• Nenhum resultado encontrado

2.5 A RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL

2.5.3 A solidariedade entre os causadores

Ao lado do estabelecimento e da comprovação do nexo de causalidade, outro grande desafio enfrentado pela responsabilidade civil ambiental e que será aprofundado ao longo desta tese, é o fato dos danos ao meio ambiente serem normalmente ocasionados por múltiplos agentes.

Em face desta autoria múltipla, cabe aos Estados a escolha entre uma responsabilização individualizada, que responsabiliza o agente apenas pela parcela de dano gerada concretamente pela sua atividade ou uma responsabilização solidária, que torna cada agente responsável pela totalidade da reparação.

Catalá (1998, p. 189) lembra que a opção por um ou outro modelo encobre a discussão em torno de quem deverá suportar o risco da insolvência de qualquer um dos agentes causadores do dano, pois, no primeiro caso, a vítima será obrigada a suportar a perda da reparação enquanto que, no segundo, a carga deverá ser arcada pelos demais autores.

A adoção de um sistema de responsabilidade individualizada em caso de autoria múltipla pode acarretar uma série de problemas probatórios, principalmente nos casos de contaminação acumulada, pois, nestes casos, é muito difícil definir a cota de participação de cada agente. Por conta disso, a maior parte dos ordenamentos opta, atualmente, pelo sistema de responsabilidade solidária (CATALÁ, 1998, p. 190).

Embora não haja disposição expressa na legislação ambiental brasileira a respeito da solidariedade passiva, há firme posição jurisprudencial neste sentido.

A construção é feita com base no art. 3º, inc. IV da Lei 6.938/1981, que define poluidor como “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” e no art. 942 do Código Civil que estabelece que para a responsabilidade civil extracontratual, “os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação”.

Recentes julgados do Superior Tribunal de Justiça têm reafirmado esse entendimento, como se pode notar a partir da ementa dos Recursos Especiais nº 18567/SP e 37354/SP, ambos apreciados pela 2ª Turma do Tribunal.

O primeiro Recurso Especial foi relatado pela Ministra Eliana Calmon e teve a seguinte ementa:

PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE PASSIVA.

SOLIDARIEDADE.

1. A solidariedade entre empresas que se situam em área poluída, na ação que visa preservar o meio ambiente, deriva da própria natureza da ação.

2. Para correção do meio ambiente, as empresas são responsáveis solidárias e, no plano interno, entre si, responsabiliza-se cada qual pela participação na conduta danosa

3. Recurso especial não conhecido.25

O segundo teve a relatoria do Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. A ementa foi redigida desta forma:

AÇÃO CIVIL PUBLICA. RESPONSAVEL

DIRETO E INDIRETO PELO DANO

CAUSADO AO MEIO AMBIENTE.

SOLIDARIEDADE. HIPOTESE EM QUE SE

CONFIGURA LITISCONSORCIO

FACULTATIVO E NÃO LITISCONSORCIO NECESSARIO.

I - A ação civil pública pode ser proposta contra o responsável direto, contra o responsável indireto ou contra ambos, pelos danos causados ao meio ambiente. Trata-se de caso de responsabilidade solidária, ensejadora do litisconsórcio facultativo

25

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ementa. Acórdão em recurso especial n. 18.567/SP. Relator: Ministra Eliana Calmon. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 01 ago. 2010.

(C.P.C., art. 46, i) e não do litisconsórcio necessário (C.P.C, art. 47).

II - Lei n. 6.898, de 31.8.91, arts. 3., IV, 14, par. 1., e 18, parágrafo único. Código Civil, arts. 896, 904 e 1.518. Aplicação.

III - Recurso especial não conhecido.26

Assim, tem-se entendido que, se a degradação ambiental tiver mais de um agente, que tenha atuado direta ou indiretamente, todos devem responder de forma solidária e, por consequência, a reparação pode ser exigida, sem distinção de um, alguns ou de todos os causadores.

Importa notar que o art. 3º, inc. IV da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente não difere entre a causa principal e secundária do evento danoso para reduzir ou eliminar a obrigação de reparar. Assim, qualquer causador, não importa se tenha contribuído de maneira mais ou menos significativa, pode ser demandado para responder integralmente pelo dano ambiental. A contribuição causal, como destaca o primeiro acórdão, só tem relevância no plano interno entre os causadores e pode ser apurada em posterior ação de regresso.

Sob o ponto de vista processual e como consequência da própria solidariedade, sendo a ação intentada contra mais de um causador, formar-se-á um litisconsórcio passivo facultativo.

Situação diversa ocorre, no entanto, quando a degradação é ocasionada por múltiplos agentes, mas em circunstâncias de modo e em locais diversos, não sendo possível vislumbrar um vínculo entre elas.

Esta questão foi analisada pelo Ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, ao examinar Recurso Especial nº 647.493/SC.

O Recurso Especial cuidava da responsabilização pela poluição ocasionada no município de Criciúma e adjacências, decorrente da extração de carvão mineral. Dentre as diversas questões debatidas, enfrentou-se a possibilidade de imposição da responsabilidade solidária às carboníferas, que atuavam em diferentes municípios catarinenses.

Assim opinou o ministro relator:

26 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ementa. Acórdão em recurso especial n. 37.354/SP. Relator: Ministro Antônio Pádua Ribeiro. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 01 ago. de 2010.

[...] havendo mais de um causador de um mesmo dano, devem responder solidariamente pela degradação ambiental. Todavia, se diversos forem os poluidores, mesmo que a poluição seja idêntica, mas perpetrada em lugares distintos e independentes, não há como atribuir-se a responsabilidade solidária, ante a falta de nexo causal entre o dano verificado em determinado local, ressalvado, por óbvio, as hipóteses de dano uno e indivisível, como se dá, v.g. na poluição dos recursos hídricos, subterrâneos e do ar.27

Neste caso, ausente a unidade e a indivisibilidade do dano ambiental, a solução mais adequada é mesmo a dissociação dessas condutas, considerando cada lesão como um dano independente.