produto, porém, não tem nenhuma autonomia na alocação de recursos humanos e não humanos. Para isso é necessário manter negociações constantes com todas as áreas envolvidas da empresa. A negociação de recursos ocorre num nível mais elevado, de Superintendência ou Diretoria, e a negociação dá-se com base no portfólio total de projetos em andamento.

“Eu [Produto] sou o dono do prazo e o que bate no prazo das demais áreas. Eu sou uma área com uma grande cabeça e nenhum braço. Eu sou o PMO”. “Eu [Produto] sou responsável por todas as frentes: contratual, jurídico, distribuição, processos, contábil, BackOffice, troca de informações entre as áreas. É a área de Produto que se responsabiliza pelo fluxo de informações no projeto”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

A necessidade de negociação de recursos com as áreas internas da empresa acaba absorvendo tempo significativo dos executivos da área de Produto, que estabelecem encontros frequentes com as principais áreas envolvidas.

“Eu tenho uma reunião semanal com TI para acompanhamento de grade de projetos, alocando recursos e prazos constantemente. É comum eu ter que repriorizar minhas atividades”.

“É o tempo inteiro pensando sobre prioridades, pois os recursos são limitados. É uma das coisas mais complicadas para acertar as coisas no desenvolvimento”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

“Há momentos que eu chego para ele [Produto] e digo são esses os projetos que conflitam, eu preciso decidir com você quais vamos dar prosseguimento agora, e quais vão para o backlog para desenvolvimento depois. Essa discussão acontece nesse nível de abertura, semanalmente”.

(entrevista com Superintendente de TI Varejo)

Cada projeto tem a figura formal de um líder de projeto, que geralmente é representado por gerentes ou coordenadores da área de Produtos, e mantêm seu foco na execução do projeto em suas diversas atividades.

“Há um gerente de projeto formal, há gerências que só se dedicam a projetos. Cada projeto tem uma liderança da área de produto e um “par” coordenando as atividades de TI, as demais áreas entram, conforme a demanda. Para cada projeto há uma pessoa da área de Produto designada, o que forma uma grade de projetos que é acompanhada semanalmente pelas áreas de Produto e TI”.

(entrevista com Superintendente de Produtos Varejo)

Esse tipo de estrutura de time de projeto, sem uma liderança forte, assemelha-se aos modelos Funcional e Lightweight descritos por Clark e Wheelright (1993).

Após as atividades de desenvolvimento, o executivo de Produto tem autonomia para decidir como será o teste e lançamento do novo produto. Quando um novo produto é desenvolvido para um público maior de clientes e utilizará intensivamente recursos de agências, há uma fase de testes de produto bastante estruturada em que os clientes participam mais ativamente.

Todos os anos a Vice-Presidência e a área de TI escolhem um grupo de agências que serão envolvidas nos testes de produto. A primeira fase de testes é feita em ambiente de testes computacionais. Numa segunda fase, o produto é testado completamente em cinco agências

durante duas semanas e, em seguida, o número de agências sobe para vinte, sem duração definida.

O último passo é o lançamento oficial para as mais de 1.000 agências do Unibanco em todo o país. Essa estrutura de testes estruturados encontra similaridade com o caso do Bank of America, analisado por Thomke (2003). A área de Produto é a responsável por treinar todos os funcionários de agências que vão interagir com os clientes, para que coletem as manifestações de aprovação ou não do produto pelos clientes.

Mesmo após o lançamento nacional, a área de Produto continua o acompanhamento do produto para garantir que as equipes estão treinadas adequadamente e que os resultados obtidos estão conforme o planejado.