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Capítulo 2: O sistema de ensino da Irlanda do Norte desde a primeira metade do século

2.3. Segregação e Escolas Integradas

Como é possível observar, a Irlanda do Norte sempre possuiu um sistema de ensino divi- dido. Alunos católicos frequentavam escolas católicas e alunos protestantes frequentavam as escolas protestantes. Raramente havia contacto entre os alunos dos dois credos religi- osos, o que fazia com que o desconhecimento, a desconfiança e a segregação não tivessem fim à vista. Paralelamente, a sociedade vivia num estado de medo e de violência. Duas comunidades vizinhas cometiam, diariamente, violentas atrocidades contra a outra.

Em 1973 foi criado, na Universidade de Queens, o Projeto Malone. Na época, um cora- joso diretor de uma escola sediada em Belfast tentou persuadir o Ministro da Educação da época a financiar o projeto que previa aproximar as duas maiores comunidades da Irlanda do Norte, através da Educação, (desenvolvimento curricular, atividades e reuniões conjuntas). Contudo, devido à falta de verbas do Governo, os fundos não chegaram para este projeto.

Mais tarde, surgiram mais dois novos projetos na Universidade de Ulster. O primeiro intitulava-se Social Sciences Curriculum Project e o segundo projeto dizia respeito à edu- cação religiosa. Segundo Alan Smith, o sucesso destes dois projetos é difícil de estimar, já que os mesmos eram experimentais. Paralelamente, muitos voluntários começaram a trabalhar em conjunto para estabelecer pontes entre escolas católicas e escolas protestan- tes. O número de voluntários aumentou e no final dos anos 1990 existiam aproximada- mente 20 instituições que trabalhavam a paz entre as várias comunidades e as escolas. Segundo o autor, estes projetos eram dispersos geograficamente e isolados e cada um contribuiu para a criação e aperfeiçoamento de um programa que incluía o trabalho do currículo, técnicas para a resolução de conflitos ou técnicas educativas para a promoção da paz. Também com estes projetos, o número de voluntários foi gradualmente aumen- tando e, pouco a pouco, a população começou a trabalhar a paz na Irlanda do Norte (Smith, 1999).

Como se sabe, as escolas católicas e protestantes não tinham qualquer contacto e viviam à margem uma da outra. Os alunos não conviviam, à semelhança das duas comunidades educativas. Neste sentido, em 1976, um conjunto de investigadores da Universidade de Ulster formou a equipa Ford Foundation e iniciou um questionário relativo ao sistema de ensino da Irlanda do Norte. Foi publicado, no ano seguinte, o trabalho Schools Apart, que pretendia estudar as diferenças entre os dois sistemas e averiguar o quanto estavam sepa- rados. Paralelamente, muitos dos entrevistados mostraram a sua ansiedade relativamente à Educação e à segregação religiosa. Mais tarde, foi feita uma segunda investigação: Schools Together, que pretendeu “medir” a quantidade de contacto entre as escolas cató- licas e as escolas protestantes, tendo sido o resultado final bastante desolador: um con- tacto mínimo. A terceira investigação tentou implementar projetos para ligar as várias escolas, de uma mesma área geográfica. Este projeto acabou por durar quatro anos, (entre 1986 e 1990), e produziu dois relatórios. Assim, os alunos de escolas católicas e protes- tantes tiveram a oportunidade de aprender tópicos do currículo juntos, de conviver e brin- car. Estes encontraram-se de forma regular e trabalharam como se de um dia de escola normal se tratasse. Já nas escolas secundárias, os professores trabalharam juntos para criar um único programa de História da Irlanda. No segundo relatório, o projeto foi alargado a outras duas comunidades e foram avaliados alguns aspetos do mesmo trabalho. Os resul- tados destes projetos-piloto foram muito importantes e mostraram que os alunos passaram a possuir uma atitude mais crítica no que diz respeito à História da Irlanda, uma vez que desmitificou muitos mitos acerca das comunidades e que promoviam ainda mais a segre- gação das mesmas. Para além disso, os relatórios mostraram que o contacto entre alunos católicos e protestantes era mais positivo quando estes trabalhavam um currículo com uma abordagem mais reforçada. De salientar ainda que estes projetos mostraram que o contacto entre as duas comunidades era possível, benéfico e os pais aprovavam este tipo de iniciativas. Mais tarde, em 1987, o Governo financiou com 0,4 milhões de libras anu- ais, um programa que tinha como objetivo envolver as escolas da Irlanda do Norte neste projeto, ou seja, no Inter School Contact. O contacto entre as escolas das várias comuni- dades foi progressivamente aumentando e, segundo o autor, tanto as escolas primárias como as escolas secundárias estão a participar, na atualidade, em algum tipo de programa desta índole172 (Smith, 1999).

2.3.2. Escolas Integradas

“I do not know of any measures which would prepare the way for a better feeling in Ireland than uniting children at an early age and bringing them up in the same school, leading to commune with one another and to form those little intimacies and friendships which often subsist through life. Dr. James Doyle, Roman Catholic Bishop of Kildare and Leighlin, 1826 citado por Bardon (2009), p. 1.

Foi tendo em conta toda a realidade vivida na Irlanda do Norte e tendo em mente que a Educação é um poderoso instrumento de paz, que um grupo de pessoas decidiu lutar por um ensino integrado, ou seja, onde crianças católicas e protestantes pudessem aprender juntas, convivendo diariamente e perceber que o outro não é assim tão diferente.

Assim, surgiu, em 1974, o grupo All Children Together, (ACT), ou seja, Todas as Crian- ças Juntas. Foi através deste movimento que foi possível criar um ambiente propício ao diálogo acerca da educação integrada, o que acabou por criar “(…) opened arguments, promoted discussion and debate encouraged research, and allowed various strategies for the generation of change to be tested” (Osborne, Cormack & Gallagher (Org.), 1993, p. 26).

Mais tarde, em 1978, foi criada mais uma subcategoria no sistema educativo da Irlanda do Norte, denominado Controlled Integrated Schools. Foi apenas 3 anos mais tarde que abriu a primeira escola mista ou integrada: a Lagan College. Depois desta escola, muitas outras acabaram por abrir e, em 1989, estavam em funcionamento 14 escolas integradas, na sua maioria, escolas primárias. Todas estas escolas foram o resultado da forte iniciativa dos pais, o que levou o Departamento da Educação e o Ministro Brian Mawhinney a realizar algumas reformas de forma a incentivar a abertura de mais escolas integradas (Osborne, Cormack & Gallagher (Org.), 1993).

Em consequência da abertura das escolas integradas, foi publicada em 1982, pelo Depar- tamento da Educação da Irlanda do Norte, a circular intitulada “The improvement of Community Relations: the Contributions of School”. Este documento foi extremamente importante, não só pelas orientações que dava, mas também pelo seu simbolismo, pois foi a primeira vez que se pensou como é que se podia melhorar as relações das duas comunidades, sendo as escolas um instrumento valioso nesse percurso. Assim, e como referem os autores, o Departamento da Educação da Irlanda do Norte começou a canalizar

cada vez mais verbas para o trabalho das relações entre as comunidades a partir das esco- las e começou também a criar documentos para orientar este processo (Osborne, Cormack & Gallagher (Org.), 1993, p. 27).

Assim, o Governo envolveu-se em projetos que tinham como principal objetivo promover a paz, o respeito e a tolerância entre as comunidades Norte-Irlandesas. Desta forma, com a circular de 1982, o Governo escrevia: “the Contribution of Schools which stated that “Every teacher, every school manager, Board member and trustee, and every educational administrator within the system has a responsibility for helping children learn to under- stand and respect each other”. Em 1983, o NICED, (Northern Ireland Council for Edu- cation Development), foi criado para tratar questões relacionadas com a Educação, com o desenvolvimento curricular e com as relações entre as várias comunidades. Foi desta forma estabelecida uma junta que deveria reformar o Sistema Educativo da Irlanda do Norte (Smith, 1999, S/p).

2.4. Reforma do sistema educativo da Irlanda do Norte na segunda metade do século