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REAÇÃO ANTILIBERAL

No documento SAHID MALUF - Teoria Geral Do Estado (2013) (páginas 120-124)

1. O socialismo e a revolução russa. 2. O Estado soviético. 3. Observações. 4. Criação da CEI.

1. O SOCIALISMO E A REVOLUÇÃO RUSSA

A primeira reação antiliberal organizada foi o socialismo. Sua doutrinação começou no campo literário, no século XVIII, intensificando-se logo depois da implantação do Estado liberal, a par com a crítica da revolução francesa, até atingir o seu clímax com o Manifesto comunista de Marx e Engels, em 1848.

Até então, as ideias socialistas ou comunistas (ambas tinham o mesmo sentido) permaneciam no plano literário. Era o socialismo utópico, como agora se denomina. No terreno político, confundiam- se socialistas e anarquistas, por esposarem a mesma ideia da extinção do Estado, tanto que os principais líderes socialistas que doutrinaram em Paris nos meados do século XIX foram Louis Blanc, Joseph Proudhon, Miguel Bakunin, Natal Babeuf e outros qualificados por alguns autores como expoentes do anarquismo. Desse mesmo grupo heterogêneo, aliás, saíram Marx e Engels.

A partir da segunda metade do século XIX as correntes socialistas se cristalizaram no marxismo, que dá início ao chamado socialismo científico.

A obra de Marx, intitulada O Capital, condensa a doutrina marxista, enquanto o Manifesto

comunista, assinado por Marx e Engels, foi o grito de guerra que ecoou pelo mundo inteiro,

inspirando o socialismo revolucionário, e com este o socialismo de Estado.

As ideias marxistas proliferaram como sementeira lançada em terreno fértil. O Estado liberal, eivado de erros doutrinários, superado pelas realidades sociais, se tornara impotente para resolver o conflito, cada vez mais grave, entre as classes obreiras e patronais. Tal situação se agravara de maneira alarmante nos primeiros anos do século XX, ameaçando a estabilidade dos governos democráticos, os quais passaram a adotar medidas excepcionais de autodefesa.

A guerra de 1914-1918, chamando aos setores da defesa externa as forças militares e as atenções dos estadistas, criou ambiente propício à transformação violenta da ordem constituída. Foi o que ocorreu na Rússia: enquanto o grosso do exército se desviara para as frentes de batalha, sofrendo os reveses impostos pelas armas alemãs, encontrando-se o país desorganizado, debatendo-se numa tremenda crise social e econômica, valeu-se a corrente socialista da confusão reinante, para suprimir a velha autocracia dos Czares.

A revolução que se desencadeia nos centros industriais de Petrogrado e Moscou é inspirada no

Manifesto comunista, tendo por objetivo a inversão fundamental da ordem política, com a destruição

da sociedade burguesa, a abolição da propriedade privada, a nacionalização das fontes de produção e a instauração da ditadura do proletariado.

Vitoriosa a revolução, abdicou o Czar em 15 de março de 1917. De acordo com o Comitê Executivo, a Duma nomeou o governo provisório, composto de representantes de todos os partidos. Tal solução de emergência, porém, não contentou o Conselho de Operários e Soldados, o que levou

a assumir o poder o chefe do Partido Socialista Revolucionário, Kerenski, que foi um dos vultos mais proeminentes e de real mérito em toda a história da revolução russa.

A princípio a revolução socialista caminhava num sentido mais ou menos horizontal, tendendo para a estruturação de um Estado liberal proletarista, mas o governo provisório era idealista e fraco, o que permitiu que as correntes extremistas desfechassem a contrarrevolução e organizassem o

sovietismo.

Contra o Partido Socialista Revolucionário levantara-se o Partido Operário Russo Social-

Democrático, que desde logo se viu dividido em duas facções: Menchevique e Bolchevique.

O grupo Bolchevique (maioria), dirigido por Wladimir Ilitch Ulianov, conhecido mundialmente pelo nome de Lenin, apoderou-se do governo através da sua Guarda Vermelha , sob o comando de Trotsky, em novembro de 1917. Assumiu o poder o Conselho de Operários, sob a denominação

Congresso Nacional de Operários, Camponeses e Soldados, confiando-se o poder executivo a um Conselho de Comissários do Povo, sob a presidência de Lenin.

O Estado, que se diz comunista, anuncia a nova ordem como ditadura do proletariado. Em verdade, porém, é a ditadura do Partido Bolchevista que se instaura, inaugurando o reino do terror: eliminação sumária dos adversários, luta feroz pelo extermínio da religião, estatização da economia, subordinação da justiça ao controle do executivo, concentração de poderes nas mãos do Presidente do Conselho e um simulacro de representação, consistente em conselhos, comitês, comissariados etc., cujos membros são eleitos segundo a vontade do partido único.

A convocação de uma Assembleia Constituinte, prevista e anunciada pela revolução bolchevista, realizou-se efetivamente, logo em dezembro de 1917, mas como Kerensky obtivesse esmagadora maioria, a Constituinte foi dissolvida por decreto de Lenin, em 18 de janeiro de 1918.

O comunismo de guerra, que se instaura, passa por sucessivas modificações, para dar lugar à chamada Nova Política Econômica, cujo arcabouço vem delineado nas Leis Fundamentais de 1918, 1925 e 1936. Sucederam-se as medidas governamentais de alcance econômico, tais como a abolição da propriedade da terra, a nacionalização dos bancos, a organização do comércio privado etc.

Em fevereiro de 1918 foi criado o Exército Vermelho de Operários e Camponeses. Em março foi transladada a capital, de Petrogrado para Moscou. Em julho o Partido Bolchevista determinou a execução do Czar e de toda a família imperial. Durante o período do comunismo de guerra, Lenin enfrentou com pulso de aço a guerra civil, o bloqueio estrangeiro, a desarticulação completa da indústria, do comércio, da lavoura, de todas as fontes de produção, sobretudo a calamidade da fome.

Depois de 1921 entra o país numa fase de recuperação nacional, com o renascimento da indústria, a organização dos sindicatos, a fundação do Banco do Estado etc. Na ordem jurídica, foi promulgada a Declaração de Direitos do Povo Operário e Explorado, publicado o Código Civil, sendo ainda elaboradas diversas leis fundamentais.

2. O ESTADO SOVIÉTICO

Segundo a Lei Fundamental de 1923, a URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) era um tipo sui generis de confederação ou federação de Estados, visando uma cooperação efetiva de nações diversas para a manutenção da ordem socialista. A sua configuração política compreendia vários círculos autônomos, hierarquizados, tendo como órgão supremo o Congresso dos Soviets, composto de duas câmaras: o Soviet Federal e o Soviet das Nacionalidades.

O Soviet Federal (ou Soviet da União) era composto de representantes do povo, eleitos por quatro anos, na proporção de 1 por 25.000 habitantes. O Soviet das Nacionalidades, equivalente ao Senado dos Estados democráticos federativos, era composto de representantes das Repúblicas soviéticas unidas.

O Partido Bolchevista, ou Comunista, partido único, era o supervisor máximo de toda a organização política, social, econômica, administrativa e jurídica. A lei, em última análise, era uma expressão da vontade do partido. O mais alto posto de todos os departamentos estatais era ocupado pelo chefe do partido dominante.

Em resumo, eram características essenciais do Estado socialista russo: a) partido único; b) ditadura classista; c) governo coletivista integral e materialista; d) concentração de poderes no órgão executivo; e) eliminação da propriedade privada; f) estatização integral da economia; g) nacionalização das fontes de produção; h) imperialismo internacionalista.

3. OBSERVAÇÕES

Segundo o ideal comunista, o Estado seria um mal necessário, uma organização transitória, devendo extinguir-se por etapas. Atingido o estágio superior da ordem comunista, extinguir-se-ia o governo de pessoas, para dar lugar a um sistema de simples administração das coisas comuns.

Até 1936, pelos menos, essa era a doutrina. O Estado desapareceria como consequência do nivelamento das classes. Suprimidas estas, ao ser atingido o estágio superior da ordem comunista, cessariam as lutas, e com elas, a razão de ser do Estado.

Posteriormente, porém, o bolchevismo resolveu cancelar essa parte programática, mandando liquidar sumariamente os que a defendiam, notadamente o líder Pashunkanis, que foi um dos mais destacados teóricos do comunismo.

Assim, o sovietismo, firmando-se como uma ditadura classista, é uma negação do ideal comunista. Tornou-se ainda uma negação do marxismo, desde que se degenerou num sistema de capitalismo

de Estado e numa ditadura que Marx só previa como período de transição para a implantação da

ordem socialista ideal.

A ideologia soviética se diz essencialmente dinâmica; seria uma Revolução em marcha. Por isso mesmo estaria sujeita a contínuas transformações, para atender aos novos fatores e adaptar-se aos novos fenômenos sociais. A tática de recuos, disse Lenin, faz parte dessa revolução em marcha para a conquista do mundo.

O Estado soviético era essencialmente ecumênico, transcendendo do campo interno para o internacional; pregava a união dos trabalhadores do mundo inteiro, açulando as reivindicações proletárias além das suas fronteiras e criando uma atmosfera de instabilidade e de agitação social, como convinha aos seus objetivos de expansão.

Nos últimos anos, porém, a história registrou a falência do modelo marxista corporificado pela extinta URSS.

Mikhail Gorbachev assumiu em março de 1985 a secretaria geral do Partido Comunista, disposto a modernizar o modelo então vigente, cujos sinais de exaustão já eram mais do que visíveis. Lançou, logo nos meses seguintes, o programa da “Perestroika” (reestruturação) e da “Glasnost” (transparência), compromissos de reforma da economia e das estruturas políticas. Em outubro de 1988, ampliou o seu poder político e foi eleito Presidente da URSS, cargo que em maio de 1989

acumulou com a presidência do novo Parlamento Soviético.

Em fevereiro de 1990, o Partido Comunista da União Soviética (PCUS) renuncia ao monopólio do poder, ao mesmo tempo em que começam a cair governos comunistas de países vizinhos do Leste Europeu.

Em 19 de agosto de 1991 ocorre uma tentativa frustrada de golpe por parte dos setores militaristas ortodoxos da URSS. Esse golpe frustrado acaba por consolidar os poderes políticos dos reformistas mais radicais, liderados por Boris Yeltsin, primeiro presidente da Rússia eleito por voto direto em junho de 1991, e precipita irremediavelmente o fim do modelo marxista então praticado e da própria URSS.

4. CRIAÇÃO DA CEI

Uma das primeiras manifestações da desintegração da URSS aconteceu em 11 de março de 1990, com a declaração de independência da Lituânia, seguida em 1991 pelas da Geórgia, Estônia, Letônia, Ucrânia e demais Estados. Em 8 de dezembro, os Presidentes da Rússia, Ucrânia e Bielorrússia, reunidos nos arredores da cidade bielorussa de Brest, firmaram o documento de criação da Comunidade dos Estados Independentes — CEI, no modelo confederativo, oferecendo-o para a adesão das demais repúblicas, numa ação direta e decisiva contra a estrutura da URSS, ainda comandada por Mikhail Gorbachev.

Com a adesão de mais nove Estados aos princípios ali expostos, consolidando a nova Confederação, e sem outra alternativa, a 25 de dezembro de 1991 Gorbachev renuncia e a bandeira soviética no Kremlim é arriada, marcando o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

Em seu discurso de renúncia e despedida, Gorbachev encontrou espaço para reafirmar sua fé comunista, dizendo que o PCUS não poderia ser responsabilizado pelos pecados de seus líderes. Registrou que a CEI nascia da dissolução de um Estado que ele tentara preservar a qualquer custo, e que as reformas haviam nascido do próprio Partido: “Foi no Partido que essas mudanças nasceram, e foram líderes do Partido que tiveram a coragem de lançar suas plataformas”.

XXIX

No documento SAHID MALUF - Teoria Geral Do Estado (2013) (páginas 120-124)