• Nenhum resultado encontrado

a) Injusto Conceito Injusto e ilicitude Tipo de injusto e tipo legal

12. O problema, cit., p 88-9.

de), já que o processo mental do juiz se desdobra, necessaria­ mente, em duas fases distintas, torna-se inarredável este paradoxo epistemológico: na elaboração do conceito de crime, há que se levar em conta esses dois momentos, necessariamente percorridos pelo ra­ ciocínio do julgador, mas não se deve ao mesmo tempo esquecer a unidade concreta do injusto penal.

Saliente-se, por oportuno, o seguinte: os autores que, numa fi­ liação estritamente welziana, vêem no tipo apenas o indício da anti­ juridicidade, caem freqüentemente no dilema de terem que aceitar a distinção, preconizada por Welzel, entre antinormatividade e anti­ juridicidade. O fato típico é sempre antinormativo, mas ainda não antijurídico, porque, apesar de típico, pode ser lícito 13. A artifi­ cialidade dessa construção se revela por inteiro quando se considera a contradição lógica nela contida: um fato antinormativo que, a um só tempo, esteja autorizado por alguma norma (Welzel, em vez de norma, fala em proposição, ou melhor, “proposições permissivas” — “Erlaubinissãtzen” — o que nos parece a mesma coisa). Ora, uma conduta lícita, autorizada, e, concomitantemente, “antinorma- tiva”, é qualquer coisa parecida com o “permitido-proibido”, algo muito difícil de se pensar.

13. Assim, Welzel, Das deutsche Strafrecht, cit., p. 50. Assim; tam­ bém, por exemplo, Zaffároni: “El tipo no nos permite el aeceso al cono- cimiento de los preceptos permisivos, porque su función es proporcionamos el conocimiento de la prohibición. De su lectura no podemos deducir los permisos y, consecuentemente, tampoco nos permite el conocimiento de la efectiva contrariedad de la conducta individualizada con el orden jurídico. El tipo nos permite conocer la norma prohibitiva y si todo precepto per- misivo presupone una prohibición (proposición analítica), la averiguación del permiso (presencia de causa de justificación) debe ser necesariamente pos­ terior a la de la norma prohibitiva. La circunstancia de que, eventualmente, el conocimiento de la norma prohibitiva lo logremos a través de dos o más preceptos legales, no implica que nos hallamos en presencia de ninguna causa de justificación si ninguno de ellos es un permiso.

En síntesis, con la averiguación de la tipiddad no conocemos aún la con­ trariedad de esta conducta con el orden jurídico, sino con una norma prohi­ bitiva (la antinormatividad), que no debe confundirse con la antifuridicidad:

antinormatividad es la contradicción de una conducta con una norma prohi­

bitiva, y antifuridicidad es la contrariedad de esa conducta con el orden jurí­ dico (en que armónicamente se complementan normas prohibitivas con pre­ ceptos permisivos). La antinormatividad se conoce a nivel de la tipicidad, pero la antijuridicidad no” ( Teoria del delito, cit., p. 218-9).

Resumindo: a tipicidade e a ilicitude implicam-se, numa relação indissolúvel no interior do injusto, mas conceitualmente não se confundem. O tipo, para não reduzir-se a um abstrato Leitbild, ou a um “princípio formal”, só pode ser a descrição de condutas proibidas, portanto um “tipo de injusto” (Unrechtstypus) . A ex­ clusão do injusto, pela incidência de uma norma permissiva (causa de justificação ou de exclusão da ilicitude), opera-se no momento mesmo da realização do fato justificado, não depois, quando do desenvolvimento do raciocínio do julgador, este sim condicionado a um processo cognoscitivo bifásico. O tipo de injusto, assim entendido, está infiltrado pela ilicitude, que lhe dá o verdadeiro con­ teúdo material. Não contém, porém, como elementos negativos, as causas de justificação, tal como propõe a teoria dos elemeritos ne­ gativos, a qual, todavia, chega a resultado idêntico, por meio de um procedimento invertido em relação ao que estamos preconizando. Assim, quem propositadamente fere outrem, em legítima defesa, comete a ação de ferir um ser humano, contudo, induvidosamente, não pratica um crime de lesões corporais. Para chegar-se a essa conclusão, diante de um caso concreto, há que se examinar primei­ ro a tipicidade legal do fato; depois, a. exclusão da ilicitude desse fato pela incidência preponderante da norma específica que o jus­ tifica (a legítima defesa). O fato, todavia, já nasce por inteiro de modo justificado. Sua completa cognição, por parte do órgão jul­ gador, esta sim é que exige o exame da subsunção ao tipo legal em momento anterior ao da verificação da presença de uma causa de justificação. Esse raciocínio mais se reforça na hipótese inversa, isto é, quando o fato se realiza sem a presença de qualquer causa de justificação — o que é bem mais freqüente nos casos judiciais. Nesta hipótese, a adequação típica já dá o conteúdo de ilicitude do fato, não apenas o “juízo condicionado” de ilicitude. Seria até mesmo irrealístico supor-se que o juiz, ao julgar autor de latro­ cínio, cometido com exclusivo propósito de lucro, uma vez com­ provada essa imputação e constatada a adequação típica, deva, ainda, percorrer toda a doutrina, bem como a totalidade do ordenamento jurídico vigente, na tentativa inútil de surpreender alguma inespe­ rada causa de justificação que exclua , a ilicitude do fato que já se revela, em concreto, um ilícito penal. Apenas, para efeitos proces­ suais, isto é, para acertamento do injusto diante da prova produzida, é que não se exclui, em princípio — mesmo nos casos limites, de

que é exemplo o latrocínio — a possibilidade de invocação pela defesa da ocorrência de alguma causa de justificação, caso em que o julgador deve empregar a técnica de examiná-la, em momento posterior ao do juízo de subsunção do fato ao tipo legal de crime.

Daí a diferenciação que se poderia fazer entre “tipo legal” e “tipo de injusto”. O segundo contém os elementos essenciais do primeiro, mais a nota da ilicitude. O primeiro seria um tipo de

injusto condicionado, isto é, um tipo legal de crime.

125. Tipicidade formal. Atipicidade. Ao estudar o conceito

dogmático de crime, salientamos que a tipicidade é uma de suas no­ tas essenciais. Para que uma conduta humana seja considerada cri­ me, é necessário que dela se possa, inicialmente, afirmar a tipicidade, isto é, que tal conduta se ajuste a um tipo legal de crime. Quando se diz, por exemplo, que Caio, desferindo um tiro fatal em Tício, cometeu delito de homicídio, o que em última análise se está a di­ zer é que a ação de Caio, causadora da morte de Tício, coincide em seus elementos essenciais com a figura do homicídio descrita no art. 121 do Código Penal (tipo legal). Temos, pois, de um lado, uma conduta da vida real; de outro, o tipo legal de crime, constante da lei penal. A tipicidade formal consiste na correspondência que possa existir entre a primeira e a segunda 14. Sem essa correspon­ dência não haverá tipicidade. Um fato da vida real será, portanto, típico na medida em que apresentar características essenciais coinci­ dentes com as de algum tipo legal de crime. Será, ao contrário, atí­ pico se não se ajustar a nenhum dos tipos legais existentes.

Essas considerações põem em destaque a necessidade de se con­ tar com um rol exaustivo dos tipos delitivos, o que será objeto de exame a seguir. Frise-se, contudo, que a tipicidade aqui referida é, antes, um juízo formal de subsunção (mera tipicidade formal), que decorre da “função de garantia” do tipo, para que se observe o princípio da anterioridade da lei penal. A adequação típica, den­ tro de uma concepção material, exige mais que isso, conforme ve­ remos logo adiante.

14. Nesse sentido, Dreher e Trõndle, Strafgesetzhuch und Nebengesetze,

Documentos relacionados