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3.2 Discursos que sustentam a agricultura globalizada: diálogos entre Planos e Relatórios

3.2.12 Plano Agrícola e Pecuário 2011/2012

Os Planos Agrícolas e Pecuários vêm, em seu conjunto, reproduzindo o consenso de que o Brasil tem conquistado cada vez mais espaço por meio das atividades da esfera agrícola. A primeira afirmação do PAP 2011/2012 reforça esse consenso: O Brasil mantém sua produção

agropecuária entre as mais prósperas do planeta (p.7). Para compreender como esse consenso vem sendo construído e reproduzido pelos discursos desses documentos, levantei aqui as afirmações de outros Planos:

Plano Agrícola e Pecuário 2003/2004: apoio integral aos produtores rurais para assegurar a modernização e desenvolvimento do segmento econômico que mais cresce no Brasil (PAP 2003/2004, p.7).

O Plano Agrícola e Pecuário 2004-05 representa o reconhecimento do Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a importância da agricultura e do agronegócio para o País (PAP 2004/2005).

No Plano 2005/2006, há toda uma construção argumentativa para justificar o não-crescimento da produção do setor (conforme pode ser visto na Figura 25, analisada anteriormente). Com uma série de explicações e análises da conjuntura que levou o setor do agronegócio a não atingir suas metas previstas, o Plano anuncia as medidas para auxiliar o setor a se recuperar:

As medidas adotadas no PAP 2005-06, resumidas neste documento, indicam que o Governo está atento às necessidades do setor e que as inovações promovidas nos planos recentes estão realmente indo ao encontro das demandas da moderna agropecuária brasileira (PAP 2005/2006, p.6).

O campo tem um desafio: voltar a ser a locomotiva da economia e grande gerador de empregos, manter expressivos saldos na balança comercial e continuar promovendo a interiorização do desenvolvimento e a inclusão social (PAP 2006/2007, p.3).

O Plano Agrícola e Pecuário (PAP) 2007/2008 dá continuidade ao compromisso do Governo Lula de apoiar o setor agropecuário no cumprimento de suas funções tradicionais de abastecimento do mercado interno, expansão das exportações e geração de emprego, renda, divisas e energia (PAP 2007/2008, p.9).

O revigorado desempenho do setor agropecuário, atestado por safras recordes e acentuada expansão das exportações, tem dado importante contribuição para a retomada do crescimento da economia brasileira. Esse fato é percebido, especialmente, no atual cenário econômico internacional que, mesmo com seus efeitos adversos, tem perspectivas favoráveis em relação ao mercado agrícola mundial e às possibilidades de expansão do agronegócio brasileiro nos mercados interno e externo (PAP 2008/2009, p.7).

A performance ascendente do setor agropecuário brasileiro ao longo das últimas décadas contribuiu para atenuar os efeitos da crise financeira internacional (PAP 2009/2010, p.6).

No Plano Agrícola e Pecuário 2010/2011, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) apresenta metas e ações que confirmam e reforçam a vocação da produção rural brasileira de conjugar crescimento econômico, responsabilidade social e respeito ao meio ambiente (PAP 2010/2011, p.6).

O Brasil já é um dos principais fornecedores de proteínas no mercado internacional de alimentos, destinando o excedente de sua produção a 215 destinos do globo (PAP 2011/2012, p.7).

Ao iniciar o ano agrícola 2012/2013 com a produção de grãos da safra 2011/2012 se situando em 161,2 milhões de toneladas, o setor agropecuário permanece contribuindo decisivamente para que o Brasil se consolide como um dos principais produtores mundiais de alimentos, garantindo abastecimento interno e aumentando a participação no comércio internacional. Esse resultado revela a robustez da agricultura brasileira e sua capacidade de enfrentar adversidades e responder aos seus desafios (PAP 2012/2013, p.7).

As severas adversidades climáticas que atingiram importantes regiões produtoras do país não impediram que fosse alcançado novo recorde na produção de grãos, estimada em 184,1 milhões de toneladas, 10,8% acima do obtido na safra 2011/12. Esse desempenho, baseado em ganhos de produtividade (4,2%) e secundariamente na expansão na área plantada (6,2%), reafirma a pujança da agricultura brasileira e o empreendedorismo do produtor rural, assegurando o fiel cumprimento das funções tradicionais da agricultura de maneira econômica e ambientalmente sustentável. Estas consistem em assegurar adequado abastecimento do mercado interno, contribuir para o superávit da balança comercial e para a geração de energia, além da criação de emprego e renda (PAP 2013/2014).

A agricultura brasileira tem crescido de forma sustentável, fortemente ancorada em aumentos crescentes de produtividade, em políticas públicas adequadas e no empreendedorismo do produtor rural, expandindo e consolidando, cada vez mais, a integração econômica regional e as áreas de fronteira agrícola (PAP 2014/2015, p.1).

Segmento econômico que mais cresce no Brasil, importância da agricultura e do agronegócio

para o país, locomotiva da economia, grande gerador de empregos, promotor da

interiorização do desenvolvimento e a inclusão social, gerador de emprego, renda, divisas e

energia, responsável pelo abastecimento interno, aquele que contribui para atenuar os efeitos

da crise financeira internacional, vocação da produção rural brasileira de conjugar

crescimento econômico, responsabilidade social e respeito ao meio ambiente, o que contribui

decisivamente para que o Brasil se consolide como um dos principais produtores mundiais de alimentos, o que aumenta a participação no comércio internacional, a robustez da

agricultura brasileira e sua capacidade de enfrentar adversidades e responder aos seus desafios, a pujança da agricultura brasileira, o que promove a integração econômica

regional e as áreas de fronteira agrícola: todos esses termos vão construindo um consenso que é funcional à consolidação da vocação brasileira para a produção agrícola e pecuária em larga escala. Esse processo constitui o lugar-comum de que o agronegócio é grande gerador de emprego, de renda, de divisas, de energia; é o nosso dom. Um lugar-comum que vai, por meio da repetição de seu padrão discursivo, tornando-se um discurso hegemônico. Com base e por meio desses termos “[...] e dos lugares-comuns do discurso dominante funcional, são construídas argumentações com as quais se obtém facilmente o consenso a conclusões que resultam tão óbvias, previsíveis e indiscutíveis, contribuindo, por sua vez, para a ampliação e o incremento dos lugares-comuns do discurso” (PONZIO, 2010, p.139).

A dinâmica que se constrói discursivamente constitui a naturalização da organização da esfera agrícola em conformidade com o espírito da época globalizada neoliberal, resultando em obviedades e previsibilidade das ações da esfera agrícola brasileira, promovendo a agricultura globalizada. Se todos adotamos como inquestionável e indiscutível esse discurso hegemônico global e essa forma de organização social, torna-se também inquestionável, indiscutível e até previsível que sejam destinados R$107,2 bilhões para o financiamento da agricultura

empresarial, conforme o Plano Agrícola e Pecuário 2011/2012 anuncia, e pouco mais de R$15 bilhões para a agricultura familiar. E se torna igualmente indiscutível e óbvio que o

resultado dessa atenção especial ao campo é mais riqueza para o País, geração de empregos, uso de melhores tecnologias, respeito à sociobiodiversidade e melhores condições para os agricultores de médio porte e para todo o setor rural brasileiro (PAP 2011/2012, p.6). E é também óbvio e inquestionável, como se não houvesse outra alternativa, que todas essas

ações buscam consolidar o protagonismo do Brasil no mercado mundial de alimentos, ampliando cada vez mais os ganhos de eficiência e sustentabilidade da produção agropecuária (PAP 2011/2012, p.10).

Essa identidade que vai se criando sobre o agronegócio brasileiro consolida-se ao mesmo tempo em que se consolida a indiscutibilidade e a inquestionabilidade da necessidade de se buscar a competitividade do setor agrícola em nome da identidade discursivamente construída e cuja repetição e constância mantém justificadas todas as ações globais materializadas nos documentos e no território brasileiro. À medida que se naturaliza o consenso de que o Brasil é

o país do agronegócio, é preciso e justo que se direcionem todos os esforços possíveis para garantir sua manutenção, seu fortalecimento e sua reprodução, já que a crescente escalada da

atividade agropecuária no Brasil amplia, a cada ano, os números da produção, assegura o abastecimento interno e contribui significativamente com o fornecimento de alimentos em escala mundial, mediante a exportação dos excedentes. Isso coloca o País entre os principais fornecedores de produtos agrícolas, consolidando sua importância no cenário econômico global (PAP 2011/2012, p.72); é inquestionável, portanto, que o avanço alcançado pelo setor

agropecuário requer, em contrapartida, investimentos em infraestrutura de transporte que possibilite um custo logístico mais competitivo nos processos de escoamento das safras e na internalização de insumos (PAP 2011/2012, p.72).

Assim, ampliar rodovias, ferrovias, hidrovias, bem como ampliar e modernizar os portos e a organização dos processos logísticos são ações absolutamente necessárias no conjunto de

esforços para garantir a competitividade do setor agrícola, o que corrobora o discurso do Fórum Econômico Mundial, quando afirma que uma infraestrutura bem desenvolvida reduz o

efeito da distância entre regiões, integrando o mercado nacional e conectando a um baixo custo a mercados em outros países e regiões (FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL, 2013, p.5). Além disso, modos efetivos de transporte – incluindo qualidade de rodovias, ferrovias, portos e transporte aéreo – habilita empresários a fornecer seus produtos e serviços ao mercado de forma segura e em tempo oportuno e facilita o movimento de trabalhadores para os postos de trabalho mais adequados (FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL, 2013, p.5).

Os consensos, os lugares-comuns são materializados nesses discursos hegemônicos e hegemonizantes que reproduzem globalmente os sentidos de que é preciso investir, apoiar, facilitar, liberalizar, flexibilizar todo o conjunto de políticas, de recursos, de ações, em nome da competitividade, posto que todo esse conjunto vai garantir a continuidade da robustez e da

pujança do agronegócio brasileiro.