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Capítulo 1. Profissão Docente: desafios e definições

1.2. Profissionalismo, profissionalidade ou profissionalização?

1.2.1 Profissionalidade docente

Não há dúvida que a formação inicial, sem suporte, solitária, é insuficiente para construir a profissionalidade do professor, já que esta terá por missão promover as bases teóricas fundamentais à ação docente, sendo complementada com a atuação e experiência dentro do ambiente escolar em que o recém-professor atuará. A relação entre espaço educacional e profissionalização docente é intrínseca, afinal, será onde o professor poderá ter a real transposição daquilo que por ele foi assimilado no processo de formação inicial.

O termo “profissionalidade” está ligado diretamente ao conhecimento, competências, saberes e técnicas necessárias à ação profissional. Partindo da profissionalidade, o professor absorve diretamente categorias pertinentes para a prática de suas atividades, tais como reflexão, aperfeiçoamento, inovação, criatividade, pesquisa, saberes, competências, capacitação, dentre diversas outras. Dessa forma, a profissionalidade é o caminho na busca de um desenvolvimento profissional e pessoal, um movimento de fora para dentro, uma constante busca, algo mais pessoal de caráter formativo.

Chakur (2009) relata que a profissionalidade do professor é o aspecto realmente profissional, no momento em que o professor se assume como um profissional do ensino. É fundamental lembrar que a profissionalidade é algo que apesar de se adquir na universidade, depende muito da postura de formação continuada, de relação direta entre o eu pessoa e o eu profissional. Chakur (2009, p. 114) confirma isso citando que:

Então, a gente se forma e, de repente, como que num passe de mágica a gente é professor? Eu acho que não! Apenas a formatura é que nos delega este papel que assumimos tranquilamente? Eu tenho a impressão de que precisa de um bom tempo ainda para a gente assumir esse papel. Às vezes é mais rápido, às vezes, não! Isso depende não só da vontade, como também das condições objetivas que a gente tenha para exercer o papel.

A partir da aquisição da profissionalidade, algumas condutas, atitudes e habilidades passam a ser norteadas ao papel do professor, como aponta Chakur (2009, pp. 115-116):

- Algumas habilidades denominadas técnico-pedagógicas, como saber quais são os objetivos que ele pode colocar para suas aulas, para sua disciplina, para a série com que está lidando, como vai avaliar.

- Outro traço é a competência em habilidades psicopedagógicas, no sentido de que ele tem que conhecer um pouco o perfil daqueles alunos com quem vai lidar: são crianças de que idade? São adolescentes? Então, ele tem que saber interagir com gerações que não são a dele.

- Responsabilidade social é outra coisa, ele tem que saber que está cuidando da

cidadania das novas gerações. Não é apenas o dar aula, nem ensinar certo conteúdo.

- O compromisso político; defesa de uma mudança e transformação social que levem a

superar as desigualdades.

- Outro elemento do papel do professor seria o engajamento na rotina institucional

preenchimento de notas, faltas e conteúdos, cumprimento dos horários, das normas

da escola, que, inclusive, auxiliam na responsabilidade com seus alunos.

- E investimento na própria formação, com o objetivo de crescer, não pode parar no tempo, já que a escola não para no tempo.

Perrenoud (2001, p. 12) complementa a lista sobre a profissionalidade do professor, relatando que este profissional deve ter a capacidade de:

- com base em diversas formas de leitura, analisar situações complexas;

- de maneira rápida e refletida (re)formular estratégias de ensino conforme os objetivos e contexto real de determinado meio, fazendo uso das técnicas e instrumentos mais adequados;

- avaliar, analisar e aprender criticamente sobre as ações e resultados de sua atuação docente;

Sobre o processo de profissionalidade, Sacristán (1993, p. 73) relata que são necessárias a viabilização e implementação de programas que auxiliam não somente às falhas de conhecimentos de um professor, mas que está prática seja compreendida como “um modelo de desenvolvimento pessoal, profissional e humano”, tendo por base situações concretas. Bourdoncle7 (1991 apud LUDKE E MENGA, 2004) propõe que, no campo do estudo das profissões, a profissionalidade está relacionada às instabilidades e ambiguidades que envolvem o trabalho em tempos neoliberais, e de modo geral, vem colocado a partir de uma evolução da ideia de qualificação8.

O profissional da educação tem de ter noção que a profissionalidade do professor não é estática, ela se desenvolve, há um processo que é desencadeado em certos níveis hierárquicos, uma evolução funcional e pessoal. Chakur (2009, p. 117) desenvolve tal ideia relatando que quando “o professor melhora, ele não volta para pior depois, melhora num ponto, ele não volta a pior depois, naquele ponto. Desse modo, não é questão de tudo ou nada ser professor” e sim

níveis de profissionalidade.

O alicerce da profissionalidade docente está no compromisso com os saberes da docência que deve ser fortalecido a todo o momento na formação (inicial e continuada) do professor.

1.2.1.1 Profissionalidade docente em tempos de mudança

Tais discussões colocam o professor como centro das atenções na ação docente. Consequentemente grande parte dos temas pedagógicos convergem na sua figura. Não só pelo lugar central que ocupa no processo de desenvolvimento escolar, mas principalmente pelas responsabilidades que lhe está direcionada em termos de mudança (MORGADO, 2005) e pela própria “hiperresponsabilização dos professores em relação à prática pedagógica e à qualidade do ensino” (SACRISTAN, 1991, p.64)

7 BOURDONCLE, R. La professionnalisation des enseignants: analyses sociologiques anglaises et américaines.

Revue Française de Pédagogie, Paris, n. 94, jan./mar. 1991.

8 O autor ainda associa que no campo das profissões desenvolve o tema profissionismo ou corporatismo ligados a

O professor acaba por ser responsabilizado pelos fracassos e sucessos educacionais, esquecendo-se de fatores externos, sociais e históricos, obrigando cada vez mais aos docentes ter consciência e preparo para assumir tais responsabilidades. Morgado (2005, p. 26) ratifica tal questão citando que:

(...) o maior ou menor sucesso educativo dos estudantes é frequentemente relacionado com a qualidade da profissionalidade docente, que ocupa, assim, um lugar de destaque no debate sobre as finalidades e as práticas do sistema escolar, focalizando-se particularmente no desempenho curricular que os professores devem assumir. (...) A este debate não tem sido alheia a constante reivindicação docente no sentido de conseguir um melhor estatuto profissional.

Fernández Enguita9 (2001, apud MORGADO, 2005), destaca dois fatores que vem interferindo no próprio desenvolvimento profissional docente: primeiramente, a própria confusão sobre os conceitos básicos tais como profissão, profissionalidade, profissionalização, profissionalismo. Para o autor a compreensão de tais termos facilita no processo de formação da melhor prática docente levando a constante reflexão de seus atos. O autor verifica ainda que “existem muito poucas profissões, se é que existe alguma, em que a actividade realizada pelo profissional e o serviço recebido pelo cliente sejam tão prolongados e tão similares, como na educação”10; em segundo lugar, está no grau de comparação entre a profissão docente e outras

profissões como medicina, advocacia, arquitetura, etc., tendo por base as reivindicações do seu status profissional. O autor11 afirma que o problema está na inserção da profissão docente num modelo liberal ou burocrático, já que as características dessa profissão tornam difíceis a sua aplicação nesse ou noutro grupo. Isso ocorre porque a classe docente é um grupo profissional “com a origem e as características formais de uma profissão burocrática, mas com o ideal colectivo e a prática informal de uma profissão liberal”.

Perante tal questionamento, Fernández Enguita12 levanta a hipótese de uma terceira via como sugestão para essa saída designada como “modelo profissional democrático", que se baseia nos seguintes pressupostos:

trata-se de um modelo “democrático versus burocrático” porque um modelo democrático possibilita a participação, a escolha e a opção da clientela, o que permite tornar público um serviço que correria o risco de se resumir a uma mera imposição estatal; é um modelo “democrático versus liberal” porque se obriga ao propósito de um serviço público igualitário e não fica à mercê da distribuição individual de recursos.

9 FERNÁNDEZ ENGUITA, M. Educar en tiempos inciertos. Madrid: Morata, 2001. 10 Ibid., p. 27.

11 Idem. 12 Ibid., p. 28.

Sacristan (1991, p. 68) comunga com tal perspectiva ao relatar que a prática docente não pode vir de decisões unilaterais dos professores, isto é, “a prática não se reduz às ações dos professores”. A educação não está restrita às atividades práticas de ensino, já que existem outros âmbitos de ação que exercem grande função sobre o meio escolar.

Nesse sentido, dois pontos devem ser levados em consideração: a existência de um Estado que garanta a educação através de um serviço público com igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativos e a garantia da construção da autonomia docente e escolar, com competências para assumir funções relativas às necessidades dos estudantes (mercado de trabalho, vestibular, cidadania, etc), a fim de construírem modelos educativos democráticos (MORGADO, 2005).